Proposta de resolução comum - RC-B8-0265/2018Proposta de resolução comum
RC-B8-0265/2018

PROPOSTA DE RESOLUÇÃO COMUM sobre o Sudão, em particular a situação de Noura Hussein Hammad

30.5.2018 - (2018/2712(RSP))

apresentada nos termos do artigo 135.º, n.º 5, e do artigo 123.º, n.º 4, do Regimento
em substituição das propostas de resolução seguintes:
B8‑0265/2018 (ECR)
B8‑0266/2018 (Verts/ALE)
B8‑0267/2018 (S&D)
B8‑0269/2018 (PPE)
B8‑0270/2018 (GUE/NGL)
B8‑0271/2018 (ALDE)

Cristian Dan Preda, Joachim Zeller, José Ignacio Salafranca Sánchez-Neyra, Pavel Svoboda, Jaromír Štětina, Tomáš Zdechovský, Lefteris Christoforou, Marijana Petir, Tunne Kelam, Csaba Sógor, Laima Liucija Andrikienė, József Nagy, Ivan Štefanec, Eduard Kukan, Roberta Metsola, Jarosław Wałęsa, Lars Adaktusson, Giovanni La Via, Elisabetta Gardini, Željana Zovko, David McAllister, Michaela Šojdrová, Bogdan Brunon Wenta, Adam Szejnfeld, Seán Kelly, Deirdre Clune, Mairead McGuinness, Francis Zammit Dimech, Dubravka Šuica, László Tőkés, Sandra Kalniete, Ivana Maletić, Ivo Belet, Jiří Pospíšil, Andrey Kovatchev, Elmar Brok, Ramona Nicole Mănescu, Inese Vaidere, Esteban González Pons em nome do Grupo PPE
Elena Valenciano, Victor Boştinaru, Soraya Post em nome do Grupo S&D
Charles Tannock, Ruža Tomašić, Jan Zahradil, Valdemar Tomaševski, Jana Žitňanská, Notis Marias, Raffaele Fitto, Monica Macovei, Branislav Škripek, Pirkko Ruohonen-Lerner em nome do Grupo ECR
Urmas Paet, Nedzhmi Ali, Petras Auštrevičius, Beatriz Becerra Basterrechea, Izaskun Bilbao Barandica, Dita Charanzová, Gérard Deprez, Martina Dlabajová, Filiz Hyusmenova, Ivan Jakovčić, Petr Ježek, Ilhan Kyuchyuk, Patricia Lalonde, Valentinas Mazuronis, Louis Michel, Maite Pagazaurtundúa Ruiz, Jozo Radoš, Frédérique Ries, Robert Rochefort, Marietje Schaake, Pavel Telička, Ramon Tremosa i Balcells, Ivo Vajgl, Johannes Cornelis van Baalen, Hilde Vautmans em nome do Grupo ALDE
Maria Heubuch, Bodil Valero, Michèle Rivasi, Judith Sargentini em nome do Grupo Verts/ALE
Miguel Urbán Crespo, Merja Kyllönen, Dimitrios Papadimoulis, Kostadinka Kuneva, Luke Ming Flanagan, Marie-Christine Vergiat, Xabier Benito Ziluaga, Lola Sánchez Caldentey, Estefanía Torres Martínez, Patrick Le Hyaric, Barbara Spinelli em nome do Grupo GUE/NGL
Ignazio Corrao, Fabio Massimo Castaldo, Daniela Aiuto, Aymeric Chauprade


Processo : 2018/2713(RSP)
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RC-B8-0265/2018
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Resolução do Parlamento Europeu sobre o Sudão, em particular a situação de Noura Hussein Hammad

(2018/2712(RSP))

O Parlamento Europeu,

–  Tendo em conta as suas anteriores resoluções sobre o Sudão,

–  Tendo em conta o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, de 1966, no qual o Sudão é parte contratante desde 1986,

–  Tendo em conta a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, na qual o Sudão é parte contratante desde 1990,

–  Tendo em conta a Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948,

–  Tendo em conta a resolução da Assembleia-Geral das Nações Unidas de 19 de dezembro de 2016 sobre os casamentos infantis, precoces e forçados,

–  Tendo em conta a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (CEDAW), adotada pela Assembleia-Geral das Nações Unidas em 1979, e a Declaração sobre a Eliminação da Violência contra as Mulheres (DEWAW), adotada pela Assembleia-Geral das Nações Unidas em 1993,

–  Tendo em conta a resolução 62/149 da Assembleia-Geral das Nações Unidas, de 18 de dezembro de 2007, apresentada pela UE e reafirmada em 2008, 2010, 2012, 2014 e 2016, que apelava a uma moratória sobre a pena de morte,

–  Tendo em conta o primeiro Protocolo à Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos, adotado em 1981, relativo aos Direitos da Mulher em África,

–  Tendo em conta os artigos 16.º e 21.º da Carta Africana dos Direitos e do Bem-estar da Criança, que entrou em vigor em 29 de novembro de 1999,

–  Tendo em conta a carta de recurso urgente respeitante ao caso de Noura Hussein Hammad, enviada em 17 de maio de 2018 pelo Comité de Peritos Africanos sobre os Direitos e o Bem-estar da Criança (ACERWC) à República do Sudão,

–  Tendo em conta a Constituição do Sudão de 2005,

–  Tendo em conta o artigo 96.º (cláusula dos direitos humanos) do Acordo de Cotonou, assinado pelo governo do Sudão em 2005,

–  Tendo em conta a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável,

–  Tendo em conta o artigo 135.º do seu Regimento,

A.  Considerando que Noura Hammad Hussein foi forçada pela própria família a casar-se com Abdulrahman Hammad quando tinha apenas 16 anos; considerando que Noura declarou ter sido violada pela primeira vez pelo marido com a ajuda de familiares; considerando que, de acordo com o seu depoimento, em 2 de maio de 2017, três homens seguraram Noura Hussein enquanto Abdulrahman a violava; considerando que Noura esfaqueou mortalmente o marido, ao defender-se de uma nova tentativa de violação no dia seguinte; considerando que um exame médico posterior indicou que Noura também tinha ficado ferida na luta com o marido;

B.  Considerando que Noura Hussein Hammad permaneceu presa na cadeia de Omdurman até 29 de abril de 2018, data em que foi considerada culpada de homicídio premeditado; considerando que Noura Hussein Hammad, que tem agora 19 anos, foi condenada à pena de morte pelo Tribunal Penal Central de Omdurman pelo homicídio do homem com quem o pai a obrigou a casar-se; considerando que, na altura em que a sentença foi proferida, a família do homem escolheu a pena de morte como «castigo» adequado para Noura Hussein Hammad; considerando que foi interposto recurso da sua condenação;

C.  Considerando que o Gabinete do Alto Comissário para os Direitos do Homem recolheu informações segundo as quais o casamento forçado, a violação e outras formas de violência com base no género contra Noura Hammad Hussein não foram tomadas em consideração pelo Tribunal como elemento de prova para atenuar a sentença; considerando que o Perito das Nações Unidas em Execuções Sumárias alegou que a imposição da pena de morte quando há provas claras de legítima defesa constitui uma execução arbitrária;

D.  Considerando que o Sudão ocupa o 165.º lugar entre 188 países no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e no Índice de Desigualdade de Género das Nações Unidas; considerando que o Comité dos Direitos da Criança das Nações Unidas (CDC) e o Comité dos Direitos Humanos das Nações Unidas manifestaram a sua profunda preocupação com a situação dos direitos humanos das mulheres no Sudão; considerando que o sistema judicial no Sudão se baseia na Lei Islâmica (xária); considerando que existem provas de que, quando não são política, cultural e economicamente iguais aos homens, as mulheres são sujeitas a violência com base no género, independentemente da sua crença, raça ou nacionalidade;

E.  Considerando que a Constituição do Sudão dispõe que «o Estado protege as mulheres contra a injustiça e promove a igualdade entre homens e mulheres»; considerando que Pramila Patten, a Representante Especial das Nações Unidas para a violência sexual em situações de conflito, afirmou, na sequência da sua visita ao Sudão de 18 a 25 de fevereiro de 2018, que existe uma cultura profundamente enraizada de negação da violência sexual naquele país; considerando que o casamento forçado, a violação conjugal e a violência de género são considerados normais no Sudão, e que todas estas formas de violência são justificadas por razões de tradição, cultura e religião; considerando que, até à data, o Gabinete do Procurador Especial não investigou um único caso de violência sexual em situações de conflito;

F.  Considerando que o mandato do Tribunal Penal Internacional (TPI) para lutar contra a impunidade por crimes de guerra, crimes contra a humanidade e genocídio inclui igualmente as atrocidades de que as mulheres são comummente vítimas, incluindo um vasto leque de crimes sexuais e com base no género; considerando que o TPI emitiu, em 4 de março de 2009, um mandado de captura contra o Presidente Omar Al Bashir da República do Sudão, acusado de cinco crimes contra a humanidade: homicídio, exterminação, deslocação forçada, tortura e violação;

G.  Considerando que foi lançada em todo o mundo uma campanha global denominada «Justiça para Noura Hussein Hammad» que visa revogar a pena de morte; considerando que, desde maio de 2018, cerca de um milhão de pessoas assinaram uma petição intitulada «Justiça para Noura Hussein Hammad»; considerando que a intimidação dos advogados de defesa representa um ataque ao processo de julgamento justo e que, tendo sido violada, Noura Hussein Hammad necessita de apoio psicológico;

H.  Considerando que o caso de Noura Hussein Hammad chamou a atenção internacional para os direitos das mulheres e veio dar relevo às questões do casamento forçado e da violação conjugal no Sudão, onde a idade núbil é de apenas 10 anos; considerando que a violação conjugal só foi reconhecida pela legislação sudanesa em 2015; considerando, contudo, que as autoridades judiciais se recusam a reconhecê-la como crime;

I.  Considerando que os ativistas dos direitos das mulheres e das crianças têm feito uma campanha cada vez maior contra os casamentos forçados de meninas e raparigas menores, um fenómeno generalizado no Sudão; considerando que a prevenção e resposta a todas as formas de violência contra as mulheres e raparigas, incluindo os casamentos precoces e forçados, é uma das metas do Plano de Ação da UE em matéria de igualdade de género para 2016-2020;

J.  Considerando que tanto a Human Rights Watch (HRW) como o Perito Independente das Nações Unidas sobre o Sudão, no seu Relatório Mundial de 2017, afirmaram que as forças da segurança sudanesas recorreram à violência sexual, à intimidação e a outras formas de abuso para silenciar as defensoras dos direitos humanos em todo o país; considerando que o advogado de Noura Hussein Hammad foi impedido pelos Serviços Nacionais de Informação e Segurança (NISS) de realizar uma conferência de imprensa, no contexto de uma campanha de intimidação cada vez mais intensa; considerando que Nahid Gabralla, diretor da SEEMA, uma organização não governamental que trabalha com as vítimas e as sobreviventes de atos de violência com base no género em Cartum, a capital do Sudão, foi preso várias vezes quando participava na campanha de apoio a Noura Hussein Hammad, uma vez que o Sudão está a impor restrições à liberdade de expressão;

K.  Considerando que o Sudão é um dos sete países que ainda não aderiram à Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (CEDAW);

L.  Considerando que, atualmente, a UE financia projetos no valor de 275 milhões de EUR no Sudão, essencialmente através do Fundo Europeu de Desenvolvimento (FED), do Instrumento Europeu para a Democracia e os Direitos Humanos (IEDDH) e do Instrumento para a Estabilidade e a Paz (IEP); considerando que o Sudão não ratificou a versão revista do Acordo de Cotonou;

M.  Considerando que no Sudão as mulheres são vítimas de discriminação, prisões arbitrárias e castigos humilhantes; considerando que, segundo o Perito Independente das Nações Unidas sobre o Sudão, os chamados crimes contra a moral pública, como aqueles de que são acusadas as mulheres «vestidas de forma indecente», bem como a humilhação dos castigos corporais, violam as normas internacionais em matéria de direitos humanos; considerando que os artigos 151.º, 152.º, 154.º e 156.º do Código Penal do Sudão, reforçam as restrições impostas às mulheres e à forma como se vestem e comportam em público; considerando que as violações destas leis são puníveis com coima e mesmo, em certos casos, flagelação;

1.  Lamenta e rejeita a condenação à morte de Noura Hussein Hammad; solicita às autoridades sudanesas que comutem a pena de morte e tenham plenamente em conta o facto de Noura Hussein Hammad ter agido em legítima defesa contra uma tentativa de violação por parte de um homem e dos seus cúmplices;

2.  Solicita às autoridades sudanesas que cumpram a legislação nacional e as normas internacionais em matéria de direitos humanos, incluindo o Protocolo à Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos sobre os Direitos da Mulher em África, bem como o Protocolo do Tribunal de Justiça da União Africana, adotado em 11 de julho de 2003; recorda que, de acordo com as normas internacionais, a imposição da pena de morte quando existem provas claras de legítima defesa constitui uma execução arbitrária, particularmente nos casos em que as mulheres são acusadas de homicídio quando se defendem;

3.  Relembra às autoridades sudanesas a sua obrigação de garantirem os direitos fundamentais, incluindo o direito a um julgamento justo; insiste em que devem ser tomadas todas as medidas necessárias para garantir que o julgamento Noura Hussein Hammad cumpra verdadeiramente as normas mais rigorosas em matéria de equidade e de respeito das garantias processuais;

4.  Reafirma que é imperioso rever e reformar leis essenciais no Sudão, nomeadamente a Lei de segurança nacional de 2010 e as leis que regulam os meios de comunicação social e a sociedade civil, a fim de as alinhar pelas normas internacionais que protegem a liberdade de expressão, de reunião e de associação; manifesta a sua preocupação com os amplos poderes de prisão e detenção conferidos aos NISS, que detêm e prendem arbitrariamente pessoas que, em muitos casos, são torturadas e sujeitas a maus tratos, escapando os agentes dos NISS à ação penal;

5.  Observa que, embora o processo esteja a seguir o seu curso, as autoridades sudanesas ainda têm a obrigação de demonstrar que não toleram a violação nem a violência com base no género e, por conseguinte, de salvar a vida de uma jovem cuja existência já foi devastada por razões que escapam ao seu controlo; solicita às autoridades sudanesas que garantam que todos os casos de violência sexual e com base no género, incluindo a violação conjugal e a violência doméstica, sejam julgados e que os seus autores sejam chamados a prestar contas; solicita às autoridades sudanesas que combatam os casamentos infantis, precoces e forçados e a violação conjugal;

6.  Solicita às autoridades sudanesas que levem a cabo uma investigação imediata, independente e imparcial sobre as graves alegações contra as forças da segurança sudanesas por utilização de violência, intimidação e outras formas de abuso contra as mulheres;

7.  Lamenta a proibição pelos NISS da conferência de imprensa organizada pela equipa de defesa de Noura Hussein Hammad após a sua condenação; condena firmemente a perseguição de ativistas dos direitos humanos e de advogados relacionada com o caso de Noura Hussein Hammad;

8.  Solicita às autoridades sudanesas que garantam a total proteção da integridade física e psicológica de Noura Hussein Hammad durante a sua detenção, bem como dos seus advogados e familiares;

9.  Reitera a sua firme oposição ao recurso à pena de morte em todos os casos e em todas as circunstâncias; considera que a pena de morte viola a dignidade humana e constitui um tratamento cruel, desumano e degradante; solicita às autoridades sudanesas que respeitem a moratória das Nações Unidas sobre a pena de morte; solicita ao Sudão que ratifique a Convenção contra a Tortura (CCT) e a CEDAW;

10.  Assinala às autoridades sudanesas que uma melhor proteção dos direitos humanos das mulheres e a criminalização da violação conjugal poderiam salvar muitas vidas e evitar casos como o de Noura Hussein Hammad;

11.  Condena veementemente os casamentos precoces e forçados e a violência contra as mulheres e as raparigas no Sudão e noutras partes do mundo; salienta que o atual recurso da condenação de Noura Hussein Hammad, que se limita aos aspetos formais e jurídicos da sentença sem qualquer apreciação dos factos, não é suficiente nos termos do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, ratificado pelo Sudão; solicita às autoridades que apliquem a recomendação da Comissão dos Direitos da Criança e alterem a lei relativa ao estatuto pessoal no sentido de elevar a idade em que o casamento é permitido legalmente;

12.  Apela veementemente à UE e aos seus Estados-Membros para que assegurem que a execução de projetos com as autoridades sudanesas respeite o princípio «não prejudicar», que permite excluir a cooperação com responsáveis por violações dos direitos humanos;

13.  Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão, ao Presidente do Sudão, à União Africana, ao Secretário-Geral das Nações Unidas, aos copresidentes da Assembleia Parlamentar Paritária ACP-UE e ao Parlamento Pan-Africano.

 

 

Última actualização: 30 de Maio de 2018
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