Relatório - A5-0095/2004Relatório
A5-0095/2004

RELATÓRIO sobre a proposta de Decisão‑Quadro do Conselho referente ao estabelecimento de disposições mínimas relativas aos elementos constitutivos das infracções penais e das sanções aplicáveis no domínio do tráfico de droga
(15102/2/2003 – C5‑0618/2003 – 2001/0114(CNS))  (Nova consulta)

23 de Fevereiro de 2004 - *

Comissão das Liberdades e dos Direitos dos Cidadãos, da Justiça e dos Assuntos Internos
Relator: Arie M. Oostlander
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Processo : 2001/0114(CNS)
Ciclo de vida em sessão
Ciclo relativo ao documento :  
A5-0095/2004
Textos apresentados :
A5-0095/2004
Textos aprovados :

PÁGINA REGULAMENTAR

Na sessão de 25 de Abril de 2002, o Parlamento aprovou a sua posição sobre a proposta da Comissão tendo em vista a adopção de uma Decisão-Quadro do Conselho referente ao estabelecimento de disposições mínimas relativas aos elementos constitutivos das infracções penais e das sanções aplicáveis no domínio do tráfico ilícito de droga (COM(2001) 259 – 2001/114(CNS)).

Por carta de 9 de Dezembro de 2003, o Conselho consultou de novo o Parlamento, nos termos dos artigos 31º, alínea e), 34º, nº 2, alínea b), e 39º, nº 1, do Tratado UE, sobre a proposta de Decisão-Quadro do Conselho referente ao estabelecimento de disposições mínimas relativas aos elementos constitutivos das infracções penais e das sanções aplicáveis no domínio do tráfico de droga (15102/2/2003).

Na sessão de 15 de Dezembro de 2003, o Presidente do Parlamento comunicou o envio do texto do Conselho à Comissão das Liberdades e dos Direitos dos Cidadãos, da Justiça e dos Assuntos Internos, competente quanto à matéria de fundo (C5‑0618/2003).

Na sua reunião de 11 de Julho de 2001, a comissão designara relator Arie M. Oostlander.

Nas suas reuniões de 21 de Janeiro e 19 de Fevereiro de 2004, a comissão procedeu à apreciação do texto do Conselho e do projecto de relatório.

Na última reunião, a comissão aprovou o projecto de resolução legislativa por 20 votos a favor, 2 contra e 2 abstenções.

Encontravam-se presentes no momento da votação Jorge Salvador Hernández Mollar (presidente), Johanna L.A. Boogerd-Quaak (vice-presidente), Giacomo Santini (vice‑presidente), Arie M. Oostlander (relator), Mary Elizabeth Banotti, Kathalijne Maria Buitenweg (em substituição de Alima Boumediene-Thiery), Michael Cashman, Carmen Cerdeira Morterero, Gérard M.J. Deprez, Adeline Hazan, Marie-Thérèse Hermange (em substituição de Charlotte Cederschiöld), Margot Keßler, Timothy Kirkhope, Eva Klamt, Luís Marinho (em substituição de Sérgio Sousa Pinto), Marjo Matikainen-Kallström (em substituição de Thierry Cornillet), Elena Ornella Paciotti, Paolo Pastorelli (em substituição de Marcelino Oreja Arburúa), Hubert Pirker, Bernd Posselt, Olle Schmidt (em substituição de Baroness Ludford), Joke Swiebel, Anna Terrón i Cusí e Maurizio Turco.

O relatório foi entregue em 23 de Fevereiro de 2004.

PROJECTO DE RESOLUÇÃO LEGISLATIVA DO PARLAMENTO EUROPEU

sobre a proposta de Decisão‑Quadro do Conselho referente ao estabelecimento de disposições mínimas relativas aos elementos constitutivos das infracções penais e das sanções aplicáveis no domínio do tráfico de droga

(15102/2/2003 – C5‑0618/2003 – 2001/0114(CNS))

(Processo de consulta)

O Parlamento Europeu,

-   Tendo em conta o projecto do Conselho (15102/2/2003)[1]

-   Tendo em conta a proposta da Comissão ao Conselho (COM(2001) 259)[2],

-   Tendo em conta a sua posição aprovada em 25 de Abril de 2002[3]

-   Tendo em conta a alínea e) do artigo 31º e o nº 2, alínea b), do artigo 34º do Tratado UE,

-   Consultado de novo pelo Conselho nos termos do nº 1 do artigo 39º do Tratado UE (C5-0618/2003),

-   Tendo em conta os artigos 106º e 67º e o nº 3 do artigo 71º do seu Regimento,

-   Tendo em conta o relatório da Comissão das Liberdades e dos Direitos dos Cidadãos, da Justiça e dos Assuntos Internos (A5-0095/2004),

1.   Aprova a proposta de Decisão-Quadro do Conselho relativa à luta contra o tráfico ilícito de droga adoptada pelo Conselho e verifica que a referida Decisão-Quadro representa um passo determinante na via da cooperação em matéria criminal;

2.   Solicita ao Conselho que o informe, caso entenda afastar-se do texto aprovado pelo Parlamento;

3.   Exorta a Comissão a prosseguir o seu trabalho e a apresentar novas propostas visando a criação de um espaço judicial comum em matéria criminal;

4.   Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho e à Comissão.

  • [1] Ainda não publicado em JO
  • [2] JO C 270 de 25.09.01, pág. 144
  • [3] JO C 131E de 5.06.03, pág. 15

EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS

Antecedentes

Em finais de Maio de 2001, a Comissão aprovou a proposta de Decisão-Quadro relativa à luta contra o tráfico ilícito de droga. Decorridos mais de dois anos, foi inesperadamente alcançado um acordo com o Conselho. Não sem dificuldades, o Parlamento aprovou um relatório no âmbito da consulta sobre a referida Decisão-Quadro, que foi inicialmente objecto de novo envio à comissão, tendo sido necessário obter duas alterações de compromisso (relativas ao âmbito e às sanções). O Parlamento acabou por emitir parecer em Abril de 2002 (após 7 meses de debate).

Entretanto, o Conselho não ogrou quiasquer progressos e tornou-se evidente que os holandeses tinham consideráveis reservas ao texto. Não obstante, a Presidência italiana conseguiu alcançar um acordo no passado mês de Novembro. O texto é actualmente objecto de exame em alguns parlamentos nacionais (Países Baixos, Irlanda, Suécia e Dinamarca) e no Parlamento Europeu.

A adopção definitiva da Decisão-Quadro constituirá, de qualquer modo, um incentivo psicológico para a União Europeia e respectiva cooperação judicial em matéria criminal. Demonstra ser possível chegar a acordo sobre um texto. Como é óbvio, o Mandado de Captura Europeu poderia ser utilizado para efeitos de aplicação da Decisão-Quadro em apreço, logo que esta tenha sido implementada.

Teor do texto

O texto inicialmente proposto pela Comissão é agora inteiramente diferente. Embora a Comissão pretendesse propor definições mais estritas do que as previstas nas Convenções das Nações Unidas em matéria de combate aos estupefacientes, o Conselho limitou as definições às constantes das Convenções (artigo 1º, nº 1). Todos os tipos de tráfico, cultura e venda serão penalizados; por exemplo, a produção, o fabrico, a venda, o transporte, a distribuição, o cultivo (de ópio, cocaína e cannabis), a posse e a aquisição, quando o objectivo seja uma das actividades proibidas (artigo 2º, nº1). Embora implicitamente incluído no texto original, o texto adoptado solicita claramente que a produção de precursores de drogas sintéticas seja condenada, se a sua produção tiver por objectivo o fabrico de drogas.

As actividades que, relacionadas com a droga, tenham por objectivo exclusivo o consumo pessoal na acepção da legislação nacional estão excluídas do âmbito de aplicação da presente Decisão‑Quadro (artigo 2º, nº 2). Tal resulta de uma das principais alterações do Parlamento e contempla efectivamente o princípio da subsidiariedade. De um ponto de vista legal, isto significa que, se um Estado-Membro o pretender, pode penalizar o consumo pessoal, mas que a presente Decisão-Quadro a tal não o obriga.

As actividades descritas serão puníveis com pena de prisão com uma duração máxima de, pelo menos, um a três anos, sendo que os Estados‑Membros podem, se assim o desejarem, impor sanções mais rigorosas (artigo 4º, nº1).

Quando estejam envolvidas grandes quantidades de droga ou as drogas sejam particularmente perigosas para a saúde, as infracções serão puníveis com pena de prisão com uma duração máxima de cinco a dez anos, pelo menos, (artigo 4º, nº 2), ao passo que, no caso de serem cometidas no âmbito de uma organização criminosa, as infracções serão puníveis com pena privativa de liberdade com uma duração máxima de, pelo menos, dez anos (artigo 4º, nº 3). Como é óbvio, o Mandado de Captura Europeu poderia ser usado neste contexto.

Não é claro que quantidades de que tipos de drogas podem ser descritas como tráfico de maior ou menor importância. Não incumbe obviamente à UE instituir um código penal circunstanciado, mas é de esperar que a jurisprudência seja bastante diferente consoante os Estados-Membros.

A instigação, a cumplicidade ou a tentativa de cometer uma destas infracções será igualmente punível (artigo 3º). O nº 2 do artigo 3º afigura-se importante, na medida em que os casos de tentativa de oferta ou de preparação de drogas devem ser objecto de penas do mesmo nível das aplicadas aos actos. Não obstante, a cooperação em matéria legal e de extradição não será obrigatória. Considera-se que esta formulação contribuiu para facilitar o acordo com os Países Baixos.

Lamentável se afigura que o texto seja omisso no que se refere a circunstâncias agravantes. O Parlamento propugnou vivamente a sua manutenção no texto. Não se vislumbra claramente a razão pela qual o Conselho eliminou este aspecto, mas é possível que pretenda que os juízes mantenham margem de manobra para decidirem.

É, porém, estranho que o Conselho mantenha as circunstâncias atenuantes, muito embora a respectiva lista seja limitada (artigo 5º). O Parlamento votou por maioria a favor da supressão das circunstâncias atenuantes, atendendo a que nem todos os Estados-Membros prevêem circunstâncias atenuantes no seu Código Penal. Este argumento foi veementemente rejeitado pela Comissão no seu parecer sobre os textos aprovados pelo Parlamento.

A excepção neerlandesa e respectivas consequências

A determinação neerlandesa no que respeita à possibilidade de continuar a permitir a posse de pequenas quantidades de drogas leves e a venda de tais drogas nos "coffee shops" constituiu um dos principais problemas a resolver para chegar a um acordo final. Embora a venda e a posse de drogas sejam proibidas nos Países Baixos, as pequenas quantidades de drogas nunca são objecto de procedimento judicial. Teoricamente, a Decisão-Quadro em apreço não requer de nenhum Estado-Membro que altere a sua política em matéria de estupefacientes, podendo, por conseguinte, os Países Baixos continuar a tolerar os "coffee shops". Não obstante, espera-se que os Países Baixos agravem, de 1 mês para 1 ano, as sanções impostas pela venda de pequenas quantidades, sendo, no entanto, que poderá prosseguir a atitude de tolerância. O Conselho e a Comissão declararam firmemente que, nesta matéria, deve aplicar-se o princípio da subsidiariedade.

Todavia, os Países Baixos estão, ao que tudo indica, dispostos a conferir um maior rigor à sua legislação, atendendo a que o Ministro neerlandês da Justiça confirmou que o seu Governo espera que os "coffee shops" venham a restringir a venda apenas a residentes. No contexto de uma declaração, o Conselho manifestou a sua intenção de dissuadir o fenómeno do turismo de estupefacientes.

O relatório de nova consulta do Parlamento

Embora, de um ponto de vista jurídico, seja possível apresentar alterações ao texto do Conselho, não é provável que esta instituição introduza qualquer alteração num texto para o qual foram necessários 18 meses para chegar unanimemente a acordo. Por conseguinte, de um ponto de vista político, afigura-se mais judicioso aceitar a Decisão‑Quadro adoptada, não esquecendo que a mesma constitui um pequeno mas decisivo passo na via da criação de um espaço judicial comum.

Também no respeitante à substância, o Parlamento deveria concordar com o texto proposto pelo Conselho, uma vez que no texto se reconhecem as duas importantes alterações de compromisso (relativas ao âmbito e às sanções). Ademais, é claro que a Decisão-Quadro não requer dos Estados-Membros que alterem a sua política em matéria de estupefacientes.

OPINIÃO MINORITÁRIA

Maurizio Turco, Marco Cappato e Ilka Schröder

A proposta de decisão-quadro do Conselho relativa ao tráfico ilícito de droga não incide apenas na questão do tráfico de droga, tendo, sim, um alcance muito mais amplo ao criminalizar abusivamente todos os actos relacionados com as drogas ilícitas, sendo a única excepção o vagamente definido "consumo pessoal". As infracções menores, que estão indirectamente relacionadas com o consumo pessoal, como, por exemplo, a passagem de uma "ganza" a um amigo, são assimiladas ao "tráfico de droga", ao mesmo tempo que as sanções são harmonizadas e impostas penas privativas de liberdade, a fim de aplicar o Mandado de Captura Europeu a estes novos "eurocrimes". As alterações apresentadas pelo PE em primeira leitura, completamente ignoradas pelo Conselho, reintroduzidas pela comissão tendo em vista a segunda leitura - que visam limitar o âmbito de aplicação da decisão-quadro ao tráfico ilícito internacional em aplicação do princípio da subsidiariedade - foram rejeitadas. O resultado contraproducente da aprovação da decisão-quadro em apreço, representa, para além da humilhação do Parlamento face ao Conselho, o reforço do regime proibicionista, o aumento dos lucros dos traficantes de droga e a corrupção das instituições, paralelamente à repressão dos consumidores de estupefacientes.