Relatório - A6-0052/2008Relatório
A6-0052/2008

RELATÓRIO que contém uma proposta de recomendação do Parlamento Europeu ao Conselho referente ao papel da União Europeia no Iraque

29.2.2008 - (2007/2181(INI))

Comissão dos Assuntos Externos
Relatora: Ana Maria Gomes

Processo : 2007/2181(INI)
Ciclo de vida em sessão
Ciclo relativo ao documento :  
A6-0052/2008

PROPOSTA DE RECOMENDAÇÃO DO PARLAMENTO EUROPEU AO CONSELHO

referente ao papel da União Europeia no Iraque

(2007/2181(INI))

O Parlamento Europeu,

–   Tendo em conta a proposta de recomendação ao Conselho apresentada por Ana Maria Gomes, em nome do Grupo PSE, referente ao papel da União Europeia no Iraque (B6‑0328/2007),

–   Tendo em conta as suas anteriores resoluções sobre o Iraque e, mais recentemente, a de 25 de Outubro de 2007[1],

–   Tendo em conta a sua Resolução, de 12 de Julho de 2007, sobre a situação humanitária dos refugiados iraquianos[2],

–   Tendo em conta as decisões da Conferência dos Presidentes, de 15 de Novembro e de 6 de Dezembro de 2007, sobre a composição e o mandato de uma “Delegação ad hoc para as Relações com o Iraque”,

–   Tendo em conta as conclusões do Conselho “Assuntos Gerais e Relações Externas”, de 23‑24 de Abril, 15‑16 de Outubro e 19‑20 de Novembro de 2007, sobre a participação da UE no Iraque,

–   Tendo em conta a Comunicação da Comissão, de 7 de Junho de 2006, intitulada “Recomendações para um Compromisso Renovado da União Europeia perante o Iraque” (COM(2006)0283),

–   Tendo em conta o Pacto Internacional para o Iraque, lançado em Charm el-Cheik, no Egipto, em 3 de Maio de 2007,

–   Tendo em conta as Resoluções 1546 (2004), 1770 e 1790 (2007) do Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU) e, nomeadamente, os seus Anexos I e II,

–   Tendo em conta a Acção Comum 2005/190/PESC do Conselho, de 7 de Março de 2005, relativa à Missão Integrada da União Europeia para o Estado de Direito no Iraque, EUJUST LEX[3], estabelecida ao abrigo da Política Europeia de Segurança e de Defesa (PESD), e as ulteriores acções comuns que a modificaram e alargaram o mandato da missão,

–   Tendo em conta a Estratégia Europeia de Segurança de 2003, subordinada ao tema “Uma Europa Segura num Mundo Melhor”, de 12 de Dezembro de 2003,

–   Tendo em conta o Consenso Europeu para o Desenvolvimento, de 22 de Novembro de 2005,

–   Tendo em conta a sua Resolução, de 1 de Junho de 2006, sobre a situação das mulheres nos conflitos armados e o seu papel na reconstrução e no processo democrático nos países em situação pós-conflito[4],

–   Tendo em conta a sua Resolução, de 1 de Junho de 2006, sobre as pequenas e médias empresas nos países em desenvolvimento[5],

–   Tendo em conta o n.º 3 do artigo 114.º do seu Regimento,

–   Tendo em conta o relatório da Comissão dos Assuntos Externos (A6‑0052/2007),

A.  Considerando que, desde 2005, a República do Iraque organizou duas eleições multipartidárias, adoptou uma Constituição por referendo, criou os fundamentos de um Estado federal e se vem empenhando num difícil processo de edificação de instituições democráticas,

B.  Considerando que a sociedade iraquiana e os seus dirigentes políticos se encontram profundamente divididos, e que a situação de segurança em algumas regiões do país continua a ser extremamente perigosa,

C. Considerando que o Iraque é vítima de um conflito e de uma insurreição de carácter sectário, sofrendo igualmente de uma ausência generalizada do Estado de direito,

D. Considerando que se registou uma melhoria da situação no que respeita à segurança na República do Iraque, mas que as força iraquianas continuam a ver-se confrontadas com o desafio de sustentar e consolidar tal melhoria, com a ajuda internacional; considerando que o êxito dos esforços sérios em prol da reconstrução e do desenvolvimento sustentável, bem como a capacidade da UE para ajudar o povo iraquiano, dependem de uma melhoria contínua da situação política e de segurança,

E.  Considerando que, durante as décadas em que o Iraque viveu sob o regime ditatorial, a administração pública do país não estava voltada para o serviço público, mas sim para o controlo da população, e que os anos de administração estritamente centralizada pelo partido Ba'ath acarretaram graves insuficiências quanto à capacidade dos iraquianos para administrar o orçamento e gerir os recursos financeiros de forma adequada, o que resultou num sector público hoje frágil e debilitado, carecendo de uma cultura plenamente desenvolvida que dê prioridade à prestação de serviços públicos à população do Iraque;

F.  Considerando que é necessário que os países vizinhos se abstenham de toda e qualquer ingerência nos assuntos internos do Iraque e respeitem a sua independência, soberania e integridade territorial, bem como o desejo da população iraquiana de edificar o sistema constitucional e político do país através dos seus próprios esforços;

G. Considerando que o conflito já causou até agora a deslocação de mais de 2,4 milhões de pessoas no interior do país, além de mais de 2,28 milhões de refugiados nos países vizinhos, sobretudo na Síria e na Jordânia,

H. Considerando que a região curda é uma parte do Iraque onde se encontra assegurado um nível de paz e estabilidade e onde se regista um incremento da cooperação internacional para o desenvolvimento e do investimento privado,

I.   Considerando que a UE, na qualidade de actor a nível mundial, deve assumir as suas responsabilidades na construção de um novo Iraque democrático, e que a política da UE no que respeita ao Iraque deve ser encarada no contexto mais amplo da parceria estratégica da UE para o Mediterrâneo e o Médio Oriente,

J.   Considerando que a UE carece de uma melhor estratégia no seu apoio aos progressos realizados pelo Iraque, tendo por objectivo tornar-se um Estado federal democrático; considerando que a UE reconhece que, para que possa fornecer uma assistência eficaz, são indispensáveis uma parceria sólida com o povo iraquiano, um empenhamento constante do Governo do Iraque em garantir a segurança, a reconciliação, a vontade de cooperar, esforços na construção de capacidades e da democracia, esforços na luta contra a corrupção e na garantia de transparência e eficácia, enquanto condições prévias fundamentais para um papel mais importante da União Europeia no Iraque; considerando que os desafios cruciais da reconstrução se situam no campo institucional e social, nomeadamente, a criação das capacidades institucionais e administrativas e a consolidação do Estado de direito, a aplicação da lei e o respeito dos direitos humanos,

K. Considerando que a UE já reconheceu a necessidade de uma programação plurianual das operações, além da actual programação anual baseada em medidas especiais, a fim de tornar mais eficaz a assistência por ela prestada,

L.  Considerando que é necessário que a UE proceda a uma adaptação do uso dos seus recursos em função dos desafios específicos com os quais o Iraque se vê confrontado no plano interno, regional e humanitário; considerando que a eficácia, a transparência e a visibilidade são condições prévias fundamentais para um papel mais importante da União Europeia no Iraque,

M. Considerando que o Iraque, que era um país de rendimentos médios na década de 1970, conheceu uma regressão, e que o uso dos recursos da União Europeia tem de ser adaptado em conformidade,

N. Considerando que a Comissão dispõe, desde Dezembro de 2005, de uma pequena delegação em Bagdade, cuja secção operacional está instalada em Amã e encontra grandes dificuldades em operar em certas zonas, sobretudo em Bagdade, em consequência de certas disposições de ordem militar e da situação no que respeita à segurança,

O. Considerando que a Comissão tem destinado, desde 2003, dotações num montante superior a 800 milhões de euros para o fornecimento de assistência ao Iraque (principalmente através do Fundo Internacional para a Reconstrução do Iraque (FIRI)); considerando que a UE tem participado directamente na melhoria da situação do Estado de direito no país desde 2005, através da sua missão PESD EUJUST LEX, e que o mandato dessa missão foi novamente prorrogado, pela última vez,

P.  Considerando que o Governo do Iraque, juntamente com o Banco Mundial e as Nações Unidas, subscreveram o Pacto Internacional para o Iraque, em Maio de 2007, como perspectiva do Governo iraquiano para os próximos cinco anos e como principal referência para a participação da comunidade internacional no país, com o total apoio da União Europeia, na sua qualidade de um dos principais doadores,

Q. Considerando que a Resolução 1770 (2007) do Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU) veio recentemente alargar de forma significativa o mandato da missão das Nações Unidas no Iraque,

R.  Considerando que os anos do regime do partido Ba'ath e as décadas de conflito armado deixaram uma sociedade traumatizada pela guerra, pela repressão, pela depuração étnica (inclusive através de ataques químicos, como no caso de Halabja) e pela negligência internacional em relação a esses crimes; considerando que a comunidade internacional e, em particular, os Estados que apoiaram a intervenção, têm a obrigação moral e legal, para além do interesse em matéria de segurança, de apoiar o povo iraquiano; considerando que a União Europeia deve mobilizar, de forma rápida e criativa, todos os instrumentos relevantes ao seu dispor para fazer o que lhe compete,

S.  Considerando que o Parlamento Europeu está determinado a aprofundar as suas relações com o Conselho de Representantes iraquiano, nomeadamente através de relações oficiais,

1.  Dirige as seguintes recomendações ao Conselho:

a)        adoptar, em conjunto com a Comissão, uma nova estratégia destinada a intensificar, em termos quantitativos, mas – sobretudo – qualitativos, o apoio da UE aos esforços da ONU para construir um Iraque seguro, estável, unificado, próspero, federal e democrático, capaz de defender os direitos humanos, proteger as suas minorias, promover a tolerância interétnica e abrir caminho à estabilidade e à segurança na região; dar resposta à Resolução 1770 (2007) do Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU), que reforça de modo significativo o papel da ONU no Iraque;

b)        canalizar a ajuda da UE para a governança democrática, com vista à realização de três objectivos em particular: reforçar a coordenação entre o Governo e o Conselho de Representantes, a fim de reduzir ao mínimo os bloqueios durante o processo legislativo; reforçar os processos eleitorais a nível local, para fazer com que os conselhos provinciais sejam plenamente representativos de todas as populações locais; reforçar a democracia local através de mecanismos de consulta, a fim de associar a população local ao processo de tomada de decisões numa base regular e frequente;

c)        reorientar a ajuda da UE ao Iraque para a assistência técnica relevante e a criação de capacidades nos domínios do Estado de direito, da justiça e dos direitos humanos, da boa governança, da gestão financeira e orçamental, da igualdade de género, da saúde e da educação, e para o reforço das instituições governamentais a nível federal, regional e local;

d)        solicitar à Comissão que garanta a transparência e a eficácia do auxílio da UE ao Iraque através:

- do acompanhamento das preocupações já expressas em 2005 no parecer sobre o projecto de orçamento geral da União Europeia para o exercício de 2006, apresentado pela Comissão dos Assuntos Externos do Parlamento Europeu, fornecendo informações exaustivas, regulares e transparentes sobre o pagamento efectivo e a aplicação da ajuda da UE, nomeadamente no que respeita às dotações canalizadas através do FIRI;

- da acção directa no terreno, se e onde a situação em termos de segurança o permitir, nomeadamente nas regiões pantanosas do Sul, onde a população foi particularmente descurada, e na região curda;

- do incentivo às agências das Nações Unidas e outras organizações internacionais a procederem do mesmo modo;

- do apoio total aos intervenientes locais - incluindo a sociedade civil e as autoridades governamentais - na concepção, aplicação e sustentabilidade de projectos e de programas;

- da garantia de que os projectos financiados pela UE não se sobreponham à acção de outros doadores internacionais, mas a complementem;

- do aumento da proporção do financiamento da UE destinado à assistência técnica bilateral e à criação de capacidades, bem como da melhoria do controlo directo do financiamento pela CE;

- da deslocação da ênfase do apoio da UE para os projectos bilaterais centrados na assistência técnica e no desenvolvimento de capacidades nos domínios do Estado de direito, da gestão financeira, da governação democrática e dos direitos humanos;

- da garantia de que uma importante ajuda da UE será orientada para a melhoria da gestão das finanças públicas e do controlo orçamental, a fim de que o Governo iraquiano esteja em condições de aplicar melhor o volume elevado e crescente de fundos públicos actualmente ao seu dispor;

- do recurso à experiência adquirida com os programas de assistência aos seus parceiros PEV, tendo em vista garantir um papel mais eficaz no Iraque;

e)        estudar a possibilidade de ser adoptado pela Comissão o documento plurianual de estratégia por país para o Iraque;

f)         promover a retomada de negociações e de intercâmbios políticos, diplomáticos, culturais e económicos bilaterais entre os Estados­Membros e o Iraque;

g)        incluir os seguintes elementos numa nova estratégia de envolvimento pró‑activo da UE e dos seus Estados­Membros no Iraque, que deverão ser postos em prática à medida que as circunstâncias o permitam – designadamente, a situação no plano da segurança –, em estreita concertação com as autoridades iraquianas e com outros parceiros, como as agências da ONU e as organizações não governamentais:

- aumentar a dimensão, as responsabilidades e os recursos da Delegação da Comissão Europeia em Bagdade, adquirir novas instalações próprias e garantir que o seu pessoal possa viver e trabalhar em segurança; encorajar os Estados­Membros não representados em Bagdade a regressarem e a partilharem as instalações da Comissão, bem como os respectivos custos de segurança;

- garantir a visibilidade da UE/CE em Erbil, Nassíria, Bassorá e outras regiões do Iraque em que a situação de segurança o permita;

- reforçar o apoio ao Estado de direito e à justiça, mantendo sobretudo a ênfase nas instituições judiciais e nas organizações não governamentais, nos seguintes domínios: reforço do Instituto de Formação Judicial, apoio à criação de gabinetes de investigação de crimes graves, reforço do Conselho Superior de Justiça, apoio à criação de um tribunal piloto em Bassorá, reforço da Ordem dos Advogados do Iraque e apoio à criação de centros de assistência jurídica;

- alargar a experiência positiva da missão EUJUST LEX e preparar o respectivo seguimento, com base nos ensinamentos colhidos e numa avaliação externa profunda, inclusive no próprio Iraque, do impacte da missão, tendo em vista continuar a reforçar o sistema policial e penal iraquiano mediante recurso, tanto à PESD, como aos instrumentos comunitários;

- apoiar a reforma da gestão das finanças públicas e a prestação de contas;

- continuar a proporcionar assistência técnica para a organização de eleições livres e justas;

- apoiar o processo de reconciliação, nomeadamente em Kirkuk e noutros territórios objecto de disputa interna, incluindo as regiões assírias conhecidas como Planícies de Nínive, com as suas minorias cristãs; apoiar as iniciativas da ONU para facilitar o diálogo regional, designadamente encontrando formas e meios para melhorar a capacidade operacional, incluindo o transporte aéreo;

- tirar partido da natureza específica do Instrumento de Estabilidade[6] para prestar uma importante assistência, fulcral para o desenvolvimento numa situação de crise, ou de crise emergente, como a que vigora no Iraque: apoiar o desenvolvimento de instituições federais, regionais e locais democráticas, não sectárias e pluralistas, com especial ênfase para o Conselho de Representantes e para a sua capacidade de gerir o processo legislativo, de controlar o poder executivo e de garantir um papel de maior relevo às mulheres na sociedade iraquiana; promover o respeito dos direitos humanos e das liberdades fundamentais, da democracia e do Estado de direito, conferindo especial destaque aos direitos das mulheres, das minorias religiosas e das crianças; apoiar as medidas destinadas a reforçar o desenvolvimento e a organização da sociedade civil e a sua participação no processo político, bem como a promover meios de comunicação independentes, pluralistas e profissionais; apoiar actividades de desminagem; proporcionar consultoria e apoio à região curda e ao seu governo nos esforços de luta contra o tráfico de droga;

- continuar a concentrar os recursos do Instrumento de Cooperação para o Desenvolvimento (ICD)[7] destinados ao Iraque nos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio, de molde a garantir com a máxima prioridade o acesso aos cuidados de saúde pública vitais quando for urgente criar instituições e capacidades para corrigir o défice estrutural agudo, adoptar medidas prioritárias para evitar uma ainda maior degradação do sistema educativo, incluindo a adopção de medidas práticas para garantir às crianças e jovens do sexo feminino a possibilidade de participarem plenamente na educação a todos os níveis, e apoiar a revitalização do sistema ambiental e social da região dos pântanos, bem como a protecção do património único dos árabes dessa região;

- encorajar as ONG europeias a cooperarem com as suas congéneres iraquianas, já particularmente activas na região curda, e a recorrerem amplamente ao Instrumento Europeu para a Democracia e os Direitos Humanos (IEDDH)[8] na prestação de assistência técnica e financeira às organizações da sociedade civil, a fim de: promover a igual participação dos homens e das mulheres na vida política, económica e social; fazer face à violência exercida sobre as mulheres, designadamente, através dos casamentos forçados, dos crimes de “honra”, do tráfico e da mutilação genital; fazer valer os direitos dos povos indígenas e das pessoas pertencentes a minorias e grupos étnicos, incluindo os assírios (caldeus, siríacos e outras comunidades cristãs), a comunidade yazidi e os turquemenos; defender os direitos da criança, em especial, no domínio da luta contra o trabalho infantil, a prostituição infantil e o tráfico de menores; combater a prisão arbitrária e a tortura; lutar pela abolição da pena de morte;

- encorajar e ajudar o Governo do Iraque a adoptar, com carácter de urgência excepcional, legislação de emergência para fornecer apoio financeiro a mais de um milhão de mulheres sem recursos que são chefes de família, bem como às pessoas a seu cargo;

- reforçar o envelope financeiro do programa Erasmus Mundus para o Iraque; apoiar as actividades, em curso e futuras, destinadas a criar redes entre instituições e organizações académicas iraquianas e estrangeiras, entre académicos, intelectuais e organizações estudantis, a fim de revitalizar o meio académico;

- reforçar a capacidade das autoridades iraquianas para efectuarem controlos fronteiriços eficazes, o que, entre outros aspectos, permitirá reduzir o afluxo de armas e material bélico ao país; ajudar a pôr cobro ao afluxo ilegal de armas ligeiras e de pequeno calibre ao Iraque, designadamente, conferindo um carácter juridicamente vinculativo ao Código de Conduta da UE relativo à Exportação de Armas, melhorando o controlo, por parte da EUFOR Althea, dos depósitos de munições e armamento existentes na Bósnia-Herzegovina, acelerando a destruição desses depósitos nos Balcãs e ajudando as autoridades iraquianas a eliminarem os excedentes de armas ligeiras e de pequeno calibre através de um vasto programa de desarmamento, desmobilização e reintegração, recorrendo quer à PESD quer aos instrumentos comunitários;

- prosseguir as oportunas e produtivas negociações relativas ao novo Acordo de Comércio e Cooperação, salientando ao mesmo tempo a importância do respeito dos direitos humanos como factor subjacente ao relacionamento contratual da UE com qualquer país terceiro, inclusive no domínio da luta contra o terrorismo;

- prestar apoio técnico e administrativo e promover o desenvolvimento de capacidades a nível local, a fim de ajudar o Governo iraquiano a aplicar o seu recente programa de microcréditos e partilhar as melhores práticas sobre o papel positivo que o microcrédito pode desempenhar no reforço do papel das mulheres nas suas comunidades, especialmente das mais de um milhão de viúvas carenciadas;

- instar a Comissão a atenuar o sofrimento dos refugiados iraquianos na Jordânia e na Síria, bem como noutros países da região afectados pela crise dos refugiados iraquianos, e aumentar significativamente a transparência e a eficácia da assistência da UE aos refugiados iraquianos naqueles países;

- aumentar os apoios da UE às ONG e às organizações internacionais nos seus esforços para mitigarem a situação dos refugiados iraquianos nos países vizinhos, assim como dos deslocados internos iraquianos, incluindo as 4 000 famílias assírias que procuraram sobretudo refúgio nas Planícies de Nínive; instar as autoridades iraquianas a assumirem as suas responsabilidades no que se refere à concessão de apoio financeiro e outros tipos de apoio à reintegração dos refugiados e dos deslocados internos;

- oferecer aos refugiados iraquianos maiores possibilidades de encontrarem refúgio nos Estados­Membros da UE, pôr termo aos actuais critérios arbitrários de concessão de protecção e impedir o repatriamento forçado; resolver urgentemente a situação precária dos refugiados palestinos que se encontram retidos na região fronteiriça entre o Iraque e a Síria;

- apelar ao Governo iraquiano e às autoridades internacionais para que recuperem as antiguidades retiradas do Museu Nacional do Iraque, em Bagdade e noutras partes do país após a intervenção de 2003, a fim de preservar a história e a cultura iraquianas para as gerações futuras;

h)        tirar partido da valiosa experiência adquirida pela União Europeia e pelos seus Estados­Membros por ocasião das operações bem sucedidas da Equipa de Reconstrução Provincial (PRT) no Afeganistão e prever a participação nos esforços das equipas de reconstrução provincial no Iraque, nomeadamente no que respeita ao fornecimento de serviços e de infra-estruturas essenciais;

i)         encorajar as empresas europeias a investirem na reconstrução do Iraque, no âmbito de concursos financiados, quer pelos governos dos Estados­Membros, quer pelo Governo iraquiano, e/ou com base numa cooperação estreita entre os mesmos;

j)         incentivar e ajudar as empresas europeias a candidatarem-se a concursos para a reconstrução do Iraque, a estarem presentes no terreno e a aproveitarem da experiência adquirida no Iraque, tanto no período que precedeu a guerra como durante o período de reconstrução;

k)        acolher com satisfação o estatuto de observador do Iraque na Organização Mundial do Comércio (OMC), enquanto passo decisivo para a integração do país na economia internacional, que contribui para complementar de uma forma positiva as negociações entre a UE e o Iraque sobre um Acordo de Comércio e Cooperação; aguardar a plena adesão do país à OMC, dentro de um prazo adequado, no futuro;

l)         proceder a negociações sobre o Acordo de Comércio e Cooperação entre a UE e o Iraque, de um modo que facilite e promova as reformas internas no país e aproxime o regime comercial do Iraque das normas e disciplinas dos sistemas multilaterais; informar regularmente o Parlamento sobre a fase em que se encontram as negociações entre a UE e o Iraque sobre o Acordo de Comércio e Cooperação;

m)       encorajar o Governo iraquiano a utilizar as receitas obtidas pela venda de petróleo de uma forma que garanta o seu reinvestimento no Iraque e a sua gestão por entidades públicas, sob a autoridade suprema do Governo iraquiano; recomendar que esta abordagem seja uma condição essencial para o apoio da UE à reconstrução e ao desenvolvimento da economia iraquiana;

n)        solicitar à Força Multinacional - Iraque (FMN-I) que coopere com o Governo iraquiano e preste contas pela situação dos mais de 24 000 detidos sob a sua responsabilidade, tendo como objectivo garantir-lhes um processo justo e o respeito dos direitos humanos fundamentais;

o)        encetar um diálogo com os EUA e procurar o reforço da multilateralização do papel desempenhado pela comunidade internacional no país, sob a égide da ONU; apoiar os esforços do Iraque para aumentar a frequência e o alcance dos debates com os Estados vizinhos, nomeadamente o Irão, a Síria, a Arábia Saudita e Turquia, sobre o futuro daquele país, sem prejuízo de qualquer outro tema que suscite apreensão; instar a Turquia a respeitar a integridade territorial do Iraque e a não reagir a actos terroristas através de acções militares em território iraquiano; instar as autoridades iraquianas a não permitirem que o território do Iraque seja utilizado como base para actos terroristas contra a Turquia;

p)        divulgar informações sobre a identidade das empresas privadas militares e de segurança que garantem a segurança do pessoal da União Europeia no Iraque; adoptar uma abordagem sobre o recurso a estas empresas durante as operações da PESD e elaborar directrizes claras sobre a utilização de empresas privadas militares e de segurança por parte das instituições da UE;

2.        Salienta o seu empenho nos princípios e na prática da democracia parlamentar; recorda, por tal motivo, a sua iniciativa, no âmbito do orçamento para 2008, destinada a apoiar a construção da democracia com os parlamentos dos países terceiros, o seu compromisso de apoiar activamente o Conselho de Representantes do Iraque oferecendo assistência na criação de capacidades, bem como a actividade desenvolvida, através da sua Delegação ad hoc para o Iraque, a fim de promover as relações bilaterais; decide, pois, apoiar o ulterior desenvolvimento do Conselho de Representantes do Iraque:

           (a) desenvolvendo iniciativas susceptíveis de reforçar a capacidade dos representantes eleitos iraquianos para desempenharem o seu papel constitucional na sociedade através de boas práticas parlamentares, de relações eficazes com o poder executivo e de um contacto estreito com os eleitores;

           (b) promovendo a transferência de experiências em matéria de administração eficaz, a formação de pessoal profissional, o desenvolvimento de uma estrutura de comissões plenamente funcional e de normas regimentais abrangentes, assim como, no plano institucional, a transparência e a prestação de contas;

           (c) facultando conhecimentos especializados em matéria de elaboração de legislação essencial para uma aplicação eficaz da estrutura federal do Estado;

3.  Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente Recomendação ao Conselho e, para conhecimento, à Comissão e aos governos e parlamentos dos Estados­Membros, bem como ao Governo e ao Conselho de Representantes da República do Iraque.

  • [1]  Textos aprovados, P6_TA (2007) 0481.
  • [2]  Textos aprovados, P6_TA(2007)0357.
  • [3]  JO L 62, de 9.3.2005, p. 37.
  • [4]  JO C 298 E, de 8.12.2006, p. 287.
  • [5]  JO C 298 E, de 8.12.2006, p. 171.
  • [6]  Vide Regulamento (CE) n.º 1717/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Novembro de 2006, que institui um Instrumento de Estabilidade (JO L 327, de 24.11.2006, p. 1).
  • [7]  Vide Regulamento (CE) n.º 1905/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de Dezembro de 2006, que institui um Instrumento de Financiamento da Cooperação para o Desenvolvimento (JO L 378, de 27.12.2006, p. 41).
  • [8]  Vide Regulamento (CE) n.º 1889/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de Dezembro de 2006, que institui um Instrumento Financeiro para a Promoção da Democracia e dos Direitos Humanos a nível mundial (JO L 386, de 29.12.2006, p. 1).

EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS

Introdução

1.  A presente Recomendação do Parlamento Europeu ao Conselho diz respeito ao futuro do Iraque e ao futuro da participação da União Europeia neste país. Ainda que a ênfase do presente documento resida, por isso, na apresentação de propostas concretas ao Conselho sobre o modo de melhorar a situação no terreno no Iraque, qualquer reflexão sobre a presença da União Europeia nesse país não pode evitar os ensinamentos retirados dos erros do passado.

O Iraque desde 2003

2.  A invasão do Iraque em 2003 foi um desastre estratégico e humanitário. Independentemente das várias justificações a que os EUA e os seus aliados recorreram em Março de 2003 para iniciar a guerra, infelizmente, os resultados na prática vieram desmentir as previsões ingénua e irresponsavelmente optimistas formuladas antes do conflito na maioria — se não na totalidade — dos domínios.

3.  Estrategicamente, a invasão pôs em perigo a unidade iraquiana; criou um vasto campo de treino para as organizações terroristas (nomeadamente, a Al-Qaeda), numa escala apenas comparável à do Afeganistão nos anos 80 e 90; removeu um dos principais obstáculos às aspirações do Irão em matéria de hegemonia regional; serviu de fonte de inspiração ao discurso e, provavelmente, à prática do extremismo islâmico à escala global; e, sobretudo, talvez tenha enfraquecido a capacidade dos movimentos democráticos do Médio Oriente para promoverem de forma pacífica, gradual e sustentável a mudança política e económica nos seus respectivos países.

4.  A nível humanitário, o resultado da invasão de 2003 é ainda mais questionável. O cômputo das vítimas oscila de forma muito vincada, entre as 77.757 a 84.705 vítimas civis[1] e as 100.000 a 150.000 mortes relacionadas com a guerra (civis e não civis)[2], incluindo as causadas pela acção dos bandos criminosos, e uma estimativa de 392.979 a 942.636 outros mortos iraquianos imputáveis à invasão de 2003 e à subsequente ocupação, que incluem as vítimas resultantes de uma anomia cada vez maior, da degradação das infra­‑estruturas e da deficiência da prestação de cuidados de saúde[3]. No momento da redacção do presente documento, já morreram no Iraque 3880 soldados norte‑americanos.

5.  Mais importante do que proceder a um exercício mórbido de contabilidade, é o reconhecimento de que a guerra de 2003, bem como o caos e a violência que se lhe seguiram, deram uma dimensão acrescida ao trauma colectivo de uma sociedade que já sofria as consequências de décadas de guerra, ditadura e sanções. Enquanto o derrube do regime de Saddam constituiu, em si, uma evolução positiva, outras consequências louváveis da invasão de 2003 — nomeadamente no domínio da Democracia e do ordenamento constitucional — têm de ser vistos apenas como parte de uma equação que globalmente deixou os Iraquianos, com toda a probabilidade, em condições piores do que aquelas em que se encontravam. A fuga é a demonstração mais eloquente do grau com que os Iraquianos exprimem o seu desacordo com o statu quo. Numa população total de cerca de 27 milhões de habitantes, mais de 2 milhões de Iraquianos são deslocados internos, tendo na esmagadora maioria abandonado as suas casas como corolário da violência sistemática, ao passo que outros 2 milhões abandonaram o país e procuraram refúgio, na maior parte dos casos, na Jordânia limítrofe e na Síria. Há 200.000 refugiados iraquianos na Europa. A crise dos refugiados originou uma expressiva fuga de cérebros, que afecta consideravelmente a classe média iraquiana, outrora próspera e instruída. De acordo com a UNAMI e outras agências da ONU, em alguns hospitais, 80% dos médicos partiram; dependendo das regiões, 30% a 70% das escolas foram encerradas; 70% da população não dispõe de acesso a um abastecimento de água condigno e 81% não tem acesso a um saneamento eficaz; a má nutrição crónica atinge 23% das crianças. O desemprego campeia de forma desenfreada: de acordo com a UNAMI, a taxa de desemprego ultrapassa os 80%, enquanto mais de metade da população vive com menos de 1 dólar por dia.

6.  Embora estas estatísticas radiquem no longo declínio da economia iraquiana desde os anos 80, devido à guerra, às sanções, à ditadura e à má gestão, a evolução verificada depois de 2003, ou tornou pior uma situação que já era má, ou pura e simplesmente não logrou fazer face às exigências mais prementes do Iraque em matéria de segurança e de desenvolvimento.

A Europa e o Iraque

7.  A guerra de 2003 dividiu a Europa. Alguns Estados­Membros da União Europeia tomaram a decisão política de apoiar os Estados Unidos no seu propósito de precipitar a guerra, supostamente para defender o mundo das armas de destruição maciça de Saddam. A unidade da UE na cena internacional foi uma das vítimas desta decisão fatídica. O legado da desunião de 2003 tem minado o papel potencial da UE na reconstrução do Iraque.

8.  Desde 2003, a CE comprometeu-se a doar cerca de 818 milhões de euros para a reconstrução do Iraque, não contando com as contribuições provenientes dos Estados­Membros. Mas a União Europeia não foi bem sucedida na melhoria palpável da situação no terreno. É verdade que não foi o único doador cujas contribuições para a reconstrução iraquiana produziram resultados magros e decepcionantes. Contudo, a presente Recomendação defende que a Europa pode fazer muito mais e muito melhor, nomeadamente, através do estabelecimento de contactos mais estreitos com as instituições iraquianas e os parceiros da sociedade civil, da expansão significativa da sua presença no terreno e da busca de formas mais criativas de utilização dos seus recursos.

9.  A presente Recomendação ao Conselho estriba‑se na mesma abordagem de base que a Resolução do PE intitulada “A União Europeia e o Iraque — Enquadramento da Acção da UE[4], de 6 de Julho de 2005, designadamente, no princípio segundo o qual o papel da UE no Iraque deve imperativamente nortear‑se pela “necessidade de ultrapassar acontecimentos passados e de olhar para o futuro” e pela “obrigação moral e política” de a “comunidade internacional” ajudar o povo do Iraque.

10. Na presente Recomendação, as Resoluções do Conselho de Segurança da ONU sobre o Iraque constituem o quadro global de referência da participação da UE naquele país. A Resolução 1770 do CSNU, que alarga consideravelmente o mandato da Missão de Assistência das Nações Unidas para o Iraque (UNAMI), sublinha “a importância da estabilidade e da segurança do Iraque para o povo iraquiano, para a região e para a comunidade internacional” e salienta “a importância de um apoio continuado a nível regional e internacional para o desenvolvimento do Iraque”.

11. A UE, como actor global com os seus próprios interesses e responsabilidades, não pode, nem deve, ignorar a crise em curso no Iraque: o país é indispensável à segurança regional, global e, naturalmente, europeia. A presente Recomendação baseia­‑se no pressuposto de que a UE tem à sua disposição um leque de recursos financeiros e políticos, que podem ser usados proveitosamente para promover o corolário de um Iraque seguro, estável, unificado, próspero e democrático, que respeite os Direitos Humanos, proteja as suas minorias e contribua para o acréscimo da estabilidade no Médio Oriente.

12. O Parlamento Europeu expressou em múltiplas ocasiões o seu descontentamento com a utilização dos fundos fiduciários de âmbito multilateral como forma de canalizar os financiamentos comunitários. Este tipo de fundos não é administrado pela UE e é impossível controlar com precisão o modo como são despendidos no terreno. No caso particular do Iraque, a utilização do Fundo Internacional para a Reconstrução do Iraque (FIRI) como principal via de acesso dos fundos comunitários suscitou apreensões no Parlamento Europeu sobre a transparência, a eficácia e a visibilidade. Essas apreensões foram particularmente sentidas no caso do Fundo Fiduciário para o Iraque do Banco Mundial, que é um dos elementos integrantes do FIRI. Na sua Resolução de 2005 sobre o Iraque[5], o Parlamento Europeu já manifestara a sua perplexidade pelo facto de “os fundos concedidos à reconstrução serem parcialmente administrados pelo ‘World Bank Trust’ e não inteiramente pelas Nações Unidas”, tendo sublinhado que, “até à data, o ‘World Bank Trust’ apenas executou uma ínfima parte dos fundos recolhidos”. O parecer da Comissão dos Assuntos Externos sobre o projecto de orçamento geral da União Europeia para o exercício de 2006 (C6-0000/2005 – 2005/2001 (BUD))[6] foi ainda mais explícito, ao requerer “que os futuros financiamentos não sejam encaminhados pelo Banco Mundial.”

13. A incapacidade da Comissão em fornecer ao Parlamento Europeu dados sobre o modo como os recursos comunitários estão a ser gastos conduziu à decisão de inscrever na reserva 20% das dotações de autorização da rubrica orçamental 19.10.03 (Cooperação com países em desenvolvimento do Médio Oriente – ICD), no contexto da aprovação final do orçamento para 2008. A condição para a libertação dessa reserva consistia na apresentação ao Parlamento, pela Comissão Europeia, de “uma panorâmica exaustiva da utilização dos fundos (em 2006, 2007 e os previstos para 2008) no Iraque.” No momento da elaboração do presente documento, a resposta da Comissão a este pedido do Parlamento foi considerada insatisfatória.

14. A presente Recomendação reitera as exigências Parlamento Europeu em relação a uma maior transparência, a uma menor utilização de fundos fiduciários multilaterais, em geral, e do Fundo Fiduciário para o Iraque do Banco Mundial no âmbito do FIRI, em particular, e a uma confiança acrescida nos projectos bilaterais, designadamente, com as agências da ONU. Enquanto a capacidade de absorção da administração iraquiana for limitada e o FIRI não lograr a garantia de um nível adequado de transparência e visibilidade aos fundos comunitários, a UE deveria deslocar a ênfase do seu apoio para projectos bilaterais centrados na assistência técnica e no desenvolvimento de capacidades nos domínios do Estado de Direito, da gestão financeira, da governação democrática e dos Direitos Humanos. A própria Comissão começou a caminhar nesse sentido, o que constitui um progresso bem-vindo.

15. As recomendações específicas sobre o futuro da participação da UE no Iraque dependem, naturalmente, das condições no terreno em termos de segurança, que constituem a única barreira de tomo a um aumento do papel desempenhado pela UE naquele país. Em qualquer caso, a União Europeia não deverá deixar de acompanhar as Nações Unidas, se e quando a ONU alargar a sua presença no Iraque — seja em Bagdade, seja em qualquer outro local. É desnecessário sublinhar que a questão da presença de tropas dos EUA em solo iraquiano escapa ao âmbito da presente Resolução. Contudo, parte­‑se do pressuposto de que os EUA assumirão as suas responsabilidades pela segurança do Iraque, enquanto as autoridades iraquianas entenderem que isso é indispensável. A única solução a longo prazo para a estabilização do Iraque é a multilateralização progressiva e a desmilitarização gradual da presença internacional no terreno, sob a égide da ONU. É neste contexto que a UE pode constituir um significativo valor acrescentado.

16. A UE deverá recorrer a todos os instrumentos financeiros relevantes de acção externa ao seu dispor para apoiar o reforço do compromisso político com a estabilidade e a prosperidade do Iraque. O Iraque não é um caso convencional de ajuda ao desenvolvimento, havendo, por isso, que modificar a abordagem seguida até ao momento – a qual recorreu, na maior parte das circunstâncias, ao Instrumento de Cooperação para o Desenvolvimento (ICD). A Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu intitulada “Recomendações para um Compromisso Renovado da União Europeia perante o Iraque[7], de Junho de 2006, contém uma série de directrizes úteis para o futuro. A ênfase que coloca, quer (1) na importância da capacidade de inclusão do processo político e do governo, quer (2) na situação de segurança que se vive no país, é bem­‑vinda. Contudo, para que a UE faça a diferença, deverá recorrer de forma criativa aos instrumentos que tem à sua disposição. Para além da manutenção de um diálogo político intenso com as instituições iraquianas (com especial destaque para o Conselho de Representantes), o Instrumento de Estabilidade, o Instrumento Europeu para a Democracia e os Direitos Humanos (IEDDH), a ajuda humanitária e o ICD, mas também as iniciativas da PESD no âmbito do desarmamento, da desmobilização e da reintegração (DDR) e da reforma do sector da segurança (RSS), deveriam ser objecto de articulação, a fim de se reforçarem mutuamente e de ajudarem a construir um Iraque seguro, estável, unificado, próspero e democrático, que respeite os Direitos Humanos e proteja as suas minorias. O Iraque não precisa de dinheiro. Precisa de estabilidade, de vontade política, de instituições políticas fortes e de capacidade administrativa para o gastar bem. São estas as áreas em que a UE pode fazer a diferença.

17. Uma das áreas específicas em que a UE tem obrigatoriamente de investir são os Direitos Humanos. A pena de morte, a cultura da impunidade e a violação sistemática dos Direitos Humanos em todas os domínios da vida colectiva iraquiana têm de ser um dos alvos principais das iniciativas da UE no Iraque. Os direitos das minorias religiosas e étnicas deverão ocupar um lugar cimeiro na lista de prioridades da futura acção comunitária naquele país. Os recursos do IEDDH deverão ser substancialmente mobilizados para o Iraque, tendo em vista, nomeadamente, o reforço da sociedade civil iraquiana.

18. Finalmente, a presente Recomendação exige transparência ao Conselho Europeu no tocante à utilização das empresas privadas militares e de segurança por parte dos funcionários da União Europeia em Bagdade. A UE carece de directrizes claras para o recurso a este tipo de empresas, designadamente, em operações no âmbito da Política Europeia de Segurança e Defesa, mas também, mais genericamente, para a sua utilização pelas Instituições comunitárias no estrangeiro. Caso a transparência neste domínio não melhore substancialmente e as Instituições comunitárias não criem directrizes claras para a utilização de empresas privadas militares e de segurança fora da UE, será muito difícil que o Parlamento Europeu avalize o reforço da presença física da União Europeia no Iraque.

  B6‑0328/2007

  • [1]  Estimativa apresentada pelo “Iraqui Body Count” e relativa a 1 de Dezembro de 2007.
  • [2]  Estimativa do Ministério da Saúde iraquiano, de Novembro de 2006.
  • [3]  Estimativa apresentada no mais recente estudo publicado pelo periódico médico The Lancet, em Outubro de 2006.
  • [4]  PA_TA(2005)0288.
  • [5]  PA_TA(2005)0288.
  • [6]  PE 360.281v02.00.
  • [7]  COM(2006)0283.

PROPOSTA DE RECOMENDAÇÃO AO CONSELHO (B6‑0328/2007)

apresentada nos termos do n.º 1 do artigo 114.º do Regimento

por Ana Maria Gomes

em nome do Grupo PSE

referente ao papel da União Europeia no Iraque

O Parlamento Europeu,

–   Tendo em conta o n.º 1 do artigo 114.º do seu Regimento,

A. Considerando o papel essencial que o Iraque desempenha para a estabilidade de toda a região e do Médio Oriente em sentido lato;

B.  Considerando as violências inter e intracomunitárias;

C. Considerando que não há solução militar possível, muito menos se for imposta por forças estrangeiras;

D. Considerando a necessidade de criar uma força nacional de manutenção da ordem, que agrupe todas as comunidades e que possa beneficiar da confiança destas;

E.  Considerando que é indispensável associar todos os actores políticos, de todas as comunidades, à procura de uma solução duradoura;

F.  Considerando que é necessário continuar a atenuar as adversidades das populações civis iraquianas, nomeadamente as das populações deslocadas ou refugiadas nos países vizinhos;

G. Considerando os compromissos assumidos pela Conferência dos Doadores;

H. Considerando que o Parlamento Europeu é corresponsável no domínio orçamental;

I.   Considerando que, de 2003 a 2006, a União Europeia concedeu ao Iraque uma ajuda de 718,5 milhões de euros;

K. Considerando que os fundos da União Europeia foram utilizados, sem efectivo controlo europeu, essencialmente através da ONU e do Banco Mundial, mediante o Fundo Internacional para a Reconstrução do Iraque (IRFFI)";

1.  Dirige ao Conselho as seguintes recomendações:

      a)   prosseguir a contribuição da União Europeia para a criação de um Estado unificado, estável, democrático, laico e respeitador das liberdades religiosas;

      b)   multiplicar as iniciativas susceptíveis de permitir a aproximação entre as diferentes comunidades, em especial nos domínios da reforma constitucional e da partilha do poder;

      c)   desenvolver — em estreita colaboração com a ONU, com os outros actores internacionais e as autoridades iraquianas — um plano coerente a longo prazo com vista à reforma do sector da segurança, com base no princípio da responsabilidade democrática das forças armadas e pondo a tónica na desmobilização das milícias;

      d)   contribuir para ajudar o Iraque a beneficiar dos seus recursos minerais;

      e)   proceder a uma auditoria independente sobre a utilização dos fundos europeus via ONU e Banco Mundial;

2.   Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente recomendação ao Conselho e, para informação, à Comissão, ao Governo iraquiano, ao Conselho dos Representantes iraquiano, à ONU e ao Banco Mundial.

PARECER DA COMISSÃO DO COMÉRCIO INTERNACIONAL (5.2.2008)

dirigido à Comissão dos Assuntos Externos

sobre uma proposta de recomendação do Parlamento Europeu ao Conselho sobre o papel da União Europeia no Iraque
(2007/2181(INI))

Relator de parecer: Ignasi Guardans Cambó

SUGESTÕES

A Comissão do Comércio Internacional insta a Comissão dos Assuntos Externos, competente quanto à matéria de fundo, a incorporar as seguintes sugestões na proposta de resolução que aprovar:

Formula as seguintes recomendações ao Conselho:

1.  Que acolha com satisfação o estatuto de observador do Iraque na Organização Mundial do Comércio (OMC), enquanto passo decisivo para a integração do país na economia internacional que contribui para complementar de uma forma positiva as negociações entre a UE e o Iraque sobre um Acordo de Comércio e Cooperação; que ambicione a plena adesão do país à OMC dentro de um prazo adequado no futuro; entretanto, deve garantir se, mediante contribuições financeiras, um apoio contínuo ao desenvolvimento das capacidades no país;

2.  Que leve a cabo as negociações sobre o Acordo de Comércio e Cooperação entre a UE e o Iraque de uma forma que facilite e fomente as reformas internas no Iraque e aproxime o regime comercial do Iraque das normas e disciplinas do sistema multilateral;

3.  Que ajude o Iraque a criar instituições adequadas e legítimas que permitam aos seus representantes negociarem as condições de adesão, e que encoraje uma assistência permanente da UE a favor da adesão e participação activa do Iraque em organizações, convenções e tratados internacionais, tais como a Conferência das Nações Unidas sobre o Comércio e Desenvolvimento (CNUCED), o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), o Programa das Nações Unidas para o Ambiente (PNUA), a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o Protocolo de Quioto e a Convenção sobre a Biodiversidade;

4.  Que se concentre na participação da UE no desenvolvimento do Pacto Internacional com o Iraque e no apoio às reformas do país no sentido de uma economia de mercado diversificada que responda às necessidades e exigências da sociedade iraquiana e faça frente às exigências e oportunidades que representa uma participação sustentável e justa no comércio mundial;

5.  Que tenha em conta a diversidade do desenvolvimento e a diversidade socio-económica entre as várias regiões que constituem o Iraque na futura configuração da política comercial e nas contribuições para a reconstrução do país; que recomende, por conseguinte, que se preste principalmente apoio ao desenvolvimento das capacidades das micro empresas e das pequenas e médias empresas;

6.  Que concentre a ajuda permanente da UE no desenvolvimento das capacidades das instituições administrativas e económicas do Iraque, em particular em matéria de reestruturação do quadro institucional, nomeadamente um banco central independente, uma moeda estável, uma autoridade fiscal e orçamental e um desenvolvimento sem entraves dos mercados financeiros; que solicite ao sector privado o fomento da reforma económica do mercado e dos investimentos estrangeiros directos;

7.  Que solicite às autoridades iraquianas que cumpram os requisitos de transparência previstos no artigo X do GATT de 1994, que adoptem as medidas legislativas necessárias e que desenvolvam as suas capacidades para as aplicar em domínios como a propriedade intelectual, os contratos públicos, as barreiras técnicas ao comércio e as medidas sanitárias e fitossanitárias;

8.  Que solicite às autoridades iraquianas que garantam a transparência e a não discriminação no que respeita aos contratos públicos, em particular para alargar o tratamento de nação mais favorecida a todos os fornecedores comunitários relativamente aos contratos celebrados por todas as autoridades públicas até que o Iraque adira ao Acordo Multilateral sobre os Contratos Públicos;

9.  Que encoraje o Governo iraquiano a utilizar as receitas obtidas pela venda de petróleo de uma forma que garanta o seu reinvestimento no Iraque e a sua gestão por adquirentes públicos sob a autoridade suprema do Governo iraquiano; que recomende que esta abordagem seja uma condição essencial para o apoio da UE à reconstrução e ao desenvolvimento da economia iraquiana;

10. Que reconheça que, tanto para a UE como para o Iraque, é mutuamente benéfico e de todo o interesse garantir uma igualdade de condições em matéria regulamentar e de facto para os investidores estrangeiros no país;

11. Que considere que, tendo em conta a necessidade de padrões comerciais mais sustentáveis, o acesso aos recursos energéticos deve ser objecto de uma regulamentação multilateral que não seja prejudicada por acordos comerciais bilaterais que disputem condições de acesso mais favoráveis;

12. Que garanta que os órgãos e as instituições executivos da UE facilitem informações completas, regulares e transparentes sobre os montantes efectivamente pagos e a execução da ajuda da UE, incluindo os fundos indirectamente concedidos mediante outras organizações como, por exemplo, o Fundo Internacional para a Reconstrução do Iraque (IRFFI);

13. Que informe regularmente o Parlamento sobre a fase em que se encontram as negociações entre a UE e o Iraque em matéria de comércio e cooperação;

14. Que encoraje o estabelecimento de um diálogo regular entre a Comissão, o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional e o Banco Europeu de Investimento, a fim de coordenar as abordagens e as iniciativas de reestruturação e/ou cancelamento da dívida, bem como as condições pertinentes em matéria de política económica, a fim de permitir um desenvolvimento social, ecológico e económico sustentável no país, de acordo com as preferências manifestadas pelo povo iraquiano;

15. Que recomende firmemente à Comissão que estabeleça a sua própria base de dados a partir de 2008 para os projectos geridos sob a égide das Nações Unidas e do Banco Mundial ou de qualquer outra instituição internacional e que recebam uma contribuição financeira global a cargo do orçamento geral da UE para grupos de projectos muito específicos; cada projecto deve poder ser identificado nessa base de dados e estar claramente assinalado pela contribuição financeira de que é objecto por parte da UE;

16. Que recomende aos Estados­Membros e à Comissão que avancem lentamente para o estabelecimento de projectos geridos e financiados pela UE; que solicite à Comissão que proporcione ao Parlamento um documento no qual se defina uma estratégia sobre a maneira de o fazer até Maio de 2008; os projectos que tiverem de se manter durante algum tempo sob a égide das Nações Unidas e do Banco Mundial devem ser objecto de explicações;

17. Que recomende à UE que continue a prestar ajuda financeira a programas que contribuam para reconstruir a sociedade iraquiana no seu conjunto;

18. Que apoie o progressivo estabelecimento de uma cooperação económica regional enquanto primeiro passo importante para a redução das tensões e o desenvolvimento gradual da cooperação a nível político e de segurança no Iraque;

19. Que solicite ao Iraque e aos Estados­Membros que fomentem a boa governação, a transparência e a responsabilidade no que respeita à exploração dos recursos naturais, garantindo simultaneamente que esta não provoque qualquer tipo de desequilíbrio e seja fundamentalmente utilizada em benefício do povo iraquiano.

RESULTADO DA VOTAÇÃO FINAL EM COMISSÃO

Data de aprovação

23.1.2008

Resultado da votação final

+:

–:

0:

17

4

1

Deputados presentes no momento da votação final

Kader Arif, Francisco Assis, Graham Booth, Carlos Carnero González, Daniel Caspary, Christofer Fjellner, Béla Glattfelder, Ignasi Guardans Cambó, Jacky Hénin, Alain Lipietz, Caroline Lucas, Marusya Ivanova Lyubcheva, Erika Mann, Vural Öger, Georgios Papastamkos, Godelieve Quisthoudt-Rowohl, Peter Šťastný, Gianluca Susta, Daniel Varela Suanzes-Carpegna, Iuliu Winkler, Corien Wortmann-Kool

Suplente(s) presente(s) no momento da votação final

Jean-Pierre Audy, Zbigniew Zaleski

Suplente(s) (n.º 2 do art. 178.º) presente(s) no momento da votação final

 

RESULTADO DA VOTAÇÃO FINAL EM COMISSÃO

Data de aprovação

27.2.2008

 

 

 

Resultado da votação final

+:

–:

0:

62

0

2

Deputados presentes no momento da votação final

Monika Beňová, Elmar Brok, Colm Burke, Philip Claeys, Véronique De Keyser, Giorgos Dimitrakopoulos, Michael Gahler, Bronisław Geremek, Maciej Marian Giertych, Ana Maria Gomes, Alfred Gomolka, Klaus Hänsch, Richard Howitt, Jana Hybášková, Anna Ibrisagic, Metin Kazak, Maria Eleni Koppa, Helmut Kuhne, Joost Lagendijk, Vytautas Landsbergis, Johannes Lebech, Emilio Menéndez del Valle, Francisco José Millán Mon, Philippe Morillon, Pasqualina Napoletano, Raimon Obiols i Germà, Vural Öger, Cem Özdemir, Justas Vincas Paleckis, Ioan Mircea Paşcu, Alojz Peterle, Hubert Pirker, Samuli Pohjamo, Bernd Posselt, Michel Rocard, Raül Romeva i Rueda, Libor Rouček, José Ignacio Salafranca Sánchez-Neyra, Jacek Saryusz-Wolski, György Schöpflin, Hannes Swoboda, Charles Tannock, Geoffrey Van Orden, Ari Vatanen, Kristian Vigenin, Zbigniew Zaleski, Josef Zieleniec

Suplente(s) presente(s) no momento da votação final

Mariela Velichkova Baeva, Cristian Silviu Buşoi, Giulietto Chiesa, Andrew Duff, Árpád Duka-Zólyomi, David Hammerstein, Tunne Kelam, Evgeni Kirilov, Jaromír Kohlíček, Peter Liese, Erik Meijer, Nickolay Mladenov, Borut Pahor, Józef Pinior, Antolín Sánchez Presedo, Inger Segelström

Suplente(s) (n.º 2 do art. 178.º) presente(s) no momento da votação final

Renate Weber