Resolução do Parlamento Europeu, de 16 de janeiro de 2014, sobre o respeito do direito fundamental à livre circulação na UE (2013/2960(RSP))
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta os artigos 21.º, 45.º, 47.º e 151.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia e os artigos 15.º, 21.º, 29.º, 34.º e 45.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia,
– Tendo em conta a Diretiva 2004/38/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativa ao direito de livre circulação e residência dos cidadãos da União e dos membros das suas famílias no território dos Estados-Membros(1), nomeadamente o artigo 7.º,
– Tendo em conta o Regulamento (UE) n.º 492/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho de 5 de Abril de 2011 relativo à livre circulação dos trabalhadores na União(2),
– Regulamento (CE) n.º 883/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de Abril de 2004, relativo à coordenação dos regimes de segurança social(3), alterado pelo Regulamento (CE) n.º 987/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de Setembro de 2009, que altera o Regulamento (CE) n.º 883/2004, relativo à coordenação dos sistemas de segurança social, e determina o conteúdo dos seus anexos(4),
– Tendo em conta a Comunicação da Comissão, de 13 de julho de 2010, intitulada «Reafirmar a liberdade de circulação de trabalhadores: direitos e principais desenvolvimentos» (COM(2010)0373),
– Tendo em conta o estudo publicado em 14 de outubro de 2013 sobre o impacto, nos sistemas de segurança social dos Estados-Membros, dos direitos de migrantes dentro da UE não ativos a prestações pecuniárias especiais de caráter não contributivo e cuidados de saúde atribuídos com base na residência,
– Tendo em conta a Comunicação da Comissão, de 25 de novembro de 2013, intitulada «Livre circulação dos cidadãos da UE e das suas famílias: cinco medidas para fazer a diferença» (COM(2013)0837),
– Tendo em conta a declaração da Vice-presidente da Comissão, V. Reding, ao Conselho "Justiça e Assuntos Internos", de 5 de dezembro de 2013, relativo à livre circulação,
– Tendo em conta a declaração do Comissário László Andor, de 1 de janeiro de 2014, sobre a supressão das restrições à livre circulação dos trabalhadores oriundos da Bulgária e da Roménia,
– Tendo em conta a sua Resolução, de 2 de Abril de 2009, sobre a aplicação da Diretiva 2004/38/CE relativa ao direito de livre circulação e residência dos cidadãos da União e dos membros das suas famílias no território dos Estados-Membros(5),
– Tendo em conta a sua resolução, de 29 de março de 2012, sobre o Relatório de 2010 sobre a cidadania da União: Eliminar os obstáculos ao exercício dos direitos dos cidadãos da UE(6),
– Tendo em conta o artigo 110.º, n.ºs 2 e 4, do seu Regimento,
A. Considerando que o direito à livre circulação constitui uma das quatro liberdades fundamentais da UE consagradas no Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, enquanto pedra angular da integração europeia diretamente relacionada com a cidadania da UE;
B. Considerando que a livre circulação constitui um elemento fundamental dos valores da UE, conferindo aos seus cidadãos a possibilidade de escolher onde querem viver e trabalhar e criando condições de mobilidade e desenvolvimento no mercado de trabalho, no sistema educativo e noutros domínios;
C. Considerando que a liberdade de circulação é um direito garantido a todos os cidadãos europeus, independentemente da existência de potenciais controlos fronteiriços aplicados por alguns Estados-Membros à entrada de cidadãos da UE no seu território; que o facto de nem todos os Estados-Membros fazerem parte do espaço Schengen não afeta o direito de todos os cidadãos da UE à livre circulação na União;
D. Considerando que os cidadãos da UE veem a liberdade de circulação como o direito mais estreitamente associado à cidadania da UE, a conquista mais positiva da UE e uma fonte de benefícios económicos para a economia do seu país;
E. Considerando que a contribuição dos trabalhadores da UE para o sistema de proteção social do Estado-Membro de acolhimento é igual à dos trabalhadores nacionais;
F. Considerando que as vantagens da liberdade de circulação dos trabalhadores móveis para o desenvolvimento do país de acolhimento são visíveis em toda a Europa, especialmente nas áreas dos cuidados de saúde, agricultura e construção;
G. Considerando que a liberdade dos cidadãos da UE de residirem em qualquer parte da União se aplica a todos os cidadãos da UE sem quaisquer restrições mas que, em conformidade com a Diretiva 2004/38/CE, está sujeita à condição de que após três meses os cidadãos da UE em causa cumpram as condições legais para não sobrecarregarem o país de acolhimento; considerando que a livre circulação de trabalhadores constitui um pilar do êxito do mercado único da UE; que embora apenas 2,8% de todos os cidadãos da UE residam num Estado-Membro que não o de origem, ainda assim não deixam de constituir um elemento fundamental do êxito do mercado interno, promovendo a economia da Europa;
H. Considerando que o princípio da igualdade de tratamento ou da não discriminação implica que todos os cidadãos da UE têm os mesmos direitos e obrigações que os nacionais do país de acolhimento (os Regulamentos (CE) n.° 883/2004 e (CE) n.° 987/2009 baseiam-se neste princípio); que todos os Estados-Membros são livres de decidir, relativamente a estes princípios, quais os benefícios da segurança social que concedem e em que condições o fazem; que a legislação da UE em matéria de coordenação dos sistemas de segurança social não permite a discriminação relativamente aos benefícios da segurança social no caso dos cidadãos da UE que são trabalhadores, parentes diretos de trabalhadores ou habitualmente residentes no Estado‑Membro em questão;
I. Considerando que a recente evolução das nossas sociedades, nomeadamente devido às transformações industriais, à globalização, a novos padrões de trabalho, à alteração demográfica e ao desenvolvimento dos meios de transporte, requer um grau de mobilidade superior entre os trabalhadores,
J. Considerando que a livre circulação dos trabalhadores representa um exemplo socioeconómico positivo tanto para a UE como para os Estados-Membros, constituindo um marco para a integração europeia, o desenvolvimento económico, a coesão social e a promoção individual a nível profissional, neutralizando os efeitos negativos da crise económica e consolidando a União enquanto poder económico mais forte que está preparado para enfrentar os desafios da mudança global;
K. Considerando que a partir de 1 de janeiro de 2014 as disposições transitórias aplicáveis à livre circulação de trabalhadores oriundos da Bulgária e da Roménia foram suprimidas;
L. Considerando que o Conselho reiterou o seu apoio à liberdade de circulação e reconheceu os benefícios mútuos que a mesma proporciona, como, por exemplo, num debate recente no Conselho «Justiça e Assuntos Internos» (8 de outubro de 2013, 5 e 6 de dezembro de 2013);
M. Considerando que à medida que as eleições europeias se aproximam, a livre circulação de cidadãos da UE se tornou tema de campanha para alguns partidos políticos; que existe o risco de esse debate, caso não seja abordado de forma racional, poder levar à culpabilização de cidadãos da UE oriundos de outros Estados-Membros, ou dos cidadãos móveis da UE, bem como a um aumento do racismo e da xenofobia; Considerando que alguns dos principais políticos europeus fizeram recentemente diversas declarações que minam o direito à liberdade de circulação;
N. Considerando que estudos recentes levados a cabo pela Comissão demonstraram que os trabalhadores móveis são contribuintes líquidos para as economias e os orçamentos dos países de acolhimento; que os trabalhadores móveis, enquanto grupo, pagam mais aos países de acolhimento em impostos e segurança social do que recebem como prestações, ao passo que as despesas com cuidados de saúde relativas a cidadãos móveis não ativos da UE são muito baixas relativamente ao total das despesas no setor da saúde (0,2%) ou às economias dos países de acolhimento (0,01 % do PIB) e que os cidadãos da UE representam uma proporção muito baixa dos beneficiários de prestações especiais de caráter não contributivo;
1. Insta os Estados-Membros a cumprirem as disposições do Tratado relativamente à legislação da UE em matéria de livre circulação e a assegurarem o respeito do princípio da igualdade e do direito fundamental à liberdade de circulação em todos os Estados-Membros;
2. Contesta vivamente a posição assumida por alguns líderes europeus ao solicitarem alterações e restrições à liberdade de circulação dos cidadãos; insta os Estados-Membros a absterem-se de tomar quaisquer medidas que possam afetar o direito à liberdade de circulação, que se baseia na legislação nuclear da UE;
3. Rejeita totalmente qualquer proposta no sentido de limitar o número de migrantes da UE, pois tal constituiria um desrespeito do princípio da livre circulação dos cidadãos, consignado no Tratado da UE; assinala que a mobilidade dos trabalhadores contribui para a competitividade da economia europeia;
4. Insta a Comissão e os Estados-Membros a assegurarem a aplicação rigorosa da legislação da União, por forma a garantir a igualdade de tratamento de todos os trabalhadores da UE e que estes não sejam discriminados em termos de acesso ao emprego, emprego e condições de trabalho, remuneração, demissão e benefícios sociais e fiscais, garantindo, assim, uma concorrência leal entre empresas; exorta as autoridades nacionais a combaterem quaisquer restrições injustificadas ou obstáculos ao direito dos trabalhadores à livre circulação, bem como qualquer forma de exploração dos mesmos;
5. Recorda que a liberdade de circulação dos trabalhadores oferece a todos os cidadãos da União, independentemente do seu local de residência, o direito de circularem livremente para outro Estado-Membro para nele trabalharem e/ou residirem para fins laborais;
6. Acolhe favoravelmente a Comunicação da Comissão (COM(2013)0837) que estabelece cinco medidas para ajudar os Estados-Membros e as suas autoridades locais a aplicarem plenamente a legislação e os instrumentos da UE, e, a este respeito, apoia totalmente as seguintes medidas, a implementar conjuntamente com os Estados-Membros: ajudar os Estados-Membros a lutar contra os casamentos de conveniência (manual); ajudar as autoridades a aplicar as regras de coordenação europeias em matéria de segurança social (guia prático); ajudar as autoridades a fazer face aos desafios da inclusão social (financiamento); intercâmbio das melhores práticas entre autoridades locais; formação e apoio das autoridades locais para efeitos de aplicação da legislação da UE em matéria de liberdade de circulação;
7. Insta os Estados-Membros a não discriminarem os trabalhadores móveis da UE associando erradamente o direito à liberdade de circulação para fins laborais aos alegados abusos dos sistemas de segurança social; salienta que nenhum dos Estados-Membros que reclamou desta sobrecarga apresentou provas à Comissão, como solicitado;
8. Insta a Comissão a controlar de forma sistemática e exaustiva o respeito do direito fundamental à liberdade de circulação de todos os trabalhadores da UE; encoraja a Comissão a prosseguir os seus esforços atuais no sentido de garantir a transposição e a aplicação corretas da Diretiva 2004/38/CE relativa à livre circulação pelos Estados-Membros, utilizando plenamente o seu poder de instaurar processos de infração;
9. Insta os Estados-Membros a utilizarem de forma plena e transparente todos os recursos à sua disposição ao abrigo dos fundos europeus, tais como o Fundo Social Europeu e o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, a promoverem a integração, a inclusão social e a luta contra a pobreza, bem como a apoiarem os esforços das comunidades locais no sentido de dar resposta a qualquer aumento do número de cidadãos marginalizados;
10. Recorda aos Estados-Membros a sua responsabilidade social de abordar a utilização indevida dos respetivos sistemas de segurança social, independentemente de tal ser feito pelos próprios cidadãos ou pelos de outros Estados-Membros; insta os Estados-Membros a respeitarem as disposições da Diretiva 2004/38/CE e a abordarem os eventuais abusos;
11. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão e aos governos e parlamentos dos Estados-Membros.