Proposta de resolução - B6-0269/2007Proposta de resolução
B6-0269/2007

PROPOSTA DE RESOLUÇÃO

4.7.2007

apresentada na sequência das perguntas com pedido de resposta oral B6‑0130/2007 e B6-0131/2007
nos termos do nº 5 do artigo 108º do Regimento
por Gianluca Susta, Ignasi Guardans Cambó e Johan Van Hecke
em nome do Grupo ALDE
sobre o Acordo TRIPS e o acesso aos medicamentos

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B6‑0269

Resolução do Parlamento Europeu sobre o Acordo TRIPS e o acesso aos medicamentos

O Parlamento Europeu,

–  Tendo em conta as suas resoluções "A meio caminho dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio"[1], de 20 de Junho de 2007, sobre Acordos de Parceria Económica[2], de 23 de Maio de 2007, e sobre a SIDA[3], de 30 de Novembro de 2006,

–  Tendo em conta a proposta de decisão do Conselho relativa à aceitação, em nome da Comunidade Europeia, do Protocolo que altera o Acordo sobre os aspectos dos direitos de propriedade intelectual relacionados com o comércio (TRIPS), feito em Genebra em 6 de Dezembro de 2005 (COM(2006) 175)[4],

–  Tendo em conta o Regulamento (CE) nº 816/2006[5] do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de Maio de 2006, relativo à concessão obrigatória de patentes respeitantes ao fabrico de produtos farmacêuticos destinados à exportação para países com problemas de saúde pública,

–  Tendo em conta o Acordo sobre os aspectos dos direitos de propriedade intelectual relacionados com o comércio (a seguir designado Acordo TRIPS), adoptado em Abril de 1994,

–  Tendo em conta a Declaração de Doha sobre o Acordo TRIPS e a Saúde Pública, adoptada em 14 de Novembro pela Conferência Ministerial da Organização Mundial do Comércio (OMC) (a seguir designada "Declaração de Doha")[6],

–  Tendo em conta a Decisão do Conselho Geral da OMC de 30 de Agosto de 2003 (a seguir designada "Decisão da OMC"), adoptada nos termos do ponto 6 da Declaração de Doha sobre o Acordo TRIPS e a Saúde Pública,

–  Tendo em conta o Protocolo que altera o Acordo sobre os aspectos dos direitos de propriedade intelectual relacionados com o comércio (TRIPS), feito em Genebra em 6 de Dezembro de 2005 (a seguir designado "Protocolo"),

–  Tendo em conta a resolução WHA 60.30 sobre saúde pública, inovação e propriedade intelectual, adoptada em 23 de Maio de 2007, na 60ª Assembleia Mundial de Saúde,

–  Tendo em conta o nº 5 do artigo 108º do seu Regimento,

A.  Considerando que, antes da entrada em vigor do Acordo TRIPS, em 1994, a capacidade de alguns países em desenvolvimento, de rendimento médio, para produzir medicamentos genéricos de baixo custo aumentou, e mesmo Estados muito pobres começaram a ser capazes de obter certos medicamentos genéricos de baixo custo no mercado mundial, quer tais produtos fossem patenteados ou não,

B.  Considerando que a Declaração de Doha reconfirmou as chamadas flexibilidades incorporadas no Acordo TRIPS e as ampliou ainda mais através da instituição de mecanismos legais para permitir aos países que não têm capacidade para fabricar genéricos que substituam medicamentos patenteados onerosos, sob licenças obrigatórias emitidas a nível interno, que obtenham importações de países com condições e vontade para os ajudar, sem a interferência dos titulares de patentes relevantes,

C.  Considerando que esta solução, inicialmente incluída numa derrogação conhecida como a Decisão da OMC, pode tornar-se permanente sob a forma de um protocolo ao Acordo TRIPS, cuja aceitação está actualmente a ser apreciada pelo Parlamento Europeu,

D.  Considerando que, nos termos do artigo 30° do Acordo TRIPS, "Os membros podem prever excepções limitadas aos direitos exclusivos conferidos por uma patente, desde que essas excepções não colidam de modo injustificável com a exploração normal da patente e não prejudiquem de forma injustificável os legítimos interesses do titular da patente, tendo em conta os legítimos interesses de terceiros"; considerando que, uma vez que o país assistente exportaria medicamentos necessários para o país importador, não deve haver um impacto económico significativo no mercado local do país exportador,

E.  Considerando que, até à data, nenhum país efectuou a notificação geral ao Conselho do TRIPS acerca da sua intenção de utilizar o mecanismo criado pela Decisão da OMC para importar medicamentos mais baratos,

F.  Considerando que os requisitos processuais e materiais que regem a emissão de licenças obrigatórias pelos países importadores (quando aplicável) e pelos países exportadores, bem como as condições e notificações relacionadas com essas licenças, constituem os principais obstáculos potenciais à utilização eficaz da Decisão da OMC,

G.  Considerando que o Protocolo foi submetido a todos os membros da OMC e poderá ser aprovado até 1 de Dezembro de 2007 ou uma data posterior determinada pela Conferência Ministerial; considerando que o Protocolo entrará em vigor aquando da sua aceitação por dois terços dos membros da OMC,

H.  Considerando que, até à data, apenas sete países (entre os 150 membros da OMC), ou 4,7% dos membros, aceitaram a alteração permanente do Acordo TRIPS: os Estados Unidos, a Suíça, El Salvador, a República da Coreia, a Noruega, a Índia e as Filipinas,

I.  Considerando que a União Europeia já transpôs a Decisão da OMC para o direito interno e que, por conseguinte, o adiamento da aceitação do Protocolo até uma data posterior a 1 de Dezembro de 2007 não criaria um vazio legal, mas poderia proporcionar tempo suficiente para avaliar a eficácia do mecanismo proposto com vista a decidir se deve ser tornado permanente,

J.  Considerando que a União Europeia deve apoiar expressamente a plena implementação nos países em desenvolvimento das flexibilidades incluídas no Acordo TRIPS, como reconhece a Declaração de Doha, "para promover o acesso aos medicamentos para todos",

K.  Considerando que o regulamento de execução da Decisão da OMC concede pouca atenção às questões da transferência de tecnologia e do reforço de capacidades, parafraseando apenas, no considerando 13, alguns termos gerais da Decisão da OMC,

L.  Considerando que a União Europeia deve abster-se de impor aos países ACP e outros países pobres em desenvolvimento e países menos desenvolvidos (PMD) novas obrigações em matéria de propriedade intelectual que possam afectar os seus programas de saúde pública,

M.  Considerando que, nos seus Acordos de Parceria Económica propostos (APE) com os Estados de África, das Caraíbas e do Pacífico (ACP), a UE está a negociar a adesão ou aceitação das obrigações do Tratado de Cooperação em Matéria de Patentes (PCT) e do Tratado de Legislação de Patentes (PLT),

1.  Salienta que o acesso a produtos farmacêuticos baratos nos países pobres em desenvolvimento e nos PMD é essencial para atingir os objectivos de desenvolvimento da UE propostos e contribuiria para a redução da pobreza, o reforço da segurança das pessoas e a promoção dos direitos humanos e do desenvolvimento sustentável;

2.  Considera que a política da UE deve visar a maximização da disponibilidade dos produtos farmacêuticos a preços acessíveis nos países em desenvolvimento;

3.  Insta o Conselho a reconhecer que a União Europeia deve adoptar medidas adicionais, com carácter de urgência, a fim de encorajar a transferência de tecnologia, a investigação, o reforço das capacidades, os sistemas de aprovisionamento regionais e o apoio ao registo, com vista a facilitar e aumentar a produção de produtos farmacêuticos pelos próprios países em desenvolvimento;

4.  Solicita à Comissão e aos Estados-Membros que concedam apoio financeiro concreto à transferência de tecnologia relacionada com os produtos farmacêuticos e ao reforço das capacidades dos países em desenvolvimento, bem como à produção local de produtos farmacêuticos em todos os países em desenvolvimento, nomeadamente os PMD, em observância das obrigações estabelecidas pelo nº 2 do artigo 66º do Acordo TRIPS;

5.  Solicita ao Conselho que se comprometa a atribuir um nível de financiamento determinado para melhorar ou criar facilidades de produção farmacêutica pertencentes a pessoas locais nos países em desenvolvimento (incluindo os países menos desenvolvidos) e reforçar a dotação total da UE a favor das parcerias público-privadas que realizam actividades de investigação e desenvolvimento de medicamentos de especial relevância para os países em desenvolvimento;

6.  Solicita à Comissão que financie a I&D sobre doenças relacionadas com a pobreza, doenças tropicais e doenças negligenciadas através de um vasto leque de instâncias, incluindo parcerias público-privadas e outras possíveis fontes de financiamento, e que apoie os institutos de investigação dispostos a cooperar com as iniciativas de saúde pública neste domínio;

7.  Solicita ao Conselho que apoie a ideia de que o mecanismo criado pela Decisão da OMC e pelo Protocolo ao Acordo TRIPS representa, na melhor das hipóteses, apenas uma pequena parte da solução para o problema do acesso aos medicamentos a preços comportáveis e de que outras medidas serão necessárias para que a União Europeia contribua para uma solução eficaz e abrangente para os problemas de saúde pública enfrentados nos países em desenvolvimento;

8.  Solicita ao Conselho que apoie os países pobres em desenvolvimento que utilizam as chamadas flexibilidades incorporadas no Acordo TRIPS e reconhecidas pela Declaração de Doha a fim de poderem fornecer medicamentos essenciais a preços acessíveis, ao abrigo dos seus programas nacionais de saúde pública;

9.  Encoraja os países pobres em desenvolvimento a utilizar todos os meios de que dispõem no quadro do Acordo TRIPS, como licenças obrigatórias e o mecanismo previsto pelo artigo 30°;

10.  Insta o Conselho a adoptar uma declaração política conjunta com o Parlamento Europeu no sentido de que os Estados-Membros da UE continuem a ter liberdade para utilizar a disposição relativa às excepções do artigo 30° do Acordo TRIPS, ao abrigo da sua legislação nacional em matéria de patentes, a fim de autorizar a produção e a exportação "para responder a necessidades de saúde pública nos membros importadores", e solicita ao Conselho que dê instruções à Comissão no sentido de esta se abster de tomar medidas que interfiram com estes procedimentos;

11.  Exorta o Conselho a restringir o mandato da Comissão para esta não negociar disposições do Acordo TRIPS-Plus relacionadas com produtos farmacêuticos que afectam a saúde pública e o acesso aos medicamentos no quadro dos Acordos de Parceria Económica (APE) com os países ACP e de outros futuros acordos bilaterais e regionais com países em desenvolvimento;

12.  Solicita à Comissão que apoie a divulgação pelos requerentes de patentes da fonte e origem das invenções derivadas de recursos biológicos e dos conhecimentos tradicionais associados que se encontram nos países em desenvolvimento, com vista a promover a partilha equitativa de benefícios e tecnologia derivados desses recursos por parte dos países fornecedores;

13.  Insta a Comissão a apoiar "estratégias de aquisições em grupo", nos termos da alínea b) do artigo 31°, e outras estratégias susceptíveis de ser utilizadas por países ou grupos de países para assegurar um maior poder de compra e economias de escala na produção de medicamentos genéricos a preços acessíveis e estimular o investimento directo nas instalações de produção local nas regiões;

14.  Solicita ao Conselho que encarregue a Comissão Europeia de apoiar de forma pró-activa o trabalho do Grupo de Trabalho Intergovernamental da OMS sobre Saúde, Inovação e Propriedade Intelectual (IGWG) e transmitir regularmente ao Parlamento Europeu relatórios sobre o trabalho que desenvolve;

15.  Encoraja as empresas farmacêuticas a procurar soluções tarifárias alternativas que envolvam uma abordagem baseada nas "grandes quantidades e margens reduzidas", susceptível de aumentar o acesso aos medicamentos sem a necessidade de invocar licenças obrigatórias;

16.  Recorda que a contrafacção de medicamentos não é uma questão de patentes em si; acentua que é necessário tomar medidas para combater a contrafacção no domínio da repressão penal (sanções penais) e da regulamentação dos medicamentos, e não mediante o aumento dos níveis de protecção da propriedade intelectual;

17.  Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão, aos governos dos Estados-Membros da UE e dos países ACP, à OMC e aos dirigentes da ONUSIDA, do PNUD e do FNUP.