Relatório - A5-0063/2003Relatório
A5-0063/2003

RELATÓRIO sobre a recomendação para uma decisão do Conselho relativa a uma alteração do artigo 10.º‑2 dos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu
(6163/2003 – C5‑0038/2003 – 2003/0803(CNS))

10 de Março de 2003 - *

Comissão dos Assuntos Económicos e Monetários
Relator: Ingo Friedrich

Processo : 2003/0803(CNS)
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A5-0063/2003
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A5-0063/2003
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PÁGINA REGULAMENTAR

Por carta de 11 de Fevereiro de 2003, o Conselho consultou o Parlamento, nos termos do artigo 10º-6 do Tratado BCE, sobre a recomendação do BCE de uma decisão do Conselho relativa a uma alteração do artigo 10.º-2 dos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu (6163/2003 – 2003/0803(CNS)).

Na sessão de 13 de Fevereiro de 2003, o Presidente do Parlamento comunicou o envio da referida proposta à Comissão dos Assuntos Económicos e Monetários, competente quanto à matéria de fundo e à Comissão dos Assuntos Constitucionais, encarregada de emitir parecer (C5‑0038/2003).

Na sua reunião de 17 de Fevereiro de 2003, a comissão designou relator Ingo Friedrich.

Nas suas reuniões de 18 de Fevereiro e 10 de Março de 2003, a comissão procedeu à apreciação da recomendação do BCE e do projecto de relatório.

Na última reunião, a comissão aprovou o projecto de resolução legislativa por 28 votos a favor, 1 contra e 4 abstenções.

Encontravam-se presentes no momento da votação Christa Randzio-Plath (presidente), José Manuel García-Margallo y Marfil, Philippe A.R. Herzog e John Purvis (vice-presidentes), Ingo Friedrich (relator), Pervenche Berès, Hans Blokland, Armonia Bordes, Jean-Louis Bourlanges (em substituição de Brice Hortefeux), Hans Udo Bullmann, Ieke van den Burg (em substituição de Mary Honeyball), Jonathan Evans, Carles-Alfred Gasòliba i Böhm, Robert Goebbels, Lisbeth Grönfeldt Bergman, Christopher Huhne, Othmar Karas, Piia-Noora Kauppi, Werner Langen (em substituição de Christoph Werner Konrad), Giorgio Lisi (em substituição de Renato Brunetta, nos termos do nº 2 do artigo 153º do Regimento), Astrid Lulling, Ioannis Marinos, Hans-Peter Mayer, Ioannis Patakis, Alexander Radwan, Bernhard Rapkay, Karin Riis-Jørgensen, Manuel António dos Santos (em substituição de Fernando Pérez Royo), Olle Schmidt, Peter William Skinner, Charles Tannock (em substituição de Theresa Villiers), Helena Torres Marques e Bruno Trentin.

Em 18 de Fevereiro de 2003, a Comissão dos Assuntos Constitucionais decidiu não emitir parecer.

O relatório foi entregue em 10 de Março de 2003.

PROPOSTA LEGISLATIVA

Proposta de decisão do Conselho relativa a uma alteração do artigo 10.º‑2 dos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu (6163/2003 – C5-0038/2003 – 2003/0803 (CNS))

Esta proposta foi rejeitada.

PROJECTO DE RESOLUÇÃO LEGISLATIVA DO PARLAMENTO EUROPEU

sobre a proposta de decisão do Conselho relativa a uma alteração do artigo 10.º-2 dos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu

(6163/2003 – C5‑0038/2003 – 2003/0803(CNS))

(Processo de consulta)

O Parlamento Europeu,

–   Tendo em conta a recomendação do BCE ao Conselho (6163/2003)[1],

–   Tendo em conta o artigo 10º-6 do Tratado BCE, nos termos do qual foi consultado pelo Conselho (C5‑0038/2003),

–   Tendo em conta o parecer da Comissão de 19 de Fevereiro de 2003 (COM(2003) 81)[2]

–   Tendo em conta o artigo 67º do seu Regimento,

–   Tendo em conta o relatório da Comissão dos Assuntos Económicos e Monetários (A5‑0063/2003),

A.   Plenamente convicto da necessidade de se proceder à reforma das modalidades de votação no seio do Conselho do BCE, tendo em vista o possível alargamento da UEM,

B.   Fazendo notar que a proposta do modelo rotativo tem sido amplamente criticada pela sua excessiva complexidade, mesmo tendo em conta as dificuldades da tarefa dentro dos limites impostos pelo artigo 10.º-6 dos Estatutos do BCE,

C.   Sublinhando que as medidas de reforma devem garantir, por um lado, a participação plena de todos os membros do Conselho do BCE no processo de tomada de decisões e, por outro, a representação adequada da economia da zona euro,

D.   Considerando que, a longo prazo, um número de membros alargado exigirá estruturas de decisão mais eficazes,

1.   Rejeita a recomendação do BCE;

2.   Reafirma a regra actual, segundo a qual todos os governadores dos bancos centrais dos Estados-Membros da zona euro possuem direitos de voto plenos e ilimitados, e segundo a qual o Conselho do BCE delibera por maioria simples dos seus membros;

3.   Requer a adopção de uma solução no quadro da próxima Conferência Intergovernamental, após consulta do Parlamento Europeu, que deverá operar uma distinção entre decisões operacionais, que deverão ser tomadas por uma Comissão Executiva alargada a nove elementos, representando de forma adequada a economia da zona euro, e as decisões estratégicas e gerais de política monetária, que deverão ser tomadas pelo Conselho do BCE deliberando por uma dupla maioria, baseada na população dos Estados-Membros, na dimensão total da economia e na dimensão relativa dentro desta do sector dos serviços financeiros;

4.   Encarrega o seu Presidente de transmitir a posição do Parlamento ao Conselho, à Comissão, ao BCE, à Convenção e aos parlamentos nacionais dos Estados-Membros.

  • [1] Ainda não publicado
  • [2] Ainda não publicado.

EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS

1.   Enfrentar aos desafios do alargamento através da reforma do Conselho de Governadores do BCE

Um hipotético alargamento da UEM poderia levar a que o número de membros com direito a voto no Conselho de Governadores do BCE aumentasse para 31 — ou até mais. Nestas circunstâncias, a tomada de decisões tornar-se-ia bastante mais difícil, em especial, se se tiver presente que uma UEM alargada poderá ser mais heterogénea do que a actual zona euro. Este facto ilustra claramente a necessidade de uma reforma das modalidades de votação no âmbito do Conselho de Governadores do BCE, sob pena da perda de credibilidade da UEM e do próprio BCE.

2.   As recomendações do BCE

Com a entrada em vigor do Tratado de Nice, foi aditado um novo artigo 10.º‑6 aos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu (SEBC/BCE). O artigo 10.º‑2 dos referidos Estatutos, que define as normas em matéria de tomada de decisões e de modalidades de votação no seio do Conselho de Governadores do BCE, pode ser alterado por meio de uma decisão unânime do Conselho (reunião de chefes de Estado ou de Governo), com base, seja numa recomendação da Comissão, seja numa recomendação do BCE. Em ambos os casos, o Parlamento Europeu tem de ser consultado.

A 3 de Fevereiro, o BCE apresentou uma recomendação relativamente a uma alteração ao artigo 10.º‑2 dos Estatutos (BCE/2003/1). É de saudar o empenho do BCE em apresentar uma recomendação o mais depressa possível após a entrada em vigor do Tratado de Nice.

Deveríamos começar por ter em conta o facto de que o BCE se propôs alcançar um objectivo extremamente ambicioso — o de preparar o principal órgão de tomada de decisões do BCE para enfrentar os desafios de alargamento —, embora dentro dos limites restritos impostos pela chamada "cláusula de autorização" definida no artigo 10.º‑6. Qualquer reforma apenas poderia modificar as modalidades de votação no quadro do artigo 10.º‑2 dos Estatutos; a introdução de mudanças mais profundas não está prevista na cláusula de autorização. Adicionalmente, teve de se chegar a um acordo que pudesse colher a unanimidade de todos os actuais Estados‑Membros.

É, evidentemente, muito difícil, se não impossível, proceder a uma reforma duradoura nestas circunstâncias. E, na verdade, subsistem sérias dúvidas sobre se as propostas de alteração ao artigo 10.º‑2 dos Estatutos respeitam os critérios fundamentais (de resto, auto‑impostos pela própria instituição) do princípio "um membro, um voto", da representatividade, da transparência e da eficiência, aos quais o Parlamento Europeu poderia acrescentar o da responsabilidade.

2.1    Descrição da recomendação do BCE

No cerne do modelo de funcionamento do BCE existe um sistema de rotação dos direitos de voto no Conselho de Governadores. Cada Governador pode ser incluído num de três grupos, dependendo da classificação do respectivo Estado‑Membro, que é definida de acordo com um indicador baseado fundamentalmente no PIB dos Estados‑Membros. Estes três grupos partilham o direito a 15 votos, enquanto os seis membros do Conselho do BCE mantêm, cada um, o direito permanente a um voto, o que significa que, no total, há 21 votos. Os cinco países "grandes" criam o primeiro grupo, partilhando quatro votos. Os restantes Governadores são distribuídos pelos segundo e terceiro grupos, de acordo com a sua posição na classificação, partilhando oito (grupo 2) e três (grupo 3) votos, respectivamente. Prevê‑se que este sistema entre em vigor quando o número de Governadores (e, nessa qualidade, de membros da UEM) chegar a 22. Entre os 16 e os 21 Estados‑Membros, haverá lugar a uma fase de transição, com apenas dois, em lugar de três, grupos. O Conselho de Governadores, por uma maioria de dois terços, poderá decidir adiar o início do sistema de rotação, até que o número de Governadores ultrapasse o limite de 18.

2.2    Avaliação da recomendação do BCE

  • O princípio "um membro, um voto"

Se é verdade que cada Governador é tratado de forma igual quando tem direito a voto, o sistema tripartido cria uma óbvia diferenciação de acordo com a origem nacional. Como a maioria dos países candidatos estariam representados no terceiro grupo e nenhum deles no primeiro, o sistema poderia criar um novo tipo de divisão indesejável na UEM.

  • Representatividade

Na medida que os Governadores dos Estados‑Membros de maior dimensão dispõem com maior frequência de períodos com direito a voto, o BCE defende que o modelo proposto garantiria que as economias da zona euro estivessem sempre adequadamente representadas. Há, porém, indicações claras de que o princípio da "representatividade" não é devidamente tido em conta na recomendação do BCE. Numa UEM alargada a 25 países, seria teoricamente possível que uma aliança de pequenos países representando apenas 10% das economias da zona euro pudesse forçar a tomada de decisões contra os grandes países e os membros do Conselho do BCE.

  • Transparência

Embora o BCE sustente que este sistema seria transparente e perceptível, o que é facto é que ele aparenta ser excessivamente complicado e de difícil transmissão; por certo, não contribuirá para que o público entenda o modo como a política monetária é elaborada. Para além disso, muitas características importantes do modelo, como o intervalo de tempo entre a rotação dos direitos de voto em cada grupo, são deixadas ao cuidado de ulteriores medidas de implementação do Conselho de Governadores. Embora haja questões de natureza puramente técnica, há outras que possuem uma ressonância política, sendo de todo inaceitável que tais questões sejam totalmente remetidas para a esfera de decisão do próprio Conselho do BCE.

  • Eficiência

É altamente duvidoso que a proposta do BCE permita alcançar um sistema que aumente a eficácia do processo de tomada de decisões. A totalidade dos membros do Conselho de Governadores poderia continuar a participar nas discussões e a apresentar os seus pontos de vista, pelo que a propalada simplificação do processo de tomada de decisões poderia vir a ser muito reduzida, atendendo a que alguns deles não podem participar nas votações. Persiste, pois, o perigo de o BCE não poder reagir com a rapidez necessária.

  • Responsabilidade

A questão da responsabilidade deveria constituir um teste adicional para a avaliação que o Parlamento Europeu faz da proposta. Se as actuais modalidades de revisão da política monetária mediante a realização do Diálogo Monetário trimestral já são, para alguns, insatisfatórias, a nova estrutura de tomada de decisões tornaria ainda mais difícil determinar, a longo prazo, quem é verdadeiramente (co‑)responsável pela adopção de determinadas políticas.

3.   Uma solução alternativa

O modelo de rotação dos grupos recomendado pelo BCE implica óbvias desvantagens. Ele tenta encontrar uma solução duradoura no quadro das limitações existentes, mas viola diversos princípios que o próprio Conselho de Governadores considerou essenciais. Uma solução muito melhor poderia e deveria considerar o desenvolvimento da UEM como uma realização contínua, abrangendo, assim, diversas fases:

3.1    A reforma do Conselho de Governadores através de um sistema de maioria dupla ("double key voting system")

A curto ou, até mesmo, a médio prazo, uma UEM alargada será bastante heterogénea. As diferenças entre os diversos Estados‑Membros no tocante às suas estruturas económicas continuarão a ser enormes. Tanto o conhecimento pormenorizado e a experiência das múltiplas situações existentes a nível nacional, como a capacidade e credibilidade para comunicar a política do BCE aos participantes no mercado e ao público em geral exigirão a participação activa de todos os governadores nacionais de bancos centrais.

Por conseguinte, há que avançar para uma reforma do Conselho de Governadores que, de facto, respeite o princípio "um membro, um voto", embora salvaguardando o fundamento da representatividade através da exigência adicional de uma maioria dupla, baseada na população dos Estados‑Membros.

  • Cada membro do Conselho de Governadores disporia sempre do direito de voto e qualquer decisão exigiria uma maioria simples dos votos expressos;
  • A pedido de um ou mais elementos do Conselho de Governadores, teria de se verificar se os elementos que constituem a maioria simples representam ou não uma parcela significativa da população da zona euro.

A ideia desta abordagem inspira‑se no n.º 4 do artigo 205° do TCE, tal como será aplicado a partir de 1 de Janeiro de 2005 nos termos do Tratado de Nice, em relação à ponderação de votos no Conselho da União Europeia, o qual estipula que uma decisão a nível de Conselho de Ministros poderá exigir uma maioria de 62% da população total.

Este sistema apresenta um vasto leque de vantagens:

  • Respeita o princípio "um membro, um voto". A solução garante a participação constante dos pequenos países nas decisões tomadas.
  • Assegura uma representação adequada das economias da zona euro.
  • De um ponto de vista processual, o facto de a verificação da existência de uma "maioria dupla" só se poder realizar a pedido mantém o funcionamento do sistema tão simples quanto possível.
  • Adequa‑se à nova contextualização do processo de tomada de decisões no período pós‑alargamento para as modalidades de votação em sede de Conselho a partir de 1 de Janeiro de 2005, que são em tudo semelhantes.
  • Todas as mudanças necessárias ficariam abrangidas pela "cláusula de autorização" prevista no artigo 10.º‑6.

3.2    Diferenciação entre categorias de decisões e a delegação das decisões operacionais ao Conselho do BCE

Uma revisão mais profunda dos processos de tomada de decisões do que a que foi aqui delineada poderá eventualmente vir a ser necessária, devido ao aumento do número de membros da UEM, embora essa eventualidade pressuponha uma alteração do Tratado. Pensando, porém, a mais longo prazo, deveríamos tentar encontrar uma solução duradoura e fundada numa abordagem genuinamente europeia, incluindo a delegação das decisões de carácter operacional a um Conselho do BCE, ele próprio redimensionado, logo que tivermos adquirido experiência suficiente numa zona euro alargada e alcançado progressos palpáveis na convergência real das economias.

Uma tal delegação pressupõe uma diferenciação entre decisões de carácter operacional e decisões de índole institucional/estratégica. As decisões operacionais referem‑se, sobretudo, a alterações das taxas de juro e às políticas cambiais, que impõem processos rápidos, bem como um organismo pequeno e eficaz de tomada de decisões. Em conformidade com a experiência de outros bancos centrais, um conselho constituído, talvez, por nove pessoas (em vez dos actuais seis), cada um com determinado pelouro, teria mais possibilidades de tomar decisões rápidas e apropriadas, sempre que necessário.

Por outro lado, uma fórmula mais elaborada e envolvendo um maior número de decisores seria mais consentânea com as decisões do foro institucional e estratégico — de que são exemplo a estratégia global de política monetária e os instrumentos que a consubstanciam. Eis a razão por que tais decisões deveriam, assim, permanecer na esfera de atribuições do Conselho de Governadores.

Tomadas conjuntamente, a introdução da votação por dupla maioria no Conselho de Governadores e a proposta de delegação das decisões operacionais ao Conselho do BCE contribuirá, numa perspectiva de longo prazo, para a emergência de um sistema transparente e eficaz de tomada de decisões, susceptível de se adequar aos futuros Estados‑Membros da UEM.