Relatório - A6-0254/2006Relatório
A6-0254/2006

RELATÓRIO sobre as perspectivas das mulheres no comércio internacional

20.7.2006 - (2006/2009(INI))


Relatora: Hiltrud Breyer

Processo : 2006/2009(INI)
Ciclo de vida em sessão
Ciclo relativo ao documento :  
A6-0254/2006
Textos apresentados :
A6-0254/2006
Textos aprovados :

PROPOSTA DE RESOLUÇÃO DO PARLAMENTO EUROPEU

sobre as perspectivas das mulheres no comércio internacional

(2006/2009(INI))

O Parlamento Europeu,

   Tendo em conta o Regulamento (CE) nº 2836/98 do Conselho, de 22 de Dezembro de 1998, relativo à integração das questões de género na cooperação para o desenvolvimento[1],

–   Tendo em conta a Decisão 2001/51/CE do Conselho, de 20 de Dezembro de 2000, que estabelece um programa de acção comunitária relativo à estratégia comunitária para a igualdade entre homens e mulheres (2001‑2005)[2] e o respectivo programa de trabalho,

–   Tendo em conta a Convenção das Nações Unidas sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres, de 1979, e o seu Protocolo Facultativo,

–   Tendo em conta a Declaração e Plataforma de Acção aprovadas em Pequim, em 15 de Setembro de 1995, pela Quarta Conferência Mundial sobre a Mulher,

–   Tendo em conta a Resolução das Nações Unidas, de Junho de 2000, sobre o seguimento da Plataforma de Acção de Pequim, a Revisão e Avaliação da Plataforma de Acção de Pequim e o documento aprovado na 23ª Sessão Especial da Assembleia Geral, de Março de 2005,

–   Tendo em conta o Livro Verde da Comissão, de 18 de Julho de 2001, intitulado “Promover um quadro europeu para a responsabilidade social das empresas” (COM(2001)0366),

–   Tendo em conta a Comunicação da Comissão, de 22 de Março de 2006, intitulada “Implementação da parceria para o crescimento e o emprego: tornar a Europa um pólo de excelência em termos de responsabilidade social das empresas” (COM(2006)0136),

–   Tendo em conta as normas das Nações Unidas sobre as responsabilidades das empresas transnacionais e outras empresas na esfera dos direitos humanos, aprovadas em 13 de Agosto de 2003, pela Subcomissão das Nações Unidas para a Promoção e Protecção dos Direitos do Homem,

–   Tendo em conta a Declaração de Princípios Tripartida da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre Empresas Multinacionais e Política Social, de Novembro de 1977, e as Orientações para as Empresas Multinacionais da OCDE, de 27 de Junho de 2000,

–   Tendo em conta a Declaração da OIT sobre Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho, de 18 de Junho de 1998, a Recomendação R100 da OIT relativa à protecção dos trabalhadores migrantes em países e territórios insuficientemente desenvolvidos, a Recomendação R111 da OIT relativa à discriminação em matéria de emprego e profissão, a Recomendação R156 da OIT relativa à protecção dos trabalhadores contra os riscos profissionais devidos à poluição do ar, ao ruído e às vibrações no local de trabalho e a Recomendação R191 da OIT relativa à revisão da recomendação relativa à protecção da maternidade,

–   Tendo em conta a Declaração do Milénio das Nações Unidas, de Setembro de 2000, e a sua revisão e actualização na Cimeira Mundial de 2005, de 14‑16 de Setembro,

–   Tendo em conta as conclusões da Presidência do Conselho Europeu de Bruxelas, de 16‑17 de Dezembro de 2004, confirmando o pleno empenho da União Europeia nos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio e na sua coerência política,

–   Tendo em conta a Declaração do “Espírito de São Paulo” da 11ª Assembleia Geral da Conferência sobre o Comércio e o Desenvolvimento, de 18 de Junho de 2004,

–   Tendo em conta a sua resolução de 15 de Novembro de 2005 sobre a dimensão social da globalização[3],

–   Tendo em conta o artigo 45º do seu Regimento,

–   Tendo em conta o relatório da Comissão dos Direitos da Mulher e da Igualdade dos Géneros (A6-0254/2006),

A. Considerando que o comércio internacional tem potencialidades para contribuir para a igualdade dos géneros e para promover o poder económico, social e político das mulheres, tanto no plano produtivo como reprodutivo; considerando, porém, que o processo de globalização do comércio contribuiu para tornar as relações laborais menos formais, para aumentar o trabalho precário e feminizar o desemprego em muitos sectores da economia,

B.  Considerando que 70% dos 1,3 mil milhões de pessoas que vivem na pobreza a nível mundial são mulheres; considerando que, em geral, as mulheres têm mais dificuldade de acesso à educação, à propriedade, ao crédito e a outros recursos e factores de produção, bem como às instâncias de decisão política e são limitadas pelos papéis do género e que estas desigualdades restringem as suas possibilidades de beneficiar das vantagens da liberalização do comércio; considerando que as mulheres em todo o mundo são privadas das oportunidades de que necessitam para melhorar a sua condição económica e social, enquanto simultaneamente as mulheres suportam a responsabilidade acrescida de cuidar dos filhos e da casa;

C. Considerando que as desigualdades entre os géneros, que levam a que as mulheres tenham menos acesso aos meios de produção e ao mercado, constituem um entrave ao crescimento a longo prazo, visto que as mulheres consagram, proporcionalmente, uma grande parte do rendimento que auferem à educação, aos cuidados de saúde e à alimentação e que o potencial económico de toda a população não é inteiramente explorado;

D. Considerando que os acordos de comércio devem respeitar plenamente o direito internacional em matéria de direitos humanos, direitos sociais e laborais e observar as convenções internacionais em vigor a favor do desenvolvimento sustentável,

E.   Considerando que as responsabilidades reprodutivas e domésticas, assim como as responsabilidades associadas à manutenção da família e à prestação de cuidados sociais, são geralmente vistas como a função principal da mulher em quase todas as sociedades mas, de uma maneira geral, não são reconhecidas nem remuneradas,

F.   Considerando que, quando a liberalização do mercado não tem em consideração os factores específicos relativos ao género, tal contribui para acentuar fenómenos como a feminização do emprego precário e a intensificação da exploração da mulher e pôr em causa as estratégias de subsistência das mulheres pobres de todo o mundo, incluindo as mulheres migrantes,

G.  Considerando que a liberalização do comércio contribuiu fortemente para a expansão da participação das mulheres na economia informal,

H.  Considerando que a OIT define a economia informal como sendo baseada no emprego sem contrato, sem benefícios e sem protecção social, exercido dentro ou fora de empresas informais,

I.   Considerado que a feminização da migração internacional não está a ser objecto de atenção suficiente; considerando que os trabalhadores migrantes são muitas vezes impedidos de exigir condições de trabalho justas e protecção aos Estados de acolhimento,

J.   Considerando que a inclusão de um Acordo sobre os Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual relacionados com o Comércio (TRIPS) na OMC, em 1995, limitou de tal modo o acesso aos medicamentos genéricos que, em Dezembro de 2005, foi acordada uma alteração do acordo TRIPS em Hong Kong,

1.  Sublinha que a liberalização do comércio tem impactos diferenciados para mulheres e homens e assinala a necessidade de coerência entre os objectivos da política europeia em matéria de igualdade dos géneros e os objectivos da política de comércio, de desenvolvimento e de ajuda, a fim de promover a igualdade entre mulheres e homens nestes domínios políticos; salienta que a participação económica é essencial para capacitar as mulheres e ultrapassar a sua discriminação estrutural, conduzindo a melhores condições de vida para as mulheres e suas famílias e contribuindo para um envolvimento mais activo das mulheres na política e para o reforço da coesão social, pelo que a partilha equitativa dos bens, a igualdade dos direitos e a independência económica das mulheres constituem um objectivo;

2.   Observa que, embora muitas mulheres também tenham beneficiado com a liberalização do comércio e o investimento directo estrangeiro em resultado das oportunidades de emprego surgidas, a liberalização contribuiu para a informalização das relações laborais, o declínio das condições de trabalho e a feminização do emprego em sectores inteiros da economia;

3.   Insta a Comissão a diligenciar junto das instituições económicas internacionais no sentido de desenvolver um plano de acção para integrar a perspectiva do género nas políticas no domínio do comércio internacional, que inclua mecanismos claros de acompanhamento e avaliação; apela a uma transformação urgente das políticas, regras e programas existentes em instrumentos e ferramentas que promovam a justiça e a igualdade entre os géneros;  

4.  Insta o Conselho e a Comissão a darem prioridade ao levantamento de todas as reservas à Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e à ratificação do seu Protocolo Facultativo por todos os Estados Partes;

5.   Solicita à Comissão que apresente, duas vezes por ano, às comissões do Parlamento Europeu competentes em matéria de direitos da mulher e de comércio internacional um relatório, assinado conjuntamente pelos administradores do organismo dador e do organismo beneficiário da ajuda financeira destinada às mulheres, a fim de comprovar que esta ajuda chega ao seu destino e não é desviada dos objectivos iniciais;

6.  Salienta a necessidade de estudos sobre a forma como as mulheres poderiam tirar proveito da liberalização do comércio, bem como de uma recolha sistemática de dados desagregados por género, que combatam a invisibilidade dos géneros nas actuais políticas comerciais e nas políticas das instituições económicas mundiais; convida a Comissão a apresentar ao Parlamento Europeu um relatório anual sobre os progressos realizados a este respeito; recorda que a análise das questões do género deve ser parte integrante da Avaliação do Impacto na Sustentabilidade (AIS) dos acordos comerciais presentemente realizada pela Comissão;

7.  Solicita à Comissão que efectue uma avaliação do impacto em função do género antes de concluir qualquer acordo comercial com países terceiros e que e que estabeleça cláusulas de condicionalidade efectivas com os países em que os direitos humanos e, em particular, os direitos das mulheres sejam gravemente violados;

8.  Solicita à Comissão a criação formal de um serviço dedicado ao comércio e ao género no seio da sua DG Comércio, que terá como missão verificar se os países com os quais a UE mantêm relações comerciais respeitam os direitos humanos e, em particular, os direitos da mulher, bem como reagir prontamente em caso de violação dos direitos humanos;

9.  Solicita à Comissão que analise, numa perspectiva de género, os métodos de produção e processamento (MPP), tal como são definidos pela OMC, a fim de identificar os MPP em função da discriminação de género, de acordo com a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e os pactos em matéria de direitos humanos, e conceba estratégias para incentivar a observância da legislação internacional nos países exportadores;

10. Insta a Comissão a assegurar que as empresas europeias que beneficiam de programas de acesso ao mercado da UE no quadro da política de cooperação comunitária não contribuam para o fomento de práticas como a exploração desumana dos trabalhadores e, em particular, das mulheres;

11. Sublinha que os benefícios do emprego na economia formal e informal dependem de uma série de factores, que incluem os salários, as condições de trabalho e a segurança do local de trabalho, e que as mulheres continuam a ser discriminadas em relação a esses benefícios; solicita, por isso, à Comissão que, no quadro da sua política de cooperação para o desenvolvimento, crie um fundo especifico no quadro dos futuros acordos de comércio e cooperação com países terceiros para apoiar as mulheres dos países em causa, encorajando o acesso das mesmas ao crédito, à educação e à formação profissional, de modo a reduzir a parte/proporção de trabalho informal; solicita que a Comissão apresente ao Parlamento um relatório, assinado conjuntamente pelos dadores e beneficiários da ajuda, para comprovar que o financiamento específico não é desviado dos seus objectivos iniciais;

12. Insta o Conselho, a Comissão e os Estados Membros a introduzirem rapidamente os princípios da não discriminação e da igualdade entre os géneros nas práticas do Fundo Europeu de Ajustamento à Globalização (FEG) e a assegurarem que as ajudas provenientes deste fundo não substituam as prestações da segurança social;

13. Salienta que o elevado número de postos de trabalho perdidos na Europa confirma a tendência para uma reestruturação industrial crescente; observa que os sectores mais atingidos são a indústria, os transportes, as telecomunicações e os serviços financeiros; insta o Conselho, a Comissão e os Estados-Membros a encararem seriamente a não discriminação e a igualdade entre mulheres e homens no que se refere ao Fundo Europeu de Ajustamento à Globalização;

14. Convida o Conselho, a Comissão e os Estados-Membros a garantirem a integração da igualdade entre os géneros e os objectivos da igualdade de oportunidades em todos os fundos europeus; destaca a necessidade de dispor de indicativos do progresso alcançado na promoção da igualdade entre homens e mulheres e na luta contra todas as formas de discriminação; solicita uma participação equilibrada de homens e mulheres no Comité de Acompanhamento previsto no artigo 35° do Regulamento (CE) n° 1260/1999 que estabelece disposições gerais sobre os Fundos Estruturais;

15. Insta à elaboração de uma classificação anual dos Estados‑Membros na promoção da igualdade dos géneros no mercado do trabalho, assegurando trabalho digno para todos através da observância das normas laborais básicas e de outras convenções da OIT; observa que o emprego e o trabalho digno devem constituir o conteúdo de um nono Objectivo de Desenvolvimento do Milénio, a adoptar o mais rapidamente possível, e insta à inclusão das normas laborais básicas nos acordos de comércio multilaterais e bilaterais e à inclusão do princípio da igualdade entre os géneros em todos os ODM;

16. Assinala que o acesso universal e a preços comportáveis a serviços essenciais, como a água, a educação, a saúde e a energia, é uma condição prévia para a capacitação das mulheres; salienta, no entanto, que a liberalização dos serviços no quadro do Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços (GATS) só pode ter um impacto positivo neste objectivo se os princípios do GATS de flexibilidade nacional e de espaço político forem inteiramente aplicados nas presentes negociações bilaterais e multilaterais;

17. Sublinha que o TRIPS prevê uma revisão dois anos após a sua entrada em vigor, o que ainda não aconteceu, pelo que insta a que se efectue essa revisão, com base numa avaliação do impacto dos custos da sua implementação para os países em desenvolvimento;

18. Insta a Comissão a verificar se a implementação do acordo alcançado na reunião ministerial da OMC em Hong Kong, em Dezembro de 2005, a respeito do licenciamento obrigatório dos medicamentos antivirais para tratamento do VIH/SIDA melhora efectivamente o acesso aos medicamentos e a incluir nesta análise a perspectiva do género;

19. Sublinha que as distorções do comércio relacionadas com o género, associadas à posição da mulher nas sociedades, em especial na sua função de velar pela segurança dos alimentos e da água e a protecção do ambiente, não devem ser vistas como entraves técnicos ao comércio (ETC) nem subordinadas às regras do comércio internacional;

20. Insta ao desenvolvimento de medidas nacionais que promovam a igualdade dos géneros, a protecção e a promoção do emprego, a assistência social e a melhoria das condições de saúde e de trabalho das mulheres e dos homens e que contribuam para o desenvolvimento sustentável; assinala a importância do respeito pela flexibilidade nacional e o espaço político em todas as negociações em matéria de política comercial e de desenvolvimento; insta a que seja garantido o direito dos países em desenvolvimento e das economias vulneráveis de escolherem quais os sectores de serviços a abrir ou a isentar da liberalização do mercado;

21. Solicita à Comissão que, no seu diálogo e na sua cooperação com os países terceiros, dedique atenção muito particular aos entraves jurídicos que se colocam ao acesso das mulheres aos meios de produção, tais como o crédito, os direitos de propriedade e o capital;

22. Salienta que, dado o importante papel das mulheres nas actividades agrícolas familiares, deve ser respeitado e reforçado o direito dos países em desenvolvimento a desenvolverem e aplicarem políticas agrícolas que lhes garantam a soberania alimentar, designadamente nas negociações no âmbito da OMC, tendo especialmente em vista o acordo da OMC relativo à agricultura; destaca a importância do “microcrédito” como instrumento de redução da pobreza; insta a Comissão a apresentar, duas vezes por ano, um relatório, assinado conjuntamente pelas autoridades dadoras e pelos organismos beneficiários dos financiamentos, a fim de comprovar que a ajuda financeira chega ao seu destino;

23. Insta a Comissão e o Conselho a apoiarem os países em desenvolvimento no reforço das suas capacidades de formulação, negociação e aplicação das políticas comerciais, de uma forma apropriada às necessidades de cada país e que promova um desenvolvimento económico sustentável e equilibrado em termos de género; solicita que toda a assistência seja equilibrada em matéria de género;

24. Considera necessário realizar avaliações do impacto no género numa fase precoce do planeamento e orçamentação do auxílio aos países em vias de desenvolvimento; considera que tal permitiria aos decisores políticos avaliar com maior acuidade o impacto de uma dada política nas mulheres e nos homens e comparar e avaliar a situação actual e as tendências em relação aos resultados esperados da política proposta; está convicto de que o relatório anual devia conter uma secção sobre o acompanhamento dado às avaliações do impacto no género;

25. Saúda a decisão do Governo norueguês de impor, por via legal, uma quota de 40% de mulheres nas administrações das sociedades por acções; insta os Estados‑Membros da UE a seguirem o exemplo norueguês;

26. Solicita a elaboração de uma classificação anual dos Estados-Membros em função dos seus esforços para fazer respeitar a igualdade de género no mercado de trabalho e garantir um trabalho digno para todos, em cumprimento das normas laborais fundamentais e outras convenções da OIT;

27. Insta a que todos os programas de “ajuda ao comércio” sejam orientados para promover a igualdade entre os géneros e o desenvolvimento sustentável e financiados através de fundos adicionais; salienta que o financiamento a título da “ajuda ao comércio” deve contribuir para o reforço da capacidade necessária do lado da procura para participar no comércio e não deve ser condicionado a políticas dos Governos beneficiários em matéria de liberalização dos mercados agrícola, industrial ou de serviços;

28. Assinala a importância da integração da dimensão do género no orçamento no quadro da política europeia de comércio, enquanto estratégia em favor da igualdade entre os géneros; insta a Comissão, o Conselho e os Estados‑Membros a implementarem urgentemente a integração da dimensão do género no orçamento como instrumento corrente das políticas orçamentais a todos os níveis;

29. Sublinha que a participação económica é essencial para reforçar a confiança e a capacidade das mulheres e melhorar o seu estatuto na comunidade; sublinha igualmente que o acesso aos recursos confere às mulheres a capacidade de criar rendimento e bens, o que torna possível uma situação propícia a que as mulheres de baixos rendimentos e as mulheres pobres criem empresas, melhorem as condições de vida, mantenham a família bem alimentada e saudável, eduquem as crianças, adquiram o respeito em casa e na comunidade e se envolvam na política; sublinha o vasto potencial dos "microcréditos" enquanto ferramenta inestimável de minoração da pobreza, promoção da auto-suficiência e incentivo da actividade económica nos países mais pobres e desfavorecidos do mundo;

30. Exorta os Estados-Membros a despenderem todos os esforços possíveis para recrutar mulheres para os respectivos ministérios do comércio, a todos os níveis, incluindo o ministerial, a fim de assegurar que a perspectiva do género seja tida em conta nas negociações de comércio mundiais; convida igualmente os Estados Membros a encorajarem as mulheres a apresentar-se como candidatas a posições em organizações internacionais como a OMC, o Banco Mundial, o FMI e a OIT, bem como a apoiarem as mulheres que o façam;

31. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução à Comissão e ao Conselho, aos Governos e Parlamentos nacionais e regionais dos Estados‑Membros e dos países candidatos à adesão e ao Conselho da Europa.

EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS

Introdução

2005 foi um ano importante para o desenvolvimento internacional, para as mulheres e para o comércio. Entre os acontecimentos principais contam‑se a revisão quinquenal dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio, a Conferência Pequim +10, a revisão da declaração da UE em matéria de política de desenvolvimento, a 6ª reunião ministerial da OMC em Hong Kong e o prosseguimento das negociações do acordo de parceria económica entre a UE e os países ACP. As relações entre género e comércio (em ambos os sentidos: do género para o comércio e do comércio para o género) constituem uma questão nova, não só para as mulheres mas também para os governos e para os decisores das políticas comerciais.

Pouco se sabe do impacto do comércio ou do impacto da globalização económica nas mulheres. Isto deve‑se, em parte, à falta de dados diferenciados por género nas estatísticas do comércio e, por outro lado, à falta de sensibilidade para as questões do género das análises e modelos económicos. Na relação entre o género e o comércio, não é só o impacto do comércio que afecta de maneira diferente mulheres e homens. Parece haver igualmente uma relação no sentido inverso: o efeito da desigualdade dos géneros no comércio.

Dois exemplos da complexa relação entre género e comércio[1]:

No sul da Ásia, por exemplo, o sucesso das exportações industriais depende, em grande parte, da discriminação salarial das mulheres. É “graças” aos baixos salários pagos às mulheres (cerca de 85% dos salários dos homens) que países como a Coreia, Taiwan e Singapura conseguem exportar produtos a preços baixos. Literalmente, isto faz da discriminação o motor do crescimento económico do sul da Ásia.

Na África subsariana, a desigualdade entre os géneros também afecta o comércio, mas de maneira diferente. Na África subsariana há uma vincada divisão do trabalho na agricultura. As mulheres cultivam os alimentos para a família e os homens ocupam‑se das culturas comerciais, para ganharem dinheiro. Para surpresa do Banco Mundial, as exportações agrícolas continuam a ser escassas em África, apesar dos muitos programas de ajustamento estrutural. Demorou anos até que o Banco Mundial compreendesse que a divisão dos géneros no trabalho constitui o factor limitativo do crescimento das exportações africanas.

As mulheres agricultoras recusam‑se a trabalhar nas culturas comerciais dos maridos, porque nada recebem em troca, enquanto que a sua produção alimentar é afectada pela invasão das suas parcelas de terra pelas culturas comerciais. Assim, no caso das exportações agrícolas da África subsariana, a desigualdade dos géneros reduz o sucesso do comércio. Com maior igualdade entre os géneros, as exportações seriam maiores, além de mais benéficas para as mulheres[2].

O relatório sobre as perspectivas da mulher no comércio internacional deverá analisar tanto os efeitos negativos como os positivos do comércio e da globalização económica e ter em conta a complexidade das questões e factores envolvidos.

As mulheres são por vezes vistas como beneficiárias do comércio global, porque são cada vez mais as mulheres que encontram emprego. De facto, nos países em desenvolvimento, a liberalização do comércio criou novas oportunidades, especialmente para as mulheres mais jovens e educadas, com qualificações profissionais, permitindo‑lhes aceder a empregos mais bem pagos e a oportunidades anteriormente inacessíveis às mulheres.

Mulheres, comércio e relações laborais

A expansão do comércio facilitou e acelerou a absorção das mulheres pela economia industrial moderna. Isto teve efeitos muito positivos para a igualdade entre os géneros: mesmo quando as condições de trabalho são menos favoráveis do que as dos homens em profissões similares, as mulheres têm acesso a um salário, com a repercussão positiva na sua autonomia que um rendimento estável confere.

O impacto da expansão do comércio na actividade económica das mulheres traz grandes benefícios humanos e no plano do desenvolvimento. Dá à mulher um maior controlo sobre o rendimento, embora nem sempre um total controlo individual. As mulheres tendem a ter despesas mais orientadas para a família do que os homens, pelo que uma melhoria da capacidade das mulheres para obter rendimentos conduz a um maior investimento no capital humano dos filhos, nas suas possibilidades de educação e nas suas condições de vida.

Nos países onde os mercados estão abertos a retalhistas estrangeiros, grandes cadeias alimentares e supermercados, está a verificar‑se uma espécie de esvaziamento económico dos lugares de venda nos mercados municipais. As vendedeiras de rua, que durante muitos anos lutaram pelo seu espaço nos mercados locais, estão a ser postas de parte e desalojadas para que os clientes tenham livre acesso às grandes lojas e centros comerciais dedicados às marcas.

Não se trata de negar que muitas mulheres altamente qualificadas beneficiam da liberalização do comércio. No entanto, ao mesmo tempo, milhões de trabalhadoras, pequenas agricultoras e vendedeiras estão a perder o acesso aos recursos produtivos, a perder espaço em termos de comércio, porque os trabalhadores pobres, especialmente as mulheres, não beneficiam da liberalização do comércio. Pelo contrário, os direitos sociais e económicos das mulheres proclamados na Plataforma de Acção de Pequim são ignorados ou mesmo definidos como entraves ao comércio sujeitos à desregulamentação.

Nas últimas duas décadas, um dos efeitos da globalização económica tem sido a crescente informalização do trabalho. A OIT define a economia informal como “emprego informal sem contrato, sem benefícios nem protecção social para o trabalhador, dentro e fora de empresas informais”[3]. A OIT (1999) distingue três tipos de emprego na economia informal. São os proprietários ou patrões de micro‑empresas, os trabalhadores por conta própria, incluindo vendedores ambulantes e pequenos agricultores, e, por último, os empregados a tempo inteiro ou esporadicamente.

Uma característica definidora da economia informal é a de os trabalhadores receberem salários mais baixos, correrem maiores riscos financeiros e apresentarem piores índices de desenvolvimento humano e níveis mais elevados de exclusão social do que os que trabalham na economia formal[4]. Como já anteriormente foi referido, a pressão que se exerce sobre as empresas que concorrem numa economia crescentemente globalizada tem levado a uma tendência descendente dos salários e dos custos de funcionamento. O trabalho é mais barato na economia informal, onde está livre de impostos e da regulação do Estado. A globalização é um dos muitos factores que explicam o crescimento da informalização. Outros factores são a privatização, os processos de ajustamento estrutural, o declínio da protecção social e mudanças culturais e sociais.

As mulheres e o comércio de serviços (GATS)

O sector dos serviços já foi, em tempos, considerado como um sector não comercializável. No entanto, o Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços (GATS), da OMC, definiu regras globais para o comércio e o investimento em serviços. Uma justificação para a inclusão dos serviços nas negociações da OMC é o crescimento dos serviços como sector económico nas últimas duas décadas e a sua importância no desenvolvimento dos países (por exemplo, serviços de comunicação, viagens e turismo, transportes, construção e distribuição).[5]

Mulheres, comércio e direitos de propriedade intelectual

O acordo TRIPS, em vigor desde 1996, constitui um quadro geral para uma abordagem multilateral à propriedade intelectual. O TRIPS implica que a utilização de plantas, microorganismos, técnicas biotecnológicas, alimentos e drogas essenciais pode ser limitada pela protecção de patentes. Isto tem graves implicações para os pobres e, em especial, para as mulheres, tendo em conta que 70% dos 1,3 mil milhões de pobres do mundo são mulheres.

As questões fundamentais do debate sobre os direitos de propriedade intelectual são múltiplas[6]. Um desafio essencial é o do acesso a medicamentos a preços comportáveis – para o VIH/SIDA, as doenças infecciosas e a saúde reprodutiva. O segundo desafio que o TRIPS coloca às mulheres é o do acesso a sementes para a produção de alimentos, a segurança alimentar e a nutrição adequada. O terceiro desafio é o do acesso à terra e o seu controlo, a utilização de recurso naturais e o acesso a tecnologias e fertilizantes para melhorar a produtividade cronicamente baixa das mulheres agricultoras.

Comércio internacional e desenvolvimento de capacidades nacionais

É chegado o momento de uma mudança de paradigma nas políticas comerciais da UE. Os acordos comerciais têm de estar vinculados aos acordos internacionais existentes em matéria de direitos humanos e de direitos das mulheres, de sustentabilidade ecológica, do direito ao desenvolvimento e da erradicação da pobreza.

Avaliação do impacto nos géneros

A avaliação do impacto nos géneros é relevante para a maior parte das políticas porque, directa ou indirectamente, estas têm impacto nas vidas das mulheres e dos homens. Nos últimos anos, o desenvolvimento e utilização de indicadores qualitativos e quantitativos têm vindo a ser cada vez mais importantes para a compreensão das tendências na situação da mulher e na relação entre os géneros.

A avaliação do impacto nos géneros conduz a políticas mais eficazes, levando os responsáveis a pensar nos diferentes efeitos que as políticas têm nas mulheres e nos homens. Permite que os decisores tenham uma melhor noção do efeito de uma determinada política e que comparem e avaliem a situação inicial com a que esperam resultar da política proposta.

A avaliação do impacto nos géneros pode ser aplicada à legislação, aos programas e planos políticos, aos orçamentos, aos relatórios e às políticas existentes. No entanto, a avaliação será mais bem sucedida se for efectuada numa fase precoce do processo decisório, de modo a que as políticas possam ser alteradas ou mesmo redireccionadas.[7]

  • [1]  WIDE, Network Women in Development, Infosheeet, Fevereiro de 2002.
  • [2]  WIDE, id.
  • [3]  Women and Men in the Informal Economy: A Statistical Picture (Mulheres e Homens na Economia Informal: Um Quadro Estatístico), OIT, 2002.
  • [4]  SOLIDAR, Decent Work, Decent Life, (Trabalho digno, vida digna) p. 11.
  • [5]  Lóbi Europeu das Mulheres: Does trade in services also concern women? (O comércio de serviços também diz respeito às mulheres?), 6/6/2001.
  • [6]  OIT, Gender Implications of TRIPS (Implicações do TRIPS na dimensão do género), Julho de 2003.
  • [7]  Comissão Europeia, Unidade Igualdade das Mulheres, Avaliação do impacto nos géneros.

PROCESSO

Título

Perspectivas das mulheres no comércio internacional

Número de processo

2006/2009(INI)

Comissão competente quanto ao fundo
  Data de comunicação em sessão da autorização

FEMM
19.1.2006

Comissões encarregadas de emitir parecer
  Data de comunicação em sessão

 

 

 

 

 

Comissões que não emitiram parecer
  Data da decisão

 

 

 

 

 

Cooperação reforçada
  Data de comunicação em sessão

 

 

 

 

 

Relator(es)
  Data de designação

Hiltrud Breyer
24.1.2006

 

Relator(es) substituído(s)

 

 

Exame em comissão

24.4.2006

2.5.2006

22.6.2006

 

 

Data de aprovação

22.6.2006

Resultado da votação final

+

-

0

21

0

1

Deputados presentes no momento da votação final

Edit Bauer, Hiltrud Breyer, Maria Carlshamre, Edite Estrela, Věra Flasarová, Nicole Fontaine, Zita Gurmai, Esther Herranz García, Rodi Kratsa-Tsagaropoulou, Urszula Krupa, Angelika Niebler, Marie Panayotopoulos-Cassiotou, Christa Prets, Teresa Riera Madurell, Raül Romeva i Rueda, Amalia Sartori, Britta Thomsen, Corien Wortmann-Kool e Anna Záborská

Suplente(s) presente(s) no momento da votação final

Lidia Joanna Geringer de Oedenberg e Kartika Tamara Liotard

Suplente(s) (nº 2 do art. 178º) presente(s) no momento da votação final

Guido Sacconi

Data de entrega

20.7.2006

Observações (dados disponíveis numa única língua)