Relatório - A6-0438/2006Relatório
A6-0438/2006

RELATÓRIO Uma Estratégia Temática de Reciclagem de Resíduos

19.12.2006 - (2006/2175 (INI))

Comissão do Ambiente, da Saúde Pública e da Segurança Alimentar
Relator: Johannes Blokland

Processo : 2006/2175(INI)
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A6-0438/2006
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A6-0438/2006
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PROPOSTA DE RESOLUÇÃO DO PARLAMENTO EUROPEU

sobre uma Estratégia Temática de Reciclagem de Resíduos

(2006/2175 (INI))

O Parlamento Europeu,

–   Tendo em conta a comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social e ao Comité das Regiões, intitulada "Avançar para uma utilização sustentável dos recursos: Estratégia Temática de Prevenção e Reciclagem de Resíduos" (COM(2005)0666),

–   Tendo em conta os artigos 2º e 6º do Tratado CE, por força dos quais as exigências em matéria de protecção do ambiente devem ser integradas nos diversos sectores da política comunitária, com o objectivo de promover um desenvolvimento ambientalmente sustentável das actividades económicas,

–   Tendo em conta o artigo 175º do Tratado CE,

–   Tendo em conta a Decisão nº 1600/2002/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de Julho de 2002, que estabelece o sexto programa comunitário de acção em matéria de ambiente (6º PAA)[1] e, designadamente, o seu artigo 8º,

–   Tendo em conta a comunicação da Comissão intitulada "Estratégia Temática sobre a Utilização Sustentável dos Recursos Naturais" (COM(2005)0670),

–   Tendo em conta a sua Resolução de 20 de Abril de 2004 sobre a comunicação da Comissão intitulada "Para uma estratégia temática sobre a prevenção e a reciclagem de resíduos",

–   Tendo em conta a sua Resolução de 19 de Novembro de 2003 sobre o relatório respeitante à aplicação da Directiva do Conselho nº 75/442/CEE (directiva‑quadro relativa aos resíduos),

–   Tendo em conta a sua Resolução de 14 de Novembro de 1996 sobre a comunicação da Comissão relativa à análise da Estratégia Comunitária para a Gestão dos Resíduos e o projecto de resolução do Conselho relativa à política em matéria de resíduos e tendo em conta a Resolução do Conselho de 24 de Fevereiro de 1997 sobre uma estratégia comunitária de gestão de resíduos,

–   Tendo em conta os acórdãos do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, em particular os acórdãos nos processos C‑203/96, C‑365/97, C‑209/98, C‑418/99, C‑419/99, C‑9/00, C‑228/00 e C‑458/00, C‑416/02 e C‑121/03,

–   Tendo em conta o artigo 45º do seu Regimento,

–   Tendo em conta o relatório da Comissão do Ambiente, da Saúde Pública e da Segurança Alimentar (A6‑0438/2006),

1. Introdução

A. Considerando que o artigo 8º do 6º PAA define objectivos, metas e princípios muito claros no domínio da política de resíduos da UE;

B.  Considerando que o nº2 do artigo 8º do PAA, no seu ponto iv), prevê a elaboração ou revisão das directivas sobre os resíduos de construção e demolição, as lamas de depuração e os resíduos biodegradáveis;

2. Situação actual

C.  Considerando que, não obstante a consecução de alguns êxitos pela política de resíduos da UE nos últimos 30 anos, continuam a verificar‑se os seguintes problemas:

1. O volume de resíduos continua a aumentar, tanto de resíduos perigosos como não perigosos;

     2. O potencial de prevenção e reciclagem de resíduos não é plenamente aproveitado;

     3. As transferências (transfronteiriças) ilegais de resíduos continuam a aumentar;

     4.  O tratamento dos resíduos ocasiona emissões para a atmosfera, a água e o solo;

5. Falta legislação aplicável a certos fluxos de resíduos importantes;

6. A legislação sobre resíduos é, em muitos casos, aplicada de modo deficiente;

7. Há significativas diferenças entre as abordagens dos diversos Estados‑Membros na resolução dos problemas dos resíduos;

8.  A actual redacção da lei comunitária sobre resíduos dá origem a problemas de interpretação;

D. Considerando que as economias são como os ecossistemas; que ambos se alimentam à base de energia e de materiais e os transformam em produtos e processos, com a diferença de que a nossa economia utiliza fluxos de recursos lineares, ao passo que a natureza é cíclica; que os ecossistemas, recorrendo à energia solar, realizam funções que transformam resíduos em recursos, algo que os processos industriais são incapazes de realizar; que, com economias e populações em rápido crescimento, a produção e os produtos que dão lugar a fluxos de resíduos que a natureza não pode absorver nem transformar em novos recursos são cada vez mais problemáticos do ponto de vista da sustentabilidade,

E.  Considerando que é necessário a transformação urgente do actual sistema de produção e de consumo; que o seu principal objectivo deve consistir em imprimir ao consumo uma direcção sustentável e em fazer com que os processos de extracção de matérias-primas, de produção e de concepção de produtos sejam o mais possível compatíveis com processos naturais e com a respectiva concepção,

F.  Considerando que uma melhor compreensão do modo como funcionam os sistemas naturais e da estruturação da actividade empresarial segundo critérios biológicos pode melhorar o ambiente assim como estabelecer uma referência mínima,

G. Considerando que a evolução para práticas mais integradas e baseadas em sistemas, como por exemplo a produção agregada, o pensamento funcional (conversão de produtos em serviços), a desmaterialização e o desenvolvimento de tecnologia com base na imitação da natureza, constitui um meio para evitar a produção de resíduos;

3. Objectivos de uma política comunitária de resíduos em evolução

H. Considerando que, na maioria dos Estados‑Membros, a eliminação, designadamente em aterros, continua a ser a forma de tratamento de resíduos mais comum;

I.   Considerando que a prevenção, a reutilização, a reciclagem e a valorização energética dos resíduos – por ordem da respectiva relevância – podem permitir poupar recursos naturais;

J.   Considerando que os objectivos comunitários e nacionais no domínio da prevenção nunca foram alcançados, embora a prevenção continue a ser o objectivo mais importante;

K. Considerando que não existem normas comunitárias mínimas adequadas, aplicáveis a muitas instalações de recuperação e de reciclagem, o que resulta em diferentes níveis de protecção do ambiente nos Estados‑Membros, dumping ambiental e distorções da concorrência;

1.   Reconhece a comunicação da Comissão intitulada "Avançar para uma utilização sustentável dos recursos: Estratégia Temática de Prevenção e Reciclagem de Resíduos" como base para a discussão sobre a futura política de resíduos;

2.   Destaca o objectivo primacial da gestão de resíduos, que é assegurar um elevado nível de protecção do ambiente e da saúde humana, mais do que facilitar o funcionamento do mercado interno de recuperação de resíduos;

3.  Sublinha que não se deve ter apenas em conta o impacto ambiental no interior da UE, mas também o impacto ocasionado fora do território da UE;

4.   Sublinha a importância dos princípios gerais da gestão de resíduos, tais como os princípios de precaução e do poluidor‑pagador, da responsabilidade do fabricante do produto gerador do resíduo e, no caso de fluxos de resíduos específicos, da responsabilidade individual do produtor, bem como dos princípios da proximidade e da auto‑suficiência;

4. Principais acções

5.   Salienta que a plena implementação da legislação comunitária relativa aos resíduos em vigor e a sua aplicação homogénea em todos os Estados‑Membros constituem uma prioridade fundamental;

6.   Lamenta que, não obstante a apresentação de uma proposta de revisão da Directiva‑Quadro "Resíduos", se verifique a falta de muitas medidas concretas e instrumentos de execução (que se encontram previstos no 6º PAA);

4.1 Simplificação e modernização da legislação em vigor

7.   Frisa que só deve recorrer‑se à alteração de definições por motivos de clarificação, e não para enfraquecer as normas de protecção ambiental ou para promover a aceitação pública de um conceito (por exemplo, atenuando as conotações negativas dos termos "resíduo" ou "eliminação");

8.   Frisa que decisões políticas, como a definição dos conceitos de resíduo, recuperação e eliminação, não devem ser tomadas no quadro da comitologia, mas sim no da co‑decisão;

9.   Salienta que o recurso ao procedimento de comitologia deve restringir‑se à tomada de decisões de carácter não político, mormente das que se revestem de natureza técnica e científica;

10. Opõe‑se a uma desclassificação geral dos resíduos susceptível de levar a um tratamento ambiental desapropriado e a uma situação de não rastreabilidade dos fluxos de resíduos. Realça que eventuais procedimentos de desclassificação de resíduos só são de considerar em casos excepcionais de fluxos homogéneos de resíduos, como o composto, os agregados de materiais reciclados, o papel recuperado e o vidro recuperado;

11. Salienta que a desclassificação como resíduo só deve ser concedida depois de o fluxo de resíduos em causa ter completado um processo de reutilização, reciclagem ou valorização - o que não exclui a possibilidade de um processo de valorização originar novos resíduos - e satisfazer as normas europeias estabelecidas, tornando‑se apto para um fim determinado, e isso após a adopção e aplicação de normas de rastreabilidade;

12. Exige que todos os resíduos destinados a recuperação energética ou a incineração mantenham a classificação de resíduos, a que deve ser aplicável a Directiva 2000/76/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de Dezembro de 2000, relativa à incineração de resíduos[2];

13. Salienta que as listas de recuperação e eliminação constantes dos anexos da Directiva‑Quadro "Resíduos" devem ser revistas e adaptadas às actuais práticas de gestão de resíduos, de acordo com o procedimento de co‑decisão;

14. Exprime fortes reservas em relação ao método de cálculo da eficiência energética proposto e ao facto de se restringir a sua aplicação exclusivamente às incineradoras de resíduos urbanos. Exorta a Comissão a rever a Directiva "Incineração", tendo em vista estabelecer normas ambientais iguais (em matéria de emissões e de eficiência energética) para a incineração e a co‑incineração de resíduos;

4.2 Introduzir o conceito de ciclo de vida na política de resíduos

15. Salienta a importância fulcral da hierarquia de resíduos, que estabelece as seguintes prioridades de acção, por ordem decrescente:

-   prevenção;

-   reutilização;

-   reciclagem de materiais;

-   outras operações de recuperação, por exemplo recuperação energética;

-   eliminação,

enquanto norma basilar em sede de gestão de resíduos, para a consecução do objectivo de reduzir a geração de resíduos, bem como dos efeitos nocivos para a saúde e o ambiente resultantes da geração e gestão de resíduos;

16. Considera o conceito de ciclo de vida um conceito útil para efeitos de avaliação dos impactos dos resíduos sobre o ambiente e a saúde humana; frisa que a hierarquia se baseia, ela própria, neste conceito, mas reconhece que a análise do ciclo de vida e outras podem, em casos excepcionais, ser utilizadas para promover derrogações à hierarquia de resíduos, embora apenas quando haja provas manifestas de que outra opção seja melhor por razões ligadas ao ambiente ou à saúde ou se essa opção implicar custos excessivamente elevados;

4.3 Melhorar a base de conhecimentos

17. Apoia a melhoria da base de conhecimentos referente à política de resíduos da UE, mas frisa que a execução de acções concretas é mais importante;

4.4 Prevenção de resíduos

18. Lastima a ausência de metas de redução quantitativa e qualitativa de todos os tipos de resíduos relevantes, apontadas como uma das acções prioritárias no 6º PAA; solicita à Comissão Europeia que, na avaliação final do 6° PAA, apresente uma proposta de objectivos;

19. Exorta a Comissão a avançar com medidas concretas de prevenção de resíduos nos campos da política de produtos, da política no domínio dos químicos e da concepção ecológica, para minimizar tanto a geração de resíduos como a presença de substâncias perigosas nos resíduos e, dessa forma, fomentar o tratamento seguro e ambientalmente correcto dos resíduos; realça a importância de promover produtos e tecnologias menos prejudiciais para o ambiente, bem como de produtos mais adequados para fins de reutilização e de reciclagem;

20. Sublinha a interacção entre as estratégias relativas aos resíduos e outras estratégias temáticas, designadamente a utilização sustentável dos recursos naturais, o desenvolvimento sustentável e a política integrada relativa aos produtos;

21. Exorta a Comissão a desenvolver um conjunto de indicadores até 2008, conforme o anunciado na Estratégia relativa aos recursos;

22. Realça que uma adequada implementação do princípio da responsabilidade do produtor constitui um poderoso instrumento de prevenção de resíduos;

23. Sublinha o papel das campanhas de informação no sector da política relativa aos resíduos, em particular no que diz respeito à prevenção, na perspectiva da sensibilização da população para as vantagens de uma gestão sustentável dos resíduos;

24. Exorta a Comissão a reforçar a vertente de prevenção de resíduos dos documentos de referência das melhores técnicas disponíveis (BREF), elaborados ao abrigo da Directiva nº96/61/CE do Conselho, de 24 de Setembro de 1996, relativa à prevenção e controlo integrados da poluição[3] (Directiva IPPC), e a incorporar nos referidos documentos as directrizes que se revelem pertinentes;

4.5 Reutilização

25. Exorta a Comissão a apresentar medidas concretas para promover as actividades de reutilização e reparação:

      - submeter os centros de reutilização a acreditação;

      - aplicar uma taxa de IVA reduzida aos produtos vendidos pelos centros de reutilização acreditados;

      - desenvolver um roteiro que elabore padrões de reutilização ao nível da UE;

      - assegurar o acompanhamento e a notificação das actividades de reutilização;

4.6 Para uma sociedade europeia da reciclagem

26. Sublinha a importância da adopção de normas mínimas comuns no domínio da recuperação e da reciclagem a nível da UE e frisa que, para que se criem condições equitativas de concorrência, é imprescindível promover uma aproximação na área da utilização dos instrumentos económicos em toda a UE;

27. Realça a importância da separação dos resíduos na fonte, assim como do estabelecimento de metas de reciclagem e da responsabilidade do produtor, para aumentar a taxa de reciclagem de determinados fluxos de resíduos;

28. Reconhece a necessidade de melhorar a cooperação ao nível da UE na administração dos problemas relativos à gestão dos resíduos a nível transfronteiriço;

29. Sublinha que uma abordagem baseada em materiais para promover a reciclagem deve ser complementar a uma abordagem baseada nos fluxos de resíduos; solicita à Comissão Europeia que continue a estudar a viabilidade prática e económica de tal estratégia;

30. Exorta uma vez mais a Comissão a propor directivas específicas para os resíduos biodegradáveis, os resíduos da construção e demolição, e as lamas de depuração, de acordo com o previsto no 6º PAA;

31. Exorta a Comissão a dar seguimento ao seu Livro Verde sobre PVC e a propor uma directiva distinta sobre PVC, atendendo aos inúmeros problemas ambientais e de saúde durante todo o seu ciclo de vida, nomeadamente quando se convertem em resíduos;

32. Apela a que o volume de resíduos destinados a eliminação seja reduzido ao mínimo; exorta de novo a Comissão a rever a Directiva "Aterros" e a nela incluir um plano que preveja as seguintes fases:

–       a partir de 2010, interdição da deposição em aterro de resíduos sem pré‑tratamento e com elementos biodegradáveis;

–       a partir de 2015, interdição da deposição em aterro de resíduos de papel, cartão, vidro, têxteis, madeira, matérias plásticas, metais, borracha, cortiça, cerâmica, betão, tijolo e ladrilho;

–       a partir de 2020, interdição da deposição em aterro de todos os resíduos recicláveis;

–       a partir de 2025, interdição da deposição em aterro de quaisquer lixos residuais, a menos que sejam inevitáveis ou perigosos (por exemplo, cinzas de filtragem);

33. Considera que o Regulamento (CE) n° 1013/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de Junho de 2006, relativo a transferências de resíduos[4] dá cumprimento às obrigações jurídicas decorrentes da Convenção de Basileia da ONU e às decisões da OCDE; apoia a prevenção do dumping ambiental e da valorização fictícia e sublinha que um dos objectivos da regulação das transferências de resíduos é fomentar a sua reutilização e reciclagem, garantindo um nível elevado de protecção ambiental e da saúde humana;

34. Realça o direito dos Estados‑Membros aplicarem os princípios da proximidade e da auto‑suficiência no que respeita à recuperação ou eliminação de resíduos municipais não triados, com vista a encorajar a planificação à escala nacional da gestão de resíduos e da capacidade de incineração de resíduos;

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35. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho e à Comissão, bem como aos governos e parlamentos dos Estados‑Membros.

  • [1]  JO L 242, 10.9.2002, p. 1.
    2 JO C 104 E, 30.4.2004, p. 401.
    3 JO C 87E, 7.4.2004, p. 400.
    4 JO C 362, 2.12.1996, p. 241.
    5 JO C 76, 11.3.1997, p. 1.
  • [2]  JO L 332, 28.12.2000, p. 91.
  • [3]  JO L 257, 10.10.1996, p. 26.
  • [4]  JO L 190, 12.7.2006, p.1.

EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS

1. Introdução

Em Dezembro de 2005 a Comissão submeteu ao Conselho e ao Parlamento Europeu uma proposta de Estratégia temática de prevenção e reciclagem de resíduos, conjuntamente com um projecto de revisão da Directiva‑Quadro "Resíduos".

A estratégia decorre do Sexto Programa de Acção em matéria de Ambiente (Julho de 2002) e vem na sequência das conclusões do Conselho e do Parlamento de Abril de 2004, em resposta a uma comunicação da Comissão. O objectivo da estratégia é contribuir para a consecução de uma utilização eficiente e sustentável dos recursos naturais, tendo em vista reduzir o impacto negativo dos resíduos no ambiente. Essa é uma das razões que explicam a publicação em simultâneo da estratégia relativa à utilização sustentável dos recursos naturais.

Há mais de 30 anos que a União Europeia vem prosseguindo uma política de resíduos. A política em causa surgiu para dar resposta ao facto de os problemas de resíduos se estarem a tornar cada vez mais manifestos e à circunstância de a sua descarga descontrolada, com todos os efeitos nocivos inerentes, estar a pôr em risco o ambiente e a saúde pública. Foi esse o motivo fundamental que levou ao desenvolvimento de uma política de resíduos. Esta teve sempre como principal objectivo a protecção do ambiente. É muito importante ter esta preocupação, a protecção do ambiente, sempre bem presente.

2. Situação actual

Nos últimos 30 anos percorreu‑se um longo caminho. Muitas substâncias nocivas foram eliminadas da composição de produtos e, assim, já não integram os fluxos de resíduos. Desenvolveram‑se métodos de tratamento de resíduos menos prejudiciais para o ambiente. Importa, contudo, notar que há grandes discrepâncias entre os Estados‑Membros no que respeita ao volume de resíduos que são reutilizados ou reciclados. A nível comunitário, foi adoptada legislação sobre a exportação, deposição em aterros e incineração de resíduos. Para além disso, introduziu‑se legislação relativa a fluxos de resíduos específicos, casos dos resíduos de pilhas e acumuladores, embalagens, veículos em fim de vida e equipamento eléctrico e electrónico. Não se tem revelado tarefa fácil adoptar, executar, fiscalizar e fazer cumprir legislação que abrange tantos fluxos de resíduos e métodos de tratamento diferentes, aplicável em 25 Estados‑Membros.

Embora se tenha feito um longo caminho no que se refere à adopção e aplicação de legislação, registam‑se os seguintes problemas e deficiências, em particular:

· O volume de resíduos continua a aumentar.

· Continua a depor‑se em aterros um volume excessivo de resíduos.

· A expressão da reutilização e reciclagem de resíduos mantém‑se demasiado reduzida.

· As discrepâncias entre os Estados‑Membros em matéria de progressos na (aplicação da) política de resíduos permanecem demasiado numerosas e marcadas.

· Parcialmente em consequência disso, o transporte ilegal e indesejável de resíduos continua a ser uma ocorrência frequente.

· A interpretação e a aplicação da política de resíduos continuam a ser uma fonte de permanente controvérsia, incluindo no que toca aos conceitos legais utilizados.

· A legislação europeia vem sendo aplicada e executada de forma inadequada.

À luz dos problemas expostos, o relator saúda o facto de a Comissão ter finalmente apresentado uma proposta de estratégia. Lamentavelmente, porém, a proposta não ataca os problemas supramencionados senão numa medida muito limitada. No domínio da prevenção e da reciclagem, poucas medidas concretas são avançadas. As únicas propostas concretas apresentadas prendem‑se com a revisão da directiva‑quadro.

3. Objectivos de uma política comunitária de resíduos em evolução

O principal objectivo da política de resíduos da UE é a protecção do ambiente, e não facilitar a criação de um mercado interno de resíduos. Naturalmente, é importante erradicar as situações de desigualdade de concorrência no mercado de resíduos. Isso significa que é necessário um enquadramento jurídico uniforme em matéria ambiental, válido e obrigatório para todos os Estados‑Membros. Apesar de um historial de 30 anos de legislação europeia em matéria de resíduos, lamentavelmente, continuamos muito longe de dispor de um quadro uniforme aplicável em toda a União. No tocante a uma série de fluxos de resíduos específicos, não existe ainda qualquer legislação. Acresce que a legislação vigente não é transposta e aplicada (do mesmo modo) em todos os Estados‑Membros. Por conseguinte, é fundamental investir no aperfeiçoamento do modo como se transpõe, aplica e faz cumprir a actual legislação europeia de resíduos.

É igualmente de frisar que os princípios de precaução, do 'poluidor‑pagador', da responsabilidade do produtor e da proximidade e auto‑suficiência têm de continuar a ser cabalmente aplicados futuramente na política de resíduos comunitária. Sobretudo no campo dos fluxos de resíduos específicos, o princípio da responsabilidade individual do produtor pode trazer resultados positivos, como, por exemplo, nos casos dos resíduos de embalagens, pilhas, veículos em fim de vida e equipamento eléctrico e electrónico.

4. Medidas‑chave

A Comissão propôs um "pacote" de medidas, que se podem agrupar segundo as quatro grandes áreas a que respeitam. Seguidamente, passamos à explanação e comentário dessas medidas.

4.1 Simplificação e modernização da legislação em vigor

A Comissão propõe que se clarifique uma série de definições que são aplicadas ou interpretadas de diferentes modos. Trata‑se dos conceitos de resíduos, eliminação, recuperação e reciclagem. Na prática, tornou‑se evidente que se verificavam vários equívocos e alguma incerteza em torno dos conceitos legais utilizados na política de resíduos da UE. Isto é devido, principalmente, à elevada complexidade do universo que a mesma visa regular, que abarca todo o tipo de fluxos e de formas de tratamento de resíduos. Além disso, a indústria dos resíduos tem insistido com frequência em testar os limites da legislação europeia de resíduos nos tribunais. Isto ocasionou uma série de acórdãos interpretativos ou de aclaração da legislação, exarados pelo Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias. Teoricamente, o Tribunal de Justiça limita‑se a julgar as causas à luz da legislação em vigor. No entanto, e dado que a legislação em vigor é manifestamente ambígua em alguns pontos, e enferma de deficiências, o Tribunal tem vindo, em grande medida, a meter foice em seara do legislador.

Ao legislador (Parlamento Europeu e Conselho) cumpre agora suprir as deficiências e a falta de clareza da legislação. É muito importante, porém, empreender essa tarefa de forma bem reflectida. A alteração de definições é susceptível de dar lugar de novo a um longo período de incerteza e a outros problemas de interpretação. Como tal, é preferível perfilhar as actuais definições, clarificando‑as e completando‑as, apenas quando necessário. No seu conjunto, elas visam assegurar um enquadramento claro da legislação europeia de resíduos. O objectivo da alteração de definições não é, em absoluto, resolver problemas de imagem ou contornar determinados preceitos dirigidos à protecção do ambiente consignados na legislação de resíduos. O intento de reclassificar determinados fluxos de resíduos como produtos, pondo‑os ao abrigo do rótulo "resíduo", com a correspondente carga negativa, não constitui fundamento legítimo para alterar a definição do conceito legal de resíduo. E o mesmo é válido para a alteração da definição do conceito de recuperação que vise apenas retirar a conotação negativa associada à noção de eliminação. O não cumprimento de metas de reutilização, reciclagem e recuperação de fluxos de resíduos estabelecidas noutras directivas não é, tão‑pouco, um fundamento aceitável para a alteração de definições. Convém reiterar que a alteração de definições legais deve basear‑se em razões de lógica, coerência e clareza. Havendo problemas ligados às metas, poderá eventualmente ser necessário alterar as metas, e não as definições!

4.1.1 Definição de "resíduo"

A Comissão propõe consagrar a possibilidade de reclassificação de fluxos de resíduos, que, em determinadas condições, deixarão de ser resíduos para efeitos legais. Para tanto, estabeleceram‑se critérios adequados de desclassificação. Todavia, é necessário grande cuidado ao enveredar por esta abordagem. É importante especificar à partida que ela só é susceptível de ser aplicada a um número restrito de fluxos de resíduos. São eles os fluxos de resíduos homogéneos que não têm nem podem ter um impacto negativo sobre o ambiente. Outro requisito prévio é o de que a isenção do estatuto de resíduos não implique uma redução do nível de protecção ambiental. Finalmente, a atribuição do mesmo estatuto só deverá ser possível depois de os resíduos serem submetidos a um tratamento que os transforme num produto que satisfaça critérios de qualidade específicos europeus, garantindo‑se assim a sua aptidão para os fins a que se destina, de forma segura e ambientalmente responsável. Os fluxos de resíduos que poderão ser elegíveis para efeitos de isenção do estatuto de resíduo são os de composto produzido à base de resíduos reciclados e a parte de inertes dos resíduos de demolição (entulho granulados).

4.1.2 Definição de "eliminação" e actividades de recuperação

As definições estabelecidas na legislação em vigor, na interpretação que delas faz o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, não tendem a favorecer as melhores práticas ambientais. A co‑incineração de resíduos no forno de uma cimenteira, por exemplo, subsume‑se, na avaliação do Tribunal, no conceito de recuperação, enquanto a incineração de resíduos numa instalação específica constitui eliminação, apesar de as normas ambientais aplicáveis às emissões de poluentes serem menos rigorosas no caso das instalações de co‑incineração. Para resolver este problema, a Comissão propõe que se qualifique de recuperação a actividade das instalações de incineração com elevado grau de eficiência energética. Tal abordagem suscita várias questões, visto que a incineração de resíduos é, declaradamente, um meio de eliminação de resíduos. Melhor seria resolver o problema em questão, referente às instalações de incineração e co‑incineração, mediante a imposição a ambas de iguais exigências ambientais. Na prática, isso pode ser feito por via de uma alteração da directiva relativa à incineração de resíduos que sujeite as instalações de incineração e de co‑incineração às mesmas normas em matéria de emissões e de eficiência energética.

A Comissão reserva aos comités técnicos um importante papel na definição dos critérios destinados a determinar em que momento os resíduos deixam de o ser, ou os casos em que uma actividade é susceptível de ser considerada eliminação e aqueles em que é susceptível de ser considerada recuperação. Dada a relevância das consequências que podem acarretar, tais decisões têm de ser tomadas a nível político, no quadro do processo de co‑decisão.

4.2 Introduzir o conceito de ciclo de vida na política de resíduos

A Comissão propõe que, no momento de apurar o melhor modo de tratamento de um fluxo de resíduos, se proceda a uma análise assente na abordagem do ciclo de vida. Esse tipo de análise permite determinar o modo de tratamento que é menos prejudicial ao ambiente, tendo em conta a totalidade do respectivo ciclo de vida, desde o fabrico até ao tratamento de resíduos, inclusive. Em princípio, tal abordagem é de aplaudir, na medida em que assenta na avaliação dos impactos ambientais globais. Por outro lado, há o risco decorrente do carácter eminentemente teórico da abordagem em causa. Na prática, será muito difícil efectuar uma análise objectiva de ciclo de vida. No caso de a análise envolver factores de avaliação problemática, haverá uma grande margem para discussão. Isso pode abrir a porta, rapidamente, a avaliações baseadas em considerações políticas, em lugar de puramente técnicas.

Assim, é de manter como base a actual hierarquia de resíduos, de cinco graus. A possibilidade de uma derrogação a tal hierarquia é admissível, porém, no caso de um número restrito de fluxos de resíduos específicos. Naturalmente, será necessário demonstrar de modo claro que uma forma de tratamento dos resíduos de nível inferior encerra benefícios ambientais evidentes. Além disso, as decisões dessa natureza não devem ficar a cargo de comités técnicos, uma vez que são decisões políticas.

4.3 Melhorar a base de conhecimentos

Embora seja sempre desejável melhorar a base de conhecimentos na área da política de resíduos, há o risco de se consagrar a esse fim um volume exagerado de tempo e de energia. Importa não sacrificar a tal objectivo a adopção e aplicação de medidas concretas dirigidas a aperfeiçoar a política de resíduos e a reforçar a protecção do ambiente.

A base de conhecimentos para efeitos de análise do ciclo de vida, por exemplo, deve dar origem a um método objectivo e ser objecto de verificação por um comité de peritos independentes.

4.4 Prevenção de resíduos

A Comissão propõe, simplesmente, que a eventual adopção de medidas de prevenção de resíduos seja deixada, predominantemente, a cargo dos Estados‑Membros. O Sexto Programa de Acção em matéria de Ambiente prevê de modo claro a introdução de metas específicas de redução. A Comissão não propõe, contudo, o estabelecimento de metas, apesar de necessário, atendendo ao aumento contínuo da geração de resíduos. Seja como for, urge dissociar o crescimento económico da geração de resíduos. Um alargamento do âmbito de aplicação do princípio da responsabilidade do produtor pode ser um dos instrumentos a utilizar.

4.5 Para uma sociedade europeia da reciclagem

O objectivo a que a Comissão aspira, uma sociedade da reciclagem, é meritório. No entanto, é importante termos consciência de que, infelizmente, ainda estamos muito longe de o atingir. Embora o Sexto Programa de Acção em matéria de Ambiente imponha à Comissão o encargo de elaborar novas directivas relativas aos resíduos, nomeadamente os biodegradáveis, os provenientes da construção e demolição, e as lamas de depuração, ela ainda não fez isso. A legislação em causa é, no entanto, urgentemente necessária, dado o défice de clareza de que padecem os regimes vigentes. A presente situação não contribui para a protecção do ambiente nem para a criação de um mercado interno de reciclagem. Acresce que a própria indústria tem vindo a solicitar a elaboração de legislação comunitária relativa a esses fluxos de resíduos.

É também assaz surpreendente que a Comissão sugira que a legislação europeia em vigor constitui um problema. Vai‑se ao ponto de advogar a ideia de que as metas de reciclagem de resíduos de veículos em fim de vida e de equipamentos eléctricos e electrónicos devem ser alteradas. Mais, segundo a Comissão, o Regulamento "Transferências de Resíduos" deveria ser objecto de uma reavaliação, apesar de (após intensas negociações) se encontrar já a aguardar publicação. A Comissão labora, manifestamente, em erro nesta questão, visto que o Regulamento "Transferências de Resíduos" se destina precisamente a evitar as transferências transfronteiriças de resíduos, que têm por propósito contornar as normas ambientais ou tratar os resíduos de um modo que assegure um menor grau de protecção do ambiente.

É, pois, essencial que o Parlamento Europeu e o Conselho declarem expressamente que o principal objectivo da legislação europeia de resíduos é a protecção do ambiente.

Finalmente, a Comissão propõe que a Directiva "Óleos Usados" seja revogada. Na proposta de revisão da Directiva‑Quadro "Resíduos", é mantida a obrigação de recolha dos óleos usados. Existe o risco, porém, de se incorrer em falta de motivação no caso de os óleos usados passarem a ser utilizados como combustível. A proposta é fundamentada no facto de uma análise centrada no ciclo de vida ter, aparentemente, demonstrado que a regeneração de óleos usados não apresentava vantagens ambientais claras em relação à combustão. Esta posição é, no entanto, contestada pela indústria de processamento de óleos. Além disso, em vários Estados‑Membros assistiu‑se a um processo de canalização de investimento para a construção de infra‑estruturas especificamente destinadas ao processamento de óleos usados. A proposta da Comissão afigura‑se pouco coerente com o desígnio de criar uma sociedade da reciclagem.

PROCESSO

Título

Uma Estratégia Temática de Prevenção e Reciclagem de Resíduos

Número de processo

2006/2175 (INI)

Comissão competente quanto ao fundo
  Data de comunicação em sessão da autorização

ENVI
6.7.2006

Comissões encarregadas de emitir parecer
  Data de comunicação em sessão

ITRE
6.7.2006

 

 

 

 

Comissões que não emitiram parecer
  Data da decisão

ITRE

22.2.2006

 

 

 

 

Cooperação reforçada
  Data de comunicação em sessão

 

 

 

 

 

Relator(es)
  Data de designação

Johannes Blokland
29.11.2005

 

Relator(es) substituído(s)

 

 

Exame em comissão

13.7.2006

 

 

 

 

Data de aprovação

28.11.2006

Resultado da votação final

+:

–:

0:

51

0

0

Deputados presentes no momento da votação final

Adamos Adamou, Georgs Andrejevs, Irena Belohorská, Johannes Blokland, John Bowis, Frieda Brepoels, Dorette Corbey, Chris Davies, Avril Doyle, Mojca Drčar Murko, Edite Estrela, Jill Evans, Anne Ferreira, Matthias Groote, Françoise Grossetête, Cristina Gutiérrez-Cortines, Satu Hassi, Gyula Hegyi, Jens Holm, Marie Anne Isler Béguin, Caroline Jackson, Christa Klaß, Eija-Riitta Korhola, Holger Krahmer, Marie-Noëlle Lienemann, Linda McAvan, Roberto Musacchio, Riitta Myller, Péter Olajos, Miroslav Ouzký, Vittorio Prodi, Frédérique Ries, Guido Sacconi, Karin Scheele, Richard Seeber, Kathy Sinnott, Bogusław Sonik, Antonios Trakatellis, Marcello Vernola, Anja Weisgerber, Åsa Westlund

Suplente(s) presente(s) no momento da votação final

Pilar Ayuso, Giovanni Berlinguer, Philip Bushill-Matthews, Niels Busk, Bairbre de Brún, Hélène Goudin, Ambroise Guellec, Jutta Haug, Karsten Friedrich Hoppenstedt, Miroslav Mikolášik

Suplente(s) (nº 2 do art. 178º) presente(s) no momento da votação final

 

Data de entrega

19.12.2006

 

Observações (dados disponíveis numa única língua)

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