Relatório - A6-0071/2007Relatório
A6-0071/2007

RELATÓRIO sobre o pedido de defesa dos privilégios e imunidades de Giuseppe Gargani

21.3.2007 - (2006/2300(IMM))

Comissão dos Assuntos Jurídicos
Relatora: Diana Wallis

Processo : 2006/2300(IMM)
Ciclo de vida em sessão
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A6-0071/2007
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A6-0071/2007
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PROPOSTA DE DECISÃO DO PARLAMENTO EUROPEU

sobre o pedido de defesa dos privilégios e imunidades de Giuseppe Gargani

(2006/2300(IMM))

O Parlamento Europeu,

–   Tendo recebido um pedido de Giuseppe Gargani, apresentado em 30 de Novembro de 2006, relativo à defesa da sua imunidade em relação a uma acção cível pendente num tribunal italiano, o qual foi comunicado em sessão plenária em 11 de Dezembro de 2006,

–   Tendo ouvido Giuseppe Gargani, nos termos do nº 3 do artigo 7º do seu Regimento,

–   Tendo em conta os artigos 9º e 10º do Protocolo relativo aos Privilégios e Imunidades das Comunidades Europeias, de 8 de Abril de 1965, bem como o nº 2 do artigo 6º do Acto relativo à Eleição dos Deputados ao Parlamento Europeu por Sufrágio Universal Directo, de 20 de Setembro de 1976,

–   Tendo em conta os acórdãos do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias de 12 de Maio de 1964 e de 10 de Julho de 1986[1],

–   Tendo em conta o nº 3 do artigo 6º e o artigo 7º do seu Regimento,

–   Tendo em conta o relatório da Comissão dos Assuntos Jurídicos (A6‑0071/2007),

1.  Decide defender os privilégios e imunidades de Giuseppe Gargani;

2.  Encarrega o seu Presidente de transmitir de imediato a presente decisão, bem como o relatório da sua comissão competente, às autoridades competentes da República Italiana.

  • [1]  Processo 101/63, Wagner/Fohrmann e Krier, Colectânea de Jurisprudência do TJCE, 1964, p. 435; processo 149/85, Wybot/Faure e outros, ibidem, 1986, p. 2391.

EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS

I. FACTOS

Na sessão de 11 de Dezembro de 2006, o Presidente do Parlamento comunicou ter recebido um pedido de defesa da imunidade parlamentar do Deputado Giuseppe Gargani, apresentado por carta datada de 30 de Novembro de 2006, pedido que foi devidamente transmitido à Comissão dos Assuntos Jurídicos e do Mercado Interno.

O pedido diz respeito ao procedimento judicial instaurado pela Sra. Di Giovanni, Presidente do Tribunale di Sorveglianza de Nápoles, contra o Deputado Gargani, os editores e os directores do semanário Il Roma, através do qual pretende obter o reconhecimento da sua responsabilidade solidária pelo alegado dano causado por um artigo redigido por Giuseppe Gargani à sua reputação e, consequentemente o pagamento de 500 000 euros a título de indemnização pelo referido dano.

O artigo do Deputado Gargani intitulava-se "Justiça ilógica (...) A liberdade de expressão considerada como um crime. Uma outra forma de transformar o sistema judicial numa caricatura de justiça? A questão coloca-se inevitavelmente na sequência de mais um procedimento judicial que suscita dúvidas e consternação".

O artigo comentava o caso de Lino Jannuzzi, senador e jornalista italiano, que foi condenado à pena de mais de dois anos de detenção "pelo facto de o Tribunale di Sorveglianza de Nápoles, com base numa interpretação inaudita da lei, ter indeferido os pedidos apresentados com vista à suspensão da sentença que condenou o Sr. Jannuzzi por difamação no âmbito das suas actividades de jornalista em anos anteriores.

O artigo tecia ainda críticas sobre a situação da justiça em Itália à luz do caso do Sr. Jannuzzi, no qual se considera que o mesmo foi "detido imediatamente por causa de três artigos escritos há uma década, sem ter em conta o direito de liberdade de expressão consagrado na Constituição no quadro das liberdades fundamentais do indivíduo, que lhe é aplicável, assim como a qualquer outro cidadão italiano.

Afirmava-se ainda no artigo que o facto de o Tribunal de Nápoles não ter optado por uma outra pena que não a de detenção dá margem a uma instintiva suspeita de fumus persecutionis.

No restante do artigo, o Deputado Gargani fazia referência às penas alternativas à detenção e à questão da falta de disposições relativas à imunidade parlamentar enquanto meio de permitir um equilíbrio entre os Poderes do Estado e de evitar que o Judiciário possa exercer pressão sobre o Parlamento. Além disso, tratava da questão da politização do Judiciário e do papel dos magistrados, aos quais cabe investigar os casos e julgá-los, bem como da importância que uma formação vocacional adequada no domínio da justiça poderia ter no âmbito da reforma do sistema judicial em Itália. A título de conclusão, o Deputado Gargani afirmava que a reforma do sistema judicial permitiria evitar que se continuasse a apresentar pedidos de graça ao Presidente da República, o que "não está ao alcance de qualquer cidadão que tenha a infelicidade de encontrar um juiz que age de acordo com ideias preconcebidas e demonstra falta de senso de responsabilidade e de ponderação". Deve observar-se que o nome da requerente não é mencionado no artigo, mas unicamente o tribunal presidido pela mesma.

A requerente argumenta que as alegadas observações difamatórias revestem um carácter particularmente "singular" tendo em conta o curriculum vitae do Deputado Gargani, sendo feita referência à sua licenciatura em Direito, ao facto de pertencer à Ordem dos Advogados, às suas funções de chefe do Departamento Jurídico do Partido Democrata Cristão na Campânia e à sua condição de presidente da Comissão dos Assuntos Jurídicos do Parlamento Europeu.

Há que notar que a requerente já havia intentado anteriormente no Tribunale di Roma acções penais com base nos mesmos factos, tendo o processo então sido arquivado em virtude do facto de o Deputado Gargani ter proferido as declarações em causa "no exercício das suas funções parlamentares, tal como prevê o artigo 68º da Constituição". Não obstante, a requerente persiste claramente em afirmar que Giuseppe Gargani é culpado do delito de difamação na medida em que, segundo declara na petição inicial, as pessoas com as características do arguido "são igualmente responsáveis quando uma publicação constitui um meio de cometer um delito e dá, consequentemente, origem a um dano, até mesmo (ao contrário do que ocorre no caso vertente) no caso de a infracção não ter sido declarada verificada por um tribunal penal pelo facto de não terem sido preenchidos os requisitos necessários para a instauração de procedimento judicial, podendo, por isso, o juiz do Tribunal Cível reconhecer incidenter tantum que o delito foi cometido, exclusivamente para os efeitos da concessão de uma compensação.

II. DISPOSIções legais e considerações sobre a imunidade dos deputados ao parlamento europeu

1.   Os artigos 9º e 10º do Protocolo relativo aos Privilégios e Imunidades das Comunidades Europeias, de 8 de Abril de 1965, dispõem:

“Artigo 9º:

Os membros do Parlamento Europeu não podem ser procurados, detidos ou perseguidos pelas opiniões ou votos expressos no exercício das suas funções.

Artigo 10º:

Enquanto durarem as sessões do Parlamento Europeu, os seus membros beneficiam:

a) No seu território nacional, das imunidades reconhecidas aos membros do Parlamento do seu país;

b) No território de qualquer outro Estado-Membro, da não sujeição a qualquer medida de detenção e a qualquer procedimento judicial.

Beneficiam igualmente de imunidade quando se dirigem para ou regressam do local de reunião do Parlamento Europeu.

A imunidade não pode ser invocada em caso de flagrante delito e não pode também constituir obstáculo ao direito de o Parlamento Europeu levantar a imunidade de um dos seus membros."

2.  O procedimento no Parlamento Europeu é regido pelo disposto nos artigos 6º e 7º do Regimento. As disposições aplicáveis têm a seguinte redacção:

“Artigo 6º  : Levantamento da imunidade

1. O Parlamento, no exercício dos seus poderes em matéria de privilégios e imunidades, procurará fundamentalmente manter a sua integridade enquanto assembleia legislativa democrática e garantir a independência dos seus membros no exercício das suas funções.

(...)

3. Qualquer pedido dirigido ao Presidente por um deputado ou antigo deputado relativo à defesa dos privilégios e imunidades será comunicado em sessão plenária e remetido à comissão competente.

(...)”

“Artigo 7º  : Procedimentos relativos à imunidade

1. A comissão competente apreciará sem demora e pela ordem da respectiva apresentação todos os pedidos de levantamento da imunidade ou de defesa dos privilégios e imunidades.

2. A comissão apresentará uma proposta de decisão que se limitará a recomendar a aprovação ou a rejeição do pedido de levantamento da imunidade ou de defesa dos privilégios e imunidades.

3. A comissão poderá solicitar à autoridade competente todas as informações ou esclarecimentos que julgar necessários para dar parecer sobre se o levantamento da imunidade é ou não justificado. O deputado em questão terá a possibilidade de ser ouvido e poderá apresentar todos os documentos ou outros elementos de prova escritos que entender oportunos. Poderá fazer-se representar por outro deputado.

(...)

6. No caso de um pedido de defesa de privilégios ou imunidades, a comissão precisará se as circunstâncias descritas constituem uma restrição administrativa ou de qualquer outra natureza à livre circulação dos deputados que se dirijam para ou regressem dos locais de reunião do Parlamento Europeu, por um lado, ou à emissão de opinião ou voto no exercício das suas funções, por outro lado, ou ainda se as mesmas são assimiláveis aos aspectos do artigo 10º do Protocolo relativo aos Privilégios e Imunidades que não são da competência do direito nacional, e convidará a autoridade em questão a tirar as ilações necessárias.

7. A comissão poderá emitir um parecer fundamentado sobre a competência da autoridade em questão e sobre a admissibilidade do pedido, mas em nenhum caso poderá pronunciar-se sobre a culpabilidade ou não culpabilidade do deputado, nem sobre o facto de se justificar ou não processar penalmente o deputado pelas opiniões ou actos que lhe são atribuídos, ainda que o exame do pedido de levantamento da imunidade lhe proporcione um conhecimento aprofundado do assunto.

(...)”

III. JUSTIFICAçÃO DA DECISÃO PROPOSTA

O artigo 9º do Protocolo relativo aos Privilégios e Imunidades dispõe que os membros do Parlamento Europeu gozam de imunidade absoluta em relação aos procedimentos judiciais "pelas opiniões ou votos emitidos no exercício das suas funções".

Na petição inicial apresentada no Tribunale di Roma, a requerente reivindica o direito de receber, devido ao dano à sua reputação, em consequência das alegadas calúnias e injúrias proferidas, uma indemnização de 500 000, por cujo pagamento os diversos requeridos e, inclusivamente, o Deputado Gargani, são solidariamente responsáveis.

Resulta da análise do artigo em questão que o Deputado Gargani se limitou a formular observações sobre uma questão de interesse público, tendo utilizado o caso do Sr. Jannuzzi como ponto de partida para tecer uma crítica ao sistema judicial italiano, defender a imunidade parlamentar e apresentar propostas para a reforma do sistema judicial.

O Deputado Gargani, tendo em conta a posição, não apenas enquanto político, mas igualmente enquanto presidente da Comissão dos Assuntos Jurídicos do Parlamento, a qual é responsável pelos privilégios e imunidades dos deputados (em conformidade com a secção XVI, nº 9, do Anexo VI do Regimento), tem um interesse legítimo em exprimir a sua opinião sobre a situação referente à imunidade parlamentar em Itália. Com efeito, atendendo ao facto de a Comissão dos Assuntos Jurídicos do Parlamento ser obrigada, por força do disposto no artigo 10º do Protocolo, a aplicar a lei nacional sobre a imunidade parlamentar, pode argumentar-se que a mesma tem não apenas o direito, mas o dever de realizar debates públicos sobre essas questões.

Ao publicar o artigo em questão, o deputado Gargani mais não fazia do que exercer as suas funções na qualidade de membro do Parlamento e Presidente da Comissão dos Assuntos Jurídicos. Procurar amordaçar, mediante a instauração de procedimento judicial, os membros do Parlamento, impedindo-os de manifestarem as suas opiniões sobre questões de legítimo interesse público, é algo inaceitável numa sociedade democrática e manifestamente contrário ao disposto no artigo 9º do Protocolo, que tem em vista proteger a liberdade de expressão dos membros no exercício das suas funções, no interesse do Parlamento enquanto Instituição.

Por outro lado, o facto de a acção cível em questão ter sido intentada após a instauração, sem êxito, de procedimento penal por solicitação da requerente com base nos mesmos factos sugere a existência de fumus persecutionis.

IV. CONCLUSÕES

Atendendo às considerações anteriores e após ter apreciado os motivos a favor e contra relativamente à defesa da imunidade, a Comissão dos Assuntos Jurídicos e do Mercado Interno recomenda que o Parlamento Europeu defenda a imunidade e os privilégios do Deputado Giuseppe Gargani.

PROCESSO

Título

Pedido de defesa dos privilégios e imunidades de Giuseppe Gargani

Número de processo

2006/2300(IMM)

Pedido de defesa da imunidade
  transmitido por*
  Data do pedido
  Data de comunicação em sessão

* Dados disponíveis numa única língua


Giuseppe Gargani
30.11.2006
11.12.2006

Comissão competente quanto ao fundo
  Data de comunicação em sessão

JURI
13.12.2006

Relator(es)
   Data de designação

Diana Wallis
18.12.2006

Relator(es) substituído(s)

 

Exame em comissão

30.1.2007

20.3.2007

 

 

 

Data de aprovação

20.3.2007

Resultado da votação final

+

-

0

12
0
0

Deputados presentes no momento da votação final

Cristian Dumitrescu, Klaus-Heiner Lehne, Hans-Peter Mayer, Manuel Medina Ortega, Aloyzas Sakalas, Francesco Enrico Speroni, Diana Wallis, Jaroslav Zvěřina, Tadeusz Zwiefka

Suplente(s) presente(s) no momento da votação final

Sharon Bowles, Mogens N.J. Camre, Kurt Lechner

Suplente(s) (nº 2 do art. 178º) presente(s) no momento da votação final

 

Observações (dados disponíveis numa única língua)