Relatório - A6-0089/2009Relatório
A6-0089/2009

RELATÓRIO sobre preocupações com a saúde associadas aos campos electromagnéticos

23.2.2009 - (2008/2211(INI))

Comissão do Ambiente, da Saúde Pública e da Segurança Alimentar
Relatora: Frédérique Ries

Processo : 2008/2211(INI)
Ciclo de vida em sessão
Ciclo relativo ao documento :  
A6-0089/2009
Textos apresentados :
A6-0089/2009
Textos aprovados :

PROPOSTA DE RESOLUÇÃO DO PARLAMENTO EUROPEU

sobre preocupações com a saúde associadas aos campos electromagnéticos

(2008/2211(INI))

O Parlamento Europeu,

–   Tendo em conta os artigos 137.º, 152.º e 174.º do Tratado CE que visam promover um elevado nível de protecção da saúde humana, do ambiente e da saúde e segurança dos trabalhadores,

–   Tendo em conta a Recomendação do Conselho, de 12 de Julho de 1999, relativa à limitação da exposição da população aos campos electromagnéticos[1] e o relatório da Comissão, de 1 de Setembro de 2008, sobre a sua aplicação (COM(2008)532 final),

–   Tendo em conta a Directiva 2004/40/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de Abril de 2004, relativa às prescrições mínimas de segurança e saúde em matéria de exposição dos trabalhadores aos riscos devidos aos agentes físicos (campos electromagnéticos)[2],

–   Tendo em conta a Directiva 1999/5/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de Março de 1999, relativa aos equipamentos de rádio e equipamentos terminais de telecomunicações e ao reconhecimento mútuo da sua conformidade[3] e às respectivas normas harmonizadas de segurança para telemóveis e estações de base,

–   Tendo em conta a Directiva 2006/95/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro de 2006, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros no domínio do material eléctrico destinado a ser utilizado dentro de certos limites de tensão[4],

–   Tendo em conta a sua resolução de 4 de Setembro de 2008 sobre a Análise intercalar do Plano de Acção Europeu "Ambiente e Saúde” -2004-2010[5],

–   Tendo em conta a sua resolução de 10 de Março de 1999 sobre a proposta de recomendação do Conselho relativa à limitação da exposição da população aos campos electromagnéticos 0 Hz-300 GHz[6],

–   Tendo em conta o artigo 45.º do seu Regimento,

–   Tendo em conta o relatório da Comissão do Ambiente, da Saúde Pública e da Segurança Alimentar (A6-0089/2009),

A. Considerando que os campos electromagnéticos (CEM) existem na natureza e estiveram, por isso, sempre presentes na terra; considerando, no entanto, que ao longo das últimas décadas, a exposição ambiental a fontes de CEM fabricadas pelo homem têm aumentado constantemente, devido ao aumento da procura de electricidade, às tecnologias sem fio cada vez mais evoluídas e às mudanças ocorridas na sociedade; que, em última análise, cada cidadão encontra-se actualmente exposto a uma mistura complexa de campos eléctricos e magnéticos de diferentes frequências, tanto em casa como no local de trabalho,

B.  Considerando que a tecnologia dos aparelhos sem fio (telemóvel, Wifi-Wi max-Bluetooth, telefone com base fixa DECT) emite CEM que podem desencadear efeitos nocivos para a saúde humana,

C. Considerando que uma maioria de cidadãos europeus, nomeadamente jovens dos 10 aos 20 anos, utiliza um telemóvel como um objecto utilitário e na moda, e que subsistem dúvidas quanto aos riscos que daí podem advir para a saúde, em particular para os jovens, cujos cérebros ainda se estão a desenvolver,

D. Considerando que a controvérsia no seio da comunidade científica sobre os eventuais riscos para a saúde decorrentes dos CEM aumentou após 12 de Julho de 1999, data da fixação de limites de exposição da população aos CEM (0 Hz - 300 GHz) pela Recomendação 1999/519/CE,

E.  Considerando que a falta de conclusões definitivas da comunidade científica não tem impedido certos governos nacionais ou regionais, em pelo menos nove Estados-Membros da União Europeia, mas também na China, na Suíça e na Rússia, de fixar limites de exposição ditos "preventivos", ou seja, inferiores aos preconizados pela Comissão e pelo seu comité científico independente, o Comité Científico dos Riscos para a Saúde Emergentes e Recentemente Identificados (CCRSERI )[7],

F.  Considerando que as acções destinadas a limitar a exposição da população aos CEM deveriam ser ponderadas em função das melhorias da qualidade de vida, em termos de protecção e segurança, proporcionadas por aparelhos que emitem CEM,

G. Considerando que, entre os projectos científicos que suscitam tanto o interesse como a polémica, figura o estudo epidemiológico INTERPHONE, que foi financiado pela União com 3,8 milhões de euros, principalmente ao abrigo do 5º programa-quadro de IDT [8], e cujas conclusões têm sido aguardadas desde 2006,

H. Considerando, no entanto, que certos conhecimentos parecem colher a unanimidade, especialmente os que referem a variabilidade das reacções individuais a uma exposição a microondas, a necessidade de efectuar prioritariamente testes de exposição em condições reais com modelos de tamanho real para avaliar os efeitos não térmicos associados aos campos de radiofrequência (RF), e a vulnerabilidade particular das crianças, em caso de exposição aos CEM[9],

I.   Considerando que a UE estabeleceu limites de exposição para proteger os trabalhadores contra os efeitos dos CEM; considerando que, com base no princípio da precaução, também devem ser adoptadas medidas análogas para os segmentos da população afectados, como os residentes e os consumidores,

J.   Considerando que o inquérito Eurobarómetro Especial sobre os Campos Electromagnéticos (N.º 272a de Junho de 2007) revela que a maioria dos cidadãos tem o sentimento de que as autoridades públicas não os mantêm adequadamente informados sobre as medidas destinadas a protegê-los da exposição aos CEM,

K. Considerando que é necessário prosseguir as investigações no domínio dos campos de frequência intermédia e de frequência extremamente baixa, para que possam ser retiradas conclusões sobre os seus efeitos na saúde,

L.  Considerando que a utilização da imagiologia por ressonância magnética (IRM) não pode, de modo algum, ser posta em causa pela Directiva 2004/40/CE, porquanto a tecnologia da IRM está na vanguarda da investigação, do diagnóstico e do tratamento das doenças que põem em risco a vida dos pacientes na Europa,

M. Considerando que a norma de segurança IEC/EN 60601-2-33 aplicável à IRM define valores-limite para os CEM, que foram fixados com o propósito de excluir toda e qualquer situação de perigo para pacientes e trabalhadores,

1.  Solicita à Comissão que reveja a base científica e a adequação dos limites dos CEM , tal como estabelecidos na Recomendação 1999/519/CE, comunicando-as ao Parlamento. Essa revisão deverá ser levada a cabo pelo CCRSERI;

2.  Solicita que seja dada particular atenção aos efeitos biológicos aquando da avaliação do potencial impacto da radiação electromagnética na saúde, atendendo especialmente a que alguns estudos detectaram a existência dos efeitos mais nocivos aos níveis mais baixos; requer a realização de uma investigação empenhada para fazer face a eventuais problemas de saúde, mediante o desenvolvimento de soluções que contrariem ou reduzam a tensão pulsatória e a modulação de amplitude das frequências utilizadas na transmissão;

3.  Sustenta que, paralelamente ou em alternativa a esta alteração dos limites europeus de exposição aos CEM, a Comissão, em coordenação com especialistas dos Estados-Membros e dos sectores industriais relevantes (companhias de electricidade, operadores de telecomunicações e fabricantes de aparelhos eléctricos, incluindo telemóveis), deveria elaborar um guia das opções tecnológicas disponíveis que permitam reduzir a exposição às CEM;

4.  Salienta que a indústria, bem como os gestores de infra-estruturas relevantes e as autoridades competentes podem, desde já, agir sobre certos factores, como a definição de disposições em relação à distância entre o local considerado e os emissores, ou a altitude do local em relação à altitude da antena retransmissora, ou a direcção da antena emissora em relação às zonas residenciais, tudo isto com a preocupação óbvia de tranquilizar e melhor proteger as populações que vivem na proximidade destes equipamentos; exorta à selecção dos locais mais apropriados para a instalação de postes e de emissores e insta os operadores a partilharem as infra-estruturas instaladas desta forma com o intuito de restringir a proliferação de postes e de emissores mal situados; exorta a Comissão e os Estados-Membros a elaborarem orientações apropriadas;

5.  Convida os Estados-Membros e as autoridades locais e regionais a estabelecerem um sistema único de licenciamento para a instalação de antenas e repetidores, e a incluírem nos respectivos planos de urbanização um plano regional para a instalação das antenas;

6.  Exorta as autoridades responsáveis pelo licenciamento da implantação de antenas de telefonia móvel a, juntamente com os operadores do sector, chegarem a um acordo com vista a uma utilização partilhada das infra-estruturas, a fim de reduzir o seu número e a exposição da população aos CEM;

7.  Reconhece os esforços das telecomunicações móveis e de outras tecnologias sem fio que fazem transmissões por CEM para evitar os efeitos nocivos no ambiente e, em particular, para combater as alterações climáticas;

8.  Considera que, face à multiplicação dos recursos a tribunal e de medidas de tipo moratório emitidas pela autoridade pública sobre a instalação de novo equipamento gerador de CEM, é do interesse geral favorecer soluções assentes no diálogo entre a indústria, as autoridades públicas, as autoridades militares e as associações de moradores quanto aos critérios para a instalação de novas antenas GSM ou de linhas de alta tensão, e zelar por que pelo menos as escolas, as creches, as casas de repouso e os serviços de saúde sejam mantidos a uma distância específica, determinada por critérios científicos, deste tipo de equipamentos;

9.  Convida os Estados-Membros a que, em associação com os operadores do sector, disponibilizem ao público mapas da exposição à radiação gerada pelas linhas de electricidade de alta tensão, às radiofrequências e microondas, em especial, as geradas pelas estações de telecomunicações, emissores de rádio repetidores e antenas de telefone; solicita que, a fim de facilitar a sua consulta pelo público, essa informação seja publicada numa página Web e divulgada através dos meios de comunicação social;

10. Propõe à Comissão que estude a possibilidade de utilizar as dotações financeiras das Redes Transeuropeias de Energia na investigação dos efeitos dos CEM em frequências extremamente baixas e, em especial, nas linhas de distribuição de electricidade;

11. Exorta a Comissão a iniciar, durante a legislatura de 2009-2014, um programa ambicioso de compatibilidade electromagnética entre as ondas criadas artificialmente e as emitidas naturalmente pelo corpo humano vivo, que seja capaz de identificar a curto prazo se as microondas têm consequências indesejáveis para a saúde humana;

12. Exorta a Comissão a apresentar um relatório anual sobre o nível de radiação electromagnética na UE, as suas fontes e acções levadas a cabo na UE, tendo em vista proteger, de forma mais adequada, a saúde humana e o ambiente;

13. Convida a Comissão a encontrar uma solução para que a aplicação da Directiva 2004/40/CE seja acelerada, assegurando assim que os trabalhadores sejam realmente protegidos dos CEM, como o são já do ruído[10] e das vibrações[11] por outros dois textos comunitários, bem como a introduzir uma derrogação em relação à IRM, nos termos do n.º 1 da referida directiva;

14. Lamenta o adiamento sistemático, desde 2006, da publicação das conclusões do estudo epidemiológico internacional INTERPHONE, que tem por objectivo determinar se existe uma relação entre a utilização do telemóvel e certos tipos de cancro, nomeadamente, os tumores cerebrais, do nervo auditivo e da glândula parótida;

15. Salienta, neste contexto, o apelo à prudência lançado pela coordenadora do estudo INTERPHONE, Dra. Elisabeth Cardis, que, com base nos conhecimentos actuais, recomenda que as crianças utilizem o telemóvel de forma moderada e privilegiem a utilização do telefone fixo;

16. Entende, em todo o caso, que cabe à Comissão, que contribuiu com um financiamento de relevo para este estudo global, exigir aos responsáveis do projecto que indiquem as razões da falta de publicação definitiva, e, caso obtenha resposta, informar imediatamente o Parlamento e os Estados-Membros;

17. Sugere igualmente à Comissão, no interesse da eficiência política e orçamental, a reafectação parcial do financiamento comunitário consagrado aos estudos sobre os CEM para uma campanha global de sensibilização dos jovens europeus para as boas práticas em matéria de utilização do telemóvel, tais como utilizar o kit mãos-livres, fazer chamadas curtas, desligar o telefone quando não utilizado (por exemplo, nas salas de aula) e utilizar os telefones em áreas com boa recepção;

18. Considera que tais campanhas de sensibilização deveriam também familiarizar os jovens europeus com os riscos para a saúde associados a aparelhos domésticos e com a importância de desligar os aparelhos em vez de os deixar em estado de vigília;

19. Solicita à Comissão e aos Estados-Membros que reforcem a dotação financeira para fins de investigação e desenvolvimento (I&D), com vista à avaliação dos efeitos negativos potenciais a longo prazo das radiofrequências geradas pelas comunicações móveis; solicita igualmente um aumento dos convites públicos à apresentação de propostas no domínio da investigação dos efeitos adversos da exposição múltipla a diferentes fontes de CEM, em especial no que se refere à população infantil;

20. Propõe que se inclua no mandato do Grupo Europeu de Ética para as Ciências e as Novas Tecnologias (GEE) uma missão suplementar de avaliação da integridade científica, a fim de ajudar a Comissão a evitar eventuais situações de risco, de conflito de interesses, ou mesmo de fraude, susceptíveis de ocorrerem num contexto de competição acrescida para os investigadores;

21. Exorta a Comissão, em reconhecimento da preocupação pública que se faz sentir em muitos Estados-Membros, a trabalhar com todas as partes interessadas relevantes, tais como especialistas nacionais, organizações não governamentais e sectores industriais, com vista a melhorar a disponibilidade e o acesso a informação actualizada, compreensível para leigos, sobre a tecnologia sem fio e normas de protecção;

22. Exorta a Comissão Internacional para a Protecção contra as Radiações Não-Ionizantes e a Organização Mundial da Saúde (OMS) a darem provas de uma maior transparência e a encetarem um diálogo aberto com todas as partes interessadas em matéria de definição de normas;

23. Condena certas campanhas de marketing particularmente agressivas de operadores de telecomunicações por ocasião das festas de fim de ano e outras ocasiões festivas, como a venda de telemóveis exclusivamente destinados a crianças ou pacotes de tempo grátis de chamadas que têm por alvo os adolescentes;

24. Propõe que a União inclua na sua política relativa à qualidade do ar interior o estudo dos aparelhos domésticos "sem fio" que, à semelhança do Wifi para acesso à Internet e do telefone para telecomunicações europeias digitais sem fios (DECT), se generalizaram nos últimos anos nos lugares públicos e nas habitações, expondo os cidadãos a uma emissão de microondas permanente;

25. Exige, no interesse de uma constante melhoria da informação dos consumidores, que as normas técnicas do Comité Europeu de Coordenação das Normas de Electricidade (CENELEC) sejam alteradas no sentido de obrigar à aposição de uma etiqueta sobre a potência de emissão, indicando para qualquer aparelho que funcione sem fio que o mesmo emite microondas;

26. Solicita ao Conselho e à Comissão, em coordenação com os Estados-Membros e com o Comité das Regiões, que promovam o estabelecimento de uma norma única, a fim de minimizar a exposição dos moradores, em caso de extensão da rede de linhas eléctricas de alta tensão próximas das suas habitações;

27. Manifesta a sua preocupação pelo facto de as companhias de seguros tenderem a excluir das apólices de responsabilidade civil a cobertura dos riscos associados aos CEM, o que indica claramente que as seguradoras europeias já estão a aplicar a sua versão do princípio da precaução;

28. Exorta os Estados-Membros a seguirem o exemplo da Suécia e a reconhecerem as pessoas que sofrem de hipersensibilidade eléctrica como pessoas deficientes, de molde a conceder-lhes protecção adequada, bem como igualdade de oportunidades;

29. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho e à Comissão, bem como aos governos e parlamentos dos Estados-Membros, ao Comité das Regiões e à OMS.

  • [1]  JO L 199 de 30.7.1999, p. 59.
  • [2]  JO L 159 de 30.04.04, p. 1.
  • [3]  JO L 91 de 07.04.99, p. 10.
  • [4]  JO L 374 de 27.12.06, p. 10.
  • [5]  Textos aprovados, P6_TA(2008)0410.
  • [6]  JO C 175 de 21.6.1999, p. 129.
  • [7]  Parecer de 21 de Março de 2007, aprovado na 16ª reunião plenária.
  • [8]  Programa “Qualidade de vida”, contrato N.º QLK4-1999-01563.
  • [9]  Março 2001, estudo STOA sobre “Efeitos fisiológicos e ambientais das radiações electromagnéticas não ionizantes”, PE397.574
  • [10]  Directiva 2003/10/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Fevereiro de 2003, relativa às prescrições mínimas de segurança e de saúde em matéria de exposição dos trabalhadores aos riscos devidos aos agentes físicos (ruído) (JO L 42 de 15.2.2003, p. 38),
  • [11]  Directiva 2002/44/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de Junho de 2002, relativa às prescrições mínimas de segurança e saúde respeitantes à exposição dos trabalhadores aos riscos devidos aos agentes físicos (vibrações) (JO L 177 de 6.7.2002, p. 13),

EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS

O impacto das ondas electromagnéticas na saúde: de que estamos a falar?

Entre as surpresas que nos reserva o corpo humano, uma das mais originais é certamente a sua capacidade de emitir, de um modo natural, campos eléctricos gerados principalmente pelo nosso funcionamento biológico. É por isso que a actividade eléctrica do coração e do cérebro podem ser registadas, respectivamente, por um electrocardiograma e por um electroencefalograma. Será que esta actividade eléctrica natural interage com os campos electromagnéticos gerados pela actividade humana? Como absorve o corpo humano as ondas electromagnéticas emitidas por aparelhos tão diversos como a rádio, a televisão, o microondas, o telemóvel, as antenas retransmissoras ou as linhas de alta tensão?

Tantas perguntas que suscitam inúmeras incertezas científicas, e que as autoridades públicas ainda não apreenderam em toda a sua dimensão. Daí o interesse deste relatório redigido com total independência, sem tomar partido na intensa polémica científica sobre o tema dos campos electromagnéticos. Um relatório que fixa como seu objectivo principal, através de uma dezena de propostas concretas, dar respostas aos cidadãos, sejam eles simples utilizadores destes aparelhos e/ou moradores vizinhos de antenas retransmissoras ou de linhas de alta tensão. Cidadãos que são cada vez mais numerosos a exprimirem as suas preocupações quanto ao impacto na sua saúde desta exposição permanente a microondas.

Recomendações europeias pouco seguidas pelos Estados-Membros.

Dada a falta de competências conferidas pelos Tratados, nenhuma lei europeia obriga os Estados-Membros a tomar medidas em matéria de ondas de baixa e de muito baixa frequência, ou seja, as ondas que hoje em dia são emitidas principalmente pelas antenas de telefonia móvel e pelas tecnologias sem fio.

É por essa razão que, a nível da União Europeia, as normas de exposição dos cidadãos estão fixadas numa Recomendação do Conselho de 12 de Julho de 1999 relativa à limitação da exposição da população aos campos electromagnéticos 0 Hz - 300 GHz.

Essas normas seguem exactamente as que são preconizadas pela Comissão Internacional para a Protecção contra as Radiações não Ionizantes (CIPRNI), organização não governamental reconhecida oficialmente pela Organização Mundial de Saúde (OMS), que avalia os resultados científicos do mundo inteiro.

A supramencionada Recomendação do Conselho da União Europeia fixa os seguintes valores-limite:

1.        GSM (900 MHz): 41,25 Volts/metro

2.        DCS (1800 MHz): 58,33 Volts/metro

3.        UMTS (2100 MHz): 61 Volts/metro.

Em contrapartida, nada impede os Estados-Membros de adoptarem normas de protecção mais exigentes: pelo menos 9 Estados-Membros, entre os quais a Grécia, a Polónia e, mais recentemente, a Bélgica, já o fizeram a nível nacional ou regional.

No Grão-Ducado do Luxemburgo, um Estado que a relatora conhece bem, o Governo decidiu-se, desde os finais de 2000, pela aplicação do princípio da precaução, impondo um valor máximo do campo eléctrico de 3 Volts /metro por transmissor situado perto de zonas residenciais. A população luxemburguesa está praticamente 14 vezes mais protegida contra os campos electromagnéticos do que outros cidadãos da União Europeia.

A nível da União Europeia, esta falta de coordenação das políticas nacionais relativamente a este tema não é motivo de satisfação, e a relatora considera que compete à Comissão adoptar uma política clara em matéria de ondas electromagnéticas (vertente competitividade, inovação, saúde e informação aos consumidores) que não deve resumir-se à actual dispersão de alguns projectos financiados pela Direcção-Geral da Investigação.

Para a relatora, nesta fase, há uma pista a seguir: a verdade encontra-se, certamente, numa solução política em que os valores-limite fixados sejam regularmente adaptados (à luz das novas tecnologias colocadas no mercado e dos resultados dos novos estudos epidemiológicos) e assegurem um elevado nível de protecção dos consumidores, e das crianças em particular, sem, no entanto, impedir o funcionamento das redes de telefonia móvel.

Esta é a abordagem escolhida pela Agência Europeia de Copenhaga que, corajosamente, em Setembro de 2007, recomendava aos poderes públicos dos 27 Estados-Membros que tomassem medidas para melhor proteger a população: "medidas adequadas e proporcionais para evitar ameaças importantes". Trata-se de um avanço importante neste dossiê. Um apelo à acção que contrasta com o statu quo preconizado pela Organização Mundial de Saúde.

Com efeito, a OMS parece querer "ganhar tempo" e marca-nos encontro para 2015 a fim de avaliar completamente o impacto das ondas electromagnéticas no homem!

Votações de 10 de Março de 1999 e de 4 de Setembro de 2008: o Parlamento Europeu persiste e assina.

Há 10 anos, já o Parlamento emitia uma mensagem marcada pela prudência a respeito das normas definidas pela Europa para proteger os cidadãos das microondas. Uma crítica mal velada à Comissão Europeia e ao Conselho, já que o relator Gianni Tamino defendia, nem mais nem menos, a aplicação do princípio da precaução e do "Alara" (as low as reasonably achievable), em virtude do qual a exposição às radiações deve ser tão baixa quanto razoavelmente possível.

Uma orientação clara sobre este tema sensível dos valores-limite de exposição que o Parlamento Europeu globalmente confirmou aquando da votação de 4 de Setembro último sobre a Análise intercalar do Plano de Acção Europeu "Ambiente e Saúde" -2004-2010.

A resolução votada obteve a unanimidade quase total dos seus deputados (522 votos a favor, 16 contra), e nela se solicita ao Conselho "que modifique a sua Recomendação 1999/519/CE de molde a ter em conta as melhores práticas nacionais e, neste contexto, estabelecer valores-limite de exposição mais rigorosos para todo o equipamento que emita ondas electromagnéticas nas frequências entre 0,1 MHz e 300 GHz."

A relatora está consciente de que a questão dos limites é da exclusiva competência dos Estados e das regiões, e prefere insistir aqui nas alternativas que se oferecem aos industriais, para prevenir todo e qualquer risco para a saúde: seguir a solução adoptada pelas autoridades austríacas, por exemplo, que colocaram as antenas retransmissoras em locais mais elevados a fim de melhor repartir a frequência de emissão.

Com efeito, não podemos deixar de admitir que, ao longo destes últimos dez anos, o ambiente quotidiano dos cidadãos europeus se alterou consideravelmente a partir do momento em que se generalizou o recurso às tecnologias sem fio (telefone com base fixa "DECT", telemóvel, emissões UMTS-Wifi-Wi max-Bluetooth, interfones para bebés, etc.). Reconhecer o contributo destas novas tecnologias, bem como a sua omnipresença tanto no local de trabalho como na biblioteca ou no domicílio privado, é também admitir que estes aparelhos devem ser objecto de uma avaliação antes de serem colocados no mercado e que, de um modo geral, devem ser fixados limites para o nível de exposição às microondas numa habitação. Sem isso, existe o risco de não dar a devida assistência ao consumidor em perigo!

É o clima de confiança actualmente inexistente que convém recuperar nos próximos anos junto dos cidadãos consumidores e moradores na proximidade de campos electromagnéticos, mas também no seio da própria comunidade científica. Se a relatora optou deliberadamente por não citar nenhum estudo ou documento já publicado, excepto os emanados do Parlamento Europeu, foi precisamente por não haver um consenso generalizado dentro da comunidade científica sobre as ondas electromagnéticas e os seus eventuais riscos para a saúde.

O estudo INTERPHONE: um exemplo clássico.

A relatora sabe perfeitamente que as controvérsias sobre esta matéria fazem parte do curso normal da ciência: a polémica que durante anos criou divisões em torno das alterações climáticas e das suas causas é um bom exemplo disso!

No entanto, é difícil aceitar que haja estudos que são "postos no frigorífico" pelo facto de os especialistas serem incapazes de chegar a acordo sobre uma conclusão, especialmente quando é o dinheiro dos contribuintes europeus que está em jogo.

O estudo INTERPHONE é, neste capítulo, um verdadeiro exemplo clássico. Apresentado em 1998, iniciado em 2000 e, sobretudo, anunciado como o projecto científico mais completo por envolver nada menos do que 12 Estados a nível mundial, com um protocolo exemplar para aumentar ao máximo a capacidade de detecção dos riscos de certos tipos de cancro, as suas conclusões continuam a ser aguardadas desde 2006. É caso até para perguntar se algum dia dará uma resposta clara.

É precisamente por estar consciente da enorme pressão exercida sobre os cientistas que a relatora pretende apoiá-los neste contexto de competição acrescida em que a descoberta só é válida se se tornar inovação e for publicada nas principais revistas científicas. Além disso, a relatora considera importante reformar o modo de funcionamento dos comités científicos junto da Comissão.

Para esse efeito, duas ideias simples: a primeira é assegurar no seio dos seus comités uma representação equitativa de todas as partes interessadas, incluindo portanto representantes das organizações não governamentais e das associações de consumidores. A segunda visa, num espírito de transparência e de controlo eficaz, propor que se inclua no mandato do Grupo Europeu de Ética para as Ciências e as Novas Tecnologias (GEE) uma missão de avaliação da integridade científica. Este tipo de controlo, já posto em prática no seio de instituições científicas nacionais, será de uma ajuda preciosa para a Comissão, a fim de evitar toda e qualquer possibilidade de situações de risco, de conflitos de interesses ou mesmo de fraudes susceptíveis de ocorrerem no sector da investigação.

Em jeito de conclusão, a relatora deseja chamar a atenção para os inúmeros documentos de que tomou conhecimento e que assinalam que as companhias de seguros se recusam geralmente a incluir na responsabilidade civil a cobertura do risco relativo aos campos electromagnéticos. Conhecendo a capacidade das seguradoras para avaliar todo o tipo de riscos e para apostar no futuro, temos o direito de nos questionarmos sobre as razões que as levam a aplicar a seu modo o princípio da precaução.

RESULTADO DA VOTAÇÃO FINAL EM COMISSÃO

Data de aprovação

17.2.2009

 

 

 

Resultado da votação final

+:

–:

0:

43

1

3

Deputados presentes no momento da votação final

Adamos Adamou, Margrete Auken, Liam Aylward, Irena Belohorská, Maria Berger, John Bowis, Hiltrud Breyer, Martin Callanan, Dorette Corbey, Magor Imre Csibi, Avril Doyle, Mojca Drčar Murko, Jill Evans, Christofer Fjellner, Elisabetta Gardini, Matthias Groote, Satu Hassi, Christa Klaß, Holger Krahmer, Urszula Krupa, Peter Liese, Marios Matsakis, Linda McAvan, Roberto Musacchio, Miroslav Ouzký, Vladko Todorov Panayotov, Vittorio Prodi, Frédérique Ries, Dagmar Roth-Behrendt, Guido Sacconi, María Sornosa Martínez, Thomas Ulmer, Anja Weisgerber, Åsa Westlund, Anders Wijkman, Glenis Willmott

Suplente(s) presente(s) no momento da votação final

Inés Ayala Sender, Kathalijne Maria Buitenweg, Philip Bushill-Matthews, Jutta Haug, Johannes Lebech, Caroline Lucas, Hartmut Nassauer, Justas Vincas Paleckis, Alojz Peterle, Lambert van Nistelrooij