RELATÓRIO sobre o Relatório Anual 2008 do BCE
2.2.2010 - (2009/2090(INI))
Comissão dos Assuntos Económicos e Monetários
Relator: Edward Scicluna
PROPOSTA DE RESOLUÇÃO DO PARLAMENTO EUROPEU
sobre o Relatório Anual 2008 do BCE
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta o Relatório anual do Banco Central Europeu (a seguir designado "BCE"), de 2008,
– Tendo em conta o artigo 113.° do Tratado CE,
– Tendo em conta o artigo 15.º do Protocolo relativo aos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu, anexo ao Tratado,
– Tendo em conta o Tratado de Lisboa, que altera o Tratado da União Europeia e o Tratado que institui a Comunidade Europeia,
– Tendo em conta a sua Resolução de 2 de Abril de 1998 sobre a responsabilidade democrática na terceira fase da União Económica e Monetária[1],
– Tendo em conta a Comunicação da Comissão, de 7 de Outubro de 2009, intitulada “Declaração anual sobre a área do euro referente a 2009” (COM(2009)0527) e o documento de trabalho dos serviços da Comissão anexo a essa Comunicação (SEC(2009)1313/2),
– Tendo em conta as previsões económicas provisórias publicadas pela Comissão em Setembro de 2009,
– Tendo em conta a proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à supervisão macroprudencial comunitária do sistema financeiro e que cria um Comité Europeu do Risco Sistémico, apresentada pela Comissão em 23 de Setembro de 2009 (COM(2009)0499),
– Tendo em conta a proposta de decisão do Conselho que atribui ao Banco Central Europeu tarefas específicas no que se refere ao funcionamento do Comité Europeu do Risco Sistémico, apresentada pela Comissão em 23 de Setembro de 2009 (COM(2009)0500),
– Tendo em conta o artigo 48.º do seu Regimento,
– Tendo em conta o relatório da Comissão dos Assuntos Económicos e Monetários (A7‑0010/2010),
A. Considerando que a crise económica e financeira se traduziu pelo declínio económico mais grave que o mundo conheceu desde os anos 30 e cujas consequências continuarão a fazer sentir-se de forma considerável no tecido económico e social dos Estados‑Membros durante muitos anos;
B. Considerando que, em 2008, o PIB real da zona do euro apenas aumentou 0,7% em virtude da crise económica e financeira e que se espera que registe uma forte baixa em 2009,
C. Considerando que, em 2008, a taxa de inflação média anual (de 3,3%, com um máximo de 4,0% no Verão de 2008) constitui a taxa mais elevada registada desde a introdução do euro e que a inflação baixou subsequentemente para taxas negativas no Verão de 2009,
D. Considerando que o défice médio das administrações públicas na zona do euro aumentou de 0,6% do PIB em 2007 para 1,9% em 2008 e que, até meados de Outubro de 2009, vinte Estados-Membros foram objecto de processos por défice excessivo,
E. Considerando que o rácio médio da dívida pública na zona do euro aumentou de 66,2% do PIB no final de 2007 para 69,6% no final de 2008, prevendo-se entretanto que este rácio aumente ainda mais nos próximos anos,
F. Considerando que, em 2008, a taxa de câmbio do euro em relação ao dólar sofreu fortes flutuações, com um máximo de 1,60 dólares em Julho, registando 1,25 dólares em Outubro e um aumento subsequente para 1,50 dólares em Outubro de 2009,
G. Considerando que o BCE não alterou as suas taxas de juro no primeiro semestre de 2008 aumentando-as, em Julho de 2008, em 25 pontos base para 4, 25% e baixando-as, de forma constante, para 2,5%, durante o último trimestre de 2008, e para 1% em 2009,
H. Considerando que, para fazer face à crise financeira, o BCE alargou consideravelmente a provisão de liquidez aos bancos na zona do euro e adoptou um certo número de medidas não convencionais para obviar às perturbações observadas nos mercados financeiros; considerando que facilidades de provisão de liquidez semelhantes foram concedidas apenas a um certo número de Estados-Membros não pertencentes à zona do euro,
Preâmbulo
1. Deseja à Eslováquia as boas-vindas à zona do euro e toma nota do êxito desta adesão;
2. Recorda que ser membro da União Europeia constitui uma condição prévia para a adesão ao euro;
3. Regozija-se com o facto de o Tratado de Lisboa conferir ao BCE o estatuto de instituição da UE; considera que tal vem reforçar a responsabilidade do Parlamento, na medida em que constitui a principal instituição através da qual o BCE é responsável perante os cidadãos europeus;
A resposta do BCE à crise financeira
4. Afirma que o BCE teve de tomar, em 2008, algumas das decisões políticas mais difíceis desde a sua criação devido à crise económica e financeira dramática com repercussões de vasto alcance;
5. Constata que as projecções económicas do BCE, a exemplo das projecções do FMI e de outras instituições internacionais, não conseguiram prever a gravidade da recessão em 2008;
6. Verifica que o BCE continuou a reagir à crise financeira, ajudando os Estados-Membros a manterem e a alargarem a sua provisão de liquidez às instituições de crédito; recomenda ao BCE que alargue tal provisão de liquidez para além da zona do euro, a fim de apoiar os Estados-Membros que tenham sido mais duramente afectados pela crise financeira;
7. Manifesta-se desiludido com o facto de alguns bancos comerciais não terem repercutido as reduções das taxas de juro junto dos seus clientes e de isto ter sido particularmente notório quando as taxas de juro do BCE atingiram os seus níveis mais baixos de sempre;
8. Regozija-se com o facto de o BCE ter alargado a sua abordagem habitual em matéria de política monetária e adoptado uma série de medidas especiais, como sejam a orientação da provisão de liquidez para a procura real ou a disponibilização de liquidez por períodos mais longos;
9. Constata que as reduções das taxas de juro operadas pelo BCE foram menos radicais do que as operadas por outros bancos centrais, como sejam a Reserva Federal norte-americana e o Banco de Inglaterra no Reino Unido, e do que as esperadas por muitos observadores económicos na altura;
10. Manifesta a sua decepção pelo facto de a liquidez suplementar injectada pelo BCE não ter debelado de forma suficiente o colapso do crédito enfrentado pela indústria, nomeadamente pelas pequenas e médias empresas, e de alguns bancos terem aproveitado essa liquidez para melhorarem a suas margens e cobrirem as suas perdas;
11. Lamenta que os Estados-Membros não tenham seguido a recomendação do BCE de fazerem acompanhar os seus planos de apoio aos bancos de condições aprovadas em comum a nível europeu no que diz respeito à distribuição de dividendos e de bónus, ao apoio à actividade económica, nomeadamente às PME, e às transacções efectuadas em paraísos fiscais;
12. Partilha do ponto de vista do BCE segundo o qual a complexidade crescente dos instrumentos financeiros, juntamente com uma certa falta de transparência das instituições financeiras, a falha dos reguladores e lacunas na regulação do mercado financeiro, contribuiu para a existência de um risco sistémico acrescido; considera ainda que esta situação contribuiu para uma crescente falta de confiança do público nas instituições financeiras;
13. Interpela o BCE sobre a possibilidade de estabelecer uma câmara de compensação, nomeadamente para contratos de swap de riscos de incumprimento (CDS), no interior da zona do euro;
14. Chama a atenção do BCE para os riscos de eclosão de novas bolhas especulativas, nomeadamente no mercado das matérias-primas; convida-o a alertar rapidamente os governos;
15. Está de acordo com o BCE em relação ao facto de ser necessário extrair lições da crise; considera, em particular, que é necessário melhorar a gestão dos riscos e da liquidez no seio do sistema financeiro e reforçar a transparência dos mercados e das instituições financeiras, a fim de evitar que uma crise deste tipo se repita; recorda que os desequilíbrios globais ligados às flutuações cambiais entre o euro e moedas de países terceiros, como o dólar americano e o renminbi-yuan, também devem ser tratados, a fim de evitar crises financeiras no futuro;
16. Felicita as medidas adoptadas pelo BCE tendo em vista propor uma "estratégia de saída" pormenorizada da política de relaxamento monetário, a qual deverá ser implementada quando chegar a altura; insiste no facto de uma planificação e uma coordenação das políticas dos diferentes Estados-Membros serem essenciais para este efeito; neste contexto, regozija-se com o facto de grande parte das medidas deixar automaticamente de se aplicar se a situação económica melhorar de forma constante;
17. Recomenda que toda e qualquer tentativa de aumento das taxas de juro seja efectuada com a maior prudência possível, de molde a não comprometer o crescimento económico;
18. Considera que os Estados-Membros devem manter a aplicação das suas actuais medidas de incentivo fiscal para proteger o emprego, encorajar o investimento e estimular o crescimento, e que devem suspender essas medidas quando houver um regresso sustentável ao crescimento, altura em que deverão tratar do défice público excessivo;
Estabilidade económica e monetária
19. Partilha das preocupações do BCE quanto às divergências observadas entre as economias da zona do euro e à forma como a crise afectou diferentes Estados, nomeadamente os que já padeciam de deficiências a nível estrutural, que registam custos unitários do trabalho elevados e que acusam défices na balança corrente e se encontram endividados;
20. Convida os Estados-Membros da zona do euro a tomarem nota do facto de a participação na referida zona não poder ser considerada como um fim em si mesmo caso se queira que a União Económica e Monetária exista realmente, e sublinha a necessidade de proceder a reformas; acrescenta que a não realização das referidas reformas pode comprometer a credibilidade e a sustentabilidade do Pacto de Estabilidade e Crescimento;
Governação e tomada de decisões
21. Salienta que, num período marcado por uma elevada volatilidade das taxas de câmbio, o euro reforçou-se, nomeadamente, em relação ao dólar americano e ao renminbi-yuan, e manifesta a sua preocupação pelo facto de esta situação poder ter efeitos prejudiciais para a competitividade da zona do euro;
22. Recomenda que o BCE reforce a transparência do seu trabalho, a fim de aumentar a sua legitimidade e previsibilidade, nomeadamente através da publicação das actas das reuniões do Conselho de Governadores, à semelhança do Sistema da Reserva Federal dos EUA, do Banco de Inglaterra e do Banco do Japão; considera que tal transparência também é necessária no que diz respeito aos modelos internos utilizados para avaliar as garantias ilíquidas e à valoração atribuída a títulos específicos apresentados como garantia;
23. Reafirma o seu apoio ao diálogo monetário numa base trimestral entre o Parlamento e o BCE; considera ainda que o diálogo constitui um importante mecanismo para supervisionar o funcionamento do BCE e contribuir para a salvaguarda da sua responsabilidade e transparência perante o público;
24. Destaca a independência do BCE, para a qual contribui o processo de nomeação dos membros da sua Comissão Executiva; considera que esta apenas pode ser reforçada pela utilização do novo estatuto jurídico conferido ao BCE pelo Tratado de Lisboa e pelos Estatutos do BCE em vigor para submeter os candidatos propostos pelo Conselho a uma votação de aprovação pelo Parlamento Europeu;
25. Compromete-se a constituir, no seu âmbito, um comité de selecção, composto por peritos externos, que permita, em 2010, seleccionar vários candidatos para o cargo de membros da Comissão Executiva, após o que os candidatos seleccionados deverão apresentar-se para uma audição perante a Comissão dos Assuntos Económicos e Monetários do Parlamento Europeu, a qual deverá formalizar o papel consultivo do Parlamento Europeu na avaliação dos candidatos; este procedimento deverá conduzir à aprovação, pelo plenário do Parlamento Europeu, de uma resolução a transmitir ao Conselho antes de este transmitir essa recomendação aos Governos dos Estados‑Membros;
26. Considera que a crise demonstrou que os mercados estavam expostos a riscos sistémicos; saúda a proposta relativa à instituição de um Comité Europeu do Risco Sistémico (CERS), que dará rapidamente o alerta em caso de riscos e de desequilíbrios nos mercados financeiros; nota que o CERS tem de reagir rápida e eficazmente a riscos sistémicos incipientes; Salienta que deverá ser definida de forma qualitativa a noção de "risco sistémico", para permitir o bom funcionamento do CERS; exorta, por conseguinte, o BCE a estabelecer modelos e definições claros e, de uma forma mais geral, a conceder pleno apoio a um funcionamento eficaz do CERS; acrescenta que nenhuma nova tarefa atribuída ao BCE no que diz respeito ao CERS deverá, de forma alguma, comprometer a independência do BCE;
27. Toma nota do papel desempenhado pelo Eurogrupo no contexto do desenvolvimento de uma coordenação mais estreita entre as políticas económicas na zona do euro; regozija-se, consequentemente, com o facto de o Tratado de Lisboa conferir personalidade jurídica ao Eurogrupo; recomenda igualmente que o BCE continue a participar plenamente nas reuniões informais entre os membros do Eurogrupo;
A dimensão externa do euro
28. Congratula-se com o facto de o euro ter contribuído para aumentar a prestação de serviços financeiros transfronteiras na zona do euro e, consequentemente, para um mercado monetário altamente integrado;
29. Nota que o estatuto do euro como moeda internacional continua a aumentar, contando para 26,5% das reservas globais externas em divisas detidas no fim de 2008;
30. Considera que o crescente estatuto internacional do euro trará vantagens e responsabilidades na cena mundial; considera que este facto continuará a incentivar Estados-Membros não participantes na zona do euro a aderirem a esta última;
31. Considera que o Parlamento deverá trabalhar com o BCE e as outras instituições da UE no sentido de continuar a reforçar o papel da zona do euro na cena monetária e financeira mundial;
32. Considera que o processo que tornou possível a adopção do euro deverá inspirar a União Europeia quando esta se exprimir sobre o futuro do sistema monetário internacional;
33. Considera que o BCE, os Bancos Centrais nacionais e o Conselho de Governadores devem reconhecer e respeitar a sua responsabilidade social perante o seu pessoal e perante a sociedade, e ter o mais possível em conta o memorando sobre os aspectos sociais estabelecido pelo Comité Permanente dos Sindicatos dos Bancos Centrais Europeus;
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34. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão, ao Eurogrupo e ao Banco Central Europeu.
- [1] JO C 138 de 4.5.1998, p. 177.
EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS
O presente relatório examina o Relatório anual 2008 do Banco Central Europeu (BCE) e o desempenho deste último na sua resposta continuada à crise financeira. Uma vez que o BCE publicou o seu relatório em Abril de 2009 e que as eleições europeias de Junho atrasaram a elaboração do relatório do Parlamento, existe, inevitavelmente, alguma sobreposição relativamente às políticas do BCE em 2009. O presente relatório centra-se principalmente sobre o desempenho do BCE em relação à crise financeira e económica, às disparidades entre economias da eurozona exacerbadas pela crise, assim como sobre a estratégia de saída de crise do BCE e a governação deste último.
Dois anos de conturbação financeira
A crise financeira e económica é testemunha do pior declínio económico global desde os anos 30. Com efeito, desde a sua criação, os últimos dois anos foram os mais difíceis para o BCE no seu papel de garante monetário e da estabilidade dos preços. Após um período relativamente benigno de crescimento económico na maior parte da Europa, durante os anos 90 e no início desta década, o BCE foi forçado a reagir à crise que sacudiu o mundo financeiro e político até ao seu cerne. A maioria das economias dos Estados-Membros foram sujeitas a "testes de esforço", não através de modelos de simulação (como frequentemente foi feito antes), mas em tempo real e com consequências bastante reais.
Em 2008, o crescimento do PIB no conjunto da zona euro foi de apenas 0,7% e, na altura em que o presente relatório for aprovado em plenário, já teremos visto estatísticas assustadoras de uma contracção significativa da economia, juntamente com défices orçamentais anormais e previsões de um regresso muito ligeiro ao crescimento em 2010 e 2011.
A maioria dos Estados-Membros estão a registar défices orçamentais crescentes e uma dívida pública que se avoluma. As previsões económicas da Comissão, de Maio de 2009, antecipam para o conjunto da eurozona défices orçamentais na média de 5,3% e uma dívida pública média de 77,7%, valores que, por sua vez, se espera virem ainda a aumentar em 2010. Apesar dos pacotes de incentivos lançados pelos Estados-Membros no conjunto da Europa, o desemprego, nomeadamente entre a população com menos de 25 anos, aumentou acentuadamente e é provável que a situação se venha a repetir em 2010. Entretanto, porém, a grande maioria do aumento da dívida pública e dos défices resulta de uma diminuição das receitas fiscais e de um aumento das despesas da segurança social, juntamente com medidas de incentivo orçamental avaliadas num montante equivalente a cerca de 1,5% do PIB da UE. Poderá demorar vários anos até que estes défices, provocados pela crise financeira, regressem aos níveis de 2006 e 2007.
A resposta do BCE à crise
A função principal do BCE é, nos termos dos Tratados da UE, manter a "estabilidade dos preços". Apesar de a inflação se ter situado muito acima do limite máximo de 2% que o BCE impôs a si próprio, tendo atingido um pico de 4% em Junho e Julho de 2008, daí em diante as respectivas taxas declinaram e registam agora valores negativos.
Paralelamente a este desempenho económico, o BCE, após ter decidido, em Junho de 2008, aumentar de 25 pontos de base as taxas de juro, passando-as para 4,25%, reduziu-as de novo por incrementos, de 4,25% para 2%, no período de Outubro de 2008 a Janeiro de 2009, e mais ainda para 1%, em Maio de 2009, numa tentativa de revigorar a concessão de crédito.
Por vezes pode-se pensar que as reduções das taxas de juro não foram tão radicais como as realizadas por outros bancos centrais, nomeadamente, a Reserva Federal dos EUA e o Banco de Inglaterra. Com efeito, esta perspectiva foi partilhada por muitos observadores políticos e económicos.
Não obstante, o principal papel do BCE durante a crise foi expandir significativamente as disposições em matéria de liquidez que estabeleceu em 2007, com medidas não harmonizadas, a fim de assistir os Estados-Membros. O BCE adaptou o seu quadro de gestão de liquidez, nomeadamente através da utilização de leilões de taxa fixa com atribuição completa nas suas operações de mercado, do estreitamento temporário do corredor formado pelas taxas das suas facilidades permanentes, do alargamento da lista de activos elegíveis como garantias e da prestação de liquidez em divisas externas, em cooperação com outros bancos centrais.
Efectivamente, pode-se mostrar que a redução das taxas de juro centrais do BCE, em combinação com as alterações do quadro operacional, contribuíram para reduzir o custo de financiamento da economia no seu conjunto. Porém, a realidade é que, apesar de a expansão da liquidez por parte do BCE ter evitado o colapso de muitas instituições, essa liquidez nem sempre passou para os clientes, particularmente em detrimento das pequenas e médias empresas, em que a necessidade de recuperação económica persistirá. Em vez disso, muitos bancos utilizaram a liquidez para reforçar as suas próprias posições.
Divergência crescente na eurozona
Apesar de muitos economistas terem esperado que a União Monetária viesse a reforçar o empenhamento dos Estados-Membros em mais reformas estruturais para reforçar a convergência entre estes últimos, a realidade mostrou que, em muitos Estados-Membros, tal não é o caso.
Com efeito, os países da zona do euro que, no início da recessão, tinham níveis de défice e dívida pública superiores aos estabelecidos no Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC) foram, consequentemente, os que menos possibilidades tiveram de lançar os desesperadamente necessários pacotes de incentivos para preservar postos de trabalho, investimentos e actividades económicas.
Não obstante, a crise afectou todos e cada um dos Estados-Membros e, na altura em que o presente relatório foi elaborado, vinte Estados-Membros haviam já violado os limites estabelecidos no PEC. Circunstâncias excepcionais merecem políticas excepcionais por parte da Comissão no que diz respeito à observância do PEC, a fim de evitar tolher a recuperação económica, o que teria então um impacto devastador em matéria de desemprego e de crescimento económico.
Estratégia de saída da crise
Mais tarde ou mais cedo, será necessário pôr em acção uma "estratégia de saída" planeada, com os Estados-Membros a abandonarem gradualmente os seus pacotes de incentivos e o BCE a recuperar a liquidez, de aproximadamente 700 mil milhões de euros, que concedeu aos bancos a título de medidas não harmonizadas. O relator considera que tal "estratégia de saída", tanto no domínio monetário, como orçamental, deverá ser executada apenas após podermos constatar um relançamento económico sustentável e convincente, e solicita que haja coordenação entre os Estados-Membros no que diz respeito ao calendário de implementação de tais estratégias.
A Comissão deverá permitir aos Estados-Membros a prossecução dos seus pacotes de incentivos, sem os obrigar a reverter este processo através de um retorno precoce e excessivamente entusiasta aos parâmetros do PEC.
Não obstante, um dos desafios da eurozona na sua segunda década de existência deverá consistir em revigorar o processo de reformas estruturais, a fim de tornar a união económica num sucesso comparável à união monetária. De facto, só através de reformas estruturais combinadas com um crescimento económico vigoroso será possível saldar os enormes défices e dívidas existentes.
O papel do euro
Um dos maiores benefícios do euro é a forma como contribuiu para aumentar a prestação de serviços financeiros a nível transfronteiras, reduzindo os custos, aumentando a competitividade e criando um mercado monetário europeu altamente integrado.
De igual modo, o euro manteve o seu estatuto de moeda internacional. Cerca de 25% das reservas mundiais em divisas são denominadas em euros. Este estatuto internacional continuará a incentivar os Estados-Membros que actualmente não participam na zona do euro, assim como países terceiros, a procurarem a adesão à UEM.
Governação e tomada de decisões
O relator considera, como os relatores precedentes, que o diálogo monetário trimestral entre o Parlamento e o BCE, iniciado pelo Presidente Duisenberg e prosseguido pelo Presidente Trichet, constitui um marco importante no nosso calendário parlamentar e contribui para a responsabilização do BCE perante o Parlamento.
As medidas que visam complementar esta responsabilização estão estabelecidas nos próprios Estatutos do BCE, nomeadamente no n.º 2 do seu artigo 11.º, segundo o qual:
"o Presidente, o Vice-Presidente e os vogais da Comissão Executiva são nomeados... de comum acordo, pelos governos dos Estados-Membros, a nível de Chefes de Estado e de Governo, sob recomendação do Conselho e após este ter consultado o Parlamento Europeu e o Conselho do BCE."
O relator gostaria que este procedimento fosse reforçado, especificamente através do requisito de que os candidatos propostos pelo Conselho também fossem sujeitos a votação pelo Parlamento.
Reformar a arquitectura financeira da UE
Finalmente, a crise mostrou que os mercados nem sempre se autocorrigem e que são vulneráveis ao risco sistémico. A este respeito, o relator congratula-se com as propostas que actualmente estão a ser examinadas pelo Parlamento, incluindo a revisão da arquitectura financeira da UE e, nomeadamente, o estabelecimento de um Conselho Europeu do Risco Sistémico (CERS) - um organismo concebido para agir como monitor e emitir um alerta rápido contra quaisquer riscos ou desequilíbrios sistémicos nos mercados financeiros. Neste contexto, a prioridade mais imediata é estabelecer uma definição qualitativa de "risco sistémico", a fim de permitir um funcionamento efectivo do CERS.
Acima de tudo, há que extrair as lições da crise. Devemos restabelecer a confiança nas instituições financeiras, o que poderá ser conseguido através de medidas que incluam maior transparência e melhor gestão de riscos. Temos que assegurar que uma crise destas dimensões não se repita mais.
RESULTADO DA VOTAÇÃO FINAL EM COMISSÃO
Data de aprovação |
27.1.2010 |
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Resultado da votação final |
+: –: 0: |
35 2 3 |
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Deputados presentes no momento da votação final |
Burkhard Balz, Sharon Bowles, Udo Bullmann, Pascal Canfin, Nikolaos Chountis, George Sabin Cutaş, Rachida Dati, Leonardo Domenici, Derk Jan Eppink, Diogo Feio, Markus Ferber, Elisa Ferreira, Vicky Ford, José Manuel García-Margallo y Marfil, Jean-Paul Gauzès, Sven Giegold, Sylvie Goulard, Enikő Győri, Liem Hoang Ngoc, Othmar Karas, Wolf Klinz, Jürgen Klute, Werner Langen, Astrid Lulling, Arlene McCarthy, Ivari Padar, Alfredo Pallone, Anni Podimata, Antolín Sánchez Presedo, Olle Schmidt, Edward Scicluna, Peter Simon, Peter Skinner, Theodor Dumitru Stolojan, Ivo Strejček, Kay Swinburne, Marianne Thyssen, Ramon Tremosa i Balcells |
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Suplente(s) presente(s) no momento da votação final |
Sophie Briard Auconie, Danuta Jazłowiecka, Arturs Krišjānis Kariņš, Philippe Lamberts |
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