RELATÓRIO sobre a responsabilidade das empresas por violações graves dos direitos humanos em países terceiros
19.7.2016 - (2015/2315(INI))
Comissão dos Assuntos Externos
Relator: Ignazio Corrao
PROPOSTA DE RESOLUÇÃO DO PARLAMENTO EUROPEU
sobre a responsabilidade das empresas por violações graves dos direitos humanos em países terceiros
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta a Declaração Universal dos Direitos do Homem (DUDH) e outros tratados e instrumentos das Nações Unidas em matéria de direitos humanos, em particular o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais, adotados em Nova Iorque, em 16 de dezembro de 1966,
– Tendo em conta a Convenção Europeia dos Direitos do Homem,
– Tendo em conta o artigo 47.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia,
– Tendo em conta os artigos 2.º, 3.º, 8.º, 21.º e 23.º do Tratado da União Europeia (TUE),
– Tendo em conta os artigos 81.º, 82.º, 83.º, 114.º, 208.º e 352.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE),
– Tendo em conta o Quadro Estratégico da UE em matéria direitos humanos e democracia, adotado pelo Conselho dos Negócios Estrangeiros em 25 de junho de 2012[1], e o Plano de Ação para os Direitos Humanos e a Democracia (2015-2019), adotado pelo Conselho em 20 de julho de 2015[2],
– Tendo em conta as diretrizes da União Europeia relativas aos direitos humanos,
– Tendo em conta as suas resoluções de urgência sobre casos de violação dos direitos humanos, da democracia e do Estado de direito,
– Tendo em conta a sua Resolução, de 17 de dezembro de 2015, sobre o Relatório Anual sobre os Direitos Humanos e a Democracia no Mundo (2014) e a política da União nesta matéria[3],
– Tendo em conta a sua Resolução, de 12 de março de 2015, sobre o Relatório Anual sobre os Direitos Humanos e a Democracia no Mundo em 2013 e a política da União Europeia nesta matéria[4],
– Tendo em conta a sua Resolução, de 8 de outubro de 2013, sobre a corrupção nos setores público e privado: o impacto nos direitos humanos em países terceiros[5],
– Tendo em conta a sua Resolução, de 6 de fevereiro de 2013, sobre a responsabilidade social das empresas: comportamento responsável e transparente das empresas e crescimento sustentável, de 28 de janeiro de 2013[6],
– Tendo em conta a sua Resolução, de 6 de fevereiro de 2013, sobre a responsabilidade social das empresas: promoção dos interesses da sociedade e via para uma retoma sustentável e inclusiva[7],
– Tendo em conta a resolução do Conselho dos Direitos do Homem das Nações Unidas (CDHNU), de 26 de junho de 2014, segundo a qual o CDHNU decidiu criar um grupo de trabalho intergovernamental aberto e cujo mandato será elaborar um instrumento internacional, juridicamente vinculativo, para regulamentar, no âmbito dos direitos humanos, as atividades de empresas transnacionais e de outros tipos de empresas[8],
– Tendo em conta os Princípios Orientadores das Nações Unidas sobre Empresas e Direitos Humanos, as orientações revistas da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Económicos (OCDE) sobre as Empresas Multinacionais, a Declaração Tripartida de Princípios da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre as Empresas Multinacionais e a Política Social, o quadro definido pelo Comité Internacional de Informação Integrada (IIRC), os dez princípios do Pacto Global das Nações Unidas e a norma ISO 26000 da Organização Internacional de Normalização sobre responsabilidade social, bem como o Manual para as PME europeias do Gabinete Europeu do Artesanato e das PME para a Normalização sobre a norma de orientação ISO 26000 no domínio da responsabilidade social,
– Tendo em conta o projeto «Concretização de valor a longo termo para empresas e investidores»[9], atualmente em execução no quadro da iniciativa das Nações Unidas «Princípios para o Investimento Responsável» e do Pacto Global das Nações Unidas,
– Tendo em conta a recomendação do Conselho da Europa aos seus Estados membros sobre direitos humanos e empresas, adotada em 2 de março de 2016[10],
– Tendo em conta a Comunicação da Comissão sobre uma nova estratégia da UE para o período de 2011-2014[11], o Livro Verde da Comissão intitulado «Promover um quadro europeu para a responsabilidade social das empresas»[12] e a definição de responsabilidade social das empresas (RSE) aí referida, bem como as respetivas comunicações de seguimento em 2006 e 2011,
– Tendo em conta as obrigações extraterritoriais para os Estados resultantes dos Princípios de Maastricht,
– Tendo em conta o artigo 52.º do seu Regimento,
– Tendo em conta o relatório da Comissão dos Assuntos Externos (A8-0243/2016),
A. Considerando que a UE assenta nos valores do respeito pela dignidade humana, pela liberdade, pela democracia, pela igualdade, pelo Estado de direito e pelos direitos humanos, incluindo os direitos das pessoas pertencentes a minorias, e que a sua ação na cena internacional (incluindo a política comercial) «assenta [nestes] princípios»;
B. Considerando que os Princípios Orientadores das Nações Unidas sobre Empresas e Direitos Humanos se aplicam a todos os Estados e a todas as empresas, sejam de caráter transnacional ou outro, independentemente da sua dimensão, setor, localização, propriedade e estrutura, embora o controlo eficaz e os mecanismos de sanção continuem a ser um desafio em termos da aplicação a nível mundial dos Princípios Orientadores das Nações Unidas; que, nas suas resoluções de 6 de fevereiro de 2013, o Parlamento Europeu chamou a atenção para as caraterísticas especiais das PME, que as políticas de RSE devem ter em devida conta, bem como para a necessidade de uma abordagem flexível em matéria de RSE, adaptada ao seu potencial;
C. Considerando que o Pacto Global das Nações Unidas[13], constituído por dez princípios, convida as empresas a adotar, apoiar e aplicar, dentro da sua esfera de influência, um conjunto de valores fundamentais em matéria de direitos humanos, normas laborais, ambiente e luta contra a corrupção, comprometendo-se em relação a esses valores e integrando-os nas suas atividades empresariais numa base voluntária;
D. Considerando que as empresas são um dos principais agentes da globalização económica, dos serviços financeiros e do comércio internacional e que lhes é exigido o respeito por toda a legislação aplicável e pelos tratados internacionais vigentes, e o respeito pelos direitos humanos; que o comércio e os direitos humanos podem reforçar-se mutuamente, e que a comunidade empresarial, ao mesmo tempo que é obrigada a respeitar os direitos humanos, pode também ter um papel importante a desempenhar na oferta de incentivos positivos para promover os direitos humanos, a democracia, as normas ambientais e a responsabilidade social;
E. Considerando que, todavia, estas empresas podem, por vezes, causar violações dos direitos humanos, ou contribuir para estas, e afetar os direitos dos grupos vulneráveis, como as minorias, as populações indígenas, as mulheres e as crianças, ou contribuir para problemas ambientais;
F. Considerando que as violações dos direitos humanos cometidas por empresas são um motivo de preocupação a nível mundial, e que todas as empresas do mundo têm o dever de respeitar os direitos humanos, ao mesmo tempo que as instituições europeias têm como dever principal regulamentar a responsabilidade das empresas que têm uma ligação com a UE;
G. Considerando que muitas empresas ativas a nível internacional, sejam ou não europeias, que operam em países terceiros, têm operações comerciais importantes na Europa ou estão aí sediadas, e/ou são detidas por empresas europeias, possuem ativos ou bens na Europa, controlam outras empresas na Europa, recebem investimentos ou utilizam os serviços financeiros de instituições na Europa; que a globalização e o desenvolvimento da tecnologia levaram as empresas a externalizar atividades para prestadores locais ou a utilizar serviços na sua cadeia de abastecimento e produção, produzidos ou prestados por outras empresas em muitos países diferentes e, por conseguinte, em muitas jurisdições diferentes, com diferentes ordenamentos jurídicos, níveis e normas de proteção em matéria de direitos humanos, e com diferentes níveis de aplicação;
H. Considerando que a proteção dos direitos humanos deve ser uma prioridade para os Estados-Membros e para a própria União; que a UE tem desempenhado um papel de liderança na negociação e execução de uma série de iniciativas de responsabilidade mundial, que estão aliadas à promoção e ao respeito pelas normas internacionais; que as violações dos direitos humanos exigem uma reparação eficaz; que é necessário um sistema de recurso mais eficaz e equitativo, no âmbito do Direito quer nacional, quer internacional, para lidar com as violações dos direitos humanos cometidas por empresas;
I. Considerando que continua a não existir uma abordagem holística global para a responsabilidade das empresas em matéria de violações dos direitos humanos; que as vítimas de violações dos direitos humanos que impliquem empresas internacionais enfrentam uma série de obstáculos para obterem uma reparação judicial, incluindo obstáculos processuais em termos de admissibilidade e divulgação de provas, custas judiciais frequentemente proibitivas e uma ausência de normas de responsabilidade claras relativamente ao envolvimento de empresas em violações dos direitos humanos;
Empresas e direitos humanos
1. Observa que a globalização e a internacionalização crescentes das atividades empresariais e das cadeias de abastecimento tornarão mais importante o papel que as empresas desempenham no que toca a assegurar o respeito pelos direitos humanos e criarão uma situação em que as normas, as regras e a cooperação a nível internacional são cruciais para evitar as violações dos direitos humanos em países terceiros; manifesta profunda preocupação pelos casos de violações dos direitos humanos em países terceiros, nomeadamente em resultado de algumas decisões de gestão de sociedades e empresas da UE, bem como de indivíduos, intervenientes não estatais e Estados; relembra aos intervenientes empresariais a sua responsabilidade de respeitar os direitos humanos nas suas operações mundiais, independentemente de onde os utilizadores estão localizados e de o Estado de acolhimento cumprir ou não as suas próprias obrigações em matéria de direitos humanos;
2. Observa que a rápida evolução na tecnologia exige uma atenção imediata e um quadro jurídico adequado;
3. Reitera a necessidade urgente de agir de forma continuada, eficaz e coerente a todos os níveis, incluindo no plano nacional, europeu e internacional, a fim de abordar eficazmente as violações de direitos humanos cometidas por empresas internacionais quando ocorram e de resolver os problemas jurídicos decorrentes da dimensão extraterritorial das empresas e do seu comportamento, e as incertezas associadas quanto à atribuição da responsabilidade pelas violações dos direitos humanos;
Contexto internacional
4. Congratula-se com a adoção dos Princípios Orientadores das Nações Unidas e apoia a sua aplicação em todo o mundo; salienta que os Princípios Orientadores das Nações Unidas foram aprovados unanimemente pela ONU, com o total apoio dos Estados-Membros da UE, da Organização Internacional do Trabalho e da Câmara de Comércio Internacional, incluindo o apoio ao conceito de uma «combinação inteligente» de ações regulamentares e voluntárias; solicita que os Princípios Orientadores das Nações Unidas e outras normas internacionais em matéria de responsabilidade social das empresas sejam invocados sistematicamente pelos representantes da União Europeia nos diálogos sobre direitos humanos com os países terceiros; exorta, além disso, as empresas a aplicarem os Princípios Orientadores das Nações Unidas, nomeadamente através da definição de políticas de diligência e de salvaguardas de gestão dos riscos, bem como da concessão de reparações efetivas nos casos em que as suas atividades tenham causado ou contribuído para um impacto negativo nos direitos humanos;
5. Reconhece o Pacto Global das Nações Unidas, a norma ISO 26000 sobre responsabilidade social, a Declaração Tripartida de Princípios da OIT sobre empresas multinacionais e política social e as orientações da OCDE para as empresas multinacionais como instrumentos que podem mobilizar a responsabilidade no âmbito das atividades comerciais das empresas;
Apelos dirigidos às empresas sobre o seu dever de respeitar os direitos humanos
6. Insta as empresas, europeias ou não, a aplicarem o dever de diligência em matéria de direitos humanos e a integrarem os seus resultados nas políticas e procedimentos internos, afetando recursos e responsabilidades em consonância e assegurando a sua devida aplicação; salienta que este aspeto exige a afetação de recursos suficientes; sublinha que a transparência e a comunicação em relação às medidas tomadas para evitar violações dos direitos humanos em países terceiros são cruciais para possibilitar um controlo democrático adequado e permitir aos consumidores fazer escolhas com base em factos;
7. Reconhece a grande importância da responsabilidade social das empresas (RSE) e congratula-se com a utilização crescente de instrumentos baseados na RSE e o compromisso voluntário por parte de empresas; sublinha com veemência, no entanto, que o respeito pelos direitos humanos é um dever moral e uma obrigação jurídica para as empresas e os seus órgãos de gestão, e deve ser integrado numa perspetiva económica a longo prazo, onde quer que operem e independentemente da sua dimensão ou setor industrial; reconhece que as obrigações jurídicas específicas para as empresas devem ser bem adaptadas de acordo com a sua dimensão e as suas capacidades e que a UE e os Estados-Membros devem perseguir o objetivo de alcançar a melhor proteção dos direitos humanos através das medidas mais eficazes e não apenas sobrecarregando as empresas com normas formais de caráter administrativo e burocrático;
8. Considera ser necessário prever uma flexibilidade suficiente na aplicação das orientações RSE, a fim de atender às necessidades específicas de cada Estado-Membro e região e, em particular, no que diz respeito às capacidades das PME; saúda a cooperação ativa da Comissão, com a participação do Parlamento e do Conselho, a par de outros organismos internacionais, no sentido de alcançar uma convergência fundamental das iniciativas em matéria de RSE a longo prazo e o intercâmbio e a promoção de boas práticas empresariais em matéria de RSE, bem como de avançar com as diretrizes estabelecidas na ISO 26000 da Organização Internacional de Normalização, de modo a garantir uma única definição mundial, coerente e transparente de RSE; exorta a Comissão a contribuir efetivamente para a orientação e coordenação das políticas dos Estados-Membros, minimizando, assim, o risco de custos adicionais para as empresas que operam em mais do que um Estado-Membro, em resultado de disposições divergentes;
9. Reitera a necessidade de atender à especificidade das PME, cujas atividades se situam essencialmente a nível local e regional e no quadro de setores específicos; considera, por conseguinte, fundamental que as políticas da União em matéria de RSE, incluindo os planos de ação nacionais sobre a RSE, respeitem os requisitos das PME, sejam consentâneas com o princípio de «pensar primeiro em pequena escala» e reconheçam a abordagem informal e intuitiva das PME relativamente à RSE; rejeita toda e qualquer iniciativa que possa provocar encargos adicionais de caráter administrativo ou financeiro para as PME e manifesta apoio a medidas que permitam às PME levar a cabo ações conjuntas;
10. Recorda que, se se entender que as empresas causaram ou contribuíram para causar danos, estas devem assumir a responsabilidade moral mas também jurídica, e devem prever processos de recurso efetivo para as pessoas e as comunidades afetadas ou participar nos mesmos; observa que estes processos incluem restituição, indemnização, reabilitação e garantias de não repetição;
11. Congratula-se com a prática de integrar a responsabilidade de respeitar os direitos humanos nos requisitos contratuais vinculativos entre as empresas e os seus clientes e fornecedores, sejam estes empresas ou particulares; observa que esses requisitos podem, na maior parte dos casos, ser executados pela via judicial;
Apelos dirigidos aos Estados-Membros sobre o seu dever de proteger os direitos humanos
12. Acolhe favoravelmente o trabalho iniciado para a elaboração de um Tratado das Nações Unidas sobre empresas e direitos humanos, com caráter vinculativo; lamenta qualquer comportamento obstrutivo quanto a este processo e insta a UE e os Estados-Membros a participarem de forma construtiva nestas negociações;
13. Recorda os papéis distintos mas complementares dos Estados e das empresas no que diz respeito à proteção dos direitos humanos; recorda que os Estados, agindo no quadro da sua jurisdição, têm o dever de proteger os direitos humanos, incluindo contra os abusos cometidos por empresas, mesmo que estas operem em países terceiros; recorda com veemência que, quando ocorrem violações dos direitos humanos, os Estados devem garantir o acesso a um recurso efetivo por parte das vítimas; recorda, neste contexto, que o respeito pelos direitos humanos por parte de países terceiros, incluindo a garantia de um recurso efetivo para as pessoas sob a sua jurisdição, constitui um elemento essencial das relações externas da UE com esses países;
14. Apela à Comissão e aos Estados-Membros para que garantam uma coerência política em matéria de empresas e direitos humanos a todos os níveis: no âmbito das diferentes instituições da UE, entre as instituições e entre a UE e os seus Estados-Membros e, em especial no que se refere à política comercial da União; insta a Comissão e os Estados‑Membros a incluir expressamente o princípio acima mencionado em todos os tratados que subscrevam, em conformidade com os compromissos internacionais assumidos em matéria de direitos humanos; observa que, para tal, será necessária uma cooperação intensiva entre diferentes direções-gerais da Comissão e o Serviço Europeu para a Ação Externa;
15. Apela à UE, aos Estados-Membros, aos países terceiros e a todas as autoridades nacionais e internacionais para que adotem instrumentos vinculativos consagrados à proteção eficaz dos direitos humanos neste domínio, com urgência e de forma tão ampla quanto possível, e que assegurem que todas as obrigações nacionais e internacionais decorrentes da aplicação das normas internacionais supracitadas sejam plenamente aplicadas; manifesta esperança de que os esforços europeus em matéria de RSE possam servir de modelo a outros países; está convicto de que os bancos de desenvolvimento nacionais devem adotar uma postura exemplar no que se refere a um respeito verificável pelos direitos humanos;
16. Insta todos os Estados, incluindo a UE e os Estados-Membros, a aplicarem os Princípios Orientadores das Nações Unidas de forma rápida e robusta, em todos os domínios da sua competência, nomeadamente através da elaboração de planos de ação; lamenta que, não obstante a Comunicação da Comissão de 2011 sobre a responsabilidade social das empresas, nem todos os Estados-Membros tenham adotado políticas ou declarações de RSE que refiram os direitos humanos ou tenham publicado os seus planos em matéria de empresas e direitos humanos, e insta a UE a apresentar o seu plano; convida os Estados-Membros a elaborarem ou a reverem os planos de ação nacionais, em conformidade com as orientações transmitidas pelo Grupo de Trabalho das Nações Unidas sobre Empresas e Direitos Humanos; solicita que a elaboração destes planos se baseie em avaliações de referência que identifiquem lacunas nas leis, na criação de mecanismos para controlar a aplicação e a eficácia dos planos, nas políticas e na prática, bem como numa participação significativa das partes interessadas;
17. Exorta os Estados-Membros a legislarem de um modo coerente, holístico, eficaz e vinculativo, a fim de cumprir a sua obrigação de prevenir, investigar, punir e reparar as violações dos direitos humanos cometidas pelas empresas sob a sua jurisdição, incluindo em países terceiros;
18. Insta a UE e os Estados-Membros a definirem normas claras que prevejam que as empresas estabelecidas no seu território ou sob a sua jurisdição têm de respeitar os direitos humanos durante as suas atividades, em todos os países e contextos em que operem, e no respeitante às suas relações comerciais, incluindo fora da UE; considera que as empresas, segundo a sua dimensão e capacidades, e incluindo os bancos e outras instituições financeiras ou credoras ativas em países terceiros, devem assegurar que dispõem de sistemas para avaliar os riscos e atenuar os eventuais impactos negativos em matéria de direitos humanos, trabalho, proteção do ambiente e aspetos ligados a catástrofes das suas atividades e cadeias de valor; insta os Estados-Membros a avaliarem periodicamente a adequação de tais leis e a colmatarem quaisquer lacunas;
19. Recorda que os recentes desenvolvimentos legislativos à escala nacional, tais como a cláusula relativa à transparência nas cadeias de abastecimento da Lei britânica sobre a escravatura moderna e a Lei francesa sobre o dever de diligência, representam avanços importantes para um dever de diligência obrigatório em matéria de direitos humanos, e que a UE já adotou medidas neste sentido (Regulamento da UE sobre a madeira, Diretiva da UE sobre a publicação de informações não financeiras, proposta da Comissão de uma Diretiva relativa ao sistema da União para a autocertificação, no quadro do dever de diligência nas cadeias de aprovisionamento, dos importadores responsáveis de estanho, de tungsténio e de tântalo, dos seus minérios e de ouro provenientes de zonas de conflito e de alto risco); insta a Comissão e os Estados-Membros, bem como todos os Estados, a basearem-se neste modelo no tocante à introdução do dever de diligência obrigatório em matéria de direitos humanos;
20. Salienta que o dever de diligência obrigatório em matéria de direitos humanos deverá seguir os passos preconizados pelos Princípios Orientadores das Nações Unidas e ser norteado por determinados princípios gerais relativos à identificação proativa dos riscos para os direitos humanos, à elaboração de planos de ação rigorosos e concretos com vista a prevenir ou mitigar estes riscos, à resposta adequada aos abusos conhecidos e à transparência; salienta que as políticas devem ter em conta a dimensão das empresas e as respetivas capacidades de adaptação, com especial atenção às microempresas e às pequenas e médias empresas; sublinha que os intervenientes pertinentes devem ser consultados durante todas as fases do processo e que todas as informações relevantes específicas dos projetos ou dos investimentos devem ser divulgadas às partes interessadas;
21. Insta todos os Estados, e nomeadamente a UE e os Estados-Membros, a definirem como prioridade imediata de ação o estabelecimento de um dever de diligência obrigatório em matéria de direitos humanos aplicável às empresas que são propriedade ou estão sob controlo do Estado, e/ou que recebam apoio substancial e serviços de agências estatais ou de instituições europeias, bem como às empresas que forneçam bens ou serviços através de contratos obtidos por concursos públicos;
22. Solicita à UE e aos Estados-Membros que abordem as empresas utilizadoras de matérias-primas ou bens no quadro do atual processo legislativo, que possam ser originários de zonas de conflito (por exemplo, os chamados «minerais de conflito»), para que divulguem a sua origem e utilização desses materiais através da rotulagem dos produtos, facultem informações completas sobre o conteúdo e a origem dos produtos, solicitando aos seus fornecedores, europeus ou outros, que divulguem esses dados; insta ao apoio relativamente o dever de diligência obrigatório quanto aos chamados minerais de conflitos para os importadores de minerais e metais de «3TG» (estanho, tungsténio, tântalo e ouro), com base no Guia da OCDE sobre o dever de diligência para cadeias de abastecimento responsável de minerais provenientes de zonas de conflito e de alto risco; apela para que se pondere a inclusão do dever de diligência na cadeia de abastecimento neste processo;
23. Regista com satisfação que, na sequência da revisão da Diretiva Contabilística 2014/95/UE em vigor no que se refere à divulgação de informações não financeiras e de informações sobre a diversidade, as grandes empresas e grupos terão de, a partir de 2017, divulgar informações sobre as suas políticas, riscos e resultados no que se refere ao respeito pelos direitos humanos e questões conexas; insta os Estados-Membros a aplicarem integralmente a Diretiva Contabilística Revista dentro do prazo aprovado, incluindo a criação de mecanismos eficazes e adequados que assegurem a conformidade das empresas com os requisitos de informação; insta a Comissão a elaborar orientações claras para as empresas sobre os novos requisitos de publicação de informações não financeiras; recomenda que estas orientações incluam e desenvolvam os elementos essenciais mínimos a divulgar para uma compreensão precisa e abrangente sobre os principais riscos e impactos em matéria de direitos humanos das atividades das empresas e da cadeia de valor mundial das empresas;
Acesso a um recurso efetivo
24. Convida a Comissão a efetuar um exame aprofundado, em consulta com todas as partes interessadas, nomeadamente a sociedade civil e as empresas, dos atuais entraves à justiça nos processos levados aos tribunais dos Estados-Membros por alegadas violações dos direitos humanos cometidas no estrangeiro por empresas sediadas na UE; realça que esta avaliação deve ser orientada para a identificação e a promoção da adoção de medidas eficazes destinadas a eliminar ou diminuir estes entraves;
25. Insta os Estados-Membros a tomarem todas as medidas adequadas, em cooperação com parceiros internacionais, para assegurar, através de meios judiciais, administrativos, legislativos ou outros meios apropriados, que, se essas violações dos direitos humanos ocorrerem, as pessoas afetadas tenham acesso a um recurso efetivo quando uma empresa sediada nos Estados em causa detiver, dirigir ou controlar as empresas responsáveis por violações dos direitos humanos em países terceiros; exorta os referidos Estados a tomarem as medidas adequadas para eliminar os obstáculos de natureza jurídica, prática e outros suscetíveis de conduzir a uma recusa de acesso a vias de recurso e a preverem as vias processuais adequadas a fim de permitir o acesso à justiça às pessoas afetadas de países terceiros, tanto por via civil como por via penal; exorta os Estados, para este efeito, a romper o véu da personalidade jurídica, que possa dissimular a propriedade efetiva de determinadas empresas;
26. Insta a UE e todos os Estados, em particular os Estados-Membros da UE a reduzirem os encargos financeiros e processuais nos litígios civis; congratula-se com a Recomendação 2013/396/UE da Comissão, adotada em 11 de junho de 2013[14], e incentiva todos os Estados-Membros a dar-lhe cumprimento; considera que o instrumento proporcionado pela referida recomendação pode potencialmente diminuir os custos do litígio para as vítimas de violações dos direitos humanos; incentiva a que este tipo de recurso seja aplicável a todas as vítimas de violações dos direitos humanos, inclusive em países terceiros, e apela à definição de normas comuns para permitir que as associações representativas instaurem ações em nome das alegadas vítimas;
Apelos dirigidos à Comissão
27. Está ciente de que a «responsabilidade das empresas» não é um problema isolado, mas que abrange um amplo leque de diferentes domínios jurídicos e políticos;
28. Congratula-se com as iniciativas não vinculativas do setor privado em prol da gestão responsável da cadeia de abastecimento introduzidas pelos serviços da Comissão, mas sublinha que as iniciativas do setor privado não são, por si só, suficientes; solicita a adoção urgente de normas vinculativas e executórias, e respetivas sanções, e de mecanismos de controlo independentes;
29. Congratula-se com o novo regulamento relativo ao sistema de preferências generalizadas (SPG +), que entrou em vigor em 1 de janeiro de 2014[15], na qualidade de instrumento chave da política comercial da UE para promover os direitos humanos e laborais, a proteção do ambiente e a boa governação nos países em desenvolvimento vulneráveis; congratula-se, em particular, com o rigoroso e sistemático mecanismo de controlo do SPG + e insta a que a ênfase seja colocada na aplicação efetiva, a nível nacional, dos acordos enumerados na Convenção;
30. Sublinha que a UE e os seus Estados-Membros devem proteger os direitos humanos; observa que, de uma forma geral, os acordos de comércio podem contribuir para reforçar o sistema de comércio mundial baseado em regras e que o comércio deve evoluir a par com os valores, tal como recentemente referido pela Comissão na sua nova estratégia comercial intitulada «Comércio para Todos»; relembra a necessidade de avaliar os eventuais impactos nos direitos humanos dos acordos de comércio e investimento e de incorporar neste quadro todas as cláusulas e salvaguardas necessárias em matéria de direitos humanos, capazes de atenuar e eliminar os riscos identificados de efeitos sobre os direitos humanos; solicita à Comissão que adote todas as medidas necessárias e possíveis para agir de uma forma holística e coerente, e insta com veemência à inclusão sistemática nos acordos de comércio e investimento de normas sobre a responsabilidade das empresas por violações dos direitos humanos, a aplicar a nível nacional, e de referências às orientações e aos princípios reconhecidos a nível internacional;
31. Insta a Comissão a apresentar, com caráter de urgência, uma proposta legislativa para o controlo das exportações de produtos de dupla utilização, uma vez que as tecnologias produzidas por empresas europeias continuam a causar violações dos direitos humanos em todo o mundo;
32. Insta à criação de um corpus legislativo coerente, incluindo normas que rejam o acesso à justiça, a jurisdição, o reconhecimento e a execução de decisões judiciais em matéria civil e comercial, a legislação aplicável, bem como o auxílio judiciário em situações transfronteiras que envolvam países terceiros;
33. Incentiva à reflexão sobre a extensão das regras de competência nos termos do Regulamento Bruxelas I[16] aos demandados de países terceiros em ações contra as empresas que tenham uma relação clara com um Estado-Membro entre outros – pelo facto de estarem domiciliadas ou de terem atividades substanciais aí, ou porque o seu principal local de atividade é na UE – ou empresas relativamente às quais a UE seja um mercado essencial de vendas;
34. Solicita uma melhoria do acesso às provas através de procedimentos reforçados quanto à respetiva divulgação;
35. Recorda que, quando as violações dos direitos humanos são cometidas pelas empresas, estas ações pode implicar uma responsabilidade penal individual e exige que os autores de tais crimes sejam objeto de ação penal, ao nível apropriado; insta os Estados-Membros a eliminarem os obstáculos jurídicos, processuais e práticos que impedem as autoridades judiciais de investigar e instaurar ações contra as empresas e os seus representantes implicados em crimes relacionados com violações dos direitos humanos;
36. Insta o Conselho e a Comissão a agirem em conformidade com o artigo 83.º do TFUE, a fim de estabelecer regras mínimas relativas à definição das infrações penais e das sanções em domínios de criminalidade particularmente grave com dimensão transfronteiriça e relacionados com graves violações dos direitos humanos cometidas por empresas em países terceiros, tendo em conta a natureza e o impacto dessas infrações e a especial necessidade de as combater a partir de uma base comum;
37. Sublinha que o respeito integral pelos direitos humanos na cadeia de produção é fundamental e não uma mera questão de escolha dos consumidores; solicita a criação, a nível da UE, de um rótulo de identificação para produtos certificados que indique o respeito pelos direitos humanos, ao qual as empresas adeririam de forma voluntária, com o objetivo de aumentar a sensibilização entre produtores e consumidores, controlado por uma instância independente regida por regras estritas e investida de poderes de inspeção, visando verificar e certificar que não foram cometidos abusos em nenhuma das fases da cadeia de produção do bem em causa; considera que a UE e os Estados-Membros devem promover este rótulo; recomenda igualmente a concessão de benefícios aos produtos que obtenham o rótulo em causa;
38. Insta a Comissão a lançar uma campanha à escala da UE, apresentando e promovendo o rótulo para produtos que ateste o respeito pelos direitos humanos, apelando aos consumidores europeus para que optem por utilizar os produtos e as empresas que obtenham este rótulo e incentivando ainda todas as sociedades e empresas a adotarem boas práticas relativamente ao respeito pelos direitos humanos e questões conexas;
39. Convida a Comissão e os Estados-Membros a apresentarem relatórios periódicos sobre as medidas tomadas no sentido de assegurar uma proteção eficaz dos direitos humanos no contexto das atividades empresariais, os resultados alcançados, as lacunas que subsistem nessa proteção e medidas futuras recomendadas para as colmatar;
40. Encarrega o seu Presidente de transmitir o presente relatório ao Conselho, à Comissão, à Vice-Presidente da Comissão/Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, ao Representante Especial da União Europeia para os Direitos Humanos e ao Serviço Europeu para a Ação Externa.
- [1] http://data.consilium.europa.eu/doc/document/ST-11855-2012-INIT/pt/pdf
- [2] http://data.consilium.europa.eu/doc/document/ST-10897-2015-INIT/pt/pdf
- [3] Textos Aprovados, P8_TA(2015)0470.
- [4] Textos Aprovados, P8_TA(2015)0076.
- [5] Textos Aprovados, P7_TA(2013)0394.
- [6] Textos Aprovados, P7_TA(2013)0049.
- [7] Textos Aprovados, P7_TA(2013)0050.
- [8] http://daccess-dds-ny.un.org/doc/UNDOC/GEN/G14/082/52/PDF/G1408252.pdf?OpenElement
- [9] http://www.unpri.org/whatsnew/realising-long-term-value-for-companies-and-investors/
- [10] https://wcd.coe.int/ViewDoc.jsp?p=&Ref=CM/Rec(2016)3&Language=lanEnglish&Ver=original&BackColorInternet=DBDCF2&BackColorIntranet=FDC864&BackColorLogged=FDC864&direct=true
- [11] COM(2011)0681.
- [12] COM(2001)0366.
- [13] https://www.unglobalcompact.org/what-is-gc/mission/principles
- [14] JO L 201 de 26.7.2013, p. 60.
- [15] http://ec.europa.eu/trade/policy/countries-and-regions/development/generalised-scheme-of-preferences/
- [16] http://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=URISERV%3Al33054
RESULTADO DA VOTAÇÃO FINAL NA COMISSÃO COMPETENTE QUANTO À MATÉRIA DE FUNDO
Data de aprovação |
12.7.2016 |
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Resultado da votação final |
+: –: 0: |
62 5 1 |
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Deputados presentes no momento da votação final |
Lars Adaktusson, Michèle Alliot-Marie, Nikos Androulakis, Francisco Assis, Petras Auštrevičius, Amjad Bashir, Mario Borghezio, Elmar Brok, Klaus Buchner, James Carver, Lorenzo Cesa, Javier Couso Permuy, Andi Cristea, Mark Demesmaeker, Georgios Epitideios, Knut Fleckenstein, Anna Elżbieta Fotyga, Eugen Freund, Michael Gahler, Iveta Grigule, Sandra Kalniete, Manolis Kefalogiannis, Afzal Khan, Janusz Korwin-Mikke, Andrey Kovatchev, Eduard Kukan, Ilhan Kyuchyuk, Arne Lietz, Barbara Lochbihler, Sabine Lösing, Andrejs Mamikins, David McAllister, Tamás Meszerics, Francisco José Millán Mon, Javier Nart, Pier Antonio Panzeri, Demetris Papadakis, Ioan Mircea Paşcu, Vincent Peillon, Alojz Peterle, Tonino Picula, Cristian Dan Preda, Jozo Radoš, Sofia Sakorafa, Jacek Saryusz-Wolski, Jaromír Štětina, Charles Tannock, Ivo Vajgl, Geoffrey Van Orden, Hilde Vautmans, Boris Zala |
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Suplentes presentes no momento da votação final |
Laima Liucija Andrikienė, Andrzej Grzyb, Takis Hadjigeorgiou, Marek Jurek, Soraya Post, Tokia Saïfi, Igor Šoltes, Eleni Theocharous, Traian Ungureanu, Bodil Valero, Marie-Christine Vergiat, Janusz Zemke |
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Suplentes (art. 200.º, n.º 2) presentes no momento da votação final |
Beatriz Becerra Basterrechea, Therese Comodini Cachia, Ignazio Corrao, Edouard Ferrand, Liliana Rodrigues |
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