Proposta de resolução - B6-0476/2007Proposta de resolução
B6-0476/2007

PROPOSTA DE RESOLUÇÃO

12.11.2007

apresentada na sequência de uma declaração da Comissão
nos termos do nº 2 do artigo 103º do Regimento, por
sobre a resposta da UE a situações de fragilidade nos países em desenvolvimento

Processo : 2007/2662(RSP)
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B6-0476/2007
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B6-0476/2007
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B6‑0476/2007

Resolução do Parlamento Europeu sobre a resposta da UE a situações de fragilidade nos países em desenvolvimento

O Parlamento Europeu,

–  Tendo em conta a Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social e ao Comité das Regiões intitulada “Resposta da UE a situações de fragilidade - Intervir em contextos difíceis, em prol do desenvolvimento sustentável, da estabilidade e da paz”, de 25 de Outubro de 2007[1],

–  Tendo em conta o Consenso Europeu sobre o Desenvolvimento,

–  Tendo em conta o Regulamento (CE) nº 1905/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de Dezembro de 2006, que institui um instrumento de financiamento da cooperação para o desenvolvimento, denominado o “Instrumento da Cooperação para o Desenvolvimento”

–  Tendo em conta o Acordo de Cotonu,

–  Tendo em conta a "Política da União Africana de Reconstrução e Desenvolvimento Pós‑Conflito", adoptada por 52 Estados Membros aquando da Cimeira da UA realizada em Banjul, em Julho de 2006,

–  Tendo em conta os “Dez princípios do bom empenhamento dos doares em Estados frágeis e situações de fragilidade”, do Grupo dos Estados Frágeis do CAD da OCDE, aprovado na reunião de Alto Nível do CAD, realizada em 3 e 4 de Abril de 2007, em Paris;

–  Tendo em conta a Resolução 60/1 da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 24 de Outubro de 2005, sobre a responsabilidade de proteger, designadamente os seus números 138-140,

–  Tendo em conta o artigo 103º do seu Regimento,

A.  Considerando que, desde a década de 1990, os Estados que não têm capacidade para desempenhar as suas funções “tradicionais” e promover o desenvolvimento e que dispõem de instituições débeis foram designados “Estados frágeis” pelo Banco Mundial e pela comunidade internacional empenhada no desenvolvimento,

B.  Considerando que a fragilidade do Estado é mais um conceito empírico do que um conceito normativo e constitui uma variável dependente e não uma condição original; considerando que uma situação de fragilidade existe antes ou depois de uma crise; considerando que a responsabilidade de determinar em que momento os Estados deixam de ser “frágeis” deve incumbir aos cidadãos,

C.  Considerando que, apesar de não existir uma definição operacional inequívoca do conceito, é possível identificar os Estados que se encontram em situações de fragilidade e que o número de Estados considerados "frágeis” pelo Banco Mundial quase duplicou, passando de 14 para 26 entre 2000 e 2006, sendo que 14 desses Estados se situam na África subsaariana,

D.  Considerando que é essencial compreender os factores externos e internos da fragilidade, a fim de fornecer assistência e capacitação a esses Estados, em benefício directo dos seus cidadãos e em prol da paz e da prosperidade regional e global,

E.  Considerando que diferentes formas de fragilidade (por exemplo, propensa a conflitos, a chamada "maldição dos recursos", má governação, enclave) exigem diferentes tipos de intervenção; considerando que um determinado país poderá ser afectado por diferentes tipos de fragilidade, tornando assim difícil uma categorização e uma acção específica,

F.  Considerando que a resposta a situações de fragilidade é um processo de longo prazo e requer um empenhamento contínuo e de longo prazo tanto por parte dos países afectados como por parte da comunidade internacional,

G.  Considerando que a União Africana reconhece que a reconstrução é uma questão essencialmente política e não técnica; salientando, por conseguinte, a necessidade de construir uma autoridade de Estado legítima para permitir uma governação baseada no consenso, uma acção determinada em prol de grupos vulneráveis e o reforço das capacidades locais no âmbito de uma distribuição equitativa do poder e de uma obrigação mútua de prestação de contas[2],

H.  Considerando que as situações de fragilidade radicam frequentemente na pobreza e em condições de vida precárias, conduzindo, nos casos mais extremos, ao colapso do Estado e à insegurança permanente; considerando que a ausência de protecção e de direitos dos cidadãos nos países afectados requer uma acção por parte da UE e da comunidade internacional e deve estar no centro dessa acção,

I.  Considerando que não existe ainda uma partilha suficiente de experiências em matéria de construção do Estado entre os países e entre os doadores, o que impede que sejam retirados os ensinamentos,

J.  Considerando que é necessário um mecanismo duplo de prestação de contas, a saber, entre os doadores e os países beneficiários e entre estes e os seus povos,

K.  Considerando que a existência de múltiplos instrumentos de financiamento comporta o risco de duplicação ou de não atribuição de recursos e torna a prestação de contas e a participação ainda mais difíceis no caso das sociedades já enfraquecidas,

1.  Considera que a fragilidade é um desafio complexo do desenvolvimento e salienta a necessidade de uma agenda bem definida e coerente em matéria de fragilidade, baseada no princípio de “não causar danos”, ou seja, adaptada à situação e que tenha em conta considerações de longo prazo e coordene os múltiplos objectivos e abordagens das diferentes partes interessadas, à luz do objectivo principal e global de redução da pobreza e consecução dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio;

2.  Congratula-se com a preparação de uma resposta da UE a situações de fragilidade e salienta a necessidade de envolver os parlamentos em todas as fases desta estratégia;

3.  Afirma que um sistema político democrático e estável, que promova o desenvolvimento, o Estado de direito, a protecção dos direitos humanos, a boa governação e uma prevenção de conflitos pacífica é a melhor forma de sair da fragilidade e caminhar em direcção a instituições abertas e operantes e a um processo decisório eficaz e equitativo;

4.  Salienta que a programação e as acções em situações de fragilidade devem ser abrangentes e coerentes e centrar-se nas pessoas e no desenvolvimento sustentável dos países afectados; considera que os instrumentos e mecanismos existentes devem adoptar uma abordagem sensível à fragilidade e concorda inteiramente que o potencial dos Documentos de Estratégia por País e dos programas temáticos, preparados em parceria para prevenir a fragilidade, deve ser reforçado;

5.  Salienta que os principais elementos da agenda em matéria de fragilidade devem ser os três seguintes, colocando a tónica na luta contra a pobreza e na prevenção: promover a segurança humana, melhorar o desenvolvimento e assegurar a paz; salienta igualmente a necessidade de implementar estes elementos de forma coerente no terreno;

6.  Considera que o planeamento estratégico de longo prazo deve ser coordenado com a execução de programas no terreno, que se devem manter flexíveis e adaptáveis, e deve ser capaz de responder ao contexto do país; por esse motivo, solicita à Comissão que promova o desenvolvimento a longo prazo, mas forneça igualmente a curto prazo serviços básicos, como sejam a saúde e a educação;

7.  Salienta que os programas de desenvolvimento em situações de fragilidade devem obedecer aos mesmos princípios que quaisquer outros programas de desenvolvimento, ou seja, apropriação, parceria, obrigação mútua de prestação de contas e sustentabilidade;

8.  Solicita à Comissão que apoie um diálogo político e de paz inclusivo e processos de reconciliação e reforce a participação das comunidades e da sociedade civil em todos os aspectos do ciclo de recuperação e das estratégias de desenvolvimento;

9.  Salienta que uma paz sustentável apenas pode ser alcançada se for feita justiça, e esta for perceptível, em particular, no que se refere aos crimes de guerra e crimes contra a humanidade; neste contexto, solicita à Comissão que apoie o reforço dos sistemas legais e judiciais de Estados frágeis, a fim de assegurar que os responsáveis por sérios crimes contra a humanidade sejam levados a tribunal, mas também para permitir o avanço paralelo de iniciativas em prol da justiça e da reconciliação;

10.  Apela ao reforço dos direitos legais individuais, incluindo o direito à propriedade dos mais pobres; solicita à Comissão que apoie os esforços envidados nos países em desenvolvimento para diversificar a produção agrícola, por forma a lhes permitir sair de uma situação de economias altamente vulneráveis assentes em monoculturas e, deste modo, evitar situações de fragilidade resultantes do colapso económico;

11.  Reitera a necessidade de a acção da UE em matéria de desenvolvimento e ajuda humanitária colocar uma ênfase acrescida em medidas de prevenção, alerta precoce e análises de risco, a fim de evitar catástrofes, quer produzidas pelo Homem quer naturais, que dão origem a situações de fragilidade;

12.  Afirma que um modelo abrangente de fragilidade e desenvolvimento deve ter em conta as iniciativas existentes a nível local, regional e continental, designadamente a recente Política da União Africana de Reconstrução e Desenvolvimento Pós‑Conflito, a Nova Parceria para o Desenvolvimento da África (NPDA), o Mecanismo Africano de Avaliação pelos Pares e a Carta Africana sobre a Democracia, as Eleições e a Governação; insta, por esse motivo, a Comissão a apoiar os esforços destinados a reforçar a cooperação Sul-Sul neste domínio;

13.  Insta igualmente a Comissão a assegurar que as partes interessadas a nível nacional sejam não só plenamente associadas aos esforços para ultrapassar situações de fragilidade, mas que sua noção e definição de construção do Estado e o seu modelo de Estado sejam igualmente considerados e que seja utilizado o saber local;

14.  Salienta o papel crucial desempenhado pelas mulheres e pelos grupos vulneráveis na promoção do desenvolvimento e da paz e solicita à Comissão que promova a sua capacitação, tendo designadamente em conta as suas necessidades e situações específicas em ambientes de fragilidade;

15.  Congratula-se com o facto de, no âmbito da Estratégia Conjunta UE-África, a UE e a África tencionarem organizar um diálogo sobre o conceito de “situações de fragilidade”, a fim de alcançar uma compreensão comum e acordar as medidas a adoptar, e de este diálogo estar já previsto no Plano de Acção;

16.  Recorda que incumbe a cada Estado individual a responsabilidade de proteger as suas populações contra o genocídio, crimes de guerra, limpezas étnicas e crimes contra a humanidade e que a UE apoia firmemente a responsabilidade de proteger, em conformidade com a Resolução 60/1 da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 24 de Outubro de 2005; salienta que a responsabilidade de proteger inclui o recurso a pressões e ameaças diplomáticas, económicas e legais sistemáticas, sendo a intervenção militar coerciva apenas o último recurso, que deve ser estritamente controlado;

17.  Salienta que a resposta a situações de fragilidade é complexa e requer recursos financeiros e humanos significativos, bem como compromissos de longo prazo; solicita, por esse motivo, à Comissão e aos Estados­Membros que assegurem que estes recursos são disponibilizados de forma suficiente, adequada e previsível e garantam a coerência entre as agências doadoras;

18.  Salienta que o recurso ao apoio orçamental não se adequa a situações de fragilidade, em que as capacidades de auditoria e monitorização são débeis ou inexistentes; solicita, por esse motivo, à Comissão que utilize outras formas de financiamento nessas situações, a não ser que disponha de informações detalhadas sobre a forma como os fundos são aplicados;

19.  Solicita à Comissão que forneça ao Parlamento um mapa dos dadores e dos actores internacionais e do tipo de trabalho que desenvolvem, a fim de permitir monitorizar a utilização óptima dos recursos e instrumentos disponíveis;

20.  Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão, aos Governos dos Estados­Membros, aos Co-Presidentes da Assembleia Parlamentar Paritária ACP-UE e à União Africana.