PROPOSTA DE RESOLUÇÃO
1.9.2008
nos termos do n.º 2 do artigo 103.º do Regimento
por Feleknas Uca, Luisa Morgantini, Gabriele Zimmer e Ilda Figueiredo
em nome do Grupo GUE/NGL
sobre os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM) e a mortalidade materna
Ver igualmente a proposta de resolução comum RC-B6-0377/2008
B6‑0393/2008
Resolução do Parlamento Europeu sobre os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM) e a mortalidade materna
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio, adoptados na Cimeira do Milénio, realizada pelas Nações Unidas em Setembro de 2000,
– Tendo em conta o Relatório da Comissão intitulado "Objectivos de Desenvolvimento do Milénio 2000–2004" (SEC(2004)1379),
– Tendo conta as suas Resoluções de 12 de Abril de 2005, sobre o papel da União Europeia na consecução dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM), e de 20 de Junho de 2007, sobre os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio – balanço intercalar,
– Tendo em conta a Quarta Conferência Mundial sobre as Mulheres, realizada em Pequim, em Setembro de 1995, a Declaração e a Plataforma de Acção adoptadas em Pequim, bem como os ulteriores documentos finais adoptados em sucessivas sessões especiais das Nações Unidas (Pequim +5 e Pequim +10) sobre as novas acções e iniciativas a empreender, a fim de dar aplicação às referidas Declaração e Plataforma de Acção, aprovadas, respectivamente, em 9 de Junho de 2000 e em 11 de Março de 2005,
– Tendo em conta a Declaração Conjunta do Conselho e dos representantes dos Governos dos EstadosMembros reunidos no Conselho, do Parlamento Europeu e da Comissão sobre a política de desenvolvimento da União Europeia, intitulada “ O Consenso Europeu” e assinada em 20 de Dezembro de 2005, bem como o Consenso Europeu sobre a Ajuda Humanitária, de 18 de Dezembro de 2007,
– Tendo em conta os relatórios anuais do Fundo das Nações Unidas para a População sobre a situação da população mundial 2005 e 2006, intitulados "A Promessa de Igualdade, Equidade em matéria de Género, Saúde Reprodutiva e Objectivos de Desenvolvimento do Milénio" e "Passagem para a esperança - mulheres e migrações internacionais”, respectivamente,
– Tendo em conta o Protocolo sobre os Direitos das Mulheres em África, igualmente conhecido sob a denominação “Protocolo de Maputo ”, que entrou em vigor em 26 de Outubro de 2005, e o Plano de Acção de Maputo para a operacionalização do Quadro Político Continental para a saúde sexual e reprodutiva e direitos conexos 2007-2010, adoptado na Sessão Especial da União Africana, em Setembro de 2006,
– Tendo em conta a Conferência Internacional das Nações Unidas sobre População e Desenvolvimento (CNPD) realizada no Cairo, em Setembro de 1994, o Programa de Acção aprovado no Cairo e os documentos finais subsequentes aprovados na sessão especial das Nações Unidas Cairo+5 sobre a adopção de novas medidas de implementação do Programa de Acção adoptado em 1999,
– Tendo em conta a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres, de 3 de Setembro de 1981,
– Tendo em conta o n.º 2 do artigo 103.º do seu Regimento,
A. Considerando que a Assembleia Geral das Nações Unidas incluiu como sub-objectivo, no elenco dos ODM, o acesso universal à saúde reprodutiva atév2015, bem como a redução de 75% da taxa de mortalidade materna até 2015 e que 186 países se comprometeram a cumprir esses objectivos,
B. Considerando que, mau grado esses compromissos, a situação em termos de saúde materna acusou mesmo uma deterioração em algumas regiões/países da Àfrica Subsariana e da Ásia do Sul,
C. Considerando que, anualmente, mais de meio milhão de mulheres morrem durante a gravidez ou aquando do parto e que 99 % dessas mortes têm lugar nos países em desenvolvimento; que, em 20 anos, a taxa verificada na África Subsariana quase não se alterou - uma em cada 16 mulheres perde a vida durante o parto; que a mortalidade materna constitui, por conseguinte, a mais flagrante desigualdade em matéria de saúde observada no mundo,
D. Considerando que as causas de mortalidade materna mais frequentes são as hemorragias, as infecções/septicemia e os abortos praticados em condições inseguras; que cerca de 50 milhões de mulheres recorrem anualmente ao aborto e que 19 milhões de abortos são praticados em condições inseguras; que, de acordo com as estimativas, 68 000 mulheres perdem anualmente a vida na sequência dessas intervenções, enquanto milhões de outras mulheres são afectadas por infecções e outras complicações, como a infertilidade,
E. Considerando que a taxa de mortalidade das mulheres durante o parto continua a ser o indicador mais revelador das disparidades existentes entre ricos e pobres, quer no interior dos países, quer entre eles,
F. Considerando ter sido demonstrado que uma melhoria da saúde das mulheres e da sua situação geral acelera a realização de todos os outros Objectivos de Desenvolvimento do Milénio,
G. Considerando que o G8 adoptou um conjunto de medidas relativas à saúde, que contribuirá para a formação e o recrutamento de 1,5 milhões de profissionais da saúde em África, no intuito de assegurar que 80% das futuras mães sejam acompanhadas por um profissional da saúde durante o parto; que tal engloba o compromisso de elevar a 2,3 o número de profissionais da saúde por 1 000 habitantes em 36 países africanos, nos quais se regista uma situação de penúria; que, todavia, não é feita qualquer referência à atribuição dos 10 mil milhões de dólares norte-americanos, que, segundo activistas da sociedade civil, seriam necessários para salvar anualmente a vida de seis milhões de mães e crianças,
H. Considerando que se registam anualmente 536 000 casos de mortalidade materna (95% dos quais ocorrem em África e na Ásia do Sul) e que, por cada mulher que perde a vida, 20 ou mais mulheres são afectadas por complicações graves, desde infecções crónicas a lesões incapacitantes, designadamente a fístula obstétrica, que poderiam ser facilmente evitadas se existisse um acesso universal a cuidados obstétricos básicos e de emergência e a serviços de saúde reprodutiva,
I. Considerando que os casos de mortalidade materna evitáveis constituem violações do direito à vida das mulheres e das adolescentes e que as causas de mortalidade e de morbilidade maternas podem igualmente conduzir a violações de outros direitos humanos, nomeadamente do direito de controlar e decidir livremente e de modo responsável sobre questões relacionadas com a sexualidade, um acesso à saúde sexual e reprodutiva isento de coerção, discriminação e violência - ou seja, o direito das mulheres ao nível mais elevado possível de saúde física e mental, bem como o direito à não discriminação no tocante ao acesso aos cuidados de saúde básicos,
J. Considerando que o direito à vida, consagrado no artigo 3.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem das Nações Unidas e no Pacto Internacional relativo aos Direitos Políticos e Civis, impõe aos governos a obrigação de protegerem os cidadãos de uma perda de vida evitável, incluindo, especificamente, a mortalidade materna,
K. Considerando que assiste às mulheres o direito à não discriminação em matéria de cuidados de saúde básicos, mas que a amplitude da mortalidade e da morbilidade maternas no mundo patenteia o grave problema da desigualdade e da discriminação sistemática de que são vítimas as mulheres ao longo de toda a sua vida,
L. Considerando que, no quadro da Conferência Internacional sobre Demografia e Desenvolvimento, a comunidade internacional se comprometeu a disponibilizar novos recursos, identificando a "saúde reprodutiva" (incluindo o planeamento familiar e os serviços de saúde materna) como prioridade central dos esforços internacionais em matéria de desenvolvimento,
M. Considerando que, em vez de um aumento do apoio, o total dos financiamentos concedidos por doadores a favor do planeamento familiar é agora muito inferior ao registado em 1994, tendo diminuído de 723 milhões de dólares norte-americanos, em 1995, para 442 milhões em 2004, em termos absolutos,
N. Considerando que a mortalidade materna poderia ser evitada graças à prestação de cuidados maternos adequados, ao acesso a uma contracepção eficaz, bem como ao aborto legal e seguro,
O. Considerando que, apesar da gravidade do problema e da violação dos direitos humanos, os serviços de saúde materna não figuram entre as prioridades da agenda internacional, secundarizados que são pela atenção votada a intervenções específicas de luta contra certas doenças e que as elevadas taxas de VIH contribuíram para a estagnação ou deterioração do progresso na via da redução da mortalidade e da morbilidade maternas,
1. Manifesta a sua profunda preocupação pelo facto de o objectivo relativo à mortalidade materna (ODM 5) se ter afastado extremamente da meta e não estar no bom caminho para ser atingido pelos países em desenvolvimento, em particular na África Subsariana e na Ásia do Sul;
2. Regista que, a par da educação, o empoderamento das mulheres contribui significativamente para a melhoria do ODM 5 sobre a saúde materna, o que constitui um indicador crítico dos progressos gerais em matéria de desenvolvimento;
3. Solicita ao Conselho e à Comissão que, antes da Reunião de Alto Nível das Nações Unidas sobre os ODM, atribuam prioridade a acções destinadas a cumprir o ODM 5 no que se refere a melhorar a saúde materna, cuja importância é crucial para alcançar todos os demais ODM;
4. Insta o Conselho e a Comissão a reduzirem a disparidade observada entre as taxas de mortalidade materna nos países industrializados e nos países em desenvolvimento mercê do aumento do investimento e de acções tendentes a melhorar os recursos humanos no domínio da saúde e de maiores recursos e empenho visando o reforço dos sistemas de saúde e das infra-estruturas básicas de saúde, incluindo dotações destinadas ao acompanhamento, supervisão, funções básicas de saúde pública, acção comunitária e outras funções de apoio necessárias, sobretudo nas zonas rurais dos países em desenvolvimento;
5. Exorta a Comissão e o Conselho a intensificarem os esforços com vista a eliminar a mortalidade e a morbilidade maternas evitáveis através do desenvolvimento, aplicação e avaliação periódica de "roteiros" e planos de acção para a redução dos custos globais decorrentes da mortalidade e da morbilidade maternas, em que seja adoptada uma abordagem sistemática e sustentada, baseada nos direitos humanos e na equidade, adequadamente apoiada e facilitada por mecanismos e financiamentos institucionais sólidos;
6. Exorta a Comissão e o Conselho a desenvolverem indicadores e valores de referência para reduzir a mortalidade materna (incluindo dotações no quadro da APD), bem como a criarem mecanismos de controlo e responsabilização que possam dar origem a uma melhoria constante das políticas e dos programas existentes;
7. Insta a Comissão e o Conselho a alargarem a oferta de serviços de saúde materna no contexto dos cuidados de saúde primários, com base no conceito da escolha informada, na educação sobre a protecção da maternidade, em cuidados pré-natais específicos e eficazes, em programas de nutrição materna e numa assistência ao parto adequada que evite recorrer excessivamente a cesarianas e preveja cuidados obstétricos de emergência, serviços de encaminhamento para complicações relacionadas com a gravidez, o parto e o aborto, cuidados pós-natais e planeamento familiar, incluindo o acesso a contraceptivos eficazes;
8. Insta a Comissão e o Conselho a promoverem medidas e acções tendentes a melhorar o acesso de todas as mulheres a serviços abrangentes em matéria de saúde sexual e reprodutiva e esclarecê-las sobre os seus direitos e sobre os serviços ao seu dispor;
9. Insta a Comissão e o Conselho a garantirem a disponibilidade, acessibilidade, incluindo de ordem financeira, e a boa qualidade dos serviços de saúde reprodutiva, bem como a atribuírem todos os recursos disponíveis às políticas e programas relativos à mortalidade materna;
10. Insta a Comissão e o Conselho a propiciarem formação, recursos e infra-estruturas de promoção de capacidades próprias para um número adequado de parteiras/parteiros qualificados, a fim de garantir a todas as mulheres e adolescentes grávidas o acesso às mesmas;
11. Solicita Conselho e à Comissão que frisem a necessidade de serviços de saúde reprodutiva de carácter abrangente em situações de conflito e de pós-conflito, em especial entre as mulheres deslocadas e apátridas;
12. Insta a Comissão e o Conselho a reforçarem o seu papel de liderança política em matéria de direitos sexuais e de saúde reprodutiva, bem como a aumentarem a respectiva dotação financeira, visando auxiliar os países a alcançarem os ODM, em particular o acesso universal à saúde reprodutiva no quadro do ODM5, e a fazerem da saúde reprodutiva uma prioridade;
13. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão, aos Governos dos EstadosMembros e ao Secretário-Geral das Nações Unidas.