PROPOSTA DE RESOLUÇÃO sobre o Irão
3.2.2010
apresentada nos termos do n.º 2 do artigo 110.º do Regimento
Cornelia Ernst, Helmut Scholz em nome do Grupo GUE/NGL
Ver igualmente a proposta de resolução comum RC-B7-0078/2010
B7‑0086/2009
Resolução do Parlamento Europeu sobre o Irão
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta as eleições presidenciais de 12 de Junho de 2009 e os tumultos subsequentes no Irão,
– Tendo em conta a Resolução adoptada pelo Conselho dos Governadores da Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA) em 27 de Novembro de 2009 sobre a aplicação do Acordo de Salvaguarda do TNP e as disposições pertinentes das Resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas 1737 (2006), 1747 (2007), 1803 (2008) e 1835 (2008) sobre a República Islâmica do Irão,
– Tendo em conta as suas anteriores resoluções sobre o Irão, em particular as de 7 de Maio e de 22 de Outubro de 2009,
– Tendo em conta a Resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 29 de Outubro de 2009, sobre a situação dos direitos humanos na República Islâmica do Irão,
– Tendo em conta a Declaração do Conselho Europeu de 10 e 11 de Dezembro de 2009,
– Tendo em conta a quarta Reunião Interparlamentar PE-Irão, cuja realização, inicialmente marcada para Teerão, de 9 a 12 de Dezembro de 2007, foi cancelada pelo Irão,
– Tendo em conta o n.º 2 do artigo 110.º do seu Regimento,
Democracia e Direitos Humanos
A. Considerando que há sérios indícios de que as eleições presidenciais de Junho foram marcadas por fraudes maciças, o que resultou num vasto movimento de protesto (o chamado "Movimento Verde”) com manifestações gigantescas dentro e fora do Irão, que prosseguiram nos últimos meses,
B. Considerando que as forças de segurança do Irão - a Guarda Revolucionária, a milícia Basij e a polícia - reagiram com uma severa repressão, procedendo à detenção arbitrária de milhares de manifestantes e dissidentes pacíficos, incluindo estudantes e universitários, militantes dos direitos da mulher, advogados, jornalistas, detentores de blogs, eclesiastas e eminentes defensores dos direitos humanos, num esforço manifesto para intimidar os críticos e sufocar a dissidência,
C. Considerando, além disso, que as forças de segurança intensificaram o assédio sistemático praticado contra os membros de minorias religiosas, como os Baha'i e os Sunitas, e têm realizado uma campanha de detenções e execuções arbitrárias contra os Curdos, os Azeris, os Baluques, e a sociedade civil e militantes políticos árabes;
D. Considerando que dúzias de manifestantes morreram na sequência de ataques das forças de segurança ou em detenção, que milhares de pessoas foram detidas e que cerca de 300 activistas ainda estão na prisão; considerando que muitas das pessoas detidas terão sido espancadas e torturadas e, em alguns casos, terão sido objecto de violência sexual em prisões e centros de detenção secretos; considerando que centenas de iranianos que participaram em manifestações terão deixado o país por receio de represálias e procuram desesperadamente um local seguro nos países vizinhos e na Europa;
E. Considerando que, segundo um inquérito parlamentar realizado no início de 2010, o Procurador adjunto Saeed Mortazavi foi directamente responsável pela morte, por tortura e não assistência, de pelo menos três detidos na prisão de Kahrizak;
F. Considerando que, em 28 de Janeiro de 2010, Mohammad Reza Ali-Zamani e Arash Rahmanipour foram executados, e que estas foram as primeiras execuções relacionadas por fontes oficiais com o movimento de contestação, não obstante o facto de um dos dois, se não ambos, se encontrar já preso no momento das eleições, e considerando ainda que, segundo se afirma, pelo menos nove pessoas foram condenadas à morte por alegadas ligações ao Movimento Verde,
G. Considerando que, desde o início de Agosto, as instâncias judiciárias organizaram processos espectaculares para o julgamento de centenas de reformadores e activistas de renome, que terão sido obrigados a confissões públicas na televisão, do que resultou, para alguns, a condenação a longas penas de prisão e mesmo à morte,
H. Considerando que, em 27 de Dezembro, último dia do rito Ashura, Ali Mousavi, de 35 anos, sobrinho de Mir Hossein Mousavi, o principal candidato da oposição nas eleições presidenciais de Junho, foi morto a tiro e deliberadamente atropelado por um carro, o que leva a crer que foi alvo de um assassinato destinado a servir de forte advertência ao seu tio,
I. Considerando que o físico Masoud Ali Mohammadi foi assassinado pela explosão de uma bomba, o que, para muitos, constituiu um aviso aos professores e estudantes universitários, pois Masoud Ali Mohammadi terá desempenhado um papel importante na mobilização do apoio público de 400 outros cientistas ao líder da oposição, Mir Hossein Moussavi, incentivando simultaneamente os seus alunos a participar em manifestações pacíficas após as eleições de Junho,
J. Considerando que, após as manifestações massivas de 27 de Dezembro, o Irão acusou as potências ocidentais de fomentar a agitação, expulsou dois diplomatas britânicos, deteve um diplomata sueco durante 24 horas e acusou pessoal da Embaixada alemã de apoiar activamente o movimento de protesto,
K. Considerando que, após as eleições, as autoridades iranianas causaram grandes e frequentes perturbações nas redes de rádio e televisão internacionais, bloquearam muitas páginas Internet internacionais, nomeadamente Facebook e Twitter, bem como páginas Internet locais da oposição e serviços de telefonia móvel em Teerão, o que provocou igualmente problemas de transmissão nas redes de outros países do Médio Oriente e mesmo na Europa,
L. Considerando que empresas europeias e russas têm fornecido ao Irão os necessários dispositivos de filtragem e de bloqueio, alguns dos quais podem representar um risco para a saúde da população que vive nas proximidades das instalações,
Questão nuclear
M. Considerando que, em violação das obrigações decorrentes do Tratado de Não-Proliferação Nuclear, o Irão construiu clandestinamente uma instalação de enriquecimento de Qom, tendo informado a AIEA da sua existência muito tempo após o início da construção, e que esta violação das regras dá lugar a especulações quanto à possibilidade de existirem outras instalações nucleares secretas e mina ainda mais a confiança nas garantias dadas pelo Irão sobre o carácter puramente civil do seu programa nuclear,
N. Considerando que, no interesse de encontrar uma solução diplomática para a questão do programa nuclear do Irão, a UE, os Estados Unidos, a China e a Rússia propuseram um acordo, sob os auspícios da AIEA, que previa o envio do urânio enriquecido do Irão para a Rússia e a França para ser transformado em barras de combustível para manter o reactor de investigação médica de Teerão em funcionamento,
O. Considerando que, na sequência da rejeição desta proposta pelo Irão, o Conselho de Segurança da ONU tem vindo a debater o reforço das sanções contra o Irão,
Democracia e Direitos Humanos
1. Manifesta a sua preocupação quanto ao facto de a presumível fraude generalizada durante as eleições presidenciais no Irão, em Junho de 2009, não ter suscitado a realização de uma investigação séria pelo Parlamento ou pelo Líder Supremo Khamenei, e considera que a legitimidade do mandato do Presidente Ahmadinejad está gravemente comprometida, apesar da sua confirmação pelo Líder Supremo Khamenei;
2. Manifesta a sua admiração pela coragem de dezenas de milhares de iranianos que continuam a arriscar as suas carreiras profissionais e vidas, ao apelarem ao reforço da liberdade e dos direitos democráticos na República Islâmica do Irão;
3. Lamenta profundamente que o Governo o Parlamento iranianos sejam, ao que parece, incapazes de responder de forma construtiva às reivindicações legítimas de uma geração jovem, instruída e dinâmica de iranianos cujas esperanças de desenvolvimento económico e social são, há demasiado tempo, abafadas;
4. Condena veementemente os ataques sistemáticos e brutais que as forças da segurança cometem contra aqueles que se manifestam pacificamente e criticam o Governo, bem como o encerramento de jornais e o encerramento forçado de gabinetes de organizações que defendem os direitos humanos;
5. Solicita às autoridades iranianas que libertem imediatamente todas as pessoas que foram detidas por exercerem pacificamente seu direito à liberdade de expressão, de associação e de reunião, e que abram inquéritos e instaurem processos contra os funcionários do governo e os membros das forças de segurança responsáveis pelo assassinato, actos de violência e tortura contra familiares de dissidentes, manifestantes e prisioneiros;
6. Reitera os seus apelos ao poder judicial iraniano para que declare uma moratória à pena de morte e proíba inequivocamente as execuções de menores;
7. Solicita às autoridades iranianas que ponham termo imediato à prática da transmissão de julgamentos pela televisão e insta o Parlamento iraniano a alterarem os elementos da lei iraniana que permitem que o governo negue direitos a um processo justo, nomeadamente o acesso dos acusados a uma representação legal adequada;
8. Condena os esforços das autoridades iranianas para censurar a imprensa escrita, causar interferências na rádio e na televisão, por exemplo, na BBC, e bloquear a Internet, e exorta a UE e os seus Estados-Membros examinarem as repercussões internacionais destes métodos no âmbito da União Internacional das Telecomunicações (UIT),
9. Critica veementemente as empresas internacionais e, nomeadamente, a Nokia / Siemens, por ter fornecido às autoridades iranianas a censura e a tecnologia de vigilância necessárias, tendo, assim, contribuído para a perseguição e a detenção de dissidentes iranianos;
Questão nuclear
10. Lamenta profundamente o facto de o governo iraniano ter voltado a rejeitar todas as tentativas de acordo sobre a questão nuclear e que o governo de Ahmedinejad pretenda usar a questão para desviar a atenção da crise interna do país;
11. Solicita ao Irão e aos países do Médio Oriente que estejam a pensar investir em energia nuclear que não repitam os erros de muitos Estados-Membros da UE, ao apoiarem uma tecnologia perigosa e antiquada; apela, pelo contrário, a estes países para que desenvolvam todas as opções modernas das tecnologias de energias renováveis, eficiência energética e métodos de conservação;
12. Insiste numa resolução política pacífica do diferendo sobre os programas nucleares do Irão; reafirma a sua oposição a qualquer acção militar ou ameaça de uso da força e alerta para o facto de uma eventual acção militar poder conduzir a um agravamento da crise na região; manifesta a sua séria preocupação sobre o reforço da presença militar dos Estados Unidos na região;
13. Solicita a prossecução de esforços para se chegar a uma solução negociada, global e equitativa da questão nuclear iraniana, com base no reconhecimento do direito do Irão a levar a cabo actividades nucleares para fins pacíficos e em garantias verificáveis fornecidas por este país quanto ao carácter pacífico do seu programa nuclear; manifesta a sua firme convicção de que o diálogo e a diplomacia podem fornecer soluções realistas e a longo prazo para a questão iraniana, nomeadamente num quadro multilateral supervisionado pela Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA), com sede em Viena;
14. Reitera o seu apelo para a aplicação rigorosa do Tratado de Não-Proliferação Nuclear (TNP) por todas as partes e em todos os aspectos; reitera o seu pedido a todos os Estados que detêm armas nucleares para que tomem medidas para reduzir o número de ogivas nucleares e eliminar o papel das armas nucleares na política de segurança, e para que apoiem uma zona livre de armas nucleares na Europa e no Médio Oriente;
15. Reitera o seu pedido ao parlamento e ao governo iranianos para que ratifiquem e apliquem o Protocolo Adicional, e que apliquem integralmente as disposições do Acordo Geral de Salvaguardas;
16. Manifesta a sua apreensão pelo facto de Israel, a Índia e Paquistão não se terem tornado Partes no TNP; insta esses países a se tornarem Parte no referido Tratado; reitera o seu profundo pesar relativamente aos acordos nucleares celebrados entre os EUA, a França e a Índia, que desafiam a lógica do TNP ao fazerem da Índia o único país conhecido dispondo de armas nucleares ao qual é permitido prosseguir o comércio nuclear – incluindo o enriquecimento de urânio – com o resto do mundo, apesar de não ser parte do Tratado de Não-Proliferação; considera que as negociações sobre a criação de uma região isenta de armas nucleares no Médio Oriente e no Mediterrâneo poderiam constituir um passo importante para a resolução das preocupações em matéria de segurança dos países da região; convida a UE-3 a introduzir esta ideia nas negociações com o Irão;
17. Reitera, neste contexto, a sua oposição de princípio ao uso da energia nuclear, devido aos graves riscos inerentes, ao insolúvel problema dos resíduos, ao seu elevado custo e à sua relação intrínseca com as armas nucleares;
Futuras relações UE-Irão
18. Chama a atenção para o facto de as sanções contra o Irão não terem produzido qualquer resultado útil para a resolução do litígio sobre o programa nuclear do Irão; manifesta a sua apreensão pelo facto de novas sanções poderem ter consequências negativas para a população iraniana; exorta, por isso, a UE a persistir nos esforços diplomáticos e a não anuir a novas sanções contra o Irão;
19. Relembra o Conselho e os Estados-Membros de que a não proliferação e o desarmamento nuclear estão intrinsecamente ligados e se reforçam mutuamente; insta, por conseguinte, os Estados-Membros a tomarem medidas progressivas para eliminar o papel das armas nucleares na política de segurança e a lançarem medidas visíveis para que a Europa se torne numa zona livre de armas nucleares;
20. Sublinha a importância de continuar o diálogo com o Irão a todos os níveis, nomeadamente com a sociedade civil; lamenta o facto de o lado iraniano ter adiado a visita da delegação do Parlamento Europeu agendada para os dias 8 a 11 Janeiro de 2010; manifesta o seu interesse em prosseguir e intensificar o diálogo directo com a sociedade iraniana e espera de que o governo e o parlamento iranianos revejam a sua posição sobre os contactos directos;
21. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão, à Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, aos governos e parlamentos dos Estados-Membros, ao Secretário-Geral das Nações Unidas, ao Conselho de Segurança das Nações Unidas, à Comissão dos Direitos Humanos das Nações Unidas e ao Governo e ao Parlamento da República Islâmica do Irão.