PROPOSTA DE RESOLUÇÃO sobre o ACTA
17.11.2010
nos termos do n.º 2 do artigo 110.º do Regimento
Kader Arif e Véronique De Keyser em nome do Grupo S&D
Ver igualmente a proposta de resolução comum RC-B7-0617/2010
B7‑0620
Resolução do Parlamento Europeu sobre o ACTA
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta os artigos 207.º e 218.º do TFUE,
– Tendo em conta a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, nomeadamente o seu artigo 8.º,
– Tendo em conta a Estratégia para a aplicação efectiva da Carta dos Direitos Fundamentais pela União Europeia,
– Tendo em conta a conclusão, em 2 de Outubro de 2010, da última ronda de negociações sobre o Acordo Comercial Anticontrafacção,
– Tendo em conta a publicação do texto final do ACTA em 15 de Novembro de 2010,
– Tendo em conta a sua resolução de 18 de Dezembro de 2008 sobre o impacto da contrafacção no comércio internacional (2008/2133(INI)),
– Tendo em conta a sua resolução de 10 de Março de 2010 sobre a transparência e a situação actual das negociações ACTA,
– Tendo em conta a sua Declaração escrita 0012/2010 sobre a ausência de um processo transparente no Acordo Comercial de Combate à Contrafacção (ACTA),
– Tendo em conta os debates em sessão plenária de 8 de Setembro de 2010 e 20 de Outubro de 2010 sobre o Acordo Comercial Anticontrafacção,
– Tendo em conta a decisão do Parlamento Europeu, de 20 de Outubro de 2010, referente à revisão do acordo-quadro sobre as relações entre o Parlamento Europeu e a Comissão Europeia),
– Tendo em conta o Acordo Interinstitucional "Legislar melhor", celebrado entre o Parlamento Europeu, o Conselho e a Comissão (2003/C 321/01),
– Tendo em conta a decisão do Provedor de Justiça Europeu sobre a queixa 90/2009/(JD)OV sobre o acesso aos documentos do ACTA,
– Tendo em conta o parecer da Autoridade Europeia para a Protecção de Dados sobre as negociações em curso, pela União Europeia, de um Acordo Comercial Anticontrafacção (ACTA) e a carta que o Grupo de Trabalho sobre a Protecção de Dados enviou à Comissão Europeia,
– Tendo em conta a chamada prática "Amigos da Presidência" que visa debater qualquer aspecto do acordo eventualmente abrangido pelo direito penal,
– Tendo em conta a Directiva 2000/31/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 8 de Junho de 2000, relativa a certos aspectos legais dos serviços da sociedade de informação, em especial do comércio electrónico, no mercado interno (Directiva Comércio Electrónico),
– Tendo em conta a Directiva 2002/58/CE do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao tratamento de dados pessoais e à protecção da privacidade no sector das comunicações electrónicas, com a última redacção que lhe foi dada pela Directiva 2009/136/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de Novembro de 2009,
– Tendo em conta o Acordo sobre os Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual relacionados com o Comércio (Acordo ADPIC) da Organização Mundial do Comércio (OMC),
– Tendo em conta as Conclusões do Conselho sobre a coerência das políticas numa perspectiva de desenvolvimento (CPD),
– Tendo em conta o litígio DS409 da OMC, União Europeia e um Estado-Membro – Apreensão de Medicamentos Genéricos em Trânsito,
– Tendo em conta o comunicado de imprensa da OMC sobre o Conselho TRIPS de 8-9 de Junho de 2010,
– Tendo em conta o artigo 110.º do seu Regimento,
Tratado de Lisboa
A. Considerando que a política comercial comum (PCC) é da competência exclusiva da União; considerando que, na sequência da entrada em vigor do Tratado de Lisboa, o Parlamento terá de dar o seu acordo ao texto do ACTA antes da sua entrada em vigor na União Europeia,
Ponto da situação das negociações e os negociadores
B. Considerando que, em 2008, a União Europeia e outros países da OCDE deram início a negociações sobre um novo acordo multilateral destinado a reforçar a aplicação dos direitos de propriedade intelectual (DPI) e a combater a contrafacção e a pirataria (Acordo Comercial Anticontrafacção - ACTA),
C. Considerando que, em 2 de Outubro de 2010, se concluiu em Tóquio, no Japão, a 11.ª e mais recente ronda de negociações do Acordo Comercial Anticontrafacção (ACTA),
D. Considerando que os negociadores do ACTA tornaram público o texto consolidado em 6 de Outubro de 2010 e, seguidamente, a Comissão informou o Parlamento; considerando que, em 15 de Novembro de 2010, a Comissão publicou o texto final do ACTA, considerando que se irá realizar em Sydney (30 de Novembro - 3 de Dezembro (ou, se necessário, 4 de Dezembro) de 2010) uma reunião técnica para finalizar a vertente jurídica do texto,
E. Considerando que representantes do Conselho participaram nas rondas de negociação ACTA ao lado de representantes da Comissão,
F. Considerando que apenas 11 países (a UE conta como um país) e, entre estes, apenas dois países em desenvolvimento (Marrocos e México) participaram nas negociações,
G. Considerando que o objectivo das partes envolvidas nas negociações é alargar o ACTA aos países em desenvolvimento e aos países emergentes; considerando que parceiros comerciais importantes, como a Índia, o Brasil e a China, afirmaram no Conselho ADPIC da OMC que o ACTA pode não ser compatível com o Acordo ADPIC e outros acordos da OMC,
H. Considerando que a definição de contrafacção constante do Acordo ADPIC só se aplica à violação deliberada de marcas registadas à escala comercial (TRIPS, Parte III, Secção 4, artigo 51)[1],
Acervo comunitário
I. Considerando que a Comissão, na sua qualidade de guardiã dos Tratados, tem a obrigação de velar pelo respeito do acervo comunitário quando participa na negociação de acordos internacionais com repercussões na legislação da União Europeia,
J. Considerando que a Comissão invocou a decisão do Provedor de Justiça para justificar o facto de o ACTA ser negociado como um acordo comercial e não como um tratado sobre a aplicação da lei; considerando que o Provedor de Justiça considerou que a conclusão do ACTA pode, efectivamente, tornar necessário que a UE proponha e promulgue legislação; considerando que, nesse caso, o ACTA constituiria o único ou principal elemento subjacente a essa legislação e que os cidadãos teriam todo o interesse em ser informados sobre o ACTA,
Direitos Fundamentais
K. Considerando que qualquer acordo relativo ao ACTA concluído pela União Europeia deve respeitar as obrigações jurídicas impostas à UE em matéria de protecção da vida privada e legislação relativa à protecção de dados, tal como definidas na Directiva 95/46/CE, na Directiva 2002/58/CE (com a última redacção que lhe foi dada pela Directiva 2009/136/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de Novembro de 2009), na Directiva 2009/136/CE e na Directiva 2009/140/CE, sobre as redes e serviços de comunicações electrónicas, bem como na jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e do Tribunal de Justiça,
L. Considerando que a Comissão declarou na sua Comunicação de 19 de Outubro de 2010 que a "acção da União deve ser irrepreensível em matéria de direitos fundamentais" e que "a União deve ser exemplar a este respeito"; considerando que a Comissão declarou na sessão plenária de 20 de Outubro de 2010 que o ACTA ainda não foi rubricado e que é prerrogativa da Comissão, na sua qualidade de negociadora, decidir em que momento as negociações se encontram tecnicamente concluídas e o acordo pode se rubricado;
M. Considerando que não existe no acordo ACTA qualquer disposição que tenha de ser interpretada no sentido de se abrir um precedente ou prever uma presente ou futura derrogação ou alteração ao acervo susceptível de conduzir a uma diminuição da protecção dos direitos fundamentais no âmbito da legislação da UE e que a Comissão e o Conselho deveriam declarar explicitamente o seu acordo com este princípio,
Indicações geográficas
N. Considerando que a Comissão tem repetidamente afirmado a importância de se reforçar a protecção das indicações geográficas (IG); considerando que as partes decidiram que o ACTA deve prever a aplicação de todas as categorias de propriedade intelectual reconhecidas na Parte II do Acordo APDIC, incluindo as IG,
Execução penal e sanções penais
O. Considerando que, em 2007, a Comissão lançou um questionário dirigido aos Estados-Membros tendo em vista a realização de um estudo cuja finalidade era verificar se as sanções penais são essenciais para garantir a efectiva aplicação do direito comunitário na área dos direitos de propriedade intelectual, nos termos do n.º 2 do Artigo 83 do TFUE,
P. Considerando que a secção relativa à execução penal do ACTA aplica-se a disposições sobre procedimentos penais, responsabilidade penal, infracções penais, execução penal e sanções; considerando que a Presidência do Conselho negociou as disposições relativas à execução penal do ACTA;
Q. Considerando que a Declaração escrita 12/2010 sublinha que a avaliação dos riscos económicos e de inovação deve ser feita antes da introdução de sanções penais sempre que já existam medidas civis,
R. Considerando que o artigo 2.14.1 do ACTA contém uma definição de escala comercial: “Para efeitos do disposto na presente secção, as medidas tomada à escala comercial incluem, pelo menos, as que são realizadas como actividades comerciais para obter um benefício directo, económico ou comercial”,
S. Considerando que a nota de rodapé 9 diz o seguinte: “Cada Parte deve tratar a importação ou exportação deliberada de produtos de marca contrafeitos ou pirateados à escala comercial actividades ilegais passíveis de sanções penais ao abrigo do presente artigo. As Partes podem cumprir a obrigação relacionada com a importação ou exportação de produtos pirateados ou produtos de marca contrafeitos estipulando que a distribuição, venda ou oferta para venda de produtos de marca contrafeitos ou produtos pirateados à escala comercial são actividades ilegais passíveis de sanções penais",
T. Considerando que as consequências da aplicação do artigo 2.5.1 e 2.5.1-A são extremamente preocupantes e abrem a porta a medidas que ameaçam os direitos dos cidadãos à protecção da vida privada e à protecção dos dados,
Acesso a medicamentos
U. Considerando que o Comissário responsável pelo Comércio convidou o Parlamento, durante a sessão plenária de 20 de Outubro de 2010, a emitir o seu parecer sobre a questão em aberto de incluir as patentes nas secções referentes à execução civil; considerando que os negociadores do ACTA afirmaram que "o ACTA não constituirá um obstáculo à circulação transfronteiras de medicamentos genéricos legais"; considerando que o Parlamento declarou, na sua resolução e declaração escrita, que qualquer medida destinada a reforçar as competências de inspecção transfronteiriça e apreensão de mercadorias não deve prejudicar o acesso global a medicamentos legais, acessíveis e seguros,
Direitos de propriedade intelectual no ambiente digital
V. Considerando que na directiva sobre comércio electrónico se afirma que os fornecedores de serviços Internet não devem ser responsáveis pelos dados que transmitem ou albergam através dos seus serviços a ponto de ser necessária uma fiscalização prévia ou a filtragem desses dados; considerando que, no seu parecer sobre o ACTA, a AEPD alerta para o facto de os fornecedores de serviços Internet (FSI) poderem incluir "cláusulas nos contratos dos clientes, que permitam a vigilância dos seus dados e o corte das respectivas assinaturas",
W. Considerando que as Partes no ACTA se comprometeram a cumprir as obrigações previstas no artigo 7.° do Acordo ADPIC, tendo em vista contribuir para a promoção da inovação tecnológica; considerando que as políticas fundamentais da UE relacionadas com a interoperabilidade assentam em disposições comunitárias (em particular na Directiva 91/250/CEE) que permitem a retroengenharia de produtos e a evasão,
X. Considerando que foram introduzidas importantes salvaguardas no texto do ACTA, tanto no preâmbulo como em disposições de fundo; considerando que o artigo 1.2 do Acordo dispõe que as Partes são livres de determinar o método mais adequado para aplicar as disposições do Acordo no âmbito das suas práticas e sistemas jurídicos,
Y. Considerando que no estado actual do direito internacional e nacional, os direitos de autor e direitos conexos autorizam o titular do direito a impedir certos actos, como reproduções, gravações, adaptações, distribuição de cópias e comunicação ao público (incluindo a colocação de uma obra à disposição do público de maneira interactiva). Nenhum dos actos objecto de restrição deve ser confundido com o direito de impedir o uso (por exemplo, a leitura, a visualização) de um obra. Qualquer tentativa de alargar o direito de autor para abranger o “uso” deturparia a distinção entre PI e acesso condicional. A Comissão não pode seguir uma abordagem em que o controlo do acesso aos serviços se confunde com a violação dos direitos de PI,
Z. Considerando que o Vice-Presidente Kroes declarou recentemente em Avinhão: "Pode servir os interesses pessoais de alguns evitar o debate ou espartilhá-lo não indo além dos direitos de autor vistos de uma perspectiva moralista, que se limita a diabolizar milhões de cidadãos. Mas essa não é uma abordagem sustentável. [...] Em vez de um sistema disfuncional baseado numa série de muros de Berlim, proponho um regresso ao bom senso. Um sistema que ofereça margem para a criação de novas oportunidades para os artistas e criadores, e novos modelos empresariais que se adaptem melhor à era digital.” E o Primeiro-Ministro do Reino Unido, David Cameron, anunciou profundas modificações da legislação britânica sobre PI, inter alia importando o conceito de "justo uso",
Comité do ACTA
AA. Considerando que as disposições institucionais do ACTA atribuem ao respectivo Comité autoridade relacionada, designadamente, com a aplicação e o funcionamento do Acordo, a alteração do mesmo, a participação não governamental e as decisões respeitantes às normas e procedimentos do Comité; considerando que o Artigo 21.° do TFUE orienta a União na procura do desenvolvimento da democracia,
1. Toma nota dos esforços da Comissão para aumentar a transparência e o seu empenhamento em proteger a inovação e a competitividade da UE; insta a Comissão, no espírito do acordo-quadro revisto, a ter em plena consideração o parecer do Parlamento Europeu antes de rubricar o Acordo;
Acervo comunitário
2. Apoia a ambição da Comissão de garantir a aplicação total do acervo comunitário;
3. Solicita à Comissão que confirme explicitamente e em devido tempo antes de ter início o procedimento de aprovação do Parlamento que as disposições do ACTA não alteram nada do acervo comunitário, em particular as disposições da Directiva 95/46 (“Protecção de Dados”), da Directiva 91/250/CEE (Directiva “Software”), da Directiva 2001/29/CE (Directiva “Sociedade da Informação”), da Directiva 2000/31/CE relativa a certos aspectos legais dos serviços da sociedade de informação, em especial do comércio electrónico, no mercado interno (Directiva sobre o comércio electrónico), da Directiva 2002/58/CE relativa ao tratamento de dados pessoais e à protecção da privacidade no sector das comunicações electrónicas, com a última redacção que lhe foi dada pela Directiva 2009/136/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de Novembro de 2009, e da Directiva 2004/48/CE relativa ao respeito dos direitos de propriedade intelectual;
4. Pede à Comissão que confirme explicitamente que, nem agora nem no futuro, irá propor a alteração do acervo para o harmonizar com qualquer das disposições não vinculativas do acordo ACTA em termos que possam conduzir à diminuição da protecção dos direitos fundamentais na UE;
Base jurídica
5. Congratula-se com o facto de as competências do PE no âmbito da PCC terem sido amplamente alargadas desde que entrou em vigor o Tratado de Lisboa e, em particular, com o facto de o PE ter de dar a sua aprovação a todos os acordos comerciais celebrados pela UE;
6. Convida a Comissão a clarificar a repartição de competências entre o Conselho e a Comissão no tocante à secção do ACTA relativa à execução penal, inclusive no que diz respeito à sua rubrica; insiste em que sejam apresentadas ao Parlamento, antes da rubrica do Acordo, provas de que a base jurídica para a negociação do ACTA respeita integralmente o Tratado de Lisboa;
7. Gostaria, por isso, de conhecer os argumentos jurídicos avançados pelo Conselho e pela Comissão para discordarem do formato do Tratado e de conhecer também o mandato conferido ao negociador,
Medidas relativas às fronteiras
8. Exorta a Comissão a velar por que o âmbito de aplicação do Acordo se restrinja ao actual sistema europeu de aplicação dos DPI contra a contrafacção; considera que a palavra “injustificavelmente” não deve portanto constar do Artigo 2.X;
9. Inquieta-o o conteúdo do artigo 2.X da secção 3, que menciona o facto de a bagagem pessoal dos viajantes, mesmo quando os produtos transportados não são de natureza comercial, estar abrangida pelo acordo, a não ser que as Partes optem pela sua exclusão; considera que este artigo constitui uma incitação à adopção pelas Partes de regras mais estritas para o controlo da bagagem pessoal dos viajantes nas fronteiras, quando, pelo contrário, a Comissão deveria ter defendido a nível internacional um maior protecção dos direitos fundamentais das pessoas, em particular o direito à privacidade;
Execução penal e sanções penais
10. Insta a Comissão a publicar as resposta ao questionário que lançou em 2007 para verificar se as sanções penais são essenciais para garantir a efectiva aplicação do direito comunitário na área dos direitos de propriedade intelectual, bem como o estudo que realizou, e a ter em conta as respostas ao questionário antes de rubricar o Acordo;
11. Observa que o ACTA permite que as autoridades judiciais emitam uma ordem (ou seja, uma injunção nos termos do artigo 2.X) contra uma Parte ou terceiros; nota que este poder de injunção ultrapassa o disposto na directiva relativa ao respeito dos direitos de propriedade intelectual, que só autoriza a injunção para impedir uma infracção iminente. Além disso, os terceiros, segundo esta directiva, têm de participar na infracção para serem potencialmente sujeitos à ordem da autoridade judicial;
12. Observa que a definição de "escala comercial" prevista no ACTA (Artigo 2.14.1) é mais lata do que a definição adoptada em 25 de Abril de 2007 nos seus votos da proposta alterada de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa às medidas penais destinadas a assegurar o respeito pelos direitos de propriedade intelectual – 2005/0127 (COD);
13. Observa que a definição de escala comercial do Artigo 2.14.1 não observa o princípio de proporcionalidade;
14. Considera inadequada a extensão da responsabilidade penal numa nota de rodapé, nomeadamente, a nota de rodapé 9;
15. Insta os negociadores da UE a defender a inclusão do termo "podem" no artigo 2.14. 3 ("As Partes podem prever processos e sanções penais [...]’);
16. Solicita, por isso, à Comissão que insista na substituição de "deve" por "pode" e, por razões de clareza, (igualmente) na substituição das palavras "impedir a ocorrência de infracções a quaisquer direitos de propriedade intelectual" por "impedir a ocorrência de contrafacção";
17. Pede à Comissão que explique e confirme de forma convincente que quaisquer medidas penais previstas no ACTA serão limitadas a actividades comerciais em grande escala e que os utilizadores individuais que não exercem essas actividades não podem ser e não serão objecto de procedimentos penais ao abrigo do ACTA;
18. Salienta que, na ausência de uma avaliação de impacto significativa e de uma salvaguarda ad hoc que garanta a sua proporcionalidade no texto do ACTA, as medidas penais devem manter-se dentro dos limites previstos tanto pelo Acordo ADPIC como pelo acervo comunitário;
19. Solicita à AEPD que apresente um parecer sobre a mais recente versão do ACTA;
Indicações geográficas
20. Insta a Comissão a diligenciar de forma activa para garantir a prosperidade dos produtos europeus na economia mundial através de práticas de execução efectivas no ACTA;
21. Lamenta que o acordo não contenha, no seu artigo 1.X, a definição de "indicações geográficas falsas", pois essa omissão poderá criar confusão ou, pelo menos, dificultar a tarefa das autoridades administrativas e judiciais na interpretação e aplicação do ACTA;
22. Discorda da posição da Comissão, que diz ter obtido grandes progressos no que diz respeito à protecção das indicações geográficas; considera que, como as indicações geográficas continuarão a não ser protegidas em todos os países que não as reconhecem nas respectivas legislações nacionais, os progressos feitos neste domínio são insatisfatórios;
Direitos Fundamentais
23. Realça que a privacidade e a protecção de dados são valores fundamentais da União Europeia consagrados no artigo 8.º da CEDH e nos artigos 7.º e 8.º da Carta dos Direitos Fundamentais da UE, os quais cumpre respeitar em todas as políticas e normas adoptadas pela UE, por força do disposto nos artigos 16.º do TFUE;
24. Encarrega a Comissão de apresentar ao Parlamento, antes de rubricar o Acordo, uma análise jurídica do significado, da legalidade e da aplicabilidade das medidas desejadas pelo ACTA relativamente à cooperação entre os prestadores de serviços e os titulares de direitos, em especial no que diz respeito ao modo como os esforços de cooperação no interior da comunidade empresarial não limitarão os direitos fundamentais dos cidadãos, incluindo o direito à vida privada, o direito à liberdade de expressão e o direito a um processo equitativo; recorda à Comissão que o Acordo Interinstitucional de 2003 a impede de apoiar mecanismos de auto-regulação e de co-regulação que ponham em causa direitos fundamentais, como o direito à liberdade de expressão;
25. Solicita à Comissão que realize, em devido tempo antes de ter início o processo de aprovação do Parlamento, uma avaliação de impacto da aplicação do Acordo ACTA sobre os direitos fundamentais e a protecção de dados, os esforços em curso da UE para harmonizar as medidas de aplicação dos DPI e o comércio electrónico, e conclui que a Comissão deve consultar atempadamente o Parlamento sobre os resultados desta avaliação e, se necessário, voltar à mesa das negociações caso os resultados da avaliação de impacto o exigirem;
Acesso a medicamentos
26. Congratula-se com o facto de, na secção do ACTA reservada à aplicação civil, as patentes poderem ser excluídas, pois, de contrário, poderia ser dificultado o acesso a medicamentos legais, a preços acessíveis e capazes de salvar vidas; sustenta que aumentos sensíveis das indemnizações e outras vias de recurso para eventuais violações dos direitos de propriedade intelectual impedirão a concorrência dos genéricos e terceiros implicados na produção, venda ou distribuição de medicamentos genéricos acessíveis, em especial se essas disposições forem aplicadas a mercadorias em trânsito; manifesta-se preocupado com a possibilidade de a aplicação das disposições de execução civil previstas no ACTA às patentes ser contrária ao interesse público, ao aplicar patentes a seres vivos, produtos indígenas e medicamentos tradicionais, e poder aumentar o risco de investimento e a incerteza do mercado e ameaçar a inovação tecnológica, sobretudo em sectores nos quais é difícil detectar a infracção; insta, por isso, a Comissão a retirar as patentes da secção dedicada à execução civil;
27. Acolhe favoravelmente as melhorias no projecto do ACTA que proporcionem mais salvaguardas para a defesa da vida privada, da saúde pública e algumas das protecções no âmbito do Acordo ADPIC; convida a Comissão a avaliar se as disposições de salvaguarda do ACTA são igualmente aplicáveis no que diz respeito às disposições de execução; solicita à Comissão que forneça provas de que o ACTA não impedirá os Estados-Membros de introduzirem legislação que limite as vias de recurso para infracções, em casos como o alargamento do acesso a obras sujeitas a direito de autor que se tornaram órfãs e a concessão de flexibilidades no âmbito do Acordo ADPIC para garantir uma gama completa de futuras opções políticas; solicita à Comissão que providencie uma avaliação sobre se o ACTA será efectivamente um acordo vinculativo e sobre se o seu artigo 1.2 prevê uma flexibilidade geral para qualquer elemento do direito nacional que possa contrariar o ACTA; solicita à Comissão que apresente os mecanismos, proporcionando às Partes a flexibilidade de adoptarem excepções legítimas às obrigações do Acordo, que sejam coerentes com os objectivos e os princípios do Acordo ADPIC e da Declaração de Doha sobre o Acordo ADPIC e a Saúde Pública de 2001;
28. Insta a Comissão a incluir salvaguardas relativas à saúde no texto do Acordo e não apenas no preâmbulo;
Direitos de propriedade intelectual no ambiente digital
29. É de opinião que a "cooperação" entre titulares de direitos e intermediários para resolver as violações do direitos de PI deve ser retirada do ACTA, pois levará os segundos a criar sistemas de controlo e soluções não judiciais, que, por sua vez, constituirão uma ameaça ao direito dos utilizadores finais à vida privada, à protecção dos dados e a um legítimo processo judicial;
30. Preocupa-o o facto de uma definição demasiado alargada de actos à "escala comercial" (art.2.14.1), a par da obrigação de garantir sanções penais em caso de violação dos DPI no ambiente digital (art.2.18.1), nomeadamente por "cumplicidade e instigação" (art. 2.14.4), poder incentivar as partes contratantes no acordo a adoptar legislação que, na prática, conduzirá à criminalização dos utilizadores privados e intermediários;
31. Nota que o Acordo (Artigo 2.18.3) exige uma forma de cooperação por força de uma obrigação (ou seja, as Partes "têm de" "responder efectivamente" às infracções;
32. Está profundamente preocupado com a divulgação de informação aos titulares de direitos (Artigo 2.18.4) não necessariamente pelas autoridades judiciais ("autoridades competentes");
33. Insta os negociadores da UE a voltar a incluir no texto do ACTA a disposição 2.18.9, nos termos da qual: os procedimentos descritos nas disposições 1-8 serão aplicados sem prejuízo de uma lei das Partes adoptar ou manter um regime que preveja a limitação da responsabilidade dos fornecedores de serviços Internet e a proibição da obrigação geral de conteúdos albergados e armazenados por fornecedores de serviços Internet a pedido dos utilizadores;
34. Manifesta a sua preocupação com a ineficácia global da ressalva inserida nota de rodapé 14, que diz o seguinte: "sem prejuízo do alcance dos direitos de autor ou direitos conexos previstos na legislação das Partes" e com a nota acrescentada pelo negociador à nota de rodapé 15, segundo a qual as Partes não são obrigadas a exigir a interoperabilidade, o que parece estar em contradição com a mensagem veiculada pela recentemente adoptada Agenda Digital;
Comité do ACTA
35. Entende que o Comité do ACTA deve funcionar de maneira aberta, inclusiva e transparente; encarrega a Comissão de apresentar oportunamente, antes de o Parlamento ter de analisar o seu parecer favorável, recomendações sobre a governação do Comité ACTA, principalmente no que se refere à participação do Parlamento Europeu e ao processo de alteração do Acordo;
36. É de opinião que a Comissão deveria defender que os procedimentos e condições de adesão ao ACTA sejam devidamente flexíveis e tenham em conta os níveis de desenvolvimento, as necessidades e os objectivos dos países candidatos, em conformidade com as conclusões do Conselho sobre a coerência das políticas numa perspectiva de desenvolvimento;
37. Sublinha que qualquer alteração a este acordo deve ser sujeita a auscultação do público por todas as partes interessadas e tem de obter a aprovação parlamentar; pede à Comissão que consulte o Conselho e o Parlamento Europeu antes de aceitar ou propor qualquer alteração ao texto actual no comité do ACTA, num processo que garanta a transparência, o controlo parlamentar e a participação do público;
Plurilateralismo versus multilateralismo
38. Lamenta que o impacto mundial deste acordo seja naturalmente limitado pelo facto de os principais países que estão na origem das contrafacções não serem partes no acordo;
39. Lamenta que estas negociações e o acordo estejam a pôr em causa os fora multilaterais (como a OMPI e a OMC); sublinha que o Comité do ACTA não deve tornar-se uma nova instituição internacional;
40. Convida a Comissão Europeia a clarificar se o texto é de natureza vinculativa ou facultativa;
Condições para a aprovação do PE
41. Recorda que, para poder entrar em vigor, o Acordo ACTA exige a aprovação do PE; pede à Comissão e ao Conselho que não proponham a aplicação provisória do acordo antes de o PE dar a sua aprovação; recorda à Comissão e ao Conselho que o Parlamento se reserva o direito de recusar a aprovação do ACTA; subordina uma eventual aprovação do acordo ACTA à total cooperação no âmbito desta resolução;
42. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução à Comissão, ao Conselho e aos governos e parlamentos dos Estados Partes nas negociações do acordo ACTA.