PROPOSTA DE RESOLUÇÃO sobre a situação na Guiné-Bissau
6.6.2012 - (2012/2660(RSP))
nos termos do artigo 110.º, n.º 2, do Regimento
Véronique De Keyser, Ana Gomes, Liisa Jaakonsaari, Ricardo Cortés Lastra em nome do Grupo S&D
Ver igualmente a proposta de resolução comum RC-B7-0277/2012
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta as declarações da Vice-Presidente da Comissão/Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, de 12 e 14 de abril de 2012,
– Tendo em conta as conclusões do Conselho da União Europeia de 23 de abril, de 3 de maio e de 31 de maio de 2012,
– Tendo em conta as declarações presidenciais do Conselho de Segurança das ONU, de 21 de abril e de 7 de maio de 2012,
– Tendo em conta as decisões das cimeiras extraordinárias da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), de 26 de abril e de 3 de maio de 2012,
– Tendo em conta a reunião dos Chefes de Estado-Maior dos países membros da CEDEAO em 14 de maio de 2012,
– Tendo em conta as decisões da União Africana, de 24 de abril de 2012,
– Tendo em conta as resoluções da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), de 14 de abril e de 5 de maio de 2012,
– Tendo em conta o relatório dos peritos da missão de observação eleitoral da União Europeia,
– Tendo em conta as obrigações de respeito pela Democracia e pelos Direitos Humanos ínsitas no Acordo de Cotonu, de que Guiné-Bissau é parte,
– Tendo em conta o artigo 110.º, n.º 2, do seu Regimento,
A. Considerando que a primeira volta das eleições presidenciais, na sequência da morte do Presidente, se realizou em 18 de março de 2012;
B. Considerando que a participação popular foi significativamente maior do que nas eleições legislativas de 2008;
C. Considerando que todos os observadores internacionais consideraram as eleições credíveis e que o primeiro-ministro, Carlos Gomes Júnior, obteve 48,97% dos sufrágios;
D. Considerando que a segunda volta estava prevista para 29 de abril;
E. Considerando o golpe militar ocorrido a 12 de abril, que depôs o Presidente em exercício, Raimundo Pereira, e o primeiro-ministro, Carlos Gomes Júnior, e levou à dissolução da Assembleia Nacional;
F. Considerando que a Guiné-Bissau teve seis presidentes em treze anos, mas nenhum concluiu o seu mandato;
G. Considerando que, após um ultimato da CEDEAO, a junta militar libertou o Presidente em exercício e primeiro-ministro, que tiveram de deixar o país;
H. Considerando que as Forças Armadas de um Estado de Direito democrático devem obedecer às autoridades civis eleitas;
I. Considerando as informações que dão conta da ocorrência de pilhagens e de violações dos Direitos Humanos, em especial, de detenções arbitrárias e repressão violenta de manifestações pacíficas;
J. Considerando que foi atribuída à Guiné-Bissau uma verba orçada em 102 800 000 euros do 10.º Fundo Europeu de Desenvolvimento;
K. Considerando que a economia da Guiné-Bissau é uma das mais pobres e das mais dependentes da região e que a ajuda internacional representa uma parcela do orçamento do Estado equivalente a 80%;
L. Considerando que a crise política desvia as atenções das necessidades da população e precipita uma crise humanitária;
M. Considerando que o apoio firme da comunidade internacional pode ajudar a Guiné-Bissau a encontrar o caminho do desenvolvimento e do regresso à ordem constitucional;
N. Considerando a decisão do Conselho da União Europeia de tomar medidas especificamente dirigidas contra seis pessoas que "ameaçam a paz, a segurança e a estabilidade na Guiné-Bissau";
O. Considerando a decisão tomada pelo Banco Mundial e pelo Banco Africano de Desenvolvimento de suspenderem as suas ajudas;
P. Considerando que a União Africana suspendeu a Guiné-Bissau em todas as suas instâncias e ameaça aplicar sanções aos golpistas;
Q. Considerando que a Organização Internacional da Francofonia suspendeu Guiné-Bissau da organização;
R. Considerando que, desde 2007, o Gabinete para a Droga e a Criminalidade da Organização das Nações Unidas (UNODC) tem vindo a destacar o papel da Guiné-Bissau como país de trânsito para o tráfico de cocaína entre a América Latina e a Europa;
S. Considerando que os dirigentes políticos e militares se acusaram mutuamente de participação no tráfico de droga;
T. Considerando que o Presidente da Guiné-Conacri descreveu os militares golpistas como "traficantes de droga perigosos para a região";
U. Considerando o risco da intensificação do tráfico de droga em direção à Europa por causa da tomada do poder pelos militares;
V. Considerando a decisão da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental de enviar um contingente de 500 a 600 homens para preparar a partida da missão angolana;
W. Considerando que a Nigéria se declarou pronta a fornecer um contingente de 320 homens e que o Senegal, a Costa do Marfim e o Togo estão dispostos a enviar tropas suplementares;
X. Considerando que o custo da operação deverá orçar em 127 000 000 de dólares norte‑americanos ao longo de seis meses e que os Estados Unidos e a União Europeia foram exortados a garantir o financiamento;
Y. Considerando que os autores do golpe militar concordaram com a ida das forças da CEDEAO;
Z. Considerando que a CPLP, presidida por Angola, propõe a criação de uma força de interposição sob os auspícios da ONU e com o acordo da CEDEAO, da União Africana e da União Europeia;
AA. Considerando que a retirada das tropas angolanas, presentes desde março de 2011 no quadro de um acordo bilateral assinado em outubro de 2010, ainda não se iniciou;
BB. Considerando que este acordo foi firmado depois de a União Europeia ter posto termo à sua ajuda para a reforma das forças de segurança;
CC. Considerando a Resolução 2048 do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que impõe sanções aos autores do golpe de Estado;
DD. Considerando que o atual Presidente da República em exercício, Raimundo Pereira, bem como o primeiro-ministro, Carlos Gomes Júnior, se recusaram a renunciar ao seu mandato, apesar de se terem visto forçados a abandonar o país;
EE. Considerando que o acordo de transição que acabou de ser negociado entre a CEDEAO, os militares insurrectos e os partidos da oposição e que prevê a nomeação de um Presidente e de um Governo propostos pelos autores da rebelião, viola a legalidade constitucional e legitima o golpe de Estado;
1. Condena golpe de Estado na Guiné-Bissau e preconiza uma atitude de não tolerância em relação a golpes de Estado em geral; exige o restabelecimento imediato da ordem constitucional, o que implica o retorno incondicional do Presidente em exercício, do governo legítimo e da Assembleia Nacional às suas funções, a que chegaram por via de processos democráticos, bem como a conclusão do processo eleitoral;
2. Recusa-se a reconhecer qualquer instituição de transição não eleita;
3. Solicita a libertação imediata e incondicional de todas as pessoas ilegalmente mantidas sob detenção;
4. Condena o facto de o Presidente em exercício e o primeiro-ministro terem sido forçados a abandonar o país;
5. Condena qualquer violação dos Direitos Humanos e, designadamente, qualquer forma de violência exercida contra políticos e ONG, manifestando a sua apreensão relativamente à rápida deterioração da segurança das vidas humanas na Guiné-Bissau, em especial, no tocante à segurança alimentar e aos cuidados de saúde;
6. Exprime a sua preocupação com os relatos das ONG locais, que dão conta da ocorrência de abusos crescentes e sistemáticos em matéria de Direitos Humanos cometidos pelo governo ilegítimo dos revoltosos, em especial, ao nível da repressão de liberdades cívicas, como a liberdade de expressão, a liberdade de informação, a liberdade de circulação e a liberdade de reunião; Condena, por outro lado, as prisões arbitrárias, as detenções e os casos de assédio de ativistas e políticos que se manifestam contra o autoproclamado governo dos autores do golpe de Estado;
7. Solicita que os perpetradores das violações dos Direitos Humanos sejam responsabilizados pelos seus atos, eventualmente perante o Tribunal Penal Internacional (TPI), e que os autores das violações da ordem constitucional sejam apresentados à Justiça;
8. Declara-se apreensivo ante a possibilidade de uma crise humanitária na Guiné-Bissau e apela à União Europeia, à ONU, à União Africana, à CEDEAO e à CPLP para coordenarem esforços no sentido de se precatarem contra essa eventualidade, nomeadamente planeando ações de auxílio conjunto, em particular no setor da saúde, incluindo a prestação de apoio ao funcionamento do principal hospital de Bissau, que não dispõe do equipamento necessário para atender às necessidades diárias e que não poderá fazer face a uma crise saúde pública agravada pela chegada iminente do período das chuvas;
9. Apela à CEDEAO, à União Africana, à CPLP, à União Europeia e às Nações Unidas para que envidem todos os esforços em prol da promoção do respeito da Democracia e dos Direitos Humanos na Guiné-Bissau, coordenando as suas iniciativas em ordem à restauração da legalidade internacional e a ordem constitucional e democrática na Guiné‑Bissau;
10. Congratula-se com as sanções impostas pela União Europeia e deseja que o Conselho de Segurança das Nações Unidas passe das palavras aos atos, caso a ordem constitucional não seja restabelecida;
11. Requer que a UE seja cooptada para o "Grupo de Contacto", que deverá ser concebido, não só como parceiro de desenvolvimento, mas também como parceiro para a segurança e a estabilidade democrática;
12. Solicita o envio de uma força de estabilização e de uma missão encarregada de reformar as forças de segurança, sob a égide do Conselho de Segurança das Nações Unidas;
13. Requer que a União Europeia, a ONU, a União Africana, a CEDEAO e a CPLP coordenem as diversas forças militares dos países vizinhos que já se encontram no país, incluindo as de Angola, da Nigéria, do Senegal e do Burquina Faso; insta a União Europeia a solicitar às autoridades dos países que enviaram forças militares e de segurança — todos eles parceiros ACP vinculados ao Acordo de Cotonu — a garantia de que essas forças não serão utilizadas para apoiar a ordem ilegítima proclamada pelos autores do golpe, nem para cometer abusos dos Direitos Humanos contra o povo da Guiné-Bissau;
14. Insta o Conselho a estudar a possibilidade de ajudar esta missão no âmbito da Política Europeia de Segurança e Defesa (PESD) e convida a Alta Representante / Vice-Presidente a propor o retorno de uma missão PESD à Guiné Bissau, com um mandato reforçado para contribuir para a reforma das forças de segurança, a capacitação da administração pública e o apoio ao Estado de Direito, logo que as autoridades legítimas recuperem o exercício da autoridade do Estado na Guiné-Bissau;
15. Solicita que a União Europeia se proponha ajudar o governo legítimo da Guiné-Bissau a combater o tráfico de droga no país, que há anos corrompe as forças armadas e múltiplos setores do aparelho de Estado; recorda que o tráfico de droga passa pela Guiné-Bissau em direção ao mercado europeu, estabelecendo ligações com outras redes criminosas a operar na região, incluindo, designadamente, as do terrorismo no Sahel e na Nigéria;
16. Solicita à Comissão que prossiga a sua ajuda direta à população;
17. Apela a que seja dada toda a prioridade à luta contra a impunidade e à promoção do desenvolvimento socioeconómico na Guiné-Bissau no quadro de uma estratégia a longo prazo, que tenha em conta o contexto e os desafios a nível regional;
18. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução à Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança/Vice-Presidente da Comissão, bem como às instâncias respetivas da CEDEAO, da União Africana e dos países ACP.