PROPOSTA DE RESOLUÇÃO sobre a situação no Egito
6.3.2013 - (2013/2542 (RSP)).
nos termos do artigo 110.º, n.º 2, do Regimento,
Willy Meyer, Marie-Christine Vergiat em nome do Grupo GUE/NGL
B7‑0098/2013
Resolução do Parlamento Europeu sobre a situação no Egipto
(2013/2542 (RSP)).
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta as suas anteriores resoluções sobre o Egito,
– Tendo em conta o Plano de Ação UE-Egito de 2007, bem como o Acordo de Associação UE‑Egito, em vigor desde 1 de junho de 2004,
– Tendo em conta a sua anterior resolução de 14 de dezembro de 2011 sobre a Política Europeia de Vizinhança e sobre a União para o Mediterrâneo[1],
– Tendo em conta o Pacto Internacional da ONU sobre os Direitos Civis e Políticos, ratificado pelo Egito em 1982,
– Tendo em conta o artigo 122.º do seu Regimento,
A. Considerando que decorreram já dois anos depois após a demissão de Hosni Mubarak na sequência das manifestações em Praça Tahrir e das sublevações em todo o Egito apelando a reformas fundamentais no sistema politico, económico e social do país, ao fim da corrupção, à liberdade plena, à democracia autêntica, ao respeito pelos direitos humanos, a melhores condições de vida e a um Estado laico;
B. Considerando que os manifestantes continuam a reclamar os mesmos objetivos da revolução de 25 de janeiro no que se refere à liberdade, dignidade humana e justiça social; que reclamam aumentos salariais consentâneos com o aumento dos preços, alojamento, saúde, a criação de emprego, a retirada da Constituição objeto de distorções, a formação de um governo de salvação nacional e a rápida realização de eleições presidenciais;
C. Considerando que o Egito se encontra aprisionado numa crise política e económica desde há meses; que continuam a registar-se vagas de protestos contra Mohamed Morsi que deram sistematicamente lugar a confrontos mortais e distúrbios; que o Presidente Morsi e a Fraternidade Muçulmana estão efetivamente a assumir o papel do deposto Hosni Mubarak, não levando a efeito quaisquer reformas e procurando, simultaneamente, criar um sistema conservador no plano religioso;
D. Considerando que, em 2012, tiveram lugar em todo o Egito, mais de 3 400 protestos relativamente a aspetos sociais e económicos, na sua maioria greves e ocupações; que este número é cerca de cinco vezes superior ao registado em qualquer outro ano da década de 2000, e que mais de dois terços desses protestos ocorreram após o início das funções presidenciais de Mohamed Morsi, em 30 de junho;
E. Considerando que os ataques físicos e jurídicos contra os ativistas sindicais aumentaram desde a eleição do Presidente Morsi, que, em setembro de 2012, cinco dirigentes sindicais da Companhia de Contentores do Porto de Alexandria foram condenados a três anos de prisão por terem conduzido uma greve de 600 trabalhadores em Outubro de 2011, e considerando que o processo se encontra atualmente em fase de recurso;
F. Considerando que há já meses que os manifestantes prosseguem os seus protestos contra Mohamed Morsi; que as pessoas saíram à rua para protestar, porquanto a situação no país sob o governo da Fraternidade Muçulmana não só não melhorou, como se deteriorou; que a repressão estatal destas manifestações traz à memória a repressão de Mubarak; que os manifestantes denunciam o recurso à tortura, ao assédio, a detenções, a linchagem e a violações entre a população egípcia e pretendem que os responsáveis sejam levados a tribunal; que as frustrações crescem face à morosidade do processo de reforma e que são cometidos abusos pela polícia e por outras forces de segurança, que continuam a agir com impunidade; que, nos últimos meses, a impunidade alimentou o assédio sexual e os ataques contra as mulheres nas proximidades da Praça Tahrir;
G. Considerando que, em 25 de janeiro e nos poucos dias que se lhe seguiram, durante a comemoração do segundo aniversário da revolução de 25 de janeiro, o desnecessário recurso à força letal das forças de segurança num fim de semana de confrontos com manifestantes causou a morte de pelo menos 45 pessoas e ferimentos em outras 1 000;
H. Considerando que a nova Constituição elaborada pelo partido de Mohamed Morsi, a Fraternidade Muçulmana, abre as portas a um Estado religiosos e não garante a liberdade de expressão, porquanto legaliza o confisco de jornais e a detenção de jornalistas; que a Constituição impede a liberdade de educação, permite a discriminação religiosa, é lesiva dos direitos das mulheres e crianças e não prevê o direito à saúde e ao alojamento, nem os direitos dos trabalhadores; que esta Constituição coloca o Presidente Morsi acima da lei e permite o julgamento militar de civis;
I. Considerando que o Conselho da Shura (câmara alta do parlamento) se encontra em fase de elaboração de uma lei restritiva das greves e manifestações e que esta lei se baseia na Lei 14 de 1923, altamente restritiva e adveniente da repressão colonial britânica na sequência da sublevação contra a ocupação britânica,
J. Considerando que o Egito anunciou uma nova lei que proíbe as ONG nacionais de contactarem organizações estrangeiras sem autorização prévia dos órgãos de segurança; que a legislação atual já dificulta o registo das ONG e o financiamento estrangeiro; que esta nova lei limita severamente a capacidade das ONG de levarem a efeito inquéritos e outras atividades essenciais, restringindo ainda mais o financiamento;
K. Considerando que Mubarak foi condenado a prisão perpétua por não ter impedido as mortes, mas que um recurso judicial anulou as penas em janeiro e ordenou a realização de um novo julgamento no dia 13 do próximo mês de abril; que, não obstante esta decisão, ainda não foi dado início a uma investigação independente;
L. Considerando que, no quadro da Política Europeia de Vizinhança, a União Europeia deve desenvolver relações privilegiadas com os países vizinhos, a fim de criar um espaço de prosperidade e boa vizinhança, fundado em valores partilhados entre parceiros e caracterizado por relações estreitas e pacíficas, baseadas na cooperação;
M. Considerando que as eleições legislativas no Egito terão lugar em 22 de abril e que a Frente de Salvação Nacional, na oposição, anunciou que boicotará essas eleições;
N. Considerando que, em 2 de março, durante a sua visita o Secretário de Estado norte‑americano exerceu pressões sobre o Egito, para que este adotasse as reformas económicas de austeridade necessárias para ter direito a um pacote de empréstimos do Fundo Monetário Internacional de um valor de 4,8 mil milhões de dólares, tendo igualmente anunciado uma contribuição dos EUA de 190 milhões de dólares a título de apoio orçamental; que as reformas de austeridade relativas ao controlo do défice darão origem ao agravamento das condições de trabalho, das condições sociais e das condições de vida da população egípcia;
1. Reitera o seu apoio às reivindicações do povo egípcio no que diz respeito à liberdade, à dignidade humana, à justiça social, à liberdade plena, à democracia autêntica, ao respeito pelos direitos humanos, a melhores condições de vida e a um Estado laico e, nomeadamente, às suas reivindicações no sentido de aumentos salariais consentâneos com o aumento dos preços, do alojamento, da saúde, da criação de emprego, da retirada da Constituição objeto de distorções, da formação de um governo de salvação nacional e da rápida realização de eleições presidenciais;
2. Manifesta a sua extrema preocupação face ao aumento da repressão e aos ataques contra os sindicatos e ativistas sindicais e reclama a reintegração dos trabalhadores despedidos por envolvimento em atividades sindicais;
3. Advoga o direito dos trabalhadores a constituírem sindicatos e a lançarem-se na atividade sindical sem medo de repressões;
4. Exorta à criação de uma comissão de inquérito independente e imparcial para investigar as violações dos direitos humanos cometidas durante o regime de Hosni Mubarak, incluindo os casos de execução extrajudicial e de prisão arbitrária, para identificar os responsáveis e, sendo o caso, levá-los a tribunal, com indemnização às vítimas e suas famílias;
5. Manifesta a sua firme oposição às condições anexas ao empréstimo do FMI, porquanto essas condições contribuirão para a deterioração das condições de vida dos trabalhadores e das camadas mais vulneráveis da sociedade egípcia;
6. Insiste em que o futuro do Egito se deve manter firmemente nas mãos do povo egípcio, sem qualquer ingerência externa;
7. Insta as autoridades egípcias a assegurarem que toda a legislação que substitua a legislação aplicável às ONG seja conforme ao direito internacional, respeite os direitos à liberdade de expressão e à liberdade de associação e assente em consultas transparentes das organizações de defesa dos direitos humanos e outras ONG;
8. Exorta as autoridades egípcias a porem termo à impunidade e a tomarem medidas drásticas para pôr fim às violações, ao assédio sexual e a todas as formas de discriminação em razão do género;
9. Recorda que as relações económicas, políticas, sociais, culturais e de outra natureza entre a UE e os países da PEV devem assentar na igualdade de tratamento, na não-ingerência, na solidariedade, no diálogo e no respeito das assimetrias e das características específicas de cada país;
10. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução à Vice-Presidente da Comissão/Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, aos governos e parlamentos dos EstadosMembros, à Assembleia Parlamentar da União para o Mediterrâneo e ao governo e parlamento do Egito.
- [1] Textos Aprovados, P7_TA(2011)0576