Proposta de resolução - B7-0363/2013Proposta de resolução
B7-0363/2013

PROPOSTA DE RESOLUÇÃO sobre a situação no Egito

2.7.2013 - (2013/2697(RSP))

apresentada na sequência de uma declaração da Vice-Presidente da Comissão / Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança
nos termos do artigo 110.º, n.º 2, do Regimento

Willy Meyer, Marie-Christine Vergiat, Jacky Hénin, Paul Murphy, Marisa Matias em nome do Grupo GUE/NGL

Processo : 2013/2697(RSP)
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B7-0363/2013
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B7‑0363/2013

Resolução do Parlamento Europeu sobre a situação no Egito

(2013/2697 (RSP)).

O Parlamento Europeu,

–   Tendo em conta as suas resoluções anteriores sobre o Egito, nomeadamente as de 16 fevereiro de 2012[1], 15 de março de 2012[2] e 14 de março de 2013[3],

–   Tendo em conta a sua anterior resolução, de 14 de dezembro de 2011, sobre a Política Europeia de Vizinhança (PEV) e sobre a União para o Mediterrâneo[4],

–   Tendo em conta o Plano de Ação UE-Egito de 2007, bem como o Acordo de Associação União Europeia‑Egito, em vigor desde 1 de junho de 2004,

–   Tendo em conta o pacote de medias relativas à PEV, desenvolvido em 2004, e, em particular, o relatório intercalar da Comissão sobre a sua execução, de 20 de março de 2013,

–   Tendo em conta a declaração do seu Presidente, Martin Schulz, sobre a condenação de 43 trabalhadores de ONG no Egito em 5 de junho de 2013,

–   Tendo em conta as declarações da Vice-Presidente da Comissão/Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, Catherine Ashton, de 1 de fevereiro de 2012, sobre a repressão contínua da sociedade civil no Egito; tendo em conta a declaração do porta-voz da VP/AR sobre a nova legislação relativa às ONG, de 2 de junho de 2013; tendo em conta a declaração conjunta da VP/AR e do Comissário europeu responsável pelo Alargamento da União Europeia e pela Política de Vizinhança, Štefan Füle, sobre as sentenças pronunciadas nos julgamentos das ONG egípcias, de 5 de junho de 2013,

–   Tendo em conta as conclusões do Conselho, de 27 de fevereiro de 2012, 25 de junho de 2012, 19 de novembro de 2012 e 10 de dezembro de 2012, sobre o Egito, de 31 de janeiro de 2013, sobre o apoio da UE às mudanças sustentáveis nas sociedades em transição e, de 8 de fevereiro de 2013, sobre a Primavera Árabe,

–   Tendo em conta as declarações do Presidente do Conselho Europeu, Herman Van Rompuy, na sequência das suas reuniões com o Presidente do Egito, Mohamed Morsi, em 13 de setembro de 2012 e 13 de janeiro de 2013,

–   Tendo em conta as reuniões do Grupo de Trabalho UE de 13 e 14 de novembro de 2012 e respetivas conclusões,

–   Tendo em conta o memorando da Comissão, de 8 de fevereiro de 2013, intitulado «A resposta da UE à Primavera Árabe: a situação dois anos mais tarde»,

–   Tendo em conta a comunicação conjunta, de 15 de maio de 2012, da Comissão e da VP/AR ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões sobre a realização de uma nova Política Europeia de Vizinhança,

–   Tendo em conta a declaração do porta-voz do Secretário-Geral da ONU, Ban Ki-moon, sobre o Egito, de 5 de junho de 2013; tendo em conta a declaração do Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos do Homem, Navi Pillay, de 8 de maio de 2013; tendo em conta dos comunicados à imprensa do seu porta-voz, de 7 de junho de 2013,

–   Tendo em conta a declaração urgente da Rede Euro-Mediterrânica dos Direitos Humanos e do Observatório para a Proteção dos Defensores dos Direitos Humanos, o programa conjunto da Federação Internacional dos Direitos Humanos e da Organização Mundial contra a Tortura, sobre a situação no Egito e, em particular, sobre as restrições alarmantes impostas à sociedade civil e a sua criminalização, de 5 de junho de 2013,

–   Tendo em conta a declaração de 40 organizações da sociedade civil egípcias, de 30 de maio de 2013,

–   Tendo em conta a Constituição Egípcia e, em particular, o seu artigo 51.º, que estabelece que as associações devem ser constituídas mediante notificação,

–   Tendo em conta o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, de 1966, de que o Egito decidiu ser parte,

–   Tendo em conta a Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948,

–   Tendo em conta o artigo 110.º, n.º 2, do seu Regimento,

A. Considerando que, em 30 de junho de 2013, milhões de manifestantes em todo o país exigiram a demissão de Mohamed Morsi na maior manifestação realizada no país desde a revolução de 2011 que derrubou Hosni Mubarak; considerando que, apesar de a esmagadora maioria dos manifestantes ser pacífica, pelo menos sete pessoas morreram e centenas ficaram feridas em todo o país;

B.  Considerando que, pelo menos, 16 pessoas morreram durante os protestos; considerando que os manifestantes contra o governo invadiram a sede nacional da Irmandade Muçulmana no Cairo e que seis ministros pediram a demissão durante os protestos maciços contra o governo da Irmandade Muçulmana, facto que é revelador da fragilidade interna do Governo de Morsi;

C. Considerando que o exército egípcio anunciou que daria às forças políticas rivais do país 48 horas para resolver a crise antes de intervir se o Presidente Mursi e os seus opositores não ouvirem «a vontade do povo», salientando a possibilidade de um golpe de Estado militar no Egito;

D. Considerando que a oposição constituída pela Frente de Salvação Nacional (FSN) emitiu aquilo a que chamou «Declaração da revolução 1», apelando aos manifestantes de todo o Egito para que mantenham as concentrações pacíficas em todas as praças, ruas e aldeias do país até que seja derrubado o último membro do regime ditatorial; considerando que o Ministro da Defesa alertou para a possibilidade de o exército intervir caso a situação se torne incontrolável;

E.  Considerando que a FSN é um dos grupos de oposição progressistas, liberais e laicos que apoiaram a petição organizada pelo movimento Tamarod (Revolta), solicitando a realização de novas eleições; considerando que a oposição declarou que a petição foi assinada por mais de 22 milhões de pessoas e que Morsi foi eleito por 13 milhões de votos a favor;

F.  Considerando que os manifestantes continuam a apresentar as mesmas reivindicações da revolução de 25 de janeiro no que se refere à liberdade, à dignidade humana e à justiça social; considerando que reclamam aumentos salariais consentâneos com o aumento dos preços, alojamento, cuidados de saúde, criação de emprego, retirada da Constituição falseada, formação de um governo de salvação nacional e rápida realização de eleições presidenciais;

G. Considerando que decorreram já dois anos após a demissão de Hosni Mubarak na sequência de manifestações maciças na Praça Tahrir e das sublevações em todo o Egito apelando a reformas fundamentais no sistema politico, económico e social do país, ao fim da corrupção, à liberdade plena, à democracia autêntica, ao respeito pelos direitos humanos, a melhores condições de vida e a um Estado laico;

H. Considerando que, em novembro de 2012, o recém-eleito Presidente do Egito, Mohamed Morsi, atribuiu unilateralmente maiores poderes a si próprio, declarando as suas decisões isentas de fiscalização judicial e proibindo os tribunais de dissolver a Assembleia Constituinte e a câmara alta do Parlamento; considerando que, em resultado desta decisão, cerca de 200 000 pessoas se concentraram na Praça Tahrir apelando à sua demissão; que a Assembleia Constituinte se apressou a concluir o projeto de Constituição e Morsi fixou a data de 15 de dezembro de 2012 para um referendo;

I.   Considerando que, em dezembro de 2012, mais de 100 000 manifestantes marcharam até ao palácio presidencial para solicitar a anulação do referendo e a redação de uma nova Constituição; que o povo egípcio aprovou a Constituição, num referendo de duas voltas, com 63,8 % de votos a favor, embora a participação na votação se tenha limitado a 32,9 %;

J.   Considerando que, em 2012, tiveram lugar em todo o Egito mais de 3 400 protestos, na sua maioria greves e ocupações, sobre questões sociais e económicas; que este número é cerca de cinco vezes superior ao registado em qualquer outro ano do século XXI; que mais de dois terços desses protestos ocorreram após o início das funções presidenciais de Mohamed Morsi, em 30 de junho;

K. Considerando que os ataques físicos e jurídicos contra os ativistas sindicais aumentaram desde a eleição do Presidente Morsi; que, em setembro de 2012, cinco dirigentes sindicais da Companhia de Contentores do Porto de Alexandria foram condenados a três anos de prisão por terem conduzido uma greve de 600 trabalhadores em outubro de 2011;

L.  Considerando que, em janeiro de 2013, centenas de milhares de pessoas protestaram contra Mohamed Morsi na Praça Tahrir e em todo o país; considerando que, durante a comemoração do segundo aniversário da revolução de 25 de janeiro de 2011, o recurso desnecessário a meios letais das forças de segurança num fim de semana de confrontos com manifestantes causou a morte de pelo menos 45 pessoas e ferimentos em outras 1 000;

M. Considerando que, em 7 de maio de 2013, o Presidente Morsi remodelou o Governo, aumentando o número de ministros provenientes da Irmandade Muçulmana; considerando que estas mudanças poderão estar ligadas ao objetivo de concluir as negociações com o Fundo Monetário Internacional (FMI), que se arrastavam há muito, com vista a garantir um empréstimo de 4,8 mil milhões de dólares;

N. Considerando que há meses que o Egito se encontra enclausurado numa crise política e económica; que continuam a registar-se vagas de protestos contra Mohamed Morsi que deram sistematicamente lugar a confrontos mortais e distúrbios; que o Presidente Morsi e a Irmandade Muçulmana estão efetivamente a seguir as pisadas do deposto Hosni Mubarak, não efetuando quaisquer reformas e procurando, simultaneamente, criar um sistema conservador no plano religioso;

O. Considerando que há meses que os manifestantes prosseguem os seus protestos contra Mohamed Morsi; que as pessoas saíram à rua para protestar, porquanto a situação no país sob o governo da Irmandade Muçulmana não só não melhorou, como se deteriorou; que a inflação e o desemprego aumentaram no Egito durante o mandato presidencial de Morsi; que a repressão estatal das manifestações traz à memória a repressão realizada por Mubarak; que os manifestantes denunciam o recurso à tortura, ao assédio, a detenções, a linchagem e a violações entre a população egípcia e pretendem que os responsáveis sejam levados a tribunal; que as frustrações crescem face à morosidade do processo de reforma e aos abusos contínuos cometidos pela polícia e por outras forças da segurança, que continuam a agir com impunidade; que a impunidade alimentou o assédio sexual e os ataques contra as mulheres nas proximidades da Praça Tahrir;

P.  Considerando que a nova Constituição elaborada pelo partido de Mohamed Morsi, a Irmandade Muçulmana, abriu as portas a um Estado religioso e não garante a liberdade de expressão, porquanto legaliza o confisco de jornais e a detenção de jornalistas; que a Constituição impede a liberdade de educação, permite a discriminação religiosa, é lesiva dos direitos das mulheres e crianças e não prevê o direito à saúde e ao alojamento, nem os direitos dos trabalhadores; que esta Constituição coloca o Presidente Morsi acima da lei e permite o julgamento militar de civis;

Q. Considerando que o Conselho da Shura (câmara alta do Parlamento) está a elaborar uma lei restritiva de greves e manifestações e que esta lei se baseia na Lei 14 de 1923, que era altamente restritiva e decorre da repressão colonial britânica que se seguiu à sublevação de 1919 contra a ocupação britânica,

R.  Considerando que as ONG são cada vez mais objeto de uma legislação repressiva no Egito, que dificulta consideravelmente o seu funcionamento, incluindo o registo, o financiamento e a investigação; que se solicitou ao Banco Central do Egito que controlasse todas as transferências bancárias das ONG; que dez escritórios de ONG com financiamento internacional foram invadidos, investigados e posteriormente proibidos pelo Tribunal Supremo das Forças Armadas, tendo 43 trabalhadores sido julgados e declarados culpados pelo Tribunal Penal do Norte do Cairo, em 4 de junho de 2013, e condenados a penas de prisão de um a cinco anos com base na Lei 84/2002, que remonta à época de Mubarak;

S.  Considerando que o Egito está a negociar um empréstimo do FMI de 4,8 mil milhões de dólares, que implicaria medidas de austeridade económica; considerando que as reformas de austeridade relativas ao controlo do défice darão origem ao agravamento das condições de trabalho, das condições sociais e das condições de vida da população egípcia;

1.  Reitera o seu apoio às reivindicações do povo egípcio no que diz respeito à liberdade, à dignidade humana, à justiça social, à liberdade plena, à democracia autêntica, ao respeito pelos direitos humanos, a melhores condições de vida e a um Estado laico e, nomeadamente, às suas reivindicações no sentido de aumentos salariais consentâneos com o aumento dos preços, do alojamento, da saúde, da criação de emprego, da retirada da Constituição desnaturada, da formação de um governo de salvação nacional e da rápida realização de eleições presidenciais;

2.  Apoia os pedidos da sociedade civil egípcia, que se manifesta neste fim de semana para exigir novas eleições e a formação de um novo governo que inicie um processo constituinte para redigir uma nova Constituição;

3.  Está firmemente convencido de que os líderes e os generais do exército egípcio não oferecerão vias para sejam atendidas as justas reivindicações dos manifestantes, pois os líderes do exército ocupam fortes posições económicas no Egito e representam, portanto, interesses económicos e políticos distintos dos dos trabalhadores, pobres e jovens que exigem justiça social e uma melhoria das suas condições de vida;

4.  Manifesta a sua profunda preocupação face ao aumento da repressão e aos ataques contra os sindicatos e ativistas sindicais e reclama a reintegração dos trabalhadores despedidos por envolvimento em atividades sindicais;

5.  Advoga o direito dos trabalhadores a constituírem sindicatos e a participarem na atividade sindical sem medo de repressões;

6.  Exorta à criação de uma comissão de inquérito independente e imparcial para investigar as violações dos direitos humanos cometidas durante a presidência de Mohamed Morsi e também durante o regime de Hosni Mubarak, incluindo os casos de execução extrajudicial e de prisão arbitrária, para identificar os responsáveis, nomeadamente o Tribunal Supremo das Forças Armadas, e, se for caso disso, levá-los a tribunal, com indemnização das vítimas e suas famílias;

7.  Manifesta a sua firme oposição às condições inerentes ao empréstimo do FMI, porquanto contribuirão para a deterioração das condições de vida dos trabalhadores e das camadas mais vulneráveis da sociedade egípcia;

8.  Insiste em que o futuro do Egito deve permanecer firmemente nas mãos do povo egípcio, sem qualquer ingerência externa; opõe-se a toda e qualquer interferência imperialista externa; está convencido de que nem uma intervenção do exército egípcio nem o regresso de antigos elementos do regime de Mubarak representarão um passo em frente na resolução das legítimas aspirações da população egípcia;

9.  Insta as autoridades egípcias a velarem por que toda a legislação que substitua a legislação aplicável às ONG seja conforme com o direito internacional, respeite os direitos à liberdade de expressão e à liberdade de associação e assente em consultas transparentes das organizações de defesa dos direitos humanos e outras ONG;

10. Insta as autoridades egípcias a porem termo à impunidade e a tomarem medidas drásticas para pôr fim às violações, ao assédio sexual e a todas as formas de discriminação em razão do género;

11. Recorda que as relações económicas, políticas, sociais, culturais e de outra natureza entre a UE e os países da PEV devem assentar na igualdade de tratamento, na não-ingerência, na solidariedade, no diálogo e no respeito das assimetrias e das características específicas de cada país;

12. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução à Vice-Presidente da Comissão/Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, aos governos e parlamentos dos Estados­Membros, à Assembleia Parlamentar da União para o Mediterrâneo e ao Governo e Parlamento do Egito.