PROPOSTA DE RESOLUÇÃO sobre os fluxos migratórios no Mediterrâneo, com especial destaque para os trágicos acontecimentos ao largo de Lampedusa
16.10.2013 - (2013/2827(RSP))
nos termos do artigo 110.º, n.º 2, do Regimento
Jan Mulder em nome do Grupo ALDE
Ver igualmente a proposta de resolução comum RC-B7-0474/2013
B7‑0475/2013
Resolução do Parlamento Europeu sobre os fluxos migratórios no Mediterrâneo, com especial destaque para os trágicos acontecimentos ao largo de Lampedusa
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta a Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais,
– Tendo em conta a Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948,
– Tendo em conta as Convenções de Genebra de 1949 e os respetivos protocolos adicionais,
– Tendo em conta o Regulamento (UE) n.º 439/2010 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de maio de 2010, que institui o Gabinete Europeu de Apoio em matéria de Asilo[1],
– Tendo em conta a proposta sobre a vigilância das fronteiras marítimas externas no contexto da cooperação operacional coordenada pela Agência Europeia de Gestão da Cooperação Operacional nas Fronteiras Externas dos EstadosMembros da União Europeia,
– Tendo em conta o Regulamento (UE) n.º 1168/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de outubro de 2011, que altera o Regulamento (CE) n.º 2007/2004 do Conselho que cria uma Agência Europeia de Gestão da Cooperação Operacional nas Fronteiras Externas dos EstadosMembros da União Europeia (FRONTEX)[2],
– Tendo em conta a Posição do Parlamento Europeu aprovada em primeira leitura, em 10 de outubro de 2013, tendo em vista a aprovação do Regulamento (UE) n.º .../2013 do Parlamento Europeu e do Conselho que cria o Sistema Europeu de Vigilância das Fronteiras (EUROSUR[3]
– Tendo em conta a comunicação conjunta da Comissão Europeia e da Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, de 20 de março de 2013, intitulada "Política Europeia de Vizinhança: rumo a uma parceria reforçada" (JOIN/2013/0004),
– Tendo em conta a sua resolução, de 7 de abril de 2011, intitulada "Revisão da Política Europeia de Vizinhança – Dimensão meridional"[4],
– Tendo em conta a pergunta oral sobre o regime voluntário de recolocação permanente da União, de 20 de maio de 2013,
– Tendo em conta o relatório da comissão LIBE sobre a visita da sua delegação a Lampedusa, em novembro de 2011,
– Tendo em conta a visita a Lampedusa do Presidente da Comissão Europeia, José Manuel Barroso, e da Comissária responsável pelos Assuntos Internos, Cecilia Malmström, em 9 de outubro de 2013, bem como o debate no plenário sobre as políticas migratórias da UE no Mediterrâneo, com especial destaque para os trágicos acontecimentos ao largo de Lampedusa, que tiveram lugar no mesmo dia,
– Tendo em conta os artigos 77.º e 80.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia,
– Tendo em conta o artigo 110.º, n.º 2, do seu Regimento,
A. Considerando que, devido às recentes tragédias ocorridas ao largo de Lampedusa, pelo menos 360 migrantes perderam a vida e muitos estão desaparecidos;
B. Considerando que pelo menos 20 000 pessoas morreram no mar desde 1993, segundo a Organização Internacional para as Migrações, o que aponta uma vez mais para a necessidade de fazermos tudo ao nosso alcance para salvar as vidas das pessoas em perigo, bem como a necessidade de os EstadosMembros cumprirem as suas obrigações internacionais em matéria de salvamento marítimo;
C. Considerando que os contrabandistas e traficantes de seres humanos exploram os migrantes irregulares e que as vítimas são obrigadas, induzidas ou persuadidas sob falsos pretextos, por redes criminosas, a vir para a Europa; considerando que estas redes criminosas representam um sério risco para a vida dos migrantes e um desafio para a UE;
D. Considerando que o princípio da solidariedade e da partilha equitativa de responsabilidades está inscrito no artigo 80.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia;
E. Considerando que o novo sistema europeu comum de asilo (SECA) revisto tem como objetivo estabelecer regras mais claras e garantir uma proteção equitativa e adequada dos refugiados que necessitem de proteção internacional;
F. Considerando que a legislação da UE já prevê alguns instrumentos, como o Código de Vistos e o Código das Fronteiras Schengen, que permitem a concessão de vistos humanitários a refugiados;
G. Considerando que os EstadosMembros devem ser encorajados a utilizar os fundos que vão estar disponíveis ao abrigo do Fundo para o Asilo e a Migração e os fundos que estão disponíveis ao abrigo da Ação Preparatória "Permitir a reinstalação de refugiados durante situações de emergência", que inclui, nomeadamente, as seguintes medidas: apoio às pessoas já reconhecidas como refugiados pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR); apoio a medidas de emergência identificadas como prioridades no caso de grupos de refugiados alvo de ataques armados e que se encontrem em situações de extrema vulnerabilidade e perigo de vida; prestação, quando necessário, de ajuda financeira adicional, em situações de emergência, ao ACNUR e às suas organizações de ligação nos EstadosMembros e a nível da UE;
1. Manifesta profunda tristeza e pesar face à trágica perda de vidas ao largo de Lampedusa; exorta a União Europeia e os EstadosMembros a envidar mais esforços para impedir novas perdas de vidas no mar;
2. Considera que Lampedusa deve funcionar como um sinal de alerta para a Europa e que a única forma de impedir outra tragédia reside na adoção de uma abordagem coordenada, baseada na solidariedade e na responsabilidade e apoiada por instrumentos conjuntos;
3. Solicita ajuda humanitária para os sobreviventes destes acontecimentos trágicos, e apela à UE e aos EstadosMembros para que continuem empenhados em garantir os direitos fundamentais universais destas pessoas, nomeadamente os direitos dos menores não acompanhados;
4. Acentua que é preferível uma entrada legal na UE a uma entrada irregular mais perigosa, que pode comportar riscos de tráfico de seres humanos e causar a perda de vidas; insta, por conseguinte, os EstadosMembros a examinar toda a legislação e procedimentos da UE em vigor para permitir uma entrada segura na UE, a fim de admitir temporariamente as pessoas que se veem obrigadas a fugir do seu país; salienta que a legislação da UE já prevê alguns instrumentos, como o artigo 25.º do Código de Vistos e o artigo 5.º do Código das Fronteiras Schengen, que permitem a concessão de vistos humanitários a refugiados;
5. Manifesta a sua preocupação relativamente ao facto de um número crescente de pessoas estarem a arriscar as suas vidas fazendo perigosas travessias de barco no Mediterrâneo para chegar à UE; insta os EstadosMembros a tomar medidas para permitir que os requerentes de asilo tenham acesso ao sistema de asilo da União, de forma segura e equitativa;
6. Recorda que a solidariedade da UE deve andar a par com a responsabilidade; relembra aos EstadosMembros que têm uma obrigação legal de prestar socorro aos migrantes no mar;
7. Exorta os EstadosMembros a fazer uso das suas competências e a recorrer a todas as medidas existentes para ações de salvamento marítimo;
8. Exorta a UE e os EstadosMembros a revogar ou rever toda a legislação que criminalize as pessoas que prestam assistência a migrantes no mar; solicita à Comissão Europeia que reveja a Diretiva 2002/90/CE do Conselho, que define as sanções aplicáveis em caso de auxílio à entrada, ao trânsito e à residência irregulares, com vista a clarificar que a prestação de ajuda humanitária aos migrantes em perigo no mar é a regra geral, e não uma ação que deva dar origem a qualquer tipo de sanção;
9. Insta a União a aprovar rapidamente as novas regras em matéria de interceção para as operações no mar coordenadas pela FRONTEX, com vista a assegurar medidas de emergência eficazes e coordenadas a nível da UE, bem como operações realizadas em plena conformidade com a legislação e as normas internacionais relevantes em matéria de direitos humanos e de refugiados e com as obrigações no quadro do Direito do Mar;
10. Insta a FRONTEX e os EstadosMembros a assegurar que todas as guardas de fronteira e demais pessoal dos EstadosMembros que participem nas equipas de guardas de fronteira europeias, bem como o pessoal da agência, recebam formação no domínio do direito da União e internacional relevante e dos direitos fundamentais, em conformidade com o artigo 5.º do regulamento revisto da FRONTEX;
11. Insta a União e os EstadosMembros a envidar esforços no sentido de criar mecanismos eficazes para a identificação de locais seguros para o desembarque dos refugiados e migrantes socorridos;
12. Exorta a União e os EstadosMembros a conceder acesso a procedimentos de asilo justos e eficazes para as pessoas que possam carecer de proteção internacional, com base na premissa de que o desembarque não implica necessariamente que o único responsável pelo processo e pelas soluções seja o Estado em cujo território ocorre o desembarque das pessoas resgatadas do mar;
13. Insta a União e os EstadosMembros a gerir os fluxos de migração mistos através da utilização dos instrumentos europeus e nacionais disponíveis, bem como a assegurar uma boa coordenação e comunicações, como a facilitação da partilha de informações entre as guardas costeiras nacionais;
14. Exorta a União, a FRONTEX e os EstadosMembros a garantir que a assistência a migrantes em perigo e o salvamento marítimo sejam uma das principais prioridades da execução do recentemente adotado Regulamento EUROSUR;
15. Solicita um reforço do orçamento do Gabinete Europeu de Apoio em matéria de Asilo (GEAA) e da Agência Europeia de Gestão da Cooperação Operacional nas Fronteiras Externas dos EstadosMembros (FRONTEX) com vista a ajudar os EstadosMembros em circunstâncias que exijam assistência técnica e operacional suplementar nas fronteiras externas, tendo em conta que certas situações podem envolver emergências humanitárias e operações de salvamento marítimo; recorda que o financiamento adequado destes instrumentos é fundamental para desenvolver uma abordagem coordenada; exorta ainda os EstadosMembros a intensificar a sua cooperação prática com o GEAA e a FRONTEX, nomeadamente através de auxílios em espécie (destacamento de funcionários, apoio material, etc.);
16. Lamenta que a UE não tenha tido capacidade ou vontade de elaborar uma estratégia global para o Mediterrâneo que inscreva a migração da mão-de-obra no contexto do desenvolvimento social, económico e político da região; exorta a Vice-Presidente/Alta Representante a dar mais relevo a medidas que desencorajem a emigração casual e incentivem os governos dos Estados do Sul do Mediterrâneo a exercer de forma mais eficaz o controlo das suas fronteiras;
17. Solicita à UE que continue a prestar ajuda humanitária, financeira e política às regiões afetadas por crises no norte de África e no Médio Oriente com vista a atacar as verdadeiras causas da migração;
18. Insta os EstadosMembros a velar pela correta aplicação de todas as disposições previstas nos vários instrumentos do SECA; relembra aos EstadosMembros que as pessoas que procuram proteção internacional devem ser encaminhadas para as autoridades nacionais competentes em matéria de asilo e ter acesso a procedimentos de asilo equitativos e eficazes;
19. Sublinha, nomeadamente, a importância da partilha de responsabilidade financeira no domínio do asilo, e recomenda a criação de um mecanismo dotado de recursos adequados e baseado em critérios objetivos para reduzir a pressão sobre os EstadosMembros que acolhem números mais elevados de requerentes de asilo e de beneficiários de proteção internacional, tanto em termos absolutos como proporcionais;
20. Insta a UE e os EstadosMembros a tomar medidas adequadas e responsáveis em relação a um possível afluxo de refugiados aos EstadosMembros; solicita à Comissão e aos EstadosMembros que continuem a acompanhar a situação atual e a elaborar planos de emergência, incluindo a possibilidade de aplicação da diretiva relativa à proteção temporária, se as condições o exigirem;
21. Exorta os EstadosMembros a respeitar o princípio da não-repulsão, em conformidade com o direito internacional e da UE em vigor; apela aos EstadosMembros para que ponham termo imediato a quaisquer práticas de detenção abusivas e prolongadas que violem o direito internacional e europeu, e sublinha que as medidas de detenção de migrantes devem estar sempre sujeitas a uma decisão administrativa, ser devidamente justificadas e de caráter temporário;
22. Incentiva os EstadosMembros a dar resposta às necessidades prementes através da reinstalação, para além das quotas nacionais existentes e através da admissão por motivos humanitários; encoraja os EstadosMembros a utilizar os fundos ainda disponíveis ao abrigo da ação preparatória ou do projeto-piloto sobre a reinstalação;
23. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão, à Vice-Presidente da Comissão/Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, aos governos e parlamentos dos EstadosMembros, ao Secretário-Geral das Nações Unidas e ao Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados.