PROPOSTA DE RESOLUÇÃO sobre a pressão exercida pela Rússia sobre os países da Parceria Oriental e, em particular, a desestabilização do leste da Ucrânia
15.4.2014 - (2014/2699(RSP))
nos termos do artigo 110.º, n.º 2, do Regimento
Rebecca Harms, Mark Demesmaeker, Werner Schulz, Tarja Cronberg, Ulrike Lunacek, Helga Trüpel em nome do Grupo VERTS/ALE
Ver igualmente a proposta de resolução comum RC-B7-0436/2014
B7‑0441/2014
Resolução do Parlamento Europeu sobre a pressão exercida pela Rússia sobre os países da Parceria Oriental e, em particular, a desestabilização do leste da Ucrânia
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta as suas resoluções anteriores sobre a Ucrânia, em particular as suas resoluções de 27 de fevereiro de 2014[1] e de 13 de março de 2014[2],
– Tendo em conta as conclusões da reunião extraordinária do Conselho «Negócios Estrangeiros» sobre a Ucrânia, de 3 de março de 2014, e as conclusões do Conselho «Negócios Estrangeiros», de 17 de março de 2014 e de 14 de abril de 2014,
– Tendo em conta a declaração dos Chefes de Estado e de Governo sobre a Ucrânia no Conselho Europeu de 6 de março de 2014,
– Tendo em conta as conclusões do Conselho Europeu, de 20 de março de 2014, sobre a Ucrânia,
– Tendo em conta o artigo 110.º, n.º 2, do seu Regimento,
A. Considerando que foram organizadas manifestações pró-Rússia no leste da Ucrânia nos últimos dias; que em Donetsk, Luhansk e Kharkiv os manifestantes ocuparam edifícios das administrações regionais do Estado e outros edifícios públicos; que os separatistas invadiram igualmente edifícios do Serviço de Segurança e as instalações de estações televisivas locais;
B. Considerando que, em Donetsk, os manifestantes pró-russos proclamaram a «República de Donetsk» e tencionam realizar um referendo sobre o apoio a essa «república soberana», o mais tardar, em 11 de maio de 2014; que, em Kharkiv e Luhansk, os manifestantes proclamaram «repúblicas populares», à semelhança de Donetsk;
C. Considerando que, entre 12 e 13 de abril de 2014, as esquadras de polícia e os edifícios públicos de Sloviansk, Kramatorsk, Krasnyi Liman, Mariupol, Yenakiieve e de outras cidades da região de Donetsk foram atacados e ocupados por homens bem armados, não identificados e encapuçados, na sequência de uma série de rusgas coordenadas; que pelo menos um agente morreu e vários ficaram feridos durante os confrontos;
D. Considerando que nas últimas semanas a Rússia reforçou a presença de forças militares na sua fronteira com a Ucrânia; que existe o risco real de a Rússia poder tentar repetir o «cenário da Crimeia» com a ocupação e a anexação de partes do sudeste da Ucrânia;
E. Considerando que, em 1 de março de 2014, o Conselho da Federação da Rússia autorizou o Presidente Vladimir Putin a enviar forças armadas russas para o território da Ucrânia a pedido do próprio, sob o falso pretexto de que a situação na Ucrânia está a colocar em risco a vida dos cidadãos russos;
F. Considerando que, nos últimos tempos, não houve na Ucrânia qualquer registo de ataques, intimidação ou discriminação contra cidadãos russos ou de etnia russa ou de outras minorias;
G. Considerando que as ações dos separatistas parecem ter como objetivo a desestabilização do país, prejudicar o processo eleitoral e enfraquecer o novo governo, em coordenação com os esforços de Moscovo no sentido de aumentar a pressão sobre Kiev a nível económico, militar e político, a fim de retirar legitimidade às autoridades ucranianas e impedir a Ucrânia de procurar uma maior integração com a UE;
H. Considerando que, neste contexto, a Rússia aumentou o preço do gás para a Ucrânia para 486 USD por 1000 m3 a partir de 1 de abril, pondo unilateralmente fim ao desconto de que a Ucrânia beneficiava no âmbito dos Acordos de Kharkiv e, nos últimos dias, impediu os produtos lácteos ucranianos de entrarem no território russo; que a Federação da Rússia também aplicou, de forma arbitrária, restrições unilaterais ao comércio de produtos da Geórgia e da Moldávia;
I. Considerando que a UE adotou um pacote de medidas económicas a favor da Ucrânia que inclui igualmente assistência macrofinanceira e medidas comerciais autónomas; que a Ucrânia está prestes a finalizar um acordo com o Fundo Monetário Internacional relativo a um plano de ajuda; que as exigências e contrapartidas deste acordo se mantêm, até à data, confidenciais; que a situação social e económica do país continua a deteriorar-se;
J. Considerando que, em 21 de março de 2014, a UE e a Ucrânia assinaram as disposições políticas do Acordo de Associação (AA), com o compromisso de assinar as restantes disposições do acordo, que incluam a Zona de Comércio Livre Abrangente e Aprofundada (ZCLAA), o mais rapidamente possível;
K. Considerando que, em 10 de abril de 2014, a Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa aprovou uma resolução destinada a retirar os direitos de voto dos representantes da Federação da Rússia na Assembleia, em virtude da anexação da Crimeia pela Rússia, na sequência da ocupação militar da península;
L. Considerando que é necessária uma ação diplomática internacional firme a todos os níveis, a fim de desanuviar a situação e impedir que esta crise assuma proporções incontroláveis; que a UE tem de responder eficazmente de modo a permitir que a Ucrânia e outros países da Parceria Oriental exerçam e gozem plenamente da sua soberania sem pressões externas;
M. Considerando que, neste contexto, a OSCE decidiu destacar uma missão internacional na Ucrânia com o objetivo de acompanhar a situação e mitigar a crise; que o Conselho Europeu pediu à Alta Representante que elaborasse planos para um contributo da UE no sentido de facilitar o trabalho da missão da OSCE;
1. Manifesta profunda preocupação perante a atual crise e as potenciais implicações, impacto e consequências que esta crise poderá ter para a segurança de toda a região e para o futuro das relações UE-Rússia; exorta, neste contexto, todos os intervenientes a agirem de forma construtiva e a demonstrarem contenção, a fim de desanuviar a crise e de encontrar uma solução viável para estabilizar a situação e permitir que as autoridades ucranianas façam face aos problemas económicos e sociais atuais e tomem medidas urgentes e eficazes para os combater;
2. Lamenta, a este respeito, que a abordagem responsável assumida pelas autoridades de Kiev numa tentativa de solucionar a crise através do diálogo e de meios diplomáticos tenha, até à data, falhado e exorta essas autoridades a redobrarem os seus esforços com vista a reforçar a unidade do país e a conseguir a reconciliação entre todos os estratos da sociedade ucraniana; apela, neste contexto, ao desarmamento imediato de todos os grupos paramilitares e forças de autodefesa;
3. Condena veementemente a anexação da Crimeia pela Federação da Rússia, ato que constitui uma violação do direito internacional e da Ata Final de Helsínquia, e solicita a Moscovo que reduza e retire imediatamente as suas tropas da fronteira com a Ucrânia e ponha termo a qualquer ação deliberada, infiltração, interferência política ou apoio dissimulado às manifestações organizadas no leste da Ucrânia, enquanto primeira medida concreta no sentido de desanuviar a crise;
4. Recorda a Rússia das suas obrigações jurídicas enquanto signatária do Memorando de Budapeste de 1994, no qual as partes se comprometem a não recorrer à ameaça e a não fazer uso da força contra a integridade territorial ou a independência política da Ucrânia;
5. Aguarda com expectativa a reunião quadripartida entre a Alta Representante da UE, o Secretário de Estado dos EUA e os Ministros dos Negócios Estrangeiros da Rússia e da Ucrânia, e espera que a mesma possa contribuir para reduzir as tensões e lançar as bases de uma solução diplomática abrangente e duradoura para a crise; salienta, contudo, que as escolhas futuras da Ucrânia apenas podem ser efetuadas pelo próprio povo ucraniano, através de um processo democrático, inclusivo e transparente; exorta, a este respeito, as autoridades de Kiev a envidarem todos os esforços no sentido de assegurar que as eleições presidenciais marcadas para 25 de maio de 2104 sejam realizadas em plena conformidade com as normas da OSCE e, neste sentido, acolhe favoravelmente a decisão da Comissão de atribuir 5 milhões de euros em apoios à missão de observação eleitoral da OSCE e às medidas de criação de confiança no domínio eleitoral;
6. Considera que devem ser convocadas eleições parlamentares antecipadas após as eleições presidenciais e antes do final do ano, a fim de reforçar a legitimidade das instituições ucranianas;
7. É favorável à ideia proposta pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros Deshchytsia no sentido de uma Ucrânia não-alinhada, à semelhança do modelo finlandês, enquanto meio possível para desanuviar as tensões com a Rússia e tornar claro que um AA ou uma ZCLAA com a União Europeia não estão relacionados com a integração na NATO;
8. Considera, além disso, que a reforma constitucional na Ucrânia deve ser objeto de um debate amplo e aprofundado, com a participação de todos os estratos da sociedade ucraniana, devendo eventualmente conduzir a um referendo;
9. Lamenta profundamente que uma medida excecional de assistência a curto prazo à Ucrânia, destinada a apoiar a observação das eleições e as medidas de criação de confiança no domínio eleitoral no contexto do Instrumento de Estabilidade e Paz, possa ser adiada ou cancelada devido à escassez alarmante de pagamentos destinados ao financiamento da ajuda externa da UE; exorta a Comissão e o Conselho a prepararem-se para a transferência de recursos financeiros sem mais demoras, a fim de permitir o bom funcionamento do Instrumento de Estabilidade e Paz, num momento em que a vizinhança imediata da UE enfrenta uma crise tão grave;
10. Solicita, ao mesmo tempo, o destacamento pleno e efetivo da missão da OSCE responsável pelo acompanhamento da situação na Ucrânia após a ocupação da Crimeia; solicita, além disso, o seu alargamento à Crimeia e acolhe favoravelmente a decisão do Conselho Europeu no sentido de encontrar formas de facilitar o trabalho dessa missão;
11. Assinala que a suspensão dos direitos de voto da delegação russa por parte da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa, bem como a resolução adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas a condenar a Rússia pela anexação da Crimeia, constituem sinais inequívocos do crescente isolamento da Federação da Rússia a nível internacional, que devem ser tidos em devida consideração pelas autoridades russas, caso a Rússia pretenda continuar a ser um ator internacional credível;
12. Exorta a UE a apoiar os processos judiciais da Ucrânia em todos os tribunais internacionais e organismos de arbitragem, caso a Ucrânia decida apresentar queixas relativamente à questão da Crimeia e a outras controvérsias bilaterais com a Rússia;
13. Acolhe favoravelmente a decisão da União Europeia de aplicar sanções específicas, incluindo restrições de viagem e o congelamento de ativos, contra pessoas responsáveis por ações de intolerância e ódio, nomeadamente apelos à guerra, ou por ações suscetíveis de prejudicar ou ameaçar a integridade territorial, a soberania e a independência da Ucrânia, mas lamenta a decisão do Conselho «Negócios Estrangeiros», de 14 de abril de 2014, de não recorrer à terceira fase das sanções, não obstante o agravamento da crise;
14. Salienta que a exportação de armas e tecnologia militar pode comprometer a estabilidade e a paz de toda a região; lamenta profundamente que os Estados‑Membros da UE tenham exportado vastas quantidades de armas e tecnologia militar para a Rússia, incluindo capacidades estratégicas convencionais significativas; exorta a França, a Alemanha e a Itália, enquanto principais exportadores de armas para a Rússia, a reverem de forma aprofundada as suas políticas de exportação com este país, assim como a assumirem responsabilidades e a assegurarem o respeito do regime de controlo das vendas de armas da UE; insta o Governo francês a não entregar o navio de guerra Mistral topo de gama em 1 de novembro de 2014 tal como previsto atualmente; acolhe favoravelmente a decisão do Governo alemão de suspender imediatamente a cooperação entre a Rheinmetall e as forças armadas russas no que diz respeito à construção do centro de formação de combate;
15. Acolhe favoravelmente a assinatura das disposições políticas do Acordo de Associação e aguarda a aplicação rápida das preferências comerciais autónomas adotadas pela UE para colmatar a lacuna até à assinatura das restantes disposições do acordo, que incluam a Zona de Comércio Livre Abrangente e Aprofundada;
16. Reitera que o Acordo de Associação com a Ucrânia não constitui o objetivo último das relações entre a UE e a Ucrânia; sublinha, a este respeito, que, nos termos do artigo 49.º do TUE, a Ucrânia – como qualquer outro Estado europeu – tem uma perspetiva europeia e pode pedir a adesão à União, conquanto observe os princípios da Democracia, respeite as liberdades fundamentais e os direitos humanos e das minorias, e salvaguarde o Estado de direito;
17. Insta a União Europeia e o Governo da Ucrânia a desenvolverem e a implementarem, sem demora, uma campanha de informação eficaz dirigida aos cidadãos, a executarem programas que demonstrem os benefícios da associação política entre a Ucrânia e a UE e da respetiva integração económica, e a fazerem face a todas as informações falsas e tendenciosas, nomeadamente nas regiões do leste e do sul, incluindo a nível local;
18. Exorta o Governo ucraniano a lançar um conjunto ambicioso de reformas estruturais transparentes e abrangentes que confiram prioridade ao reforço do Estado de direito, à erradicação da corrupção através da adoção e execução da legislação necessária, ao estabelecimento de um sistema de governação equilibrado e atuante baseado na separação de poderes e em conformidade com as normas europeias, à introdução de uma reforma substancial do sistema judicial e da lei eleitoral, bem como ao alinhamento da legislação contra a discriminação com as normas da UE; considera ainda que é da máxima importância dar início a um processo gradual de descentralização dos poderes centrais para as administrações regionais e municipais, em conformidade com o princípio da subsidiariedade, sem comprometer o equilíbrio interno de poderes e o funcionamento eficaz do Estado; congratula-se, a este respeito, com a decisão da Comissão de criar um Grupo de Apoio à Ucrânia, que trabalhará no sentido da implementação da «Agenda Europeia para as Reformas»;
19. Salienta que o conjunto de medidas limitado adotado pela UE em resposta à invasão da Ucrânia pela Rússia prende-se igualmente com a forte dependência da União do aprovisionamento de energia proveniente da Federação da Rússia; considera, portanto, ser da máxima importância reduzir a dependência da UE de Moscovo e de outros regimes autoritários a médio prazo e ponderar a possibilidade de um boicote total, disponibilizando, para isso, alternativas concretas que ajudem os países da UE que atualmente dependem exclusivamente da Rússia como fonte de energia; insta a Comissão, neste contexto, a avançar com a implementação plena do Terceiro Pacote Energético e a apoiar projetos no corredor sul que permitam efetivamente diversificar o aprovisionamento de energia; exorta os Estados-Membros a não associarem as suas empresas públicas a projetos com empresas russas que possam aumentar a vulnerabilidade da Europa e, neste contexto, solicita também ao Conselho Europeu que adote metas nacionais vinculativas até 2030 no âmbito das energias renováveis e da eficiência energética, que reduzirão a dependência europeia das importações de combustíveis fósseis, como indicado na avaliação de impacto da Comissão que acompanha a sua Comunicação sobre o pacote do clima e da energia para 2030, assunto que figura na agenda do Conselho Europeu de 20 e 21 de março;
20. Acolhe favoravelmente as medidas iniciais adotadas pela Comissão destinadas a permitir que a Ucrânia combata uma crise energética, caso a Rússia suspenda o aprovisionamento de gás para o país, e exorta o Conselho e a Comissão a ajudarem e a apoiarem Kiev nos seus esforços com vista a solucionar o conflito de longa data com Moscovo devido ao aprovisionamento de gás;
21. Chama a atenção para a dramática situação social vivida no país; exorta o Governo ucraniano a divulgar na íntegra as exigências e contrapartidas do acordo com o FMI e solicita a adoção de medidas complementares que visem minorar a atual conjuntura no que se refere, em particular, aos setores mais vulneráveis da população; considera que as condições do FMI são suscetíveis de aumentar as tensões internas e levar à rápida redução dos salários e dos cargos na administração pública, o que poderá ter como efeito colateral o aumento da corrupção;
22. Reitera o seu apelo à criação de uma comissão independente para investigar os tiroteios em Kiev e os trágicos eventos na Praça Maidan, e que esta se torne rapidamente plenamente operacional, com uma forte componente internacional e sob supervisão do painel consultivo internacional do Conselho da Europa;
23. Sublinha a necessidade de uma eventual reforma da legislação existente no domínio das línguas, em cooperação com a Comissão de Veneza, de modo a respeitar as obrigações da Ucrânia no âmbito da Carta Europeia das Línguas Regionais e Minoritárias;
24. Acolhe favoravelmente a adoção do regime de isenção de vistos entre a UE e a Moldávia e aguarda a rápida finalização de um regime de isenção de vistos entre a UE e a Ucrânia, enquanto resposta às aspirações europeias das pessoas que protestaram na Praça Maidan; exorta paralelamente à introdução imediata de procedimentos de visto temporários, simples e pouco onerosos;
25. Insta, além disso, a Comissão a colaborar com as autoridades ucranianas a fim de encontrar formas de contrabalançar os efeitos das medidas de retaliação adotadas por Moscovo com o objetivo de suspender a assinatura do Acordo de Associação;
26. Acolhe favoravelmente a intenção de assinar os Acordos de Associação com a Moldávia e a Geórgia, o mais tardar, em junho de 2014, e exorta o Conselho a seguir o exemplo; entende ser do interesse dos países da Parceria Oriental encontrar formas de diminuir e ultrapassar quaisquer obstáculos que gerem uma situação de incompatibilidade com o Espaço Económico Europeu e a União Aduaneira; apela, por isso, a um diálogo franco e aberto com a Federação Russa, de modo a que sejam envidados todos os esforços para desenvolver sinergias que beneficiem os países da Parceria Oriental;
27. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão, aos governos dos Estados-Membros, aos Presidentes, aos Governos e aos Parlamentos da Ucrânia, da Geórgia e da Moldávia, ao Conselho da Europa, à OSCE e ao Presidente, ao Governo e ao Parlamento da Federação da Rússia.
- [1] Textos Aprovados, P7_TA(2014)0170.
- [2] Textos Aprovados, P7_TA(2014)0248.