Proposta de resolução - B8-0220/2014Proposta de resolução
B8-0220/2014

PROPOSTA DE RESOLUÇÃO sobre a situação humanitária no Sudão do Sul

5.11.2014 - (2014/2922(RSP))

apresentada na sequência de uma declaração da Vice-Presidente da Comissão / Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança
nos termos do artigo 123.º, n.º 2, do Regimento

Linda McAvan, Norbert Neuser, Arne Lietz, Enrique Guerrero Salom, Vincent Peillon, Marlene Mizzi, Michela Giuffrida, Elena Valenciano Martínez-Orozco, Doru-Claudian Frunzulică em nome do Grupo S&D

Ver igualmente a proposta de resolução comum RC-B8-0213/2014

Processo : 2014/2922(RSP)
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B8‑0220/2014

Resolução do Parlamento Europeu sobre a situação humanitária no Sudão do Sul

(2014/2922(RSP))

O Parlamento Europeu,

–       Tendo em conta as suas anteriores resoluções sobre o Sudão do Sul, em particular as resoluções de 10 de dezembro de 2013 sobre os esforços da comunidade internacional no domínio do desenvolvimento e da consolidação do Estado no Sudão do Sul[1]e de 16 de janeiro de 2014 sobre a situação no Sudão do Sul[2],

–       Tendo em conta as declarações da Vice-Presidente da Comissão/Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, Catherine Ashton, de 23 de janeiro de 2014 e de 10 de maio de 2014, sobre a situação no Sudão do Sul,

–       Tendo em conta a declaração, de 28 de agosto de 2014, do porta-voz da Alta Representante Catherine Ashton, sobre a situação no Sudão do Sul,

–       Tendo em conta a declaração do Conselho, de 10 de julho de 2014, sobre o Sudão do Sul,

–       Tendo em conta as conclusões do Conselho, de 20 de janeiro de 2014 e de 17 de março de 2014, sobre o Sudão do Sul,

–       Tendo em conta as declarações de 25 de setembro de 2014 da Comissária Europeia para a Cooperação Internacional, a Ajuda Humanitária e a Resposta a Situações de Crise, Kristalina Georgieva,

–       Tendo em conta a Declaração, de 30 de outubro de 2014, do Secretário-Geral da ONU, Ban Ki-moon,

–       Tendo em conta a declaração de 20 de outubro de 2014 da Autoridade Intergovernamental para o Desenvolvimento (IGAD),

–       Tendo em conta o Roteiro para o Sudão e o Sudão do Sul apresentado no comunicado emitido pelo Conselho da Paz e Segurança da União Africana em 24 de abril de 2012, que conta com o total apoio da UE,

–       Tendo em conta o Acordo de Cotonu revisto,

–       Tendo em conta a Declaração Universal dos Direitos do Homem,

–       Tendo em conta a Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos,

–       Tendo em conta o artigo 123.º, n.º 2, do seu Regimento,

A.     Considerando que teve início um conflito depois de Slava Kiir, Presidente do país, ter acusado o seu Vice-Presidente deposto, Riek Machar, de uma tentativa de golpe de Estado; considerando que Riel Machar negou estar envolvido nessa tentativa de golpe;

B.     Considerando que, segundo estimativas da ONU, mais de 10 000 pessoas morreram durante os meses de combates, de que foram amplamente divulgados atos brutais de crueldade e de violência étnica, equivalentes a crimes de guerra;

C.     Considerando que o Sudão do Sul é o Estado mais jovem e mais frágil do mundo e que ocupa o segundo lugar no índice global de vulnerabilidade humanitária e de avaliação de crises da Comissão Europeia;

D.     Considerando que as partes envolvidas no conflito no Sudão do Sul iniciaram negociações em 7 de janeiro de 2014, em Adis Abeba, sob os auspícios da IGAD;

E.     Considerando que, apesar de em 23 de janeiro de 2014 ter sido assinado um acordo de cessar-fogo, revalidado em 9 de maio de 2014, o mesmo continua a ser violado sem que sejam aplicadas quaisquer medidas punitivas;

F.     Considerando que têm sido poucos os progressos registados nas conversações de paz com vista à obtenção de uma solução duradoura, e que o coordenador da ajuda humanitária da ONU indicou que as perspetivas de se alcançar uma paz sustentável a nível político e entre comunidades não são as melhores;

G.     Considerando que os combates entre as forças do Presidente Kiir e os rebeldes leais a Riek Machar já foram retomados no final da época das chuvas, prevendo-se que se intensifiquem durante a estação seca se não houver uma solução política;

H.     Considerando que esta crise humanitária corre o risco de se estender a uma região muito mais vasta já propensa à instabilidade, em que grupos rebeldes sudaneses e o exército do Uganda já participaram nos combates;

I.      Considerando que o conflito tem conduzido a uma vaga de violência sexual de proporções alarmantes, tal como referido pelo Representante Especial do Secretário‑Geral das Nações Unidas para a violência sexual em conflitos armados, Zainab Bangura; considerando que continuam a circular relatos não confirmados sobre o recrutamento de crianças-soldado no Sudão do Sul;

J.      Considerando que a ONU declarou a crise no Sudão do Sul uma emergência de nível 3 – o mais elevado nível de crise humanitária;

K.     Considerando que, no Sudão do Sul, 3,5 milhões de pessoas receberam assistência humanitária desde o início do ano; que, graças à combinação de mecanismos de resposta a nível local e de ajuda humanitária internacional, a fome tem sido evitada;

L.     Considerando que se estima que cerca de 3,8 milhões de sul-sudaneses carecem de ajuda humanitária, 1,4 milhões estão deslocados no interior do Sudão do Sul e mais de 470 mil procuram refúgio em países vizinhos;

M.    Considerando que as principais carências humanitárias são alimentos, água potável, cuidados de saúde, abrigos, saneamento básico, higiene, resposta às epidemias (como a cólera) e proteção; considerando que é necessário reforçar o apoio psicossocial aos sobreviventes de atos de violência sexual;

N.     Considerando que as perspetivas para 2015 no que respeita à segurança alimentar para o país são pouco animadoras, esperando-se que 2,5 milhões de pessoas enfrentem uma situação de crise e de emergência ao nível da insegurança alimentar, se os combates forem reatados;

O.     Considerando que o acesso às pessoas carenciadas continua a ser obstruído pelas hostilidades e violência, que também atingem o pessoal humanitário e o fornecimento de bens;

P.     Considerando que, em setembro de 2014, o Ministro do Trabalho do Sudão do Sul declarou que todos os trabalhadores estrangeiros eram obrigados a abandonar o território até meados de outubro, declaração esta que retirou posteriormente;

Q.     Considerando que foi adiada para dezembro de 2014 a adoção de uma "lei sobre as ONG", com o objetivo de limitar o espaço em que as ONG e a sociedade civil podem operar no Sudão do Sul;

R.     Considerando que os recursos humanitários internacionais têm sido usados até ao limite devido a múltiplas e prolongadas crises globais; considerando que a comunidade internacional não será capaz, quer em termos financeiros quer operacionais, de continuar a responder a uma crise prolongada;

S.     Considerando que a UE disponibilizou mais de um terço (38 %) de todas as contribuições internacionais em resposta à crise humanitária no Sudão do Sul, com a Comissão, por si só, a aumentar o seu orçamento de ajuda humanitária para esta crise para mais de 130 milhões de euros em 2014;

T.     Considerando que a UE reprogramou um "contrato de criação do Estado" inicialmente previsto como apoio orçamental para uma parceria com ONG e organizações internacionais vocacionada para abordar a questão da educação e da saúde;

U.     Considerando que a União Africana nomeou uma comissão de inquérito para investigar as atrocidades contra os direitos humanos amplamente noticiadas;

V.     Considerando que se deve encontrar uma solução política democrática para o atual conflito e preparar o caminho para a construção, por instituições democraticamente estabelecidas, do novo Estado que surgiu na sequência do referendo sobre a independência;

W.    Considerando que, em 10 de julho de 2014, a UE anunciou uma primeira série de medidas direcionadas contra os responsáveis pela obstrução do processo de paz, infringindo o acordo de cessar-fogo e cometendo graves violações contra os direitos humanos; considerando que foi mantido o embargo de armas da UE contra o Sudão do Sul;

X.     Considerando que uma paz sustentável, a construção de um Estado em situação pós-conflito, bem como os esforços para superar as fragilidades requerem uma perspetiva de longo prazo e o envolvimento sólido, previsível e estável da comunidade internacional;

1.      Denuncia com firmeza as alarmantes catástrofes provocadas pelo Homem no Sudão do Sul, que contradizem os valores e a finalidade do movimento de libertação do país;

2.      Condena energicamente o recomeço da violência e as reiteradas violações no passado ao acordo de cessação das hostilidades; lamenta o frágil comando e controlo das forças armadas, o que aumenta o risco de uma maior fragmentação das forças beligerantes;

3.      Exorta todas as partes a honrarem o acordo e a participarem de forma construtiva nas conversações de paz de Adis Abeba; sublinha a obrigação de, ao abrigo do direito humanitário internacional, proteger a população civil, e releva que uma solução política duradoura é a melhor forma de pôr termo à crise humanitária no Sudão do Sul;

4.      Recorda que a ajuda humanitária é vital, mas não pode solucionar um problema político, e que a principal responsabilidade pela proteção das populações civis incumbe ao governo; solicita, por isso, que a riqueza do país seja diretamente disponibilizada para o bem-estar do povo do Sudão do Sul; exorta também à plena aplicação do acordo de cessar-fogo e à rápida retoma de conversações com vista à constituição de um governo de transição de unidade nacional como a única solução de longo prazo;

5.      Adverte igualmente para as repercussões e os efeitos desestabilizadores do conflito numa região já instável, em particular devido ao crescente número de refugiados nos países vizinhos; insta igualmente a União Africana a acompanhar a situação na região;

6.      Congratula-se com o contributo da UE no âmbito da crise humanitária no Sudão do Sul e insta os Estados-Membros a que, em conformidade com os compromissos internacionais assumidos, encontrem uma solução com vista ao financiamento da ajuda num número crescente de crises;

7.      Exorta a comunidade internacional a honrar os seus compromissos de financiamento em relação ao Sudão do Sul e à região, e a mobilizar recursos que deem resposta imediata ao agravamento da situação humanitária neste país;

8.      Encoraja a UE a reprogramar a sua ajuda ao desenvolvimento, de forma a dar resposta às necessidades mais urgentes da população do Sudão do Sul e a apoiar a transição para a paz e a estabilidade; saúda, por conseguinte, a suspensão da ajuda ao desenvolvimento por via do apoio orçamental ao Sudão do Sul, à exceção das ações de apoio direto à população ou de apoio direto à transição democrática e à ajuda humanitária, e apela à reorientação da ajuda através de ONG e de organizações internacionais;

9.      Insta a comunidade internacional a financiar de forma rápida e proporcional o Plano de Resposta para o Sudão do Sul bem como o plano de resposta regional para os refugiados;

10.    Denuncia a deterioração das relações entre a comunidade humanitária e todas as partes beligerantes, nomeadamente a tributação ilegal da ajuda, o assédio e mesmo o assassinato de pessoal humanitário com impunidade;

11.    Reitera que deve ser prestada ajuda humanitária e ajuda alimentar às pessoas mais vulneráveis exclusivamente em função das necessidades e recorda a todas as partes em conflito no Sudão do Sul a sua obrigação de reconhecer e respeitar a neutralidade, independência e imparcialidade dos trabalhadores humanitários, facilitar a assistência vital às populações carenciadas, independentemente da sua filiação política e etnia, e pôr imediatamente termo ao assédio aos trabalhadores da ajuda humanitária, ao confisco de ativos humanitários e ao desvio da ajuda; solicita, além disso, que a «lei sobre as ONG» seja retirada ou rejeitada;

12.    Insiste em que a ajuda humanitária, em especial sob a forma de serviços básicos e de assistência alimentar, não deve ser desviada para grupos armados;

13.    Manifesta a sua séria apreensão face à situação da segurança alimentar no Sudão do Sul resultante do conflito e agravada por desastres naturais recorrentes, e que se espera venha a deteriorar-se de forma dramática se os combates forem retomados;

14.    Insiste em que um acordo de paz permitiria às pessoas regressar às explorações abandonadas, reabrir os mercados e reconstruir as suas casas;

15.    Condena com veemência as execuções extrajudiciais e os massacres, os ataques direcionados contra civis, as prisões e detenções arbitrárias, os desaparecimentos forçados, os maus tratos e a tortura, a utilização de crianças-soldado, e a violência sexual contra as mulheres, recursos estes que estão a ser empregues como armas de guerra por todas as partes; é da opinião de que o Presidente Kiir e Riek Machar devem envidar todos os esforços para impedir os soldados sob seu controlo de cometer tais abusos contra as populações;

16.    Manifesta-se profundamente preocupado com a dimensão étnica do conflito; salienta que a luta pelo poder através da violência ou da divisão étnica é contrária ao Estado de direito democrático e viola o direito internacional;

17.    Apela a uma solução negociada, equitativa e sustentável, que permita aos dirigentes do Sudão do Sul sanar as suas diferenças de forma pacífica e democrática, e a um processo de reconciliação nacional no interesse do conjunto da população do Sudão do Sul;

18.    Apela a que se efetue investigações credíveis, transparentes e exaustivas, que respeitem as normas internacionais, nomeadamente pela Comissão de Inquérito da União Africana, em relação a todas as alegações de crimes graves por qualquer das partes no conflito; encoraja a criação de mecanismos de justiça de transição, com o necessário apoio internacional, para promover tanto a reconciliação como a responsabilização; insta o Governo do Sudão do Sul a aderir ao Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional o mais rapidamente possível;

19.    Apoia, neste contexto, a criação de um tribunal híbrido especial, com envolvimento internacional, para deter dirigentes responsáveis por graves violações contra os direitos humanos cometidas por ambas as partes no conflito, tal como proposto pelo Secretário-Geral das Nações Unidas Ban Kimoon e tal como recomendado num relatório sobre direitos humanos da UNMISS;

20.    Congratula-se com a responsabilidade coletiva pelo conflito assumida por todas as partes, mas insiste em que às palavras se têm de suceder atos; lamenta o facto de não terem sido realizados progressos significativos nas conversações de paz mediadas pela IGAD;

21.    Continua, no entanto, a apoiar a mediação liderada pela IGAD, e os seus esforços no sentido de abrir caminho a um diálogo político inclusivo; solicita por isso à UE que continue a apoiar a IGAD, tanto em termos materiais como financeiros, e a disponibilizar pessoal para o mecanismo de supervisão e verificação do cessar-fogo;

22.    Lamenta a ineficácia das sanções individuais impostas pela UE e insta à adoção de sanções específicas a aplicar pela IGAD e pela comunidade mundial; apoia a continuação do embargo de armas contra o Sudão do Sul e insta à adoção de um embargo de armas das Nações Unidas;

23.    Apoia, e considera essencial, a participação da sociedade civil nas negociações de paz;

24.    Exorta todos os países vizinhos do Sudão do Sul e as autoridades regionais a cooperarem estreitamente a fim de melhorar a situação da segurança no país e na região e encontrar uma solução política para a atual crise que seja pacífica e duradoura; salienta que a cooperação com o Sudão, em particular, representaria uma melhoria das relações existentes;

25.    Saúda o trabalho do Representante Especial da UE para o Corno de África, Alexander Rondos; recomenda que dirija todos os seus esforços no sentido de contribuir para uma solução duradoura;

26.    Enaltece o Governo do Sudão do Sul a ratificar o Acordo de Cotonu entre a UE e o Grupo de Estados de África, das Caraíbas e do Pacífico (ACP);

27.    Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão, à Vice-Presidente da Comissão/Alta Representante para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, aos governos e parlamentos dos Estados-Membros, ao Governo do Sudão do Sul, ao Comissário para os Direitos Humanos do Sudão do Sul, à Assembleia Legislativa Nacional do Sudão do Sul, às instituições da União Africana, à Autoridade Intergovernamental para o Desenvolvimento, aos Copresidentes da Assembleia Parlamentar Paritária ACP-UE e ao Secretário-Geral das Nações Unidas.