PROPOSTA DE RESOLUÇÃO sobre a destruição de locais de interesse cultural pelo EIIL/Daech
27.4.2015 - (2015/2649(RSP))
nos termos do artigo 128.º, n.º 5, do Regimento
Michèle Alliot-Marie, Andrea Bocskor, Lara Comi, Raffaele Fitto, Elisabetta Gardini, Marc Joulaud, Giovanni La Via, Barbara Matera, Alessandra Mussolini, Claude Rolin, Tokia Saïfi, Michaela Šojdrová, Davor Ivo Stier, Dubravka Šuica, Pavel Svoboda, Giovanni Toti, Sabine Verheyen, Elissavet Vozemberg, Theodoros Zagorakis, Tomáš Zdechovský, Bogdan Andrzej Zdrojewski, Joachim Zeller, Milan Zver, Roberta Metsola em nome do Grupo PPE
Ver igualmente a proposta de resolução comum RC-B8-0375/2015
B8‑0393/2015
Resolução do Parlamento Europeu sobre a destruição de locais de interesse cultural pelo EIIL/Daech
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta o artigo 167.º do TFUE, que estabelece que a ação da União tem por objetivo incentivar a cooperação entre Estados-Membros, nomeadamente no domínio da conservação e salvaguarda do património cultural de importância europeia e que a União e os Estados-Membros incentivarão a cooperação com os países terceiros e as organizações internacionais competentes no domínio da cultura;
– Tendo em conta o Regulamento (CE) n.º 116/2009 do Conselho, de 18 de dezembro de 2008, relativo à exportação de bens culturais[1],
– Tendo em conta o Regulamento (CE) n.º 1210/2003 do Conselho, de 7 de julho de 2003, relativo a determinadas restrições específicas aplicáveis às relações económicas e financeiras com o Iraque e que revoga o Regulamento (CE) n.º 2465/96[2],
– Tendo em conta o Regulamento (UE) n.º 1332/2013 do Conselho, de 13 de dezembro de 2013, que altera o Regulamento (UE) n.º 36/2012 que impõe medidas restritivas tendo em conta a situação na Síria[3], bem como as decisões posteriores do Conselho que executam estas medidas[4],
– Tendo em conta a Ação Comum 2001/555/PESC do Conselho, de 20 de julho de 2001, relativa à criação do Centro de Satélites da União Europeia[5] , alterada pela Ação Comum 2009/934/PESC do Conselho[6],
– Tendo em conta o projeto de Resolução do Conselho, de outubro de 2012, relativa à criação de uma rede informal de autoridades de aplicação da lei e de peritos competentes no domínio dos bens culturais (EU CULTNET),
– Tendo em conta a Convenção de Haia, de 14 de maio de 1954, para a Proteção dos Bens Culturais em caso de Conflito Armado,
– Tendo em conta a Convenção da UNESCO relativa às Medidas a adotar para Proibir e Impedir a Importação, a Exportação e a Transferência Ilícitas da Propriedade de Bens Culturais, de 17 de novembro de 1970,
– Tendo em conta a Convenção na UNESCO, de 16 de novembro de 1972, sobre a Proteção do Património Cultural e Natural Mundial,
– Tendo em conta a Convenção da UNESCO para a Salvaguarda do Património Cultural Imaterial, de 17 de outubro de 2003,
– Tendo em conta a Convenção da UNESCO sobre a Proteção e a Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, de 20 de outubro de 2005,
– Tendo em conta a Convenção UNIDROIT de 24 de junho de 1995, sobre os Bens Culturais Roubados ou Ilicitamente Exportados,
– Tendo em conta a Resolução 2199 do Conselho de Segurança das Nações Unidas, de 12 de fevereiro de 2015, sobre as ameaças à paz e segurança internacionais provocadas pelos atos terroristas da Al-Qaida[7],
– Tendo em conta a Carta de Veneza sobre a Conservação e o Restauro de Monumentos e Sítios, de 1964, que estabelece um quadro internacional para a preservação e o restauro de edifícios históricos,
– Tendo em conta o Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, aprovado em 17 de Julho de 1998, e, nomeadamente, o artigo 8.º, n.º 2, alínea b), subalínea ix), que reconhece como crimes de guerra «os ataques intencionais a edifícios consagrados ao culto religioso, à educação, às artes, às ciências ou à beneficência, monumentos históricos, hospitais e lugares onde se agrupem doentes e feridos, sempre que não se trate de objetivos militares»;
– Tendo em conta a sua resolução, de 12 de março de 2015, sobre o Relatório Anual sobre os Direitos Humanos e a Democracia no Mundo em 2013 e a política da União Europeia nesta matéria, em que se afirma, no ponto 211, que «as formas intencionais de destruição do património cultural e artístico, como as atualmente verificadas no Iraque e na Síria, deverão ser perseguidas judicialmente como crimes de guerra e como crimes contra a humanidade»[8],
– Tendo em conta as perguntas ao Conselho e à Comissão sobre a destruição de locais de interesse cultural pelo EIIL/Daech (O-000031/2015 – B8‑0115/2015 e O‑000032/2015 – B8‑0116/2015),
– Tendo em conta o artigo 128.º, n.º 5, e o artigo 123.º, n.º 2, do seu Regimento,
A. Considerando que, na Síria, no Iraque, e na Tunísia, numerosos locais de interesse arqueológico, religioso e cultural foram recentemente destruídos por grupos de extremistas ligados sobretudo ao Estado Islâmico no Iraque e na Síria (EIIL/Daech) e que esses ataques sistemáticos contra o património cultural foram definidos por Irina Bokova, Diretora-Geral da UNESCO, como "limpeza cultural";
B. Considerando que, segundo a UNESCO, o termo "limpeza cultural" se refere a uma estratégia intencional de destruição da diversidade cultural através da perseguição deliberada de indivíduos identificados com base na sua origem cultural, étnica ou religiosa, combinada com ataques deliberados nos seus locais de culto, celebração e aprendizagem, e que a estratégia de limpeza cultural, a que se assiste no Iraque e na Síria, se reflete em ataques contra o património cultural, ataques esses contra os testemunhos culturais físicos, materiais e edificados, tais como monumentos e edifícios, bem como contra as minorias e os testemunhos culturais imateriais, tais como costumes, tradições e crenças[9];
C. Considerando que alguns atos de destruição do património cultural foram considerados, em determinadas circunstâncias, crimes contra a humanidade[10]; considerando, nomeadamente, que tais atos, quando visem os membros de um determinado grupo religioso ou étnico, podem configurar um crime de perseguição, tal como previsto no artigo 7.º, n.º 1, alínea h), do Estatuto do Tribunal Penal Internacional;
D. Considerando que tais atos de destruição de objetos e locais de interesse histórico e cultural não constituem novidade nem se limitam ao Iraque e à Síria e que, de acordo com a UNESCO, o património cultural é um elemento importante da identidade cultural das comunidades, dos grupos e das pessoas, bem como de coesão social, pelo que a sua destruição intencional pode ter consequências adversas para a dignidade do ser humano e para os direitos humanos[11]; considerando ainda que, tal como referido nomeadamente pela UNESCO, o produto da pilhagem e contrabando de objetos e locais de culto e de interesse cultural no Iraque e na Síria, em especial pelo EIIL/Daech, é utilizado para ajudar a financiar as respetivas atividades terroristas, o que resulta na transformação de obras e artigos de arte e cultura em "armas de guerra";
E. Considerando que, graças ao financiamento concedido pela União Europeia, a UNESCO, conjuntamente com outros parceiros estratégicos, lançou em 1 de março de 2014 um projeto de três anos intitulado Emergency Safeguarding of the Syrian Heritage, com o objetivo de garantir a proteção urgente do património cultural sírio;
F. Considerando que a União Europeia ratificou a Convenção sobre a Proteção e a Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, assinada em 20 de outubro de 2005, o primeiro instrumento internacional que reconhece a dupla natureza económica e cultural dos bens culturais, que não devem, portanto, ser tratados como se tivessem apenas valor comercial;
G. Considerando que a Convenção da UNESCO relativa às Medidas a adotar para Proibir e Impedir a Importação, a Exportação e a Transferência Ilícitas da Propriedade de Bens Culturais, assinada em 14 de novembro de 1970, e a Convenção UNIDROIT sobre os Bens Culturais Roubados ou Ilicitamente Exportados, assinada em 24 de junho de 1995, constituem instrumentos fundamentais no reforço da proteção do património cultural mundial;
H. Considerando que o comércio ilícito de bens culturais é atualmente o terceiro comércio ilegal mais significativo, a seguir ao tráfico de droga e de armas; que este comércio ilícito é dominado por redes de criminalidade organizada e que os atuais mecanismos nacionais e internacionais não estão adequadamente equipados nem são adequadamente apoiados para resolver a questão;
I. Considerando o facto de que a luta contra o comércio ilícito de bens culturais não é uma competência específica da União Europeia, na medida em que não é considerada como tal nos Tratados, mas que, não obstante, se enquadra em diversos domínios de competência da UE, nomeadamente o mercado interno, o espaço de liberdade, segurança e justiça (ELSJ), a cultura e a política externa e de segurança comum;
J. Considerando a necessidade urgente de melhor coordenar a luta contra o comércio ilícito de objetos culturais e de colaborar estreitamente para promover a sensibilização, a partilha de informações e reforçar os enquadramentos jurídicos; que, neste contexto, em dezembro de 2011, nas suas conclusões sobre a prevenção e o combate à criminalidade contra bens culturais, o Conselho recomendou, nomeadamente, que os Estados-Membros reforcem a cooperação entre os funcionários dos serviços de polícia, as autoridades culturais e as organizações privadas;
K. Considerando que, em outubro de 2012, uma resolução do Conselho criou uma rede informal de autoridades de aplicação da lei e de peritos competentes no domínio dos bens culturais (UE CULTNET), cujo objetivo principal é melhorar o intercâmbio de informações relativas à prevenção do tráfico ilícito de bens culturais, bem como identificar e partilhar informações sobre redes criminosas suspeitas de estarem envolvidas no comércio ilícito;
L. Considerando que, em 28 de março de 2015, Irina Bokova, Diretora-Geral da UNESCO, lançou a campanha #Unite4Heritage, da UNESCO, em Bagdade, que visa mobilizar o apoio mundial para a proteção do património cultural, utilizando o poder das redes sociais;
1. Condena veementemente a destruição de locais de culto e de interesse cultural e arqueológico cometida pelo EIIL na Síria e no Iraque;
2. Insta a Vice-Presidente da Comissão/Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança (VP/AR) a tomar as medidas adequadas a nível político, em conformidade com a resolução 2199 do Conselho de Segurança das Nações Unidas, de 12 de fevereiro de 2015, a fim de pôr termo ao comércio ilegal de bens culturais provenientes dos territórios da Síria e do Iraque enquanto se mantiver a situação de guerra nesses territórios, impedindo assim a sua utilização como fonte de financiamento de atividades terroristas;
3. Solicita à VP/AR que recorra à diplomacia cultural e ao diálogo intercultural como instrumento no âmbito da conciliação das diferentes comunidades e da reconstrução dos locais destruídos;
4. Sugere, neste contexto, que a Comissão, em conformidade com o n.º 17 da resolução 2199 do Conselho de Segurança das Nações Unidas, de 12 de fevereiro de 2015, se centre na prevenção e na luta contra o comércio ilícito de obras de arte, especialmente objetos do património cultural que tenham saído ilicitamente do Iraque depois de 6 de agosto de 1990, e da Síria depois de 15 de março de 2011; considera que a Comissão deve formular uma abordagem coordenada de combate a esse comércio ilegal, trabalhando em conjunto com os responsáveis a nível nacional nos serviços de investigação e em estreita cooperação com a UNESCO e com outras organizações internacionais, tais como o Conselho Internacional dos Museus (ICOM), o Comité Internacional do Escudo Azul (ICBS), a Europol, a Interpol, o Instituto Internacional para a Unificação do Direito Privado (UNIDROIT) e a Organização Mundial das Alfândegas (OMA);
5. Insta a Comissão a apresentar à VP/AR um pedido de participação do Centro de Satélites da UE, em Torrejón, que apoia a tomada de decisões da União no âmbito da política externa e de segurança comum mediante o fornecimento de material resultante da análise de imagens de satélite, para efeitos de acompanhamento e elaboração de listas de estações arqueológicas e de sítios culturais na Síria e no Iraque e de apoio às atividades dos arqueólogos sírios, com o objetivo de evitar novas pilhagens e de preservar a vida da população civil;
6. Insta a Comissão a estabelecer um rápido e seguro intercâmbio de informações e de boas práticas entre os Estados-Membros, a fim de combater eficazmente o comércio ilícito de objetos culturais que tenham saído ilicitamente do Iraque e da Síria, e a considerarem a criação de programas de formação europeus destinados a juízes, polícias e funcionários aduaneiros, às administrações públicas e, de um modo mais geral, aos intervenientes no mercado, a fim de que as pessoas envolvidas no combate ao comércio ilegal de bens culturais possam desenvolver e melhorar as suas competências específicas;
7. Insta a Comissão a apoiar a campanha #Unite4Heritage, da UNESCO, encetando uma campanha de informação sobre o Iraque e a Síria, com o objetivo de sensibilizar os cidadãos para a importância do seu património cultural, a forma como o produto da pilhagem é utilizado para financiar atividades terroristas, bem como para as eventuais sanções associadas à importação ilegal de bens culturais provenientes desses ou de outros países terceiros;
8. Insta a Comissão a rever o Regulamento n.º 116/2009 (CE) do Conselho relativo à exportação de bens culturais, de modo a alcançar um maior grau de eficácia e de prever a criação de um instrumento de controlo da importação de bens culturais para a UE;
9. Exorta o Conselho a considerar a criação, no âmbito da Eurojust e da Europol, de uma secção especializada no comércio ilegal de bens culturais, encarregada de coordenar, a nível europeu, as ações penais e as investigações levadas a cabo pelas diferentes autoridades nacionais, já que a existência de secções específicas é uma condição indispensável à melhor utilização de recursos no sentido de prevenir e combater o tráfico e o comércio ilícitos;
10. Insta a União Europeia a tomar as medidas necessárias para, em cooperação com a UNESCO e o Tribunal Penal Internacional, ampliar no direito internacional a categoria de crimes contra a humanidade, a fim de incluir os atos que deliberadamente danificam ou destroem em grande escala o património cultural da humanidade;
11. Insta os Estados-Membros, que ainda não o tenham feito, a ratificarem a Convenção da UNESCO relativa às Medidas a adotar para Proibir e Impedir a Importação, a Exportação e a Transferência Ilícitas da Propriedade de Bens Culturais, de 1970, e a Convenção UNIDROIT, de 1995;
12. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão, à Vice-Presidente da Comissão Europeia / Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, ao Diretor-Geral da UNESCO, ao Representante Especial da UE para os Direitos Humanos, aos governos e parlamentos dos Estados‑Membros, à Coligação Nacional Síria e ao Governo e Parlamento do Iraque.
- [1] JO L 39, 10.2.2009, p. 1.
- [2] JO L 169 de 8.7.2003, p. 6.
- [3] JO L 335 de 14.12.2013, p. 3.
- [4] JO L 335 de 14.12.2013, p. 50.
- [5] JO L 200 de 25.7.2001, p. 5.
- [6] JO L 297 de 13.11.2009, p. 18.
- [7] http://www.refworld.org/docid/54ef1f704.html
- [8] Textos Aprovados, P8_TA(2015)0071.
- [9] http://www.unesco.org/new/en/media-services/single-view/news/conference_report_heritage_and_cultural_diversity_at_risk_in_iraq_and_syria/
- [10] Tribunal Penal Internacional para a Ex-Jugoslávia, Kordić & Čerkez, 26 de fevereiro de 2001, IT-95-14/2, 207-208.
- [11] Declaração da UNESCO sobre a destruição intencional do património cultural, de 17 de outubro de 2003.