apresentada na sequência de declarações do Conselho e da Comissão
nos termos do artigo 123.º, n.º 2, do Regimento
sobre a situação no Burundi (2015/2723(RSP))
Marie-Christine Vergiat, Malin Bjork, Pablo Iglesias, Lola Sánchez Caldentey, Sabine Lösing, Paloma Lopez Bermejo, Merja Kyllönen
em nome do Grupo GUE/NGL
Resolução do Parlamento Europeu sobre a situação no Burundi(2015/2723(RSP))
B8‑0668/2015
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta a Declaração Universal dos Direitos do Homem,
– Tendo em conta o Acordo de Cotonou e a sua cláusula relativa à democracia e aos direitos humanos,
– Tendo em conta os relatórios de missões e os eixos prioritários de ação da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) e do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) no Burundi, em particular sobre a questão da luta contra a fome e a subnutrição,
– Tendo em conta os acordos de Arusha de 28 de agosto de 2000 e, nomeadamente, o seu artigo 7.º, n.º 3,
– Tendo em conta as diferentes declarações dos representantes da ONU sobre os direitos humanos no Burundi, na perspetiva das eleições presidenciais de 2015,
– Tendo em conta as suas anteriores resoluções sobre este tema, em particular as de 18 setembro 2014 e de 11 de fevereiro de 2015 sobre a situação no Burundi,
– Tendo em conta o artigo 123.º, n.º 2, do seu Regimento,
A. Considerando que o Burundi desceu dois lugares no Índice de Desenvolvimento Humano (PNUD), tendo passado da 178.ª posição em 2013 para a 180.ª em 2014; que quatro em cada cinco pessoas vivem com menos de 1,25 dólares e que 66,9 % da população vive abaixo do limiar de pobreza; que o rendimento nacional bruto per capita, em 2013, era de 280 dólares, o mais baixo do mundo após o Maláui;
B. Considerando que, pelo menos, um em cada dois burundianos se encontra em situação de subnutrição crónica e que cerca de dois terços, mais concretamente 58 % das crianças com menos de cinco anos, sofrem de subnutrição crónica; que o país conhece a mais elevada taxa de fome dos 120 países onde o índice da fome no mundo foi calculado em 2012;
C. Considerando que o Burundi continua marcado pela guerra civil que teve lugar entre 1993 e 2005 e de que resultaram 300 000 mortos; que, embora tenham sido realizados progressos desde o final da guerra, em especial nos domínios da educação e da saúde, a situação voltou a ficar de novo tensa a partir 2010;
D. Considerando que a situação política no período 2013-2015 tem estado dominada pelas eleições legislativas, que terão lugar em julho e agosto de 2015;
E. Considerando a tensão política no Burundi se intensificou desde que o presidente Nkurunziza começou a fazer pressão para concorrer a um terceiro mandato presidencial; que, já em 2010, a quase totalidade da oposição tinha boicotado as eleições presidenciais e legislativas, o que permitiu uma vitória esmagadora do partido no poder, o CNDD-FDD; que a oposição manifesta a sua intenção de, perante a situação atual, voltar a boicotar as eleições;
F. Considerando que, apesar das pressões exercidas a nível nacional e internacional, Pierre Nkurunziza foi oficialmente investido pelo CNDD-FDD, em 25 de abril, para concorrer a um terceiro mandato, tendo apresentado a sua candidatura em 8 de maio;
G. Considerando que, desde então, as manifestações organizadas pela oposição e pelo poder têm vindo a crescer, tendo degenerado em motins nos dias 26, 27 e 28 de abril; considerando que o exército foi mobilizado, que, desde o mês de abril, as estações de rádio foram proibidas de cobrir os eventos, tendo sido posteriormente fechadas e que, desde então as mobilizações continuam;
H. Considerando que, desde o início das ações de mobilização, foram mortas cerca de 78 pessoas e mais de 500 ficaram feridas, foram detidas 800 pessoas e mais de 100 000 tiveram de abandonar o país;
I. Considerando que a violência recrudesceu em consequência das ações das milícias ligadas ao poder; que várias ONG e defensores dos direitos humanos denunciam a infiltração das forças de polícia e do exército pelas milícias do CNDD - FDD; que existem várias declarações de alegada colaboração destas milícias com as milícias hutus das Forças Democráticas de Libertação do Ruanda (FDLR); que as milícias e os serviços secretos estão há anos implicados em execuções extrajudiciais;
J. Considerando que a situação atual ameaça relançar a guerra civil, já que a candidatura a um terceiro mandato de Pierre Nkurunziza constitui uma violação dos acordos de Arusha, cujo artigo 7.º, n.º 3, dispõe que o Presidente da República é eleito por um mandato de cinco anos renovável uma única vez e que ninguém pode exercer mais de dois mandatos presidenciais; considerando que a repressão contra os partidos da oposição tem vindo a agravar-se, tornando impossível qualquer campanha eleitoral;
K. Considerando as condenações da comunidade internacional no seu conjunto face à atitude do poder e à suspensão das missões eleitorais previstas pela União Africana (UA) e pela União Europeia no país;
L. Considerando que as eleições legislativas e autárquicas tiveram lugar na segunda-feira, 29 de junho, num clima de alta tensão e sob boicote da oposição;
1. Manifesta-se profundamente preocupado com a situação no Burundi em vésperas dos próximos atos eleitorais e salienta que esta situação pode ter consequências dramáticas para toda a região;
2. Solicita a libertação imediata e incondicional de todas as pessoas que foram detidas no quadro do exercício dos seus direitos democráticos;
3. Apoia o pedido da relatora especial sobre os defensores dos direitos humanos em África, Reine Alapini-Gansou, relativo à abertura de um inquérito sobre a alegada existência de centros de formação para jovens do Burundi no leste da República Democrática do Congo e solicita que esse inquérito seja conduzido sob a égide da ONU e da UA; solicita ainda a realização de um inquérito sobre as alegadas execuções extrajudiciais há vários anos denunciadas pelas ONG nacionais e internacionais;
4. Solicita ainda que seja totalmente esclarecida a questão da integração das milícias do CNDD-FDD nas forças armadas e de polícia, e a alegada existência de cumplicidade entre estas e as FDLR ruandesas;
5. Insta o Governo do Burundi a pôr termo à violência, a encetar um verdadeiro diálogo político sobre as principais questões nacionais e a revogar as leis que restringem a liberdade de expressão e de reunião, a fim de garantir um clima propício à expressão da democracia; salienta, neste contexto, a importância crucial de autorizar a reabertura das estações de rádio fechadas e destruídas em abril de 2015 para permitir a todos o acesso à informação;
6. Apoia o pedido de retoma imediata do diálogo formulado pela UA, pela ONU, pela Comunidade da África Oriental e pela Conferência Internacional para a Região dos Grandes Lagos (CIRGL); apoia as resoluções do Conselho de Paz e Segurança da UA sobre o Burundi solicitando que a data das eleições seja fixada por consenso entre as partes e que as milícias sejam desarmadas o mais rapidamente possível;
7. Salienta a ilegitimidade das eleições realizadas na passada segunda-feira; apoia o pedido de anulação dessas eleições; considera que não estão reunidas as condições para a realização das eleições presidenciais e insiste na necessidade de estas serem adiadas até que terminem as tensões e seja restabelecido o Estado de direito no país;
8. Considera que a atual crise só pode ser resolvida mediante um diálogo político a nível nacional e regional, não devendo, em caso algum, servir de pretexto para uma nova intervenção militar na região;
9. Manifesta-se profundamente preocupado com a situação económica e social de toda a população do Burundi, nomeadamente a dos refugiados e das pessoas deslocadas, cujo número continua a aumentar devido aos problemas de segurança interna no país e às tensões vividas nos países vizinhos;
10. Manifesta a sua profunda preocupação face à discriminação e a criminalização da homossexualidade no Burundi; reitera o facto de que a orientação sexual e a identidade de género são questões pertencentes à esfera do direito individual à privacidade, garantida pela legislação internacional sobre direitos humanos, nos termos da qual deverão ser protegidas a igualdade e a não discriminação e garantida a liberdade de expressão; solicita, por conseguinte, ao Parlamento e ao Governo do Burundi que revoguem os artigos do código penal que afetem negativamente as pessoas LGBTI;
11. Solicita à União Europeia e aos seus Estados-Membros que disponibilizem os fundos necessários para fazer face à situação humanitária nesta parte do mundo e colaborem com os organismos das Nações Unidas, nomeadamente no que respeita à situação de malnutrição crónica;
12. Considera que os problemas do Burundi só poderão ser resolvidos no país se for garantida a igualdade de direitos a todos os cidadãos, abordados os problemas do controlo das terras férteis, do desemprego e da pobreza, se for combatida a corrupção, a pobreza, as desigualdades e a discriminação, sendo simultaneamente promovidas as reformas sociais, políticas e económicas a fim de criar um Estado livre, democrático e estável;
13. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão, à Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, aos governos e parlamentos dos Estados-Membros, ao Governo do Burundi, às instituições da União Africana e da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental, ao Secretário-Geral das Nações Unidas, à Assembleia-Geral das Nações Unidas, aos copresidentes da Assembleia Parlamentar Paritária ACP-UE e ao Parlamento Pan-Africano.