PROPOSTA DE RESOLUÇÃO sobre o regulamento relativo aos medicamentos pediátricos
12.12.2016 - (2016/2902(RSP))
nos termos do artigo 128.º, n.º 5, do Regimento
Giovanni La Via, Françoise Grossetête, Elena Gentile, Bolesław G. Piecha, Frédérique Ries, Stefan Eck, Joëlle Mélin em nome da Comissão do Ambiente, da Saúde Pública e da Segurança Alimentar
B8-1340/2016
Resolução do Parlamento Europeu sobre o regulamento relativo aos medicamentos pediátricos
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta o Regulamento (CE) n.º 1902/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de dezembro de 2006, que altera o Regulamento (CE) n.º 1901/2006 relativo a medicamentos para uso pediátrico («Regulamento Medicamentos Pediátricos»)[1],
– Tendo em conta o relatório da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho intitulado «Melhores Medicamentos para as Crianças – do Conceito à Realidade – Relatório geral sobre a experiência adquirida com a aplicação do Regulamento (CE) n.º 1901/2006 relativo a medicamentos para uso pediátrico» (COM(2013)0443),
– Tendo em conta as conclusões do Conselho, de 17 de junho de 2016, sobre «O reforço do equilíbrio dos sistemas farmacêuticos na UE e nos seus Estados-Membros»,
– Tendo em conta o relatório do Painel de Alto Nível do Secretário-Geral das Nações Unidas sobre o acesso aos medicamentos intitulado «Promoting innovation and access to health technologies» (Promover a inovação e o acesso às tecnologias da saúde), publicado em setembro de 2016,
– Tendo em conta a pergunta à Comissão sobre a revisão do regulamento relativo aos medicamentos pediátricos (O-000135/2016 – B8-1818/2016),
– Tendo em conta o artigo 128.º, n.º 5, e o artigo 123.º, n.º 2, do seu Regimento,
A. Considerando que o Regulamento Medicamentos Pediátricos teve um impacto considerável no desenvolvimento de medicamentos pediátricos, uma vez que as empresas farmacêuticas consideram o desenvolvimento para uso pediátrico como uma parte integrante do desenvolvimento global dos medicamentos; que o número de projetos de investigação pediátrica aumentou consideravelmente e que existe mais informação de elevada qualidade sobre a utilização pediátrica de medicamentos aprovados; que o número relativo de ensaios clínicos pediátricos também aumentou;
B. Considerando que o Regulamento Medicamentos Pediátricos contribuiu para melhorar a situação geral e deu origem a benefícios concretos no que diz respeito a uma série de doenças infantis; que, no entanto, não foram realizados progressos suficientes em vários domínios, nomeadamente em matéria de oncologia pediátrica e neonatologia;
C. Considerando que o cancro infantil continua a ser a principal causa de morte por doença em crianças com idade igual ou superior a um ano e que 6000 jovens morrem de cancro todos os anos na Europa; que dois terços dos pacientes que sobrevivem sofrem de efeitos secundários devido aos tratamentos existentes (segundo estimativas, graves no caso de 50 % dos sobreviventes) e que cumpre melhorar em permanência a qualidade de vida dos sobreviventes de cancro infantil;
D. Considerando que o Regulamento Medicamentos Pediátricos promoveu um diálogo multilateral mais intensivo e uma maior cooperação em matéria de desenvolvimento de medicamentos pediátricos;
E. Considerando que menos de 10 % das crianças que sofrem uma recaída incurável potencialmente fatal têm acesso a novos medicamentos experimentais em ensaios clínicos, dos quais poderão beneficiar;
F. Considerando que um aumento significativo do acesso a terapias inovadoras pode salvar a vida de crianças e adolescentes que sofrem de doenças potencialmente mortais, como o cancro, e que, por conseguinte, é necessário investigar sem demora estas terapias, através de estudos apropriados em crianças;
G. Considerando que o uso de fármacos não conformes com o resumo das características do produto («off label») em crianças é ainda generalizado na UE, em vários domínios terapêuticos; que, embora os estudos sobre o nível de utilização de fármacos «off label» na população pediátrica difiram no que toca ao âmbito e à população de doentes, a prescrição de fármacos «off label» não diminuiu desde a introdução do Regulamento Medicamentos Pediátricos; que a Agência Europeia de Medicamentos (EMA) já foi instada a facultar orientações sobre o uso «off label» e não licenciado de medicamentos baseado na necessidade médica e a elaborar uma lista de medicamentos «off label» em uso, apesar da existência de alternativas licenciadas;
H. Considerando que o Regulamento Medicamentos Pediátricos estabelece as regras relativas ao desenvolvimento de medicamentos para uso humano, a fim de dar resposta às necessidades terapêuticas específicas da população em idade pediátrica;
I. Considerando que apenas dois medicamentos anticancerosos inovadores específicos foram autorizados para uma malignidade pediátrica com base num plano de investigação pediátrica aprovado (PIP) desde a entrada em vigor do Regulamento Medicamentos Pediátricos;
J. Considerando que, no âmbito do atual quadro regulamentar, a obrigação jurídica de prosseguir o desenvolvimento de medicamentos pediátricos é muitas vezes desrespeitada quando os medicamentos são desenvolvidos para doenças de adultos que não ocorrem nas crianças; que esta abordagem legislativa não é satisfatória no caso das doenças específicas e exclusivas das crianças; que, além disso, o número de relatórios anuais sobre as medidas de diferimento apresentados à EMA nos termos do artigo 34.º, n.º 4, do Regulamento relativo a medicamentos para uso pediátrico aumenta todos os anos;
K. Considerando que muitos tipos de cancro infantil não ocorrem em adultos; que, no entanto, o mecanismo de ação de um medicamento eficaz no tratamento de um tipo de cancro que ocorre em adultos pode ser relevante para um tipo de cancro infantil;
L. Considerando que para as doenças que só ocorrem nas crianças, como os cancros pediátricos, o mercado faculta incentivos limitados para o desenvolvimento de medicamentos pediátricos específicos;
M. Considerando que o Terceiro Programa de Saúde da UE (2014-2020) inclui o compromisso de melhorar os recursos e os conhecimentos especializados para os doentes que padecem de doenças raras;
N. Considerando que existem atrasos consideráveis no arranque ensaios clínicos pediátricos de medicamentos oncológicos, uma vez que os responsáveis pelo respetivo desenvolvimento aguardam que, primeiro, o medicamento dê sinais promissores em doentes oncológicos adultos;
O. Considerando que nada impede um investigador de, antecipadamente, dar por concluído um ensaio pediátrico promissor, caso um medicamento não produza resultados positivos na população adulta visada;
P. Considerando que as recompensas e incentivos financeiros para desenvolver medicamentos na população pediátrica, tais como a autorização de introdução no mercado para uso pediátrico (PUMA), chegam tarde e têm um efeito limitado; que, embora seja necessário garantir que as recompensas e incentivos não sejam usados indevidamente ou utilizados de forma abusiva pelas empresas farmacêuticas, o atual regime de recompensas deve ser avaliado, a fim de determinar o modo como pode ser melhorado com o objetivo de estimular melhor a investigação e o desenvolvimento no domínio dos medicamentos pediátricos, nomeadamente na oncologia pediátrica;
Q. Considerando que os titulares de autorizações de introdução no mercado têm a obrigação de atualizar as informações sobre o produto em função dos conhecimentos científicos mais recentes;
R. Considerando que os planos de investigação pediátrica (PIP) são aprovados após complexas negociações entre as autoridades reguladoras e as empresas farmacêuticas e que, muitas vezes, demonstram ser inviáveis e/ou são iniciados demasiado tarde porque são erradamente utilizados dado se concentrarem na ocorrência rara de um cancro de adulto numa criança, e não na utilização potencialmente mais ampla do novo medicamento noutros tipos pertinentes de cancro infantil; que nem todos os projetos de investigação pediátrica aprovados são concluídos, uma vez que a investigação sobre uma substância ativa é, muitas vezes, abandonada numa fase posterior, caso não se confirmem as expectativas iniciais em termos da segurança e da eficácia do medicamento; que, até à data, apenas 12 % dos PIP aprovados foram concluídos;
S. Considerando que o Regulamento (UE) n.º 536/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho relativo aos ensaios clínicos de medicamentos para uso humano prevê a criação de um portal único que permite aos promotores apresentar um dossiê único para ensaios efetuados em mais do que um Estado-Membro; que esses ensaios transfronteiras são particularmente importantes para as doenças raras, tais como o cancro pediátrico, dado que o número de doentes num só país pode não ser suficiente para viabilizar um ensaio;
T. Considerando o elevado número de alterações introduzidas nos projetos de investigação pediátrica; que, no entanto, se as alterações significativas de um projeto devem ser discutidas com o Comité Pediátrico, no caso das alterações com menor impacto a questão não está claramente definida;
U. Considerando que, em conformidade com o artigo 39.º, n.º 2, do Regulamento Medicamentos Pediátricos, os Estados-Membros devem facultar à Comissão provas detalhadas do compromisso concreto de apoiar a investigação, o desenvolvimento e a disponibilidade de medicamentos para uso pediátrico;
V. Considerando que, em conformidade com o artigo 40.º, n.º 1, do Regulamento Medicamentos Pediátricos, o orçamento comunitário deve prever fundos destinados à investigação de medicamentos para a população pediátrica, a fim de apoiar estudos relativos a medicamentos ou substâncias ativas não protegidos por patentes ou certificados complementares de proteção;
W. Considerando que, nos termos do artigo 50.º do Regulamento Medicamentos Pediátricos, a Comissão deve apresentar, até 26 de janeiro de 2017, um relatório ao Parlamento e ao Conselho sobre a experiência adquirida com a aplicação dos artigos 36.º, 37.º e 38.º, incluindo uma análise do impacto económico das recompensas e dos incentivos, juntamente com uma análise das consequências previsíveis do regulamento para a saúde pública, a fim de propor quaisquer alterações necessárias;
1. Insta a Comissão a apresentar, em tempo útil, o relatório previsto no artigo 50.º do Regulamento Medicamentos Pediátricos; sublinha que este relatório é necessário para disponibilizar uma identificação completa e uma análise aprofundada dos obstáculos que atualmente impedem a inovação dos medicamentos destinados à população pediátrica; destaca a importância de uma sólida base factual deste tipo para a elaboração de políticas eficazes;
2. Insta a Comissão, com base nestas conclusões, a considerar a hipótese de introduzir alterações, nomeadamente através de uma revisão legislativa do Regulamento Medicamentos Pediátricos, que tenham em devida conta a necessidade de (a) planos de desenvolvimento pediátrico baseados no mecanismo de ação e não apenas no tipo de doença, (b) modelos de definição das prioridades em matéria de doenças e medicamentos, (c) PIP mais precoces e viáveis, (d) incentivos que estimulem mais a investigação e respondam de forma mais eficaz às necessidades da população pediátrica, garantindo, ao mesmo tempo, a existência de uma avaliação relativa aos custos de investigação e desenvolvimento e a transparência dos resultados clínicos, e (e) estratégias para evitar a utilização pediátrica «off label» quando existirem medicamentos pediátricos autorizados;
3. Salienta os benefícios suscetíveis de salvar vidas, no domínio da oncologia pediátrica, do desenvolvimento pediátrico obrigatório baseado num mecanismo de ação de um medicamento compatível com a biologia de um tumor, e não por indicação, limitando a utilização do medicamento a um determinado tipo de cancro;
4. Salienta que deve ser dada prioridade às necessidades e aos medicamentos pediátricos, com base em dados científicos, a fim de fazer corresponder as melhores terapias disponíveis às necessidades terapêuticas das crianças, sobretudo as afetadas por cancro, permitindo otimizar os recursos utilizados na investigação;
5. Salienta a importância de realizar ensaios transfronteiras para a investigação sobre muitas doenças pediátricas e raras; congratula-se, por conseguinte, com o Regulamento (UE) n.º 536/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho relativo aos ensaios clínicos de medicamentos para uso humano, que tornará mais fácil a realização deste tipo de ensaios, e solicita à EMA que garanta o estabelecimento da infraestrutura necessária à sua implementação o mais rapidamente possível;
6. Salienta que a realização precoce de PIP e um diálogo e uma interação científicos e regulamentares numa fase precoce com a EMA permitem às empresas otimizar um desenvolvimento pediátrico global e, nomeadamente, desenvolver PIP mais viáveis;
7. Exorta a Comissão a ponderar a possibilidade de alterar o Regulamento Medicamentos Pediátricos, para que os ensaios promissores na população pediátrica não possam ser concluídos antecipadamente devido a resultados desanimadores na população adulta;
8. Sublinha a necessidade urgente de avaliar a forma como os diferentes tipos de financiamento e recompensas – incluindo os múltiplos instrumentos baseados em mecanismos de dissociação – podem ser mais bem utilizados para impulsionar e acelerar o desenvolvimento de medicamentos pediátricos em áreas carenciadas, em particular para a neonatologia e os cancros infantis, em especial os cancros que só ocorrem em crianças; considera que as recompensas devem acelerar o desenvolvimento pediátrico destes medicamentos, para que tenha início logo que esteja disponível fundamentação científica para a utilização numa população pediátrica, bem como dados em matéria de segurança para adultos, e não devem estar dependentes do valor terapêutico comprovado para o tratamento de um cancro em adultos;
9. Solicita à Comissão, com caráter de urgência, que analise quaisquer eventuais alterações regulamentares que possam contribuir, entretanto, para melhorar a situação;
10. Insta a Comissão a renovar, no Programa-Quadro Horizonte 2020, as disposições em matéria de financiamento para apoiar investigação clínica pediátrica de elevada qualidade, na sequência de uma análise crítica dos projetos atualmente financiados;
11. Insta a Comissão a reforçar o papel da rede europeia para a investigação clínica pediátrica e a garantir que os Estados-Membros adotem medidas de apoio à investigação, ao desenvolvimento e à disponibilidade de medicamentos para uso pediátrico;
12. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução à Comissão.
- [1] JO L 378 de 27.12.2006, p. 20.