PROPOSTA DE RESOLUÇÃO sobre a situação do ADPC ente a UE e Cuba à luz da recente visita do Alto Representante a esta ilha
5.7.2023 - (2023/2744(RSP))
nos termos do artigo 132.º, n.º 2, do Regimento
Gabriel Mato, Antonio López‑Istúriz White, Leopoldo López Gil, Francisco José Millán Mon
em nome do Grupo PPE
Ver igualmente a proposta de resolução comum RC-B9-0311/2023
B9‑0311/2023
Resolução do Parlamento Europeu sobre a situação do ADPC ente a UE e Cuba à luz da recente visita do Alto Representante a esta ilha
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta as suas anteriores resoluções sobre Cuba,
– Tendo em conta o Acordo de Diálogo Político e de Cooperação entre a União Europeia e os seus Estados‑Membros, por um lado, e a República de Cuba, por outro[1] (ADPC), assinado em dezembro de 2016 e aplicado a título provisório desde 1 de novembro de 2017,
– Tendo em conta os resultados da reunião do Conselho Conjunto UE‑Cuba realizada em Havana, em 26 de maio de 2023, e a declaração conjunta à imprensa do Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança e do ministro‑adjunto dos Negócios Estrangeiros de Cuba na sequência dessa reunião,
– Tendo em conta a declaração do Alto Representante, em nome da UE, por ocasião do primeiro aniversário das manifestações de 11 e 12 de julho de 2021,
– Tendo em conta o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, bem como outros tratados e instrumentos internacionais em matéria de direitos humanos,
– Tendo em conta a Convenção da ONU contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, na qual Cuba é Estado parte,
– Tendo em conta a Constituição cubana e o seu Código Penal,
– Tendo em conta a Resolução 2506 (2023) da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa, de 22 de junho de 2023, intitulada «Consequências políticas da guerra de agressão da Federação da Rússia contra a Ucrânia»,
– Tendo em conta o Relatório n.º 83/23 da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), de 9 de junho de 2023, relativo ao processo 14.196, intitulado «Relatório sobre a admissibilidade e os méritos (publicação) – Oswaldo José Payá Sardiñas et al. – Cuba»,
– Tendo em conta o relatório do Grupo de Trabalho da ONU sobre Detenção Arbitrária, de 6 de agosto de 2021,
– Tendo em conta a definição de «organização da sociedade civil» no Jornal Oficial da União Europeia,
– Tendo em conta o artigo 132.º, n.º 2, do seu Regimento,
A. Considerando que o Parlamento deu a sua aprovação ao ADPC em 5 de julho de 2017, prevendo condições claras associadas à melhoria dos direitos humanos e da democracia em Cuba, incluindo uma cláusula de suspensão em caso de violação das disposições em matéria de direitos humanos; que, durante o terceiro diálogo formal sobre direitos humanos com Cuba, em 26 de fevereiro de 2021, a UE recordou a necessidade de respeitar as obrigações decorrentes do direito internacional em matéria de direitos humanos;
B. Considerando que qualquer diálogo político deve incluir uma participação direta e intensa por parte da sociedade civil independente e de todos os intervenientes políticos da oposição, sem quaisquer restrições, tal como salientado no artigo 36.º do ADPC; que o Parlamento condenou repetidamente as violações dos direitos humanos em Cuba, sublinhando as violações do disposto no artigo 1.º, n.º 5, no artigo 2.º, alínea c), nos artigos 5.º e 22.º e no artigo 43.º, n.º 2, do ADPC, nos termos dos quais o Governo cubano se comprometeu a respeitar os direitos humanos;
C. Considerando que o Parlamento atribuiu por três vezes o Prémio Sakharov para a Liberdade de Pensamento a ativistas cubanos: Oswaldo Payá em 2002, Mulheres de Branco em 2005 e Guillermo Fariñas em 2010; que os laureados do Prémio Sakharov e os seus familiares continuam a ser regularmente assediados, intimidados e impedidos de sair do país e de participar em eventos internacionais;
D. Considerando que o Relatório n.º 83/23 da CIDH sobre o processo 14.196 concluiu que o Estado cubano é diretamente responsável pelas mortes de Oswaldo Payá e Harold Cepero; que o relatório recorda igualmente que a CIDH verificou que as violações dos direitos à liberdade de expressão e de associação foram institucionalizadas como uma política do Estado cubano destinada a evitar qualquer posição crítica contrária ao regime ou à situação política, laboral, educativa, etc.;
E. Considerando que não se registaram progressos concretos no que se refere aos princípios e objetivos gerais prosseguidos pelo ADPC no que diz respeito à melhoria da situação dos direitos humanos em Cuba; que, pelo contrário, o regime cubano intensificou a sua repressão e as suas violações dos direitos humanos e laborais, conforme demonstra o crescente número de presos políticos; que o ADPC fracassou no seu objetivo principal de melhorar as liberdades fundamentais em Cuba;
F. Considerando que o regime cubano aprofundou as suas relações com o regime de Putin desde o início da guerra de agressão ilegal, injustificada e não provocada da Rússia contra a Ucrânia; que Cuba não apoiou quaisquer resoluções das Nações Unidas sobre a agressão russa contra a Ucrânia e elogiou a anexação do Donbass; que, no âmbito da sua aliança com a Rússia, Cuba já terá enviado soldados para a Ucrânia e reconheceu ter assinado um acordo para enviar tropas para a Bielorrússia;
G. Considerando que, na sua resolução de 22 de junho de 2023, a Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa reconhece Cuba como um aliado do regime de Putin e apela aos parlamentos dos Estados membros do Conselho da Europa para que anulem a ratificação pendente do acordo de comércio livre entre a União Europeia e a República de Cuba (ADPC);
H. Considerando que as organizações de defesa dos direitos humanos continuam a documentar a repressão em curso dos direitos à liberdade de expressão, de reunião pacífica e de associação no país, bem como a asfixia por parte das autoridades cubanas das vozes dissidentes e dos defensores dos direitos humanos; que, em 31 de maio de 2023, havia um total de 1037 presos políticos e prisioneiros de consciência em Cuba, incluindo 35 menores; que as organizações de defesa dos direitos humanos documentaram também 1111 casos de trabalho forçado, que envolvem em particular trabalhadores cubanos no estrangeiro, onde são sujeitos a formas de escravatura moderna que constituem violações dos direitos humanos;
I. Considerando que o regime cubano aplica há muito tempo leis restritivas e táticas de vigilância, censura e intimidação permanentes na sua campanha de assédio e repressão, através de mecanismos cada vez abrangentes que visam restringir os direitos à liberdade de expressão e de reunião pacífica, enquanto que as pessoas que defendem os direitos humanos são alvo de julgamentos injustos e detenções arbitrárias com base em acusações falsas e processos penais abusivos; que, de acordo com o relatório de 2021 do Comité das Nações Unidas sobre os Desaparecimentos Forçados, Cuba apresentou, em 2021, mais pedidos de medidas urgentes relacionados com desaparecimentos forçados do que qualquer outro país do mundo e ocupa o terceiro lugar no que diz respeito ao número total de pedidos deste tipo desde 2012;
J. Considerando que a perseguição dos manifestantes e das suas famílias não pára de aumentar desde as manifestações sem precedentes de 11 de julho de 2021, quando milhares de pessoas saíram às ruas em toda a ilha; que as autoridades cubanas se recusaram a autorizar os diplomatas da UE ou dos Estados‑Membros, os meios de comunicação social internacionais e as organizações de defesa dos direitos humanos a acompanhar os julgamentos das pessoas detidas durante os protestos de 11 de julho de 2021; que mais de 100 civis cubanos que participaram nos protestos foram julgados por tribunais militares, apesar de não estarem envolvidos em qualquer serviço militar nem exercerem qualquer função militar, em violação do direito internacional, e foram condenados a penas de dois a 22 anos de prisão;
K. Considerando que as pessoas presas arbitrariamente estão permanentemente sujeitas a isolamento – permanecendo nomeadamente em células de castigo –, a tortura cruel e a tratamentos desumanos, sendo‑lhes negado o acesso aos seus advogados e a tratamentos médicos adequados, correndo assim perigo de vida; que algumas delas se encontram detidas em prisões localizadas a grande distância das suas casas, o que impede que as suas famílias as visitem; que mais de 1000 presos políticos em Cuba são alegadamente torturados, incluindo menores, jovens e mulheres; que a organização «Prisoners Defenders» documentou, num relatório de 30 de maio de 2023, 181 casos de tortura sistemática entre os prisioneiros políticos em Cuba;
L. Considerando que José Daniel Ferrer continua preso apenas com base nas suas convicções e no exercício pacífico dos seus direitos humanos; que se desconhece o seu paradeiro e o seu estado de saúde; que José Daniel Ferrer, Luis Manuel Otero Alcántara e Maykel «Osorbo» Castillo Pérez são apenas alguns exemplos das centenas de cubanos vítimas da injustiça e repressão às mãos do seu próprio governo; que, nas suas 87.ª, 88.ª e 89.ª sessões, o Grupo de Trabalho das Nações Unidas sobre Detenção Arbitrária se pronunciou sobre nove processos contra Cuba, entre os quais os de José Daniel Ferrer (membro do Grupo dos 75, detido pelo seu envolvimento nos protestos de 11 de julho de 2021) e Aymara Nieto (membro das Mulheres de Branco, presa há mais de cinco anos sem justa causa);
M. Considerando que Guillermo Fariñas, laureado com o Prémio Sakharov, iniciou uma nova greve de fome em 26 de junho de 2023, em luta pela libertação incondicional de todos os presos políticos na ilha;
N. Considerando que o Vice‑Presidente da Comissão/Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança (VP/AR), Josep Borrell Fontelles, se deslocou a Cuba, em 25 de maio de 2023, para representar a UE na terceira reunião do Conselho Conjunto UE‑Cuba; que o VP/AR não se reuniu, deliberadamente, com organizações da sociedade civil credíveis e independentes, nem com prisioneiros políticos e/ou com os seus familiares;
O. Considerando que, durante a sua visita, o VP/AR, Josep Borrell Fontelles, declarou publicamente que a UE «não tem nem a capacidade nem a vontade» de impor mudanças políticas à ilha;
P. Considerando que Cuba constitui uma anomalia não democrática na região da América Latina;
1. Recorda que o ADPC salienta que «o respeito e a promoção dos princípios democráticos, o respeito de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais, consagrados na Declaração Universal dos Direitos Humanos e nos principais instrumentos internacionais em matéria de direitos humanos e respetivos protocolos facultativos aplicáveis às Partes, bem como o respeito pelo Estado de direito, constituem um elemento essencial do presente Acordo», mas assinala que o regime cubano ignora e viola constantemente tais princípios e direitos há décadas e que estas violações se agravaram nos últimos tempos;
2. Realça a obrigação de todas as partes cumprirem as disposições vinculativas do ADPC e de respeitarem o princípio da universalidade dos direitos humanos; lamenta que, apesar da adoção do ADPC, a situação da democracia e dos direitos humanos em Cuba se tenha deteriorado; recorda que o ADPC contém uma «cláusula sobre os direitos humanos» enquanto elemento essencial padronizado dos acordos internacionais da UE, que permite a suspensão do acordo em caso de violação das disposições em matéria de direitos humanos;
3. Condena com a maior veemência as violações sistemáticas dos direitos humanos e os abusos perpetrados pelo regime cubano contra os manifestantes, os dissidentes políticos, os líderes religiosos, os ativistas dos direitos humanos e os artistas independentes, entre outros; pede às autoridades cubanas que ponham imediatamente termo à política de repressão; condena a falta de liberdade religiosa em Cuba;
4. Apela à libertação imediata e incondicional de todas as pessoas detidas pelo único facto de terem exercido os seus direitos humanos, incluindo o direito à liberdade de expressão e de reunião pacífica; solicita igualmente que sejam retiradas as acusações penais abusivas e que as pessoas exiladas sejam autorizadas a regressar ao seu país;
5. Condena o recurso à tortura e aos maus tratos por parte das autoridades cubanas; solicita que sejam realizadas investigações rápidas e imparciais e que as pessoas detidas tenham acesso imediato a cuidados médicos da sua escolha e possam ver as suas famílias;
6. Reitera a sua exigência do direito a um julgamento justo, da independência do poder judicial e da garantia de acesso a um advogado independente para as pessoas privadas de liberdade;
7. Solicita às autoridades cubanas que concedam acesso a uma delegação da UE e dos Estados‑Membros, bem como a organizações independentes de defesa dos direitos humanos, para efetuarem uma visita às prisões onde continuam detidos centenas de ativistas e cidadãos comuns de Cuba por exercerem o seu direito à liberdade de expressão e de reunião e para acompanharem os seus julgamentos;
8. Sublinha que a UE e os Estados‑Membros devem responder de forma proporcionada à crise em matéria de direitos humanos em Cuba, a fim de fazer face ao âmbito e à gravidade da situação; reitera o seu apelo aos Estados‑Membros, ao Serviço Europeu para a Ação Externa e à sua delegação a Cuba para que condenem firme e publicamente a política repressiva do regime cubano e reforcem o seu apoio a uma sociedade civil genuína e independente, nomeadamente aos laureados do Prémio Sakharov;
9. Lamenta que o VP/AR não tenha aproveitado a sua presença no país para se reunir com representantes independentes da sociedade civil, com os presos políticos ou com os seus familiares, o que faz da sua visita uma oportunidade perdida; lamenta profundamente o facto de o VP/AR ter desperdiçado a oportunidade de apoiar a democracia por intermédio da sociedade civil cubana e dos presos políticos e de enviar uma mensagem clara sobre as preocupações da UE relativamente às violações dos direitos humanos em Cuba; rejeita veementemente o efeito contraproducente da fachada de respeitabilidade dado ao regime cubano, para a qual contribuiu a sua visita; recorda que qualquer diálogo entre a UE e a sociedade civil cubana e as possibilidades de financiamento devem incluir apenas organizações independentes da sociedade civil, e não ONG financiadas e toleradas pelo regime, uma vez que apoiar tais ONG equivale, em última análise, a financiar o mesmo regime que restringe as liberdades fundamentais coletivas do povo cubano; lamenta profundamente a observação feita pelo VP/AR, Josep Borrell Fontelles, durante a sua visita a Cuba, segundo a qual a UE «não tem nem a capacidade nem a vontade de impor mudanças em Cuba», embora um dos principais objetivos do ADPC seja a melhoria das liberdades fundamentais e do nível de vida dos cidadãos cubanos;
10. Apela à UE para que acione o artigo 85.º, n.º 3, alínea b), do ADPC a fim de convocar uma reunião imediata do comité misto com base nas violações do acordo por parte do Governo cubano, que constituem um «caso de especial urgência» suscetível de levar à suspensão do acordo, nomeadamente as violações contínuas, graves e materiais dos princípios democráticos e o facto de Cuba não respeitar plenamente os direitos humanos básicos e as liberdades fundamentais estabelecidos na Declaração Universal dos Direitos Humanos, que constituem um elemento essencial do Acordo, tal como consagrado no artigo 1.º, n.º 5, bem como a incapacidade para obviar a tais violações não obstante os inúmeros apelos para agir nesse sentido;
11. Reitera o seu apelo ao Conselho para que aplique as disposições do regime global de sanções da UE em matéria de direitos humanos (Lei Magnitsky da UE) e adote sanções contra os responsáveis pelas persistentes violações dos direitos humanos em Cuba, começando por sancionar Miguel Díaz‑Canel, enquanto personalidade mais importante na cadeia de comando das forças de segurança cubanas, juntamente com outros altos funcionários do Governo cubano;
12. Lamenta profundamente que as autoridades cubanas recusem autorizar o Parlamento, as suas delegações e alguns grupos políticos a visitar Cuba, apesar de o Parlamento ter dado a sua aprovação ao ADPC; insta as autoridades cubanas a autorizarem de imediato a entrada no país de uma delegação do Parlamento, de organizações independentes de defesa dos direitos humanos e dos relatores permanentes das Nações Unidas;
13. Salienta que a próxima cimeira entre a UE e a Comunidade de Estados Latino‑Americanos e Caribenhos (CELAC) constitui uma oportunidade para defender os princípios do Estado de direito, da democracia e dos direitos humanos e apela a que todos os participantes respeitem estes princípios; frisa que tal não será possível sem uma inclusão verdadeiramente transparente, abrangente e significativa da sociedade civil independente; considera que os regimes autocráticos não devem participar nas cimeiras entre países que partilham valores democráticos e respeitam os direitos humanos; insta os participantes na cimeira a emitirem uma declaração que exija o devido respeito pelos direitos humanos em ambas as regiões, com especial destaque para a falta de respeito dos princípios democráticos e das liberdades fundamentais em Cuba;
14. Condena o apoio incondicional do regime cubano à guerra de agressão russa contra a Ucrânia e o facto de defender a Rússia, bem como o acordo assinado por Cuba que prevê o envio de tropas para a Bielorrússia para fins de formação; recorda as declarações do VP/AR segundo as quais a recusa em apoiar a Ucrânia contra a agressão russa acarretaria consequências, e lamenta que estas declarações tenham demonstrado ser mera retórica e não tenham tido implicações práticas;
15. Encarrega a sua Presidente de transmitir a presente resolução ao Governo e à Assembleia Nacional do Poder Popular de Cuba, ao Vice‑Presidente da Comissão/Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, à Comissão, ao Representante Especial da UE para os Direitos Humanos, aos governos e parlamentos dos Estados‑Membros, ao Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos e aos governos dos países membros da Comunidade da América Latina e das Caraíbas.
- [1] JO L 337 I de 13.12.2016, p. 3.