Presidente. − Segue-se na ordem do dia o relatório da deputada Piia-Noora Kauppi, em nome da Comissão dos Assuntos Económicos e Monetários, sobre o tratamento fiscal dos prejuízos num contexto transfronteiriço [2007/2144(INI)] (A6-0188/2005).
Piia-Noora Kauppi, relatora. − (EN) Senhor Presidente, gostaria de começar por salientar os principais pontos do meu relatório agora em apreciação. Embora, nominalmente, o documento verse sobre fiscalidade, a verdadeira questão nele tratada é o correcto funcionamento do mercado interno da UE.
O modo como a economia global se está a desenvolver origina uma pressão cada vez maior sobre a Europa no sentido de manter a sua competitividade, facto já salientado e amplamente reconhecido em várias instâncias, nomeadamente no âmbito da definição e das revisões da Estratégia de Lisboa. Para estarmos à altura do desafio, temos de ser proactivos, e creio que um mercado único em pleno funcionamento é a condição primordial para o conseguirmos.
Para além da liberdade de circulação de pessoas, bens e serviços, é essencial assegurar condições equitativas que permitam que as empresas europeias se estabeleçam em qualquer local da Europa como se esta fosse um único país, um mercado interno – um genuíno mercado interno – em que as decisões se fundamentam em vantagens económicas reais e não em vantagens artificialmente mantidas através da burocracia.
Os obstáculos a esta liberdade não só conduzem a opções económicas que não são as melhores como também dificultam a expansão das actividades das empresas europeias. O facto de ainda existirem alguns desses obstáculos é lamentável, pois um mercado interno de âmbito europeu é um trampolim para o crescimento da actividade económica europeia e uma condição para o aparecimento de mais empresas europeias líderes a nível mundial.
A consolidação transfronteiras dos prejuízos – o tema deste relatório – constitui um passo no sentido de um mercado interno efectivo. Actualmente, o tratamento fiscal de um grupo que opera num único Estado-Membro é, neste ponto, francamente mais favorável do que o de um outro com uma estrutura transfronteiras. Regra geral, a empresa pode deduzir na tributação da empresa-mãe os prejuízos das sucursais e subsidiárias estabelecidas no mesmo Estado-Membro. Já em relação a sucursais e subsidiárias estabelecidas noutros Estados-Membros, as legislações nacionais variam consideravelmente.
Na maioria dos casos, se bem que a consolidação dos prejuízos para efeitos fiscais dentro do mesmo grupo seja possível, a respectiva aceitação está sujeita a prazos de duração variada mas sempre considerável. Esta discrepância acarreta graves consequências para o correcto funcionamento do mercado interno. Distorce as decisões de investimento, porque constitui uma barreira à entrada em alguns mercados, e tende a favorecer injustamente os grandes mercados, onde os prejuízos podem ser mais facilmente absorvidos. Reduz, muito especialmente, a capacidade de expansão das PME, as quais, frequentemente, registam prejuízos decorrentes dos custos de arranque, que não conseguem absorver de imediato – e mesmo o factor tempo é muito importante para as PME. Evidentemente, a existência de legislações diferentes nos diversos Estados-Membros avoluma os custos associados ao cumprimento da legislação fiscal, que as PME têm dificuldade em suportar e que, em empresas de maior dimensão, conduzem a soluções de engenharia fiscal.
Acresce que as demoras na dedução dos prejuízos fiscais são, naturalmente, onerosas e incómodas para todas as empresas europeias. Os encargos decorrentes da retenção – muitas vezes durante vários anos – de capital legitimamente reembolsável são bastante avultados, porquanto as actuais legislações nacionais relativas à dedução de prejuízos não prevêem a consolidação imediata.
O relatório preconiza uma solução para esta situação, sugerindo que se permita a dedução dos prejuízos no próprio ano fiscal em que ocorrem, o que transferiria da empresa para o sector público os enormes encargos gerados pelo decurso do tempo. Além disso, as condições de equidade seriam melhoradas, e os custos das empresas associados ao cumprimento da legislação fiscal reduzidos. Também ficaria demonstrado que a fiscalidade é um dos domínios em que ainda há trabalho a fazer para se poder tirar o máximo partido do mercado interno. Isso não significa que as taxas de tributação devam ser harmonizadas, mas sim que a concorrência fiscal é uma característica saudável da economia europeia. Significa sim que se devem adoptar medidas para simplificar a actividade económica transfronteiras e para estabelecer condições equitativas que propiciem investimentos decididos com base em vantagens económicas reais.
Consequentemente, congratulo-me com a acção da Comissão neste domínio, que visa fomentar medidas de dedução de prejuízos transfronteiras. Gostaria que o Parlamento apoiasse esta legislação necessária e urgente, e agradeço as mensagens de apoio que recebemos durante o processo. Penso que o parecer do Parlamento sobre esta questão será igualmente bastante oportuno, dado que o próprio Tribunal de Justiça solicitou uma orientação política na matéria.
Gostaria ainda de exortar a Comissão a avançar com uma proposta relativa à matéria colectável comum consolidada do imposto sobre as sociedades (MCCCIS) como uma solução a mais longo prazo, iniciativa que certamente merecerá o apoio desta Câmara, expresso através da aprovação deste relatório. No entanto, a MCCCIS é um projecto a longo prazo cuja realização só será possível num futuro ainda longínquo. Entretanto, são necessárias e urgentes, como solução intermédia para alguns problemas graves com que o funcionamento do mercado interno se confronta, leis relativas à dedução e consolidação de prejuízos transfronteiras.
László Kovács, Membro da Comissão. − (EN) Senhor Presidente, como estará recordado, discutimos há algumas semanas a contribuição das políticas fiscal e aduaneira para a Estratégia de Lisboa para o crescimento, o emprego e a competitividade. A dedução de prejuízos transfronteiras constitui um elemento-chave para a criação de um mercado interno competitivo sem obstáculos e por isso apto a contribuir para o crescimento e o emprego.
Permita-me que explique a importância que a aceitação da dedução de prejuízos transfronteiras tem para o mercado interno. Imagine uma pequena ou média empresa a operar eficazmente no mercado nacional de um dado país. Se pretender expandir a sua actividade para outros Estados-Membros, ou seja, para o mercado interno, terá de enfrentar alguns problemas para além dos associados a um aumento dos custos do cumprimento da legislação fiscal. De facto, o mais provável é que essa PME não possa deduzir eventuais prejuízos decorrentes dos custos de arranque aos lucros que porventura continue a registar no Estado-Membro em que está sediada.
O facto de os prejuízos suportados no estrangeiros não serem tomados em conta redunda em dupla tributação e desencoraja muitas PME de investir noutros Estados-Membros. Com a nova iniciativa relativa à dedução de prejuízos transfronteiras, as grandes empresas e – muito especialmente – as PME poderão mais facilmente alargar a sua actividade ao estrangeiro e beneficiar de todas as vantagens do mercado interno.
A iniciativa relativa à dedução de prejuízos transfronteiras constitui uma solução específica a curto e médio prazos e representa um passo intermédio. Note-se, porém, que no futuro poderá manter-se como medida complementar da MCCCIS, nomeadamente no que se refere às empresas que não estão abrangidas por esta última.
A iniciativa relativa à dedução de prejuízos transfronteiras tem um alcance mais limitado do que o da consolidação da matéria colectável prevista na MCCCIS, que permite a compensação automática global entre lucros e prejuízos de todas as empresas de um grupo.
É com muita satisfação que registo o forte apoio expresso no relatório da senhora deputada Kauppi à iniciativa da Comissão no domínio da dedução de prejuízos transfronteiras, à opção por uma abordagem coordenada e, naturalmente, também ao nosso trabalho com vista a uma proposta sobre a MCCCIS.
Também eu estou convencido de que devemos prosseguir os nossos esforços no sentido de acabar com as barreiras fiscais no mercado interno.
Zsolt László Becsey, em nome do Grupo PPE-DE – (HU) Obrigado, Senhor Presidente. Queria agradecer ao senhor Comissário e à senhora deputada Kauppi este relatório. Trataram de uma relevante questão, que suscita emoções melindrosas e contraditórias.
Dois comentários. Por um lado, afigura-se-me importante que, do ponto de vista do mercado interno, não possa haver risco de uma empresa-mãe e uma filial, pelo simples facto de operarem em dois Estados-Membros diferentes, se verem em desvantagem comparativamente a empresas que operam num único Estado-Membro.
Assim, sugiro que se exclua a dupla tributação, como propõe o Comissário, talvez através do mecanismo da cooperação electrónica. Atendendo ao factor tempo, podemos estimular uma actividade eficiente transfronteiras por parte dos agentes económicos e empregar os métodos da imputação e da isenção.
Ao mesmo tempo, sinto que há motivo para nos preocuparmos quando uma subsidiária registe lucros e a sociedade-mãe tenha prejuízos. Senhora Deputada Kauppi, nos "novos" Estados-Membros, por exemplo, isto é mais relevante do nosso ponto de vista.
A segunda observação que me suscita o ponto da eliminação da dupla tributação respeita à matéria colectável comum consolidada do imposto sobre as sociedades. É um assunto que ainda temos de debater, mas tenho reservas. Não quero arvorar-me em paladino da soberania fiscal, mas continuo a não ver claramente o efeito da matéria colectável consolidada comum. Receio igualmente que venha a haver uma grande pressão política em favor da adopção de um nível mínimo, como no IVA ou no imposto sobre o rendimento das pessoas singulares. As propostas dos socialistas e comunistas, e talvez da extrema-esquerda também, são demonstrativas disso, embora os critérios de Maastricht o impeçam, creio.
Mas o meu receio aqui deriva do facto de ignorar o efeito que a medida terá nos "novos" Estados-Membros da Europa Oriental, pobres em capital, à luz do fluxo de capitais no mercado interno. Onde ficará a administração? E será possível manter concessões fiscais individuais para contrabalançar as desvantagens em matéria de infra-estruturas?
Por estes motivos, abster-me-ei nessas secções, mas quero agradecer uma vez mais ao Comissário e à relatora. Obrigado, Senhor Presidente.
Donata Gottardi, em nome do Grupo PSE. - (IT) Senhor Presidente, Senhor Comissário, Senhoras e Senhores Deputados, a proposta de resolução que vamos votar amanhã é sintomática da necessidade de uma política fiscal a nível europeu.
Tal não significa enfraquecer ou limitar as políticas fiscais nacionais; ninguém põe em causa a competência dos Estados-Membros neste domínio. Significa, sim, acompanhá-las e coordená-las, especialmente quando - como acontece no caso dos prejuízos das empresas em contextos transfronteiras - as decisões em matéria de fusão e de deslocalização tomadas pelas empresas dentro e fora da Europa ultrapassam as fronteiras nacionais.
É evidente que a regulamentação nacional não é suficiente, como não o são os acordos bilaterais, tendo em conta que, nesta era de globalização dos mercados financeiros e produtivos, os fenómenos são múltiplos e ultrapassam as fronteiras dos países considerados individualmente. O conteúdo da proposta é fruto de um consenso à volta de muitos pontos e limito-me a recordar os principais, agradecendo sinceramente à relatora pela sua constante disponibilidade para cooperar.
Vinte e sete sistemas fiscais diferentes impedem o bom funcionamento do mercado interno e constituem um obstáculo para as empresas, em particular para as de pequena dimensão, como acaba de referir o Senhor Comissário Kovács. A primeira afirmação que se encontra no texto fala por si, e expressa a mais viva preocupação pelo efeito negativo que o diferente tratamento dos prejuízos transfronteiras por parte dos Estados-Membros acarreta para o funcionamento do mercado interno.
A solução proposta é ainda transitória e temporária, pois a única solução perfeita é uma matéria colectável comum consolidada do imposto sobre as sociedades (MCCCIS). É por isso que apoiamos a Comunicação da Comissão enquanto passo importante para resolver a questão e solicitamos, simultaneamente, uma coordenação adequada entre os Estados-Membros no que diz respeito ao calendário e às soluções - estou a citar o n.º 4.
É importante ter sido recordada a existência de institutos europeus comuns, como a "sociedade europeia" e a "sociedade cooperativa europeia", assim como de disposições europeias em matéria de grupos de sociedades de dimensão comunitária. Estes institutos devem ser valorizados, pois permitem-nos não só evocar os laços com as relações laborais, e, por conseguinte, os seus reflexos no emprego, mas também reconhecer a formação, à escala comunitária, de grupos de sociedades estáveis. Ao fim e ao cabo, o que queremos promover é o desenvolvimento e a implantação de um sistema produtivo centrado na Europa, e não nos Estados-Membros tomados individualmente, sistema produtivo que não se deixe arrastar por cantos de sereia e que decida orientar-se também tacticamente para outros países com base nos incentivos fiscais, compensando os encargos e os prejuízos, quando necessário. O sistema produtivo tem de poder contar com a igualdade de tratamento, evitando contabilidades distintas consoante a sociedade-mãe esteja implantada num só país ou esteja presente em vários países.
Este resultado não pode ser alcançado sem regras apropriadas e condições uniformes. Reconhecer que a concorrência fiscal lucrativa iria, no fundamental, esvaziar o conteúdo desta proposta não significa erguer essa concorrência como bandeira ideológica contra a proposta.
Olle Schmidt, em nome do Grupo ALDE. – (SV) Agradeço à senhora deputada Piia-Noora Kauppi o seu bom relatório. A descrição dos problemas e dificuldades que se fazem sentir no mercado interno devido ao facto de mantermos 27 sistemas fiscais distintos é bastante objectiva. Como foi referido, a globalização veio afinal aumentar ainda mais a necessidade de uma abordagem comum da UE em certas matérias fiscais, de modo a tornar possível a remoção de entraves à concorrência. A existência de regras e tramitações burocráticas diferentes também dá lugar à diminuição do vigor económico das empresas e à perda de postos de trabalho na União Europeia. Precisamos de regras mais claras e de uma perspectiva que favoreça a capacidade de empreendimento, tal como a senhora deputada Kauppi propõe. E talvez alguns de nós também precisem de destapar os olhos.
É sabido que os impostos são um tema bastante melindroso. As palavras de ordem neste domínio são a concorrência fiscal e a liberdade de cada país na fixação das respectivas taxas de tributação. O objectivo a longo prazo da Comissão consiste na definição de uma matéria colectável comum consolidada do imposto sobre as sociedades. Enquanto isso não for possível, dever-se-ia avançar com medidas pontuais que fomentem a eficiência do mercado interno.
O relatório analisa várias opções disponíveis e historia as diferentes soluções adoptadas em cada país, o que é bom, mas não suficiente. Em princípio, é tão aceitável a dedução de prejuízos transfronteiras no seio da mesma empresa como entre as empresas de um consórcio. Para facilitar um acordo neste domínio, tem de haver consenso sobre o que deve ser tributado, ou, por outras palavras, sobre a matéria colectável comum consolidada do imposto sobre as sociedades. Nós, no Grupo ALDE, entendemos que é esse o caminho certo. Em si, a introdução da MCCCIS não impedirá a concorrência fiscal, bem pelo contrário. Sendo a matéria colectável comum, a transparência será maior. O novo sistema facilitará a dedução de prejuízos, em especial por parte das pequenas e médias empresas. Mas os ministros das Finanças que andam preocupados – e são muitos – podem ficar descansados. O vosso poder para lançar impostos sobreviverá.
No que respeita à alteração 1, o nosso grupo gostaria que fosse sujeita a votação por partes, na primeira das quais seriam tratados, em separado, os impostos especiais sobre o consumo. Quanto ao mais, estamos dispostos a abster-nos na votação da alteração proposta pela senhora deputada Donata Gottardi aos considerandos E e F, a fim de facilitar o consenso e o apoio alargados do Parlamento a este excelente relatório.
Dariusz Maciej Grabowski, em nome do Grupo UEN. – (PL) Senhor Presidente, embora a relatora mereça ver reconhecido o mérito do seu trabalho, o relatório apresentado é bastante questionável. Votaremos contra, pelos motivos que passo a explicar.
Trata-se de uma tentativa de uniformização dos regimes fiscais no seio da União, e de imposição de soluções nesse domínio aos diversos Estados-Membros. E, também, de privilegiar as multinacionais em detrimento das PME, o que, a acontecer, constrangeria muitas empresas nacionais a abrir sucursais ou criar subsidiárias noutros países, sem outra justificação económica que não a de beneficiarem do regime aplicável às empresas transnacionais.
Gostaria apenas de fazer notar que, durante muitos anos, as empresas transnacionais, aproveitando-se da incompetência e da desonestidade de funcionários dos países pós-comunistas, recorreram a burlas contabilísticas e fiscais para declararem perdas e evitarem o pagamento de impostos. Essa situação foi tolerada pela União. O novo regime não só permitiria a continuação dessa conduta, como lhe daria mesmo suporte legal. Fico tanto mais perplexo quanto isto não deixaria de trazer consequências negativas para os países da velha União, que veriam reduzidas as suas receitas fiscais.
Entendo que é necessário começar por resolver o problema das burlas contabilísticas e fiscais praticadas por empresas transnacionais no seio da União e por melhorar a máquina fiscal, em especial nos novos Estados-Membros. Seria uma ajuda na prevenção e detecção das infracções fiscais.
Sahra Wagenknecht, em nome do Grupo GUE/NGL. – (DE) Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, pelo menos neste ponto estamos de acordo: a actual coexistência de 27 sistemas fiscais diferentes na UE, a par de um mercado único integrado onde vigora a livre circulação de capitais, é certamente uma situação insustentável. Mas a partir daqui, divergimos. Concorrência fiscal significa dumping fiscal para ricos e poderosos e uma carga fiscal acrescida para a generalidade dos assalariados e dos consumidores. Não admira que os proprietários e as grandes empresas estejam especialmente agradados com a situação.
O que é realmente espantoso e alarmante é o facto de essa prática continuar a ser incensada neste Parlamento, que efectivamente deveria representar os interesses da maioria e não apenas os de uns tantos privilegiados. Não obstante a finura de análise e a subtileza patenteadas, o relatório da senhora deputada Kauppi não consegue ser mais do que um exercício supérfluo. Tanto no que respeita à posição assumida em relação ao alegado impacto positivo da concorrência fiscal, como no que se refere ao modo como aborda o tema efectivamente em análise, ou seja, o tratamento fiscal dos prejuízos num contexto transfronteiras.
É um segredo de polichinelo que as empresas utilizam habitualmente a dedução de prejuízos transfronteiras para transferir os lucros para zonas e países com níveis de fiscalidade reduzidos, a fim de diminuir os correspondentes encargos fiscais. As estatísticas demonstram que têm obtido um êxito assinalável: de facto, mercê dessas compensações virtuais, os montantes do imposto sobre os lucros pago pelas multinacionais têm decrescido consecutivamente ao longo dos últimos 20 anos. As decisões do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias mais não fizeram do que facilitar este regime fiscal, desrespeitando grosseiramente a soberania fiscal dos Estados-Membros. Tudo isto serve apenas para alimentar a corrida ao dumping no domínio do imposto sobre o rendimento das sociedades.
Os que apoiam essa evolução estão a optar claramente por uma Europa onde seja possível acumular riquezas imensas no topo da escala, enquanto na base os níveis de pobreza aumentam e as antigas classes médias têm de sobreviver com rendimentos que diminuem em termos reais. Quanto a nós, queremos uma Europa diferente, incluindo uma política fiscal socialmente justa. Por conseguinte, o nosso grupo rejeitará o presente relatório.
John Whittaker, em nome do Grupo IND/DEM. - (EN) Senhor Presidente, o relator alega que esta iniciativa incentivará as pequenas e médias empresas a expandirem os seus negócios transfronteiras. Contudo, não tenho grandes dúvidas de que a iniciativa foi vivamente promovida pelas grandes multinacionais, que são quem mais beneficiará. No meu país, a Grã-Bretanha, a esmagadora maioria das empresas é pequena, e assegura cerca de 70% dos postos de trabalho. Apenas uma pequena proporção destas empresas está interessada em operações no estrangeiro. Contudo, a minha principal objecção prende-se com uma maior ingerência da União Europeia em questões fiscais. A avaliar pelo registo da UE do imposto sobre o valor acrescentado, haverá incontáveis alterações à legislação. Até agora, já tivemos oito directivas sobre o IVA, e as regras continuam confusas e vulneráveis a fraudes.
As empresas funcionam melhor quando as regras são simples e claras, como o senhor deputado Schmidt há pouco afirmou. A UE só sabe fazer uma coisa, e fá-la na perfeição. Complicar. Assim, ao contrário do que pensam outros senhores deputados, um plano muito melhor consistiria em incentivar a concorrência fiscal. As nações com impostos mais baixos e mais simples atrairiam mais empresas.
Elisa Ferreira (PSE). – Senhor Presidente, as práticas diferenciadas entre os distintos países no tratamento das perdas fiscais distorcem a concorrência no mercado interno, são injustas e incentivam más práticas fiscais. Saudamos, pois, a iniciativa da Comissão de propor um nível mínimo de harmonização destas regras esperando que o Conselho possa convergir no mesmo sentido. Trata-se de uma área em que a melhor regulação é necessária, também para substituir a incerteza jurídica que lhe está associada. Ela tem suscitado, esta incerteza, o repetido recurso à intervenção do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias e é factor de aumento de incerteza nas relações económicas prejudicando as empresas e as PME.
É de facto da maior importância garantir que as diferentes práticas fiscais são compatíveis com um efectivo funcionamento do mercado interno. A qualidade do parecer preparado pela relatora, senhora deputada Kauppi, permitiu um consenso alargado dos principais grupos políticos em torno dos elementos fundamentais que o integram. No entanto, há aspectos do parecer, na sua versão inicial, que, não sendo essenciais, poderiam impedir essa convergência. Em concreto, aos olhos do Grupo PSE, este processo não é compatível com a defesa aberta de práticas de concorrência fiscal. Tais práticas estimulam movimentos artificias de empresas, capitais e pessoas. Tais movimentos deixam frequentemente rastos de desagregação social, ambiental e do tecido produtivo. Por outro lado, a concorrência fiscal gera, em algumas economias, graves problemas de equilíbrio macroeconómico com consequências diversas, nomeadamente ao nível da qualidade e quantidade dos bens públicos disponibilizados por esses países aos seus cidadãos.
O Grupo Socialista no Parlamento Europeu considera que, num assunto desta relevância estratégica, há todo o interesse em apresentar perante a Comissão e o Conselho uma posição do Parlamento Europeu reforçada por uma ampla base de apoio. Na linha da presente iniciativa, a União Europeia tem ainda um longo caminho a percorrer, nomeadamente naquela que já foi hoje tão falada, a CCCTB, na criação de uma base consolidada comum em matéria tributável para as suas empresas e temos de criar condições políticas para esse trabalho futuro.
A convergência em relação ao presente relatório está ao nosso alcance. Esperamos que, até ao momento da votação final, o espírito de compromisso entre os principais grupos políticos permita valorizar o consenso alcançado em torno das suas mensagens essenciais e não venha a perturbar a amplitude da aprovação final, valorizando aspectos que apesar de acessórios no presente contexto, nos dividem politicamente de forma não ultrapassável.
Temos de agradecer neste processo o activo envolvimento de vários membros do Grupo PPE-DE em particular, incluindo a sua relatora, o seu espírito de compromisso e o seu espírito de abertura, que permitiu atingir uma posição que esperamos seja de consenso em torno das matérias essenciais deste relatório. Muito obrigada, Senhor Presidente.
Margarita Starkeviciute (ALDE). – (LT) Gostaria de chamar a atenção para um aspecto sobre o qual falamos muito, ou seja, as várias insuficiências do mercado interno, e de salientar o facto de o desenvolvimento do mercado interno nos trazer muitas vantagens. Este documento é importante, na medida em que atribui vantagem ao melhoramento da produtividade das empresas que operam no mercado interno. No entanto, há outro aspecto que não deve ser esquecido. Represento um país no qual a maioria das empresas pertence a multinacionais europeias; não são nacionais. Deste modo, é-nos por vezes muito difícil controlar a nossa economia no sentido macroeconómico, atendendo a que as estratégias empresariais colocam na sombra objectivos da economia nacional, como o equilíbrio orçamental, etc. Precisamos de encontrar um compromisso adequado entre as vantagens do desenvolvimento do mercado interno e a estabilidade macroeconómica. Gostaria de chamar a atenção do Senhor Comissário para a necessidade de coordenar as políticas com questões económicas e, mais uma vez, com o Comissário Almunia.
Zbigniew Krzysztof Kuźmiuk (UEN). – (PL) Senhor Presidente, intervenho neste debate sobre o tratamento fiscal dos prejuízos enquanto questão transfronteiras para realçar os pontos seguintes.
Primeiro: a fiscalidade directa, designadamente o imposto sobre o rendimento das sociedades, não se insere no âmbito das competências da Comissão Europeia. Assim, por uma questão de princípio, a Comissão não deveria imiscuir-se nesse assunto.
Segundo: surpreende-me que o relatório inclua algumas referências desfavoráveis à redução das taxas do imposto sobre os rendimentos das sociedades decidida em alguns Estados-Membros, principalmente nos novos.
Terceiro: estou preocupado com o apelo da Comissão no sentido de serem acelerados os trabalhos sobre a introdução da matéria colectável comum consolidada do imposto sobre as sociedades na União Europeia. A definição da configuração, taxas e matéria colectável deste imposto é um dos raros instrumentos que continuam a ser prerrogativa dos Estados-Membros e podem ser usados para acelerar o desenvolvimento económico dos países menos desenvolvidos.
Quarto: um estudo sobre as propostas da Comissão relativas à matéria colectável comum consolidada do imposto sobre as sociedades atribui-lhes o objectivo de garantir que todos os Estados-Membros cresçam a uma taxa de, quando muito, 2% do PIB ao ano. Sendo assim, como poderão alguns dos novos Estados-Membros recuperar o atraso de 20 ou 30 anos que os separa dos mais desenvolvidos?
Katerina Batzeli (PSE). – (EL) Senhor Presidente, Senhor Comissário, a questão da tributação e da possibilidade de transferência dos prejuízos dos grupos empresariais transfronteiriços na União Europeia não pode ser tratada pura e simplesmente com base na facilitação do funcionamento transfronteiriço das empresas. Não há dúvida de que esse objectivo é importante para o bom funcionamento do mercado interno. No entanto, como se refere no relatório da senhora deputada Kauppi hoje em apreciação, tratando-se da tributação de uma empresa, esta deve inserir-se no contexto mais alargado do debate sobre uma maior harmonização fiscal na União Europeia.
Enquanto não houver concorrência fiscal em condições de igualdade e na ausência de um acordo mínimo indispensável sobre uma base fiscal comum e unificada para as empresas, que estabeleça regras uniformes e transparentes para o cálculo da base fiscal, a concessão desta possibilidade de isenções fiscais para os prejuízos de natureza transfronteiriça exige, nesta fase, que adoptemos uma abordagem cautelosa. Isto porque existe um sério risco de causar distorções nos sistemas de tributação e de receitas dos Estados-Membros, bem como no próprio funcionamento do mercado interno e na concorrência entre empresas.
Olle Schmidt (ALDE). - (EN) Senhor Presidente, com esta nova forma de debate, eu posso, naturalmente, utilizar este minuto para perguntar ao Comissário qual é a situação no Conselho no que respeita à MCCCIS, porque sabemos que alguns ministros das Finanças não estão muito contentes. Poderá o Senhor Comissário dizer como está a decorrer o debate no Conselho e o que propõem hoje os 27 Estados-Membros?
László Kovács, Membro da Comissão. − (EN) Senhor Presidente, segui o debate com muito interesse, o que me permitiu reforçar a minha convicção de que a introdução da dedução de prejuízos transfronteiras constitui um importante factor de aprofundamento do mercado interno.
Partilho inteiramente a opinião da senhora deputada Kauppi segundo a qual, embora estejamos a falar de fiscalidade, a questão fundamental de que nos ocupamos é, na realidade, o correcto funcionamento do mercado interno.
Estou particularmente grato pelo seu apoio a uma iniciativa que visa facilitar, em especial, as actividades económicas transfronteiras das PME, assunto que me é muito caro. Gostaria de agradecer à relatora, senhora deputada Kauppi, pelo seu relatório muito encorajador, e à Comissão dos Assuntos Económicos e Monetários e à Comissão dos Assuntos Jurídicos, pelo apoio de ambas. A Comissão pode aceitar a maior parte das conclusões.
O apoio do Parlamento é bem-vindo também porque pode ter um impacto positivo nos debates que terão lugar no Conselho. Posso garantir-lhe, a propósito da sugestão sobre o assunto contida no relatório, que prosseguimos com o nosso trabalho respeitante à MCCCIS e à coordenação dos sistemas de fiscalidade directa dos Estados-Membros. A MCCCIS tem também, para mim, um significado muito especial, porquanto estou absolutamente convencido de que seria proporcionalmente muito mais benéfica para as pequenas e médias empresas do que para as grandes multinacionais.
Não obstante, compreendo as preocupações manifestadas e, respondendo à questão levantada no final do debate, gostaria de referir que o assunto está sobre a mesa no âmbito do Conselho, embora não haja uma proposta concreta. Por enquanto, trata-se apenas de um conceito, mas, em relação a este, cerca de dois terços dos Estados-Membros expressaram o seu apoio e menos de um terço levantou dúvidas ou opôs-se.
Qualquer discussão, em especial as que poderiam interferir com o actual debate sobre a dedução dos prejuízos transfronteiras, seria prematura, porque, de momento, não existe nenhuma proposta legislativa em concreto. No entanto, o programa de trabalho legislativo da Comissão inclui um ponto onde se refere que, na segunda metade do ano, apresentaremos uma proposta legislativa concreta – e a indispensável avaliação do impacto – sobre a MCCCIS. Poderemos discutir então a maior ou menor pertinência das preocupações manifestadas.
Subsiste uma outra questão: se não houver unanimidade – e, por enquanto, creio que assim será –, a solução poderá consistir no reforço da cooperação. Nesse caso, nenhum Estado-Membro seria obrigado a aceitar a MCCCIS e a utilizá-la. E, mesmo naqueles que a adoptassem, nenhuma empresa seria forçada a usá-la, pois não faria sentido obrigar empresas que não operam no mercado interno – que não têm negócios no mercado interno – a utilizar esta base tributável comum. Por conseguinte, poderiam manter a base colectável apurada nos termos anteriores.
Portanto, partilho a conclusão de que, para estimular um desenvolvimento coerente e o correcto funcionamento do mercado interno, será necessário ultrapassar as barreiras resultantes da existência de diferentes regimes fiscais das sociedades nos vários Estados-Membros, preferencialmente através de abordagens comuns e acções coordenadas.
No que respeita à dedução de prejuízos, o relatório salienta vários aspectos que devem ser reanalisados, como sejam as necessidades específicas das PME, a definição de grupos ou o âmbito do intercâmbio automático de informações.
Os meus serviços irão estudar estas sugestões e comentários e, logo que possível, apresentarão as suas conclusões. A questão das PME constitui já uma parte importante do trabalho do Vice-Presidente Günther Verheugen. Por seu lado, a definição de grupos de empresas é um elemento essencial do trabalho sobre a MCCCIS.
Posso garantir que as recomendações relativas à dedução de prejuízos transfronteiras no seio das empresas e de grupos de empresas orientarão o nosso trabalho nos próximos meses. O relatório faz várias referências à evasão fiscal. Refira-se, a propósito, que, em Dezembro último, a Comissão aprovou uma comunicação sobre a aplicação de medidas antiabuso na área da tributação directa.
A Comissão partilha as preocupações acerca da evasão fiscal expressas no relatório. Os Estados-Membros têm de impedir a erosão das suas bases tributárias provocada pelo abuso e pelo planeamento fiscal agressivo. Mas é igualmente importante garantir que não haverá restrições indevidas às liberdades consignadas no Tratado. Ao lançar esta última iniciativa, a Comissão procura suscitar novos debates com as restantes instituições sobre o modo como as medidas nacionais antiabuso podem satisfazer estes requisitos. Serão tidas em consideração as observações sobre o risco de evasão fiscal.
Finalmente, quanto às alterações propostas ao relatório, a Comissão desaconselha as alterações 1, 2, 3, 4, 5 e 6, mas poderá apoiar as alterações 7 e 8, que estão de acordo com o espírito da comunicação.
Piia-Noora Kauppi, relatora. − (EN) Senhor Presidente, serei muito breve. É para mim motivo de grande satisfação verificar que a maior parte dos grupos vai apoiar o relatório na votação de amanhã. O meu grupo sugeriu a abstenção relativamente às alterações 7 e 8. Penso que está em consonância com as recomendações da Comissão, assim como penso que as alterações 7 e 8 serão provavelmente aprovadas, o que significa que, amanhã, teremos uma ampla maioria a apoiar o relatório.
Gostaria ainda de recordar um pouco o passado: como foi difícil falarmos destas questões antes de aceitarmos as primeiras directivas relativas ao regime fiscal aplicável às sociedades – uma directiva relativa ao regime fiscal comum aplicável às sociedades-mãe e sociedades afiliadas de Estados-Membros diferentes e uma directiva relativa a um regime comum aplicável aos pagamentos de juros e royalties, na década de 1990. Mas as directivas já existem, após grandes debates, e creio que acabaremos por ter todos os elementos práticos, nomeadamente as medidas antiabuso, para melhorar a directiva relativa ao regime fiscal comum aplicável às sociedades-mãe e sociedades afiliadas de Estados-Membros diferentes, assim como podemos aperfeiçoar os trabalhos do Fórum da UE sobre preços de transferência, iniciativas que são muito necessárias.
Mas, afinal, necessitamos de uma solução muito ampla da MCCCIS. É actualmente a melhor opção disponível, e devemos tê-la seriamente em consideração. Espero que isso seja feito durante a presente legislatura do Parlamento Europeu, antes das eleições de 2009. É preciso fazer alguma coisa antes das eleições de 2009, e não podemos aguardar que os Estados-Membros apresentem as suas ratificações e referendos. Temos de actuar agora e antes que se esgote o período da presente legislatura.
Presidente. − Está encerrado o debate.
A votação terá lugar na terça-feira, 15 de Janeiro de 2008.