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Textos apresentados :

RC-B6-0024/2008

Debates :

PV 16/01/2008 - 8
CRE 16/01/2008 - 8

Votação :

PV 17/01/2008 - 6.5
CRE 17/01/2008 - 6.5

Textos aprovados :

P6_TA(2008)0018

Relato integral dos debates
Quarta-feira, 16 de Janeiro de 2008 - Estrasburgo Edição JO

8. Situação no Quénia (debate)
Ata
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  Presidente. − Seguem-se na ordem do dia as declarações do Conselho e da Comissão sobre a situação no Quénia.

 
  
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  Janez Lenarčič, Presidente em exercício do Conselho. − (SL) Regozijo-me pelo facto de o Parlamento Europeu debater hoje a situação no Quénia, bem como a proposta de resolução sobre a situação actual.

O simples facto de o Parlamento Europeu ter enviado a Missão de Observação Eleitoral chefiada por Alexander Lambsdorff, e a sua própria delegação liderada pelo deputado Jan Mulder, revela muito claramente o interesse do Parlamento Europeu na situação no Quénia.

As eleições no Quénia, como nós sabemos, tiveram lugar em 27 de Dezembro. A elevada afluência às urnas dos eleitores quenianos demonstra bem o empenho deste povo no processo democrático e a confiança que deposita nesse mesmo processo.

A Missão de Observação Eleitoral da União Europeia esteve presente no local e foi chefiada pelo Senhor Lambsdorff. A missão alertou para várias irregularidades na contagem e registo dos votos durante estas eleições. Estas irregularidades estão a causar sérias dúvidas sobre o verdadeiro resultado das eleições. Como é do conhecimento geral, depois de publicados os resultados das eleições, registaram-se tumultos violentos na capital Nairobi e noutras partes do Quénia.

Os apoiantes do líder da oposição, o Sr. Odinge, envolveram-se por várias vezes em conflitos com as forças de segurança e agrediram os seguidores do Presidente Kibaki. As forças de segurança dispararam tiros para as massas. De acordo com Louise Arbour, Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, as forças de segurança responderam com "excessiva violência".

Pelo menos 600 pessoas perderam a vida e quase um quarto de um milhão de pessoas foi forçado a deslocar-se – tudo isto no Quénia, um país para onde os refugiados de países vizinhos como a Somália e o Sul do Sudão costumavam fugir.

Esta situação afectou a economia não só do Quénia, como também de países vizinhos, especialmente aqueles sem acesso directo ao mar. Estamos perante uma tragédia. Foi também um rude golpe para o processo de democratização e um rude golpe para todo o continente africano, onde o Quénia era visto como um exemplo a seguir.

A União Europeia condenou a violência no Quénia. Fizemos um apelo aos dirigentes quenianos no sentido de tentarem esclarecer as duvidas que se levantam sobre a regularidade das eleições, mas sobretudo no sentido de se entabular um diálogo e encontrar uma solução pacífica. Naturalmente que respondemos às necessidades humanitárias da população do Quénia. A União Europeia saudou a mediação do Presidente Kufuor do Gana, que preside à União Africana.

Também expressámos o nosso apoio a um grupo de personalidades eminentes africanas liderado pelo ex-secretário-geral das Nações Unidas, o Sr. Kofi Annan, que deverá chegar a Nairobi em breve. Entretanto, o Presidente Kibaki nomeou o seu Governo sem consultar o líder da oposição, o Sr. Odinga. Este último convocou manifestações massivas no Quénia que decorreram ao longo de três dias.

Numa nota mais positiva, o Parlamento do Quénia teve a sua primeira sessão ontem. O candidato da oposição foi eleito Presidente do Parlamento. Isto foi encorajador na medida em que ainda se continuam a observar algumas regras democráticas no país e a oposição ainda tem alguma voz.

Quanto à União Europeia, é absolutamente claro que as relações normais com o Quénia não serão possíveis até ser encontrado um compromisso político. O compromisso deverá conduzir a uma solução permanente que proteja a vontade do povo queniano, ganhe a confiança dos quenianos e devolva a estabilidade ao país.

Em nome da União Europeia, posso dizer que todos os acontecimentos que se seguiram às eleições quenianas representaram uma grande decepção e que a situação ainda continua a ser preocupante, mas não se pode comparar à decepção sentida pelo próprio povo queniano, que participou em massa nas eleições na esperança de um futuro melhor.

 
  
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  Louis Michel, Membro da Comissão. – (FR) Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, é evidente que a Comissão Europeia está profundamente preocupada com a grave crise que o Quénia atravessa. De resto, logo no dia seguinte às eleições, quando vimos os sinais de alerta do risco de caos na sequência do que havia sucedido, nomeadamente durante a contagem dos votos, mobilizámo-nos e estabelecemos contactos com as autoridades de ambos os lados – a maioria cessante e a oposição. Devo dizer-vos, aliás, que não tive qualquer dificuldade em estabelecer um contacto directo e pessoal com o Sr. Odinga. Em contrapartida, desde então e apesar de repetidas tentativas, nunca consegui estabelecer um contacto pessoal e directo com o Sr. Kibaki, o que é surpreendente na medida em que esse contacto era fácil no passado. Este facto é bastante significativo do mal-estar que reinava.

A violência pós-eleitoral, que causou a morte de mais de 600 pessoas e a deslocação de mais de 250 000, trouxe de forma óbvia para a luz do dia a frustração e a cólera do povo queniano face aos profundos problemas de desigualdade socioeconómica e de corrupção que minam a sociedade queniana, com o risco de uma confrontação de carácter étnico. Mas estas eleições trouxeram também para a luz do dia as aspirações democráticas do povo queniano. Estas aspirações foram defraudadas pelas irregularidades ocorridas no dia das eleições, que lançam sérias dúvidas sobre a validade dos resultados oficiais. Partilhamos inteiramente as conclusões e declarações da missão de observação eleitoral da União Europeia, chefiada pelo vosso colega Alexander Lambsdorff, que quero realmente felicitar pelo excelente trabalho que realizou, ao ponto de as instâncias internacionais fora da UE, que tinham começado por assumir uma posição um pouco menos categórica e, de certo modo, um pouco menos objectiva, acabaram por apoiar as constatações e conclusões do senhor deputado Lambsdorff e por as subscrever.

A posição da Comissão relativamente à situação política no Quénia não podia ser mais clara. É urgente que os líderes políticos quenianos tomem consciência das suas responsabilidades e se empenhem imediata e seriamente na procura de um acordo político. Sem esse empenho, a União Europeia não terá seguramente outra opção senão rever as suas relações com o Quénia que, até agora, há que o dizer, têm sido excelentes. O Quénia é um país que era visto como estando no bom caminho em termos de governação, de respeito pelos direitos humanos e de democracia, além de que estava igualmente a desempenhar um papel importante para a estabilidade regional. São elementos que importa ter em mente.

A procura de um acordo político compete, pois, em primeiro lugar, aos líderes quenianos. Requer o fim imediato da provocação e da violência nas ruas, mas também nos meios de comunicação e nas tomadas de posição públicas. É crucial que o Presidente Mwai Kibaki e o líder da oposição Raila Odinga aceitem chegar a compromissos, reconhecendo que o resultado das eleições não se reflectiu correctamente no exercício do poder e das responsabilidades e que tem inevitavelmente de haver uma partilha de poder de modo a evitar a continuação da crise política. Esta partilha de poder poderia ser uma solução provisória até que, por exemplo, possam ser realizadas novas eleições.

Finalmente, é importante que a classe política queniana reconheça a imperiosa necessidade de resolver os problemas de fundo que estão na origem deste desencadear de violência, seja a organização constitucional do poder, a governação política do país ou as graves discriminações e desigualdades socioeconómicas.

A Comissão e a União Europeia no seu conjunto apoiam totalmente a mediação africana lançada pelo Presidente Kufuor e prosseguida por Kofi Annan, graças a Graça Machel e Benjamin Mkapa. Apelam ao Presidente Kibaki e a Raila Odinga para que cooperem plenamente com o objectivo de alcançar um acordo político. Falei longamente com Desmond Tutu no início da crise, durante a sua missão de mediação. Mantive igualmente uma longa conversa com Kofi Annan, da qual resultou que o mais apropriado seria que a mediação africana acompanhasse um processo de aproximação. Prometi o apoio da Comissão a esta mediação, quer no plano político que no plano financeiro.

Seja como for, devemos regozijar-nos pelo facto de o Presidente do Parlamento queniano ter sido eleito em boa ordem ontem à noite. Devemos ver isto como um sinal de que o quadro constitucional é respeitado, pelo menos deste ponto de vista. No entanto, os próximos dias serão cruciais. Seguiremos de perto a situação e permaneceremos em constante contacto com os mediadores africanos. Adaptaremos a nossa relação com o Quénia, inclusive no domínio da cooperação, em função da evolução da situação e das acções concretas de ambos os lados.

Todas as opções estão hoje sobre a mesa. É necessário que haja um diálogo europeu e internacional para que a nossa acção tenha o máximo impacto. Pode-se considerar que a comunidade internacional está, hoje, no mesmo comprimento de onda, que já não existem diferenças de abordagem, de sensibilidade política, ou mesmo de estratégia. Isto é importante. Não era necessariamente esse o caso no início, logo após as eleições. Creio que este é hoje um dado adquirido, e que é positivo.

No que respeita à situação humanitária, a Comissão reagiu muito rapidamente. Na sequência das avaliações dos peritos do ECHO e dos nossos parceiros no terreno, a Comissão desbloqueou uma primeira ajuda de emergência de 5,5 milhões de euros para responder às necessidades das populações deslocadas em matéria de água, alimentos, abrigo e saúde.

 
  
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  Maria Martens, em nome do Grupo PPE-DE. – (NL) Senhor Presidente, como já foi dito, desde 2002 que o Quénia constituiu um importante exemplo de democracia e de estabilidade na região. O país deu passos largos em termos políticos e económicos ao longo dos últimos anos. As eleições quenianas mostraram que a vasta maioria dos cidadãos quenianos prefere a democracia à ditadura. Eles mostraram que confiam mais em representantes eleitos do que nos militares. Não obstante, registaram-se estas alarmantes explosões de violência, e há agora uma crise humanitária que já causou centenas de mortos e mais de 250 000 refugiados. Isto não deixará de se repercutir na situação económica do país.

O que fazer? Importa que a União Europeia dê todo o seu apoio ao painel de "personalidades africanas eminentes" nomeado pela União Africana e liderado por Kofi Annan. Se há uma lição que possamos aprender com o passado, essa lição é que nós - a Europa - não devemos pensar que podemos resolver os problemas de África. Os problemas africanos requerem soluções africanas, e saúdo o facto de a Comissão Europeia apoiar esta ideia.

Senhor Presidente, o meu grupo apoia plenamente a resolução. No entanto, há ainda um aspecto que não posso realmente deixar de referir, um aspecto que o meu grupo considera particularmente lamentável, designadamente o facto de, um dia depois das eleições – ou seja, numa altura em que o resultado fora decidido e, como o Comissário teve ocasião de dizer, já se haviam constatado inúmeras irregularidades –, a Comissão Europeia ter transferido para o Governo mais de 40 milhões de euros a título de apoio orçamental. A Comissão não esperou sequer pelas conclusões da nossa própria equipa de observação - que, aliás, só foram publicadas três dias mais tarde.

Esta decisão política não pode ser justificada com o argumento técnico de que o pagamento já tinha sido adiado uma vez, até depois das eleições, e que este pagamento se tratou simplesmente do último de uma série de três pagamentos. Ela poderia e deveria ter sido adiada. Esta foi uma decisão extremamente infeliz, tanto mais porque os próprios Estados-Membros já tinham suspendido a sua ajuda. Isto não pode voltar a acontecer.

 
  
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  Emilio Menéndez del Valle, em nome do Grupo PSE. – (ES) Senhor Presidente, uma prova adicional de que a maioria do povo queniano não apoiou o Presidente Kibaki é que, nas eleições legislativas, que foram realizadas em simultâneo com as eleições presidenciais, o partido da oposição do Sr. Odinga alcançou mais do dobro dos votos alcançados pelo partido do partido do Sr. Kibaki.

Como sabemos, isso permitiu ao partido do Sr. Odinga obter o cargo de presidente da assembleia legislativa quando o Parlamento abriu ontem em Nairobi. Entretanto, 22 dos ministros do Sr. Kibaki, que aspiravam a ser deputados, foram derrotados nas eleições.

O Presidente Kibaki é, do meu ponto de vista, amplamente responsável pela situação do país, e não só pela fraude eleitoral. Os seus cinco anos de governação conduziram à frustração, à desilusão e à fraude. É certo que a economia cresceu 6%, mas mais de metade da população continua a viver abaixo do limiar de pobreza. Além disso, diversos ministros do Governo, nomeados por Kibaki num claro acto de provocação, foram associados a casos de corrupção.

Este Presidente, que procura fraudulentamente manter-se no poder, é também responsável por outro fenómeno grave: a sua actuação provocou um ressurgimento do conflito interétnico, uma espiral que poderá ser difícil de conter.

Como se isto não bastasse, e como V. Exas. sabem, há duas semanas a esta parte o Presidente da Comissão Eleitoral do Quénia afirmou, nada menos, que "não sabia quem ganhara as eleições presidenciais".

Perante tudo isto, penso que faz todo o sentido exigir – como diz o nº 11 da resolução comum deste Parlamento – a convocação de novas eleições, caso se revele impossível organizar uma recontagem limpa, transparente e credível dos votos emitidos nas eleições de 27 de Dezembro.

 
  
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  Alexander Lambsdorff, em nome do Grupo ALDE. – (DE) Senhor Presidente, gostaria de começar por exprimir os meus agradecimentos ao Conselho, à Comissão e também aos meus colegas no Parlamento Europeu. Existe uma grande unidade entre as instituições. Este facto deixa-me, pessoalmente, muito feliz, mas digo-o também em nome da minha equipa de mais de 150 observadores eleitorais, 50 dos quais, pelo menos, permaneceram no Quénia durante mais de um mês. Esta unidade é um bom sinal.

Alguns destes observadores – quero dizê-lo aqui – encontram-se presentemente a caminho do Paquistão, ou já lá terão chegado, um país que vai ser palco das próximas eleições problemáticas. A observação de eleições é, por vezes, uma tarefa difícil e perigosa. Quero agradecer muito sinceramente a estas pessoas o seu empenho neste trabalho.

Sejam quais forem os valores que defendemos, a Europa é um valor comum. Podemos sentir-nos orgulhosos – como o Senhor Comissário acabou de referir – pelo facto de outras missões de observação terem subscrito as nossas conclusões, nomeadamente a Delegação da Commonwealth e o Instituto Republicano Internacional dos Estados Unidos. Creio que o trabalho da missão de observação criou, assim, uma base para um esforço comum em que a União Europeia, a África e os Estados Unidos unam forças para chegar a uma solução para a crise no Quénia.

Na sua resolução, o Parlamento Europeu irá apontar os caminhos que considera apropriados. Como observador-chefe, não tomei parte, pessoalmente, nestas consultas. Em minha opinião, a neutralidade da nossa missão deve ser preservada inequivocamente até ao fim. E até ao fim significa até à apresentação do nosso relatório final, que estamos actualmente a compilar.

A par do trabalho profissional dos nossos observadores no terreno, a neutralidade conseguida constituiu o nosso maior trunfo. Neutralidade e profissionalismo passam, também, pelo facto de trabalharmos apenas com base em provas. Nas nossas conclusões, constatámos que há um certo cepticismo quanto aos resultados das eleições presidenciais. Como missão de observação, nunca dissemos que um determinado candidato tinha ganho as eleições. Dissemos, sim, que não era possível determinar quem era o vencedor.

Queria fazer uma citação, em inglês, de um texto escrito pelos observadores das eleições no Quénia:

(EN) "A nosso ver, e olhando para a globalidade do processo eleitoral, as eleições gerais de 2007 foram credíveis no que respeita à votação e ao processo de contagem. No entanto, o processo eleitoral perdeu credibilidade perto do fim, relativamente à contagem e anúncio dos resultados presidenciais."

Esta declaração foi feita pelos observadores nacionais quenianos, que ali acompanharam entre 16 000 e 20 000 pessoas, e que está em total sintonia com as nossas conclusões.

Desejo agora dizer algo que se aplica a mim próprio, à equipa e a todos: temos esperança numa rápida resolução da crise, no fim da violência e na possibilidade de os refugiados regressarem ao seu país o mais rapidamente possível.

 
  
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  Konrad Szymański, em nome do Grupo UEN. – (PL) Senhor Presidente, Senhor Primeiro-Ministro, Senhor Comissário, o problema do Quénia vai além das irregularidades eleitorais do Presidente Kibaki. Estamos perante uma crise humanitária para a população civil.

A situação mais dramática parece ser a que se verifica em Eldoret, na Igreja Católica do Espírito Santo, em Langas. Neste caso trata-se de numerosos homicídios, cometidos num contexto político e étnico. Muitos quenianos foram expulsos das suas casas, que foram incendiadas. A 1 de Janeiro de 2008, mais de 3 000 pessoas refugiaram-se na paróquia de Langas. Os refugiados não dispõem de alimentos, água potável e saneamento básico. A 2 de Janeiro deste ano a MISNA, a agência noticiosa missionária católica, noticiava que se tinham refugiado na catedral de Langas entre 7 000 e 10 000 pessoas. O que é necessário não é apenas uma mediação política, mas também uma intervenção destinada a garantir que não sejam permitidos surtos de violência religiosa e étnica.

 
  
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  Marie-Hélène Aubert, em nome do Grupo Verts/ALE. – (FR) Senhor Presidente, creio que, face à situação actual, a União Europeia deve fazer um esforço para afirmar a sua credibilidade no que se refere às missões de observação que envia a estes países. De facto, se se constatar de forma inegável, como foi o caso, que o resultado é claramente fraudulento, que o Presidente não pode ser considerado o Presidente legitimamente eleito, a União Europeia deve então ser coerente na sua política, começando, no mínimo, por não reconhecer o Presidente, neste caso o Sr. Kibaki. Em segundo lugar, a União deve propor e assegurar que se realizem, o mais rapidamente possível, novas eleições presidenciais que permitam eleger realmente o Presidente, desta vez nas devidas condições.

Infelizmente, existem precedentes, nomeadamente na Etiópia, onde o Presidente usou igualmente a força para se impor no cargo, apesar da evidência de fraude, seguida de grande violência repressiva. A aceitação do facto consumado pela União Europeia contribui para minar o interesse de enviar missões de observação.

Que sentido faz enviar missões de observação europeias com a seriedade e o empenho de todos os nossos colegas neste domínio, para chegar a conclusões que são unanimemente reconhecidas por todos, se, no final, nos mantemos à margem e, alguns meses depois, aceitamos a demonstração de força de um Presidente que nem sequer nos ouvirá? Aceitaríamos este tipo de situação nos nossos países? Obviamente que não.

Não podemos, portanto, em termos de democracia e de processos eleitorais por nós apoiados, ter dois pesos e duas medidas, um que seria aplicável na União Europeia e o outro que iria mudando em função dos interesses de uns e de outros nestas regiões.

O povo queniano deseja, creio, ver esta situação clarificada e reclama novas eleições para que as coisas fiquem perfeitamente claras.

 
  
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  Gabriele Zimmer, em nome do Grupo GUE/NGL. – (DE) Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, certamente que todos somos unânimes em concordar que os acontecimentos no Quénia são trágicos e que os persistentes actos de violência têm absolutamente de ter um fim. A crise no Quénia é profunda e, em minha opinião, não apenas de natureza política. O certo é que também pode vir a ter impacto na situação dos países africanos vizinhos.

É verdade que há agitadores no Quénia que tentam instigar o ódio entre os grupos étnicos com o objectivo de conquistar o poder. Mas se lerem actualmente a imprensa livre queniana, por exemplo, é muito encorajador a quantidade de jornalistas se esforçam constantemente por defender a unidade no país e a unidade entre o povo queniano, opondo-se à fragmentação da sociedade. O problema reside, sobretudo, no facto de não ter sido possível permitir que amplas camadas da população queniana tivessem a sua quota-parte na expansão económica do Quénia e de a violência poder alastrar por esse motivo. No âmbito da nossa cooperação para o desenvolvimento, deveríamos dar bastante mais ênfase ao facto de se estar a fazer uma verdadeira tentativa para alterar esta situação e, nomeadamente, iniciar uma campanha muito concreta contra a pobreza no Quénia.

Considero igualmente problemático manter discussões sobre o cancelamento do apoio orçamental ao Quénia, pois essas discussões alimentam receios quanto ao futuro neste país. Congratulo-me muito especialmente, Senhor Comissário Michel, pelo facto de a UE se posicionar de forma clara ao lado de Kofi Annan e de outros mediadores da União Africana, a fim de ajudar a resolver estes processos no Quénia também com os políticos africanos.

 
  
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  Valdis Dombrovskis (PPE-DE). – (LV) Senhor Presidente, Senhor Comissário, Senhoras e Senhores Deputados, quero, em primeiro lugar, louvar a grande participação dos cidadãos do Quénia no dia das eleições. As eleições caracterizaram-se por uma elevada taxa de participação e de paciência por parte dos cidadãos, apesar das longas filas e dos problemas técnicos registados em certos distritos. Já a situação relativamente à produção dos resultados das eleições presidenciais foi, lamentavelmente, completamente diferente. O requisito da transparência não foi cumprido. As numerosas infracções e divergências na informação lançaram dúvidas sobre os resultados anunciados. Lamentavelmente, foi dada a impressão de que os resultados foram produzidos de acordo com o princípio de que o importante não é como os cidadãos votam, mas sim como a contagem dos votos é feita. Caso não seja possível realizar uma recontagem credível e transparente dos votos, as eleições no Quénia deveriam ser repetidas. Depois do anúncio dos resultados das eleições, o clima, que era já de tensão, tornou-se lamentavelmente um clima de violência. A prioridade mais urgente neste momento é pôr termo à violência e evitar que se instale uma crise humanitária. A União Europeia deve dar o seu apoio à missão chefiada pela União Africana e por Kofi Annan para fazer a mediação entre o Presidente e a oposição, com o objectivo de pôr termo à violência e encontrar uma solução para a crise política. Caso se revele necessário, a União Europeia deve estar preparada para prosseguir esta mediação. É óbvio que a União Europeia deve conceder ao Quénia a ajuda humanitária necessária para aliviar a situação de muitos milhares de pessoas deslocadas que, devido à violência, foram forçadas a abandonar as suas casas. Todavia, a ajuda humanitária deve ser concedida por forma a chegar, efectivamente, às pessoas deslocadas, e a utilização dos fundos deve estar sujeita a um controlo adequado. Deste ponto de vista, é questionável a decisão da Comissão Europeia, adoptada no dia a seguir às eleições, de transferir 40 milhões de euros do apoio orçamental para o governo queniano sem ter em consideração as críticas dos observadores da União Europeia relativamente à forma como decorreram as eleições. O apoio orçamental não garante lamentavelmente um controlo rigoroso da utilização dos fundos, e a concessão dessa ajuda a um presidente e a um governo que chegaram ao poder em eleições questionáveis deve ser cuidadosamente avaliada. Solicito à Comissão Europeia que analise este caso e que informe o Parlamento Europeu acerca das medidas tomadas para evitar a repetição deste tipo de situação.

 
  
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  Glenys Kinnock (PSE). – (EN) Senhor Presidente, temos obviamente de considerar o facto de o Quénia ser um país onde a maior parte das pessoas subsiste verdadeiramente com alguns dólares por dia.

Os níveis de descontentamento e privação são enormes. Como se viu, a situação criou um exército inteiro de pessoas descontentes, que perceberam que o fosso entre os ricos e os pobres do Quénia se alargou, e isto no contexto de um crescimento de 6% do PIB que outros já referiram.

O Quénia é uma economia de parcos rendimentos e poucos recursos. É também um país que, desgraçadamente, está minado pelo nepotismo e pela corrupção. E, ao mesmo tempo que aqui debatemos, as pessoas estão a armazenar géneros alimentares e a voltar às ruas, tanto em Nairobi como noutras partes do Quénia.

Deste modo, quero juntar a minha voz às que defenderam que a UE tem de suspender o apoio orçamental ao Quénia até que se encontre uma solução política para a presente crise. Obviamente, é inaceitável o envio de 40,6 milhões de euros um dia depois de terem sido proferidas críticas ao acto eleitoral.

Estou muito satisfeita por, na segunda-feira, o Senhor Comissário Michel ter declarado, na nossa comissão, a revisão imediata do apoio orçamental. Gostaria de saber mais alguma coisa sobre o assunto. Em vez de canalizarmos dinheiro através dos ministérios do Quénia, temos de ponderar formas de o fazermos através do apoio a projectos, de modo a garantir que os pobres do Quénia não saiam prejudicados do processo.

Na minha opinião, temos de ser mais assertivos quanto à necessidade de condicionar a ajuda à boa governação, como está claramente previsto nos Acordos de Parceria assinados em Cotonu, algo que não temos feito. Receio que tenhamos feito vista grossa a muitas das graves acusações de corrupção naquele país.

Finalmente, os perpetradores das irregularidades nos resultados eleitorais que nos foram comunicadas pelos observadores têm de ser responsabilizados e não podem passar impunes.

De igual modo, penso que a União Europeia tem de desempenhar o seu papel de monitorização no processo de mediação. Fomos dos primeiros a solicitar tais considerações, pelo que gostaria de ver o Conselho e a União Europeia a assumirem uma abordagem mais afirmativa e coerente, garantindo a Kofi Annan todo o apoio que ele necessitar da parte da Europa, e que fosse nomeada, com a maior brevidade possível, uma nova Comissão Eleitoral.

 
  
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  Anna Záborská (PPE-DE).(SK) Por favor, permitam-me algumas questões e algumas observações.

O que aconteceu com os fundos da União Europeia que estavam na missão em Nairobi desde Novembro? Por que razão é que a transferência foi adiada até às eleições e o dinheiro, pago um dia após as eleições? Nessa altura, só havia resultados provisórios e já tinham surgido as primeiras dúvidas quanto à fiabilidade do processo. Quem controla a utilização dos dinheiros dos contribuintes da UE destinados à ajuda ao desenvolvimento? Se havia dúvidas relacionadas com o processo eleitoral, deviam ter existido regras claras, estabelecidas antecipadamente, para que os fundos não tivessem sido entregues antes do anúncio oficial dos resultados.

Quando estive no Quénia, um mês antes das eleições, houve várias pessoas que me avisaram, e o senhor Comissário também o sugeriu, que a situação poderia redundar em violência. A ajuda financeira destina-se às pessoas, por isso, não deve estar dependente da estabilização ou não da situação; caso contrário, teríamos de suspender a ajuda financeira em mais países, não só em África.

Rejeito a utilização da ajuda ao desenvolvimento como instrumento de manipulação. A suspensão dos fundos representa uma forma de pressão política e que vai pagar o preço são aqueles aos quais a ajuda se destinava. O dinheiro para estes fundos provém dos contribuintes europeus e as pessoas que ajudamos não podem tornar-se reféns dos líderes políticos. Os acordos não deveriam ser condicionados pela ajuda ao desenvolvimento: muitas vezes, eles não são condicionados pelo respeito pelos direitos humanos. As pessoas no Quénia necessitam da nossa ajuda, quer sejam apoiantes de Kibaki, quer de Odinga. Elas vivem lado a lado nos bairros de lata, numa pobreza extrema.

Sabemos que houve eleições em África. Segundo pessoas do Quénia, mesmo que a contagem dos resultados não tenha sido completamente rigorosa, os resultados não teriam sido diferentes. Por isso, não deveríamos castigar as pessoas que dependem da nossa ajuda, e eu estou a pensar nos europeus, incluindo os eslovacos, que permaneceram no local, apesar da gravidade da situação, e continuam a cumprir os projectos bilaterais. Posso garantir que os fundos para estes projectos estão a ser utilizados de forma eficaz e sem corrupção.

 
  
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  Josep Borrell Fontelles (PSE).(ES) Senhor Presidente, nós, europeus, não podemos limitar-nos a dizer que estamos muito preocupados, mas que temos muita esperança em que as coisas regressem à normalidade, porque um regresso à normalidade paga ao preço de aceitar a vitória fraudulenta de Kibaki não é uma solução que possamos aceitar.

Há demasiados países africanos onde eleições falsificadas despojaram os cidadãos de toda a fé e esperança no sistema democrático. Um novo episódio como esse, desta feita no Quénia, seria letal para os anseios democráticos de África.

A solução só pode vir de uma forte pressão externa. Sem uma forte pressão externa, os dois líderes não chegarão a qualquer espécie de acordo, e temos de dizer claramente ao Sr. Kibaki que o seu Governo é ilegal e que tem de agir em conformidade. De contrário, as nossas missões de observação eleitoral não fariam qualquer sentido.

Falámos aqui das responsabilidades do povo africano, mas devíamos lembrar-nos também das nossas. Durante demasiado tempo fechámos os olhos ao que se estava a acontecer no Quénia. Durante demasiado tempo exaltámos aquele país com um exemplo de democracia, esquecendo as desigualdades sociais e a corrupção que reinavam em todo o país: desde a sua independência, o Quénia recebeu 16 000 milhões de dólares em ajuda e teve apenas quatro Presidentes.

O Quénia está a pagar um preço muito elevado pela protecção e o apoio que demos aos seus maus governos, sem os denunciarmos. Desta vez não podemos fechar os olhos.

 
  
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  Thijs Berman (PSE).(ES) Senhor Presidente, hoje, os manifestantes foram de novo alvo de uma forte violência policial. Houve mais mortes no Quénia. Poderá esta tensão chegar ao fim se não houver novas eleições presidenciais? Duvido. Seja como for, é preciso que haja uma investigação independente sobre esta fraude eleitoral, cujo resultado tem de ser respeitado por todos o partidos partes, mesmo que isso signifique novas eleições.

O Quénia corre riscos enormes. É do interesse de todos os quenianos, da região e até da própria UE que a tranquilidade volte ao país. Recusar agora o diálogo seria irresponsável. Além disso, de uma coisa não restam dúvidas: prestar mais apoio orçamental a um Governo antidemocrático como este está totalmente fora de questão.

Kofi Annan adoeceu, e raramente um ataque de gripe chegou em pior momento. No entanto, a UE tem sem demora de prestar todo o apoio à sua missão e de oferecer assistência técnica e financeira onde tal for necessário. É evidente que são em primeira instância os líderes africanos que têm de mediar, mas se a situação ameaçar agravar-se antes do regresso do Sr. Annan, a própria UE terá de estar preparada para se juntar à União Africana e enviar sem demora uma delegação de alto nível para Nairobi. O Quénia não pode transformar-se noutra Somália. Ainda não é tarde demais.

 
  
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  David Martin (PSE). – (EN) Senhor Presidente, concordo com o senhor deputado Borrell Fontelles quando ele diz que, se alguma coisa de bom resultou da situação pós-eleitoral no Quénia, foi o facto de ela ter revelado que o chamado sucesso queniano assenta em fundações de palha. Embora seja verdade que há uma genuína sede de democracia entre os Quenianos comuns e que o Quénia tem vivido uma fase de grande crescimento económico, é igualmente evidente que, durante anos, o governo que supervisionou esse crescimento não logrou garantir que os benefícios económicos e sociais do mesmo chegassem a toda a população.

Sabemos agora que a desordem económica e social está enraizada no país e que, durante anos, a actuação do Governo se pautou pela corrupção e pela má gestão económica. Como bem afirma a senhora deputada Kinnock, os conceitos de boa governação e respeito pela democracia são pré-requisitos para a prestação de ajuda por parte da União Europeia. Mas, contrariamente ao que outros oradores disseram, isso não significa que devamos abandonar o país. Significa sim que devemos recanalizar a nossa ajuda através de agências e organizações capazes de a fazer chegar aos pobres, aos mais necessitados e aos mais desfavorecidos do Quénia. É óbvio que, não sendo os resultados das eleições devidamente monitorizados e respeitados, não podemos continuar a canalizar dinheiro através do Governo queniano. Cabe-nos, pois, emitir uma mensagem bem clara: a boa governação é um pré-requisito para a prestação de ajuda por parte da União Europeia.

 
  
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  Anders Wijkman (PPE-DE). – (EN) Senhor Presidente, esta situação, tal como foi dito por todos os colegas, é profundamente trágica: assemelha-se, em muito, ao que aconteceu há poucos anos em Adis Abeba.

Tenho dúvidas quanto a ser possível alcançar uma solução sem novas eleições. No entanto, o ideal seria encontrar agora uma solução para o Quénia pela via do diálogo, de preferência com o apoio da União Africana. Até agora, porém, os progressos a que assistimos foram muito poucos. O tempo é curto, o tecido que constitui o país está a esboroar-se ao mesmo tempo que nós falamos.

Não podemos ficar apenas a olhar, se a situação não se resolver. Nas presentes circunstâncias, impõe-se a suspensão da ajuda. Além disso, se a reconciliação fracassar, a União Europeia tem de avançar e oferecer os seus préstimos como mediadora. Será que o Conselho e a Comissão estão prontos para isso? Numa perspectiva a mais longo prazo, diria que temos de reconsiderar seriamente não só a nossa cooperação para o desenvolvimento como também, em especial, o nosso programa de governança, e que temos, em particular, de ajudar os partidos políticos a tornarem-se verdadeiros partidos e, além disso, de reforçar a instituição do Parlamento do Quénia, já que, neste preciso momento, este é um problema crucial.

 
  
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  Colm Burke (PPE-DE). – (EN) Senhor Presidente, tendo visitado o Quénia anteriormente, em especial os bairros de lata de Nairobi, estou familiarizado com a corrupção que existia já antes destas eleições. Condeno a trágica perda de perto de 600 vidas e lamento a situação humanitária crítica que se criou após as eleições de 27 de Dezembro no Quénia. Insto as autoridades competentes e demais interessados a fazerem todos os possíveis para trazer a paz ao Quénia e para assegurar o respeito dos direitos humanos e do Estado de direito.

É extremamente infeliz que o Quénia, uma das nações mais estáveis e economicamente mais desenvolvidas da África Oriental tenha agora mergulhado em tal caos, já que tal facto irá muito provavelmente ter efeitos prejudiciais sobre os países vizinhos. A missão de observação eleitoral da União Europeia concluiu que a falta de transparência e de procedimentos de segurança adequados prejudicou gravemente a credibilidade dos resultados da eleição presidencial.

Hoje mesmo, o partido de oposição do Senhor Odinga apelou uma vez mais a protestos nacionais contra os resultados da eleição presidencial do mês passado. Essas manifestações da oposição deverão durar três dias, apesar da proibição decretada pelo governo. Tais protestos poderiam dar origem a mais um banho de sangue. Muitas das mortes parecem ter sido devidas unicamente a diferenças étnicas, tendo o caso mais horrível sido o do ataque brutal a uma igreja perto da cidade de Eldoret, onde se pensa que mais de 30 pessoas da etnia Kikuyu terão morrido.

Insto o Senhor Kibaki a respeitar os compromissos democráticos do seu país, consignados na Constituição do Quénia e nas orientações da Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos. Insto a Presidência da UE e a Comissão Europeia a seguirem de perto a missão de mediação que será chefiada por Kofi Annan, no fim desta semana, e, se necessário, a assegurarem uma continuação imediata desses esforços de mediação por uma delegação de alto nível da União Europeia, eventualmente uma iniciativa conjunta UE-UA.

 
  
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  Karin Scheele (PSE). – (DE) Senhor Presidente, quero associar-me à questão colocada ao Comissário Michel pela minha colega Glenys Kinnock. Quais são os pontos principais? Como podemos conceber essa revisão? Em que sentido está a ser alterado o apoio orçamental?

Uma pergunta adicional: estão já previstas disposições no actual sistema de apoio orçamental – presumo – para que o apoio seja suspenso numa situação como a que prevaleceu no Quénia após as eleições?

 
  
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  Jan Mulder (ALDE). (NL) Senhor Presidente, todos estamos de acordo em que o que correu claramente mal no Quénia foi o processo das eleições presidenciais. O que correu relativamente bem, contudo, foram as eleições legislativas, as eleições para os membros do Parlamento nacional.

Concordo com o Comissário Michel quando diz que os acontecimentos que ontem se verificaram no Parlamento são animadores: o Presidente foi eleito – os partidos e a oposição tiveram força suficiente para aguentar com êxito as eleições para o novo Presidente. Penso, pois, que o Parlamento Europeu tem de fazer tudo o que estiver ao o seu alcance para apoiar, e se possível reforçar, a democracia no Quénia. O apoio orçamental que foi concedido precisamente um dia depois das eleições suscitou críticas por parte de muitos quadrantes desta Câmara.

Gostaria que o Comissário me respondesse à seguinte questão – se bem que, formalmente, talvez isso não seja possível. Faria o Comissário depender do parecer do Parlamento Europeu futuras decisões sobre a concessão de apoio orçamental? Do meu ponto de vista, não cabe a um pequeno número de funcionários do Comité do Fundo Europeu de Desenvolvimento tomar uma decisão dessa natureza; em vez disso, o Comissário deveria primeiro solicitar o parecer do Parlamento Europeu. Gostaria de obter uma resposta clara a esta pergunta.

 
  
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  Filip Kaczmarek (PPE-DE). – (PL) Senhor Presidente, o exemplo do Quénia ilustra as consequências do desrespeito pelas normas democráticas e a importância de eleições livres, transparentes, honestas e democráticas.

As pessoas que perdem as eleições, independentemente de as terem perdido numa rivalidade honesta ou de terem sido defraudadas pelos organizadores do processo eleitoral, não devem recorrer à violência e à destruição. Atacar pessoas aleatoriamente, entre elas mulheres e crianças, está longe de ser uma forma aceitável de lutar pelos próprios direitos. A única esperança de uma solução eficaz para problemas deste género consiste em convencer os governantes e a oposição de que o principal objectivo da política não é a conquista ou a manutenção do poder, o objectivo da política é o bem do povo.

O regresso à normalidade no Quénia deve começar, portanto, pela suspensão da violência e da destruição. Reconheço que é esse o objectivo dos mediadores da União Africana e a União Europeia deve apoiar este processo. Gostaria de agradecer ao Senhor Comissário Michel o facto de o ter dito na sua declaração.

 
  
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  Michael Gahler (PPE-DE). – (DE) Senhor Presidente, só muito recentemente se tornou evidente a dimensão da corrupção no Quénia e, em consequência, muitos Estados-Membros – em boa verdade, todos os Estados-Membros – suspenderam o apoio orçamental nestes últimos anos, tendo passado a optar pelo apoio a projectos. Esta é, na verdade, uma das críticas que quero dirigir à Comissão, posto que, aparentemente, a Comissão não deu a conhecer aos Estados-Membros estas preocupações, tendo prosseguido com o apoio orçamental. Sou igualmente a favor de que se prossiga agora o apoio na forma apropriada, mas não numa forma que dê às anteriores estruturas a possibilidade de administrar o dinheiro através do apoio orçamental.

Sou também absolutamente favorável à ideia de apoiarmos, de futuro, a instituição agora legitimada, a saber, o Parlamento queniano. Não podemos presumir automaticamente que todos os membros do Parlamento terão um comportamento correcto e que não existirá corrupção. Não tenho ilusões quanto a isso. Deveríamos, no entanto, canalizar uma grande parte do apoio para as instituições políticas do Quénia, para promover o seu Parlamento e reforçar a capacidade de trabalho dos nossos colegas. Teremos, então, oportunidade de dar a estes colegas recentemente legitimados a possibilidade de, no futuro, governarem o Quénia de forma mais eficaz do que o que o actual governo tem sido capaz de fazer.

 
  
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  Eoin Ryan (UEN). – (EN) Senhor Presidente, penso que é convicção geral que as eleições presidenciais no Quénia foram falseadas. Penso que é verdadeiramente pena que assim seja, porque o Quénia é um país que gozou de estabilidade política durante muitas décadas. Infelizmente, isso mudou nas duas últimas semanas, e assistimos à morte de mais de 600 pessoas e à deslocação de 250 000 pessoas. Infelizmente, mais uma vez, a violência é de natureza étnica.

A questão agora é a de saber o que é que a comunidade internacional e nós próprios podemos fazer para devolver estabilidade política ao Quénia, antes que a situação se degrade mais. O diálogo político construtivo entre as duas partes tem de ser uma prioridade crucial, e inclino-me para concordar com outros oradores quanto ao facto de o dia de ontem ter sido um dia positivo no Parlamento do Quénia. Sem empenhamento político, no entanto, não haverá acordo, e a União Europeia está a exortar às conversações políticas. É com grande prazer que sei que Kofi Annan e os Presidentes da Tanzânia e do Uganda vão deslocar-se ao Quénia em breve, para tentar promover alguma forma de acordo.

Muitas das pessoas deslocadas foram para o Uganda, o que significa que já houve efeitos nas regiões vizinhas do Quénia. No que diz respeito à ajuda e ao aumento, por parte da União Europeia, do seu nível de apoio financeiro aos programas humanitários no Quénia, estaria interessado em ouvir o senhor Comissário Michel responder a uma pergunta sobre o modo exacto como irá ser gasto esse dinheiro e assegurar que o dinheiro foi gasto correctamente, ponto evocado por oradores anteriores.

Creio que todos deveríamos recordar – em especial, o povo e os políticos do Quénia deveriam recordar – que a história demonstrou, vezes sem fim, que, sempre que há um vazio político, esse vazio, em muitos casos, pode ser preenchido por extremistas, mas o povo do Quénia merece melhor.

 
  
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  Janez Lenarčič, Presidente em exercício do Conselho. − (SL) O Senhor Deputado Borrell alertou-nos para a necessidade de não nos limitarmos a manifestações de preocupação. Concordo, e nesses termos, gostaria de responder à pergunta do senhor deputado Wijkman: a União Europeia está disposta a dar um contributo na procura de uma solução? A Presidência considera, no seu ponto de vista, que deve estar disposta a ajudar activamente na procura de uma solução. Mas que solução?

A senhora deputada Martens salientou a necessidade de uma solução africana para os problemas africanos. Também concordo. Por outras palavras, a União Europeia não é a entidade que tem de impor as suas próprias soluções para problemas desta natureza – pelo contrário. Contudo, cumpre-nos dar um apoio activo na procura de uma solução adequada, em conjunto com outros elementos da comunidade internacional, em especial com aqueles que partilham os mesmos valores e que foram referidos pelo senhor deputado Lambsdorff. Nesse sentido, a Presidência envidará todos os esforços para apoiar de forma sólida o grupo africano de personalidades eminentes chefiado pelo ex-Secretário-Geral das Nações Unidas, Koffi Annan. No nosso entender, também é preciso continuar com a acção de ajuda humanitária, de forma apropriada, claro.

Senhor Presidente, permita-me agradecer aos estimados deputados a este Parlamento as suas contribuições. Transmiti-las-emos seguramente com rigor aos nossos colegas no Conselho. Congratulamo-nos pelo facto de a posição das Instituições ser, de uma forma geral, muito semelhante. Acompanharemos de muito perto a evolução dos acontecimentos no Quénia.

 
  
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  Louis Michel, Membro da Comissão. – (FR) Senhor Presidente, mencionarei rapidamente, em primeiro lugar, não os 30 milhões, mas os 40,6 milhões de euros que constituíram o pagamento, há alguns meses, da segunda tranche do programa de 120 milhões de euros intitulado "Poverty reduction budget support programme" (PRBS) - programa de apoio orçamental para a redução da pobreza.

A decisão de pagamento havia sido retardada enquanto se esperavam os resultados e as recomendações da terceira revisão do programa PRBS pelo Fundo Monetário Internacional.

Estes resultados foram conhecidos no início de Novembro e, nesse mesmo mês, com base no parecer favorável do Fundo Monetário Internacional, a Comissão aprovou o princípio do pagamento de um montante de 40,6 milhões de euros por carta dirigida ao Ministro das Finanças queniano.

No entanto, tendo em conta o contexto eleitoral e o risco de utilização eleitoralista deste pagamento pelo governo, a Comissão decidiu, em concertação com os Estados-Membros, não o efectuar antes das eleições, mas somente depois de estas terem tido lugar e antes da data-limite de 31 de Dezembro de 2007 para os compromissos financeiros, em conformidade com os procedimentos aplicáveis. É por essa razão que, tecnicamente, o pagamento foi efectuado em 28 de Dezembro.

Compreendo o mal-estar que este facto está a causar, mas – gostaria de vos recordar - foi somente a partir da noite de sexta-feira 28 e de sábado 29 de Dezembro que as irregularidades começaram a surgir, quando a transmissão dos resultados das últimas 49 circunscrições eleitorais, num total de 210, foi objecto de atrasos anormais, e, como sabem, foi só na segunda-feira 1 de Janeiro, com base nos acontecimentos do fim-de-semana, que a missão de observação eleitoral da UE revelou, na sua análise preliminar, que as eleições não tinham observado as normas internacionais. Portanto, era demasiado tarde, tecnicamente, para impedir ou bloquear o pagamento deste montante de 40,6 milhões de euros.

Em segundo lugar, gostaria de dizer – porque é importante do ponto de vista da argumentação – que estou de acordo com muito do que foi dito, mas que há igualmente coisas com as quais não posso de modo algum concordar. Quando alguém sugere que a técnica ou o método do apoio orçamental seria um método ou uma técnica em que não existem condições, nem de controlos, está obviamente a dizer algo que não é correcto. Queria apenas chamar a atenção para a necessidade de, antes de suspendermos repentinamente o apoio orçamental, verificarmos primeiro se a proposta, feita pela senhora deputada Kinnock e outros, no sentido de converter o apoio orçamental em apoio a projectos é exequível rapidamente, ou tão rapidamente como o apoio orçamental permite, de modo a não colocar as populações numa situação de privação ainda mais catastrófica. Com efeito, é fácil afirmar princípios, mas é preciso assegurar também que os resultados e as consequências da sua aplicação não contribuem para agravar ainda mais a situação.

Duas reflexões, portanto, sobre o apoio orçamental. O apoio orçamental é controlado - há justificativos a fornecer - e não é menos transparente do que o sistema de apoio a projectos.

Senhora Deputada Kinnock e demais deputados, é evidente que se um acordo não for rapidamente alcançado entre as partes para restabelecer a calma e, espero, para chegar a acordo sobre a eventual organização de novas eleições, como deseja o senhor deputado Wijkman, o apoio orçamental, que de certo modo qualifica o país que o recebe como um país que cumpre determinadas normas, deixará seguramente de poder ser posto em prática, tornando-se necessário encontrar outros meios de prestar apoio. Não concordo, porém, que pura e simplesmente suspendamos a ajuda ao desenvolvimento ao Quénia. Importa ter sempre em mente que, por trás deste apoio, há pessoas que beneficiam dele. Queria deixar claro este ponto, que julgo importante.

Uma última resposta, por fim, a respeito de dois outros pontos. Será necessário organizar eleições de imediato? Creio que isso seria desejável se as partes chegarem a acordo. Podemos exprimir os desejos que quisermos, mas acreditar que se irão organizar eleições de imediato, não existindo um acordo entre as partes, não é realista. É necessário também ter o cuidado de não favorecer a criação de situações que agravem a dificuldade e o infortúnio das pessoas. Isto é algo que não devemos perder de vista e creio que temos de agir com uma grande prudência. Sou a favor da realização de eleições, desde que estas resultem de um acordo.

Apoiaremos plenamente a mediação africana e, como o Conselho referiu, a Comissão está disponível, evidentemente, para uma missão de mediação. Entrei em contacto com Kofi Annan e mantive com ele uma longa conversa. Disse-lhe que estávamos à disposição – incluindo o Alto Representante – para fazer um trabalho de mediação. Como é óbvio, o que se espera agora é que possa ser essencialmente uma mediação africana. Penso que isto é algo que não podemos perder de vista.

Para concluir, uma última observação em resposta à pergunta do senhor deputado Mulder: se o Fundo Europeu de Desenvolvimento estivesse inscrito no orçamento, como o Parlamento e eu próprio requeremos, o apoio orçamental – por exemplo o montante, a técnica, os controlos, a verificação e a monitorização – seria feito automaticamente, o que simplificaria grandemente o processo.

Não podem imaginar a que ponto a minha vida seria mais confortável e mais eficaz se dependesse muito mais directamente das escolhas, das opções e do controlo do Parlamento sobre a utilização do meu orçamento.

No estado actual das coisas, receio que tal não seja possível, infelizmente, mas é evidente que é um assunto que desejo debater. A pergunta do senhor deputado prova uma vez mais que a orçamentação do Fundo Europeu de Desenvolvimento constituiria um avanço considerável a nível da eficácia da nossa ajuda.

 
  
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  Presidente. − Recebi seis propostas resolução(1), apresentadas nos termos do n.º 2 do artigo 103.º do Regimento.

Está encerrado o debate.

A votação terá lugar amanhã, quinta-feira, dia 17 de Janeiro de 2008.

Declarações escritas (Artigo 142.º)

 
  
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  Glyn Ford (PSE). – (EN) Intervenho neste debate com uma certa tristeza. Há cinco anos, em Dezembro de 2002, fiz parte da Missão de Observação Eleitoral do Parlamento Europeu ao Quénia, chefiada pela Baronesa Nicholson. A eleição decorreu de acordo com as Orientações Internacionais, que deram aos resultados a integridade que os validou e que deu a vitória à oposição. Tendo tido a oportunidade de nos encontrarmos com Mwai Kibaki, o novo Presidente, sentimos todos, juntamente com a convicção da justiça da sua eleição, que o futuro do Quénia parecia mais esperançoso, com uma nova era, de maior eficiência e menos corrupção, a aproximar-se.

Ora,, tal como no final de Animal Farm de George Orwell, os porcos tornaram-se homens e os homens, porcos. O regime que parecia tão prometedor tornou-se tão corrupto e inepto como o anterior, destruindo, nesse processo, as esperanças e o futuro de milhões de Quenianos. Saúdo as afirmações fortes do Chefe da Missão de Observação Eleitoral da UE. Espero que a Comissão encoraje a reconciliação entre as partes em conflito e que ameace tomar medidas fortes, se não houver acordo.

 
  
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  James Nicholson (PPE-DE), por escrito. (EN) Na minha qualidade de ex-observador eleitoral do Parlamento Europeu para o Quénia, o rumo dos acontecimentos após as eleições de Dezembro preocupa-me profundamente. O facto de o Quénia ter sido visto durante anos como o país mais estável daquela parte do continente africano torna os acontecimentos ainda mais preocupantes. O Quénia, tal como o meu país, é membro da Commonwealth. Apoio a proposta feita pela equipa de observação da Commonwealth no sentido de colocar no local juízes independentes da Commonwealth para examinar os resultados das eleições. A nossa própria equipa de observação eleitoral da UE sugeriu que se procedesse a uma auditoria de avaliação independente dos resultados. Estou convencido de que o povo queniano confiaria nessa auditoria, se esta fosse levada a cabo por juízes da Commonwealth.

A nossa prioridade imediata é ver o Quénia voltar a um estado de normalidade, sendo que por "estado de normalidade" entendo uma sociedade pacífica na qual o processo democrático não é posto em causa. As notícias de hoje de que forças de segurança impediram políticos da oposição de fazerem uma demonstração de protesto não são bom sinal. Apelo à UE para que faça tudo o que está ao seu alcance para trabalhar com organizações internacionais para se assegurar de que o Quénia consegue recuperar a sua normalidade e a sua democracia.

 
  

(1) Ver Acta.

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