Presidente. – Seguem-se na ordem do dia as declarações do Conselho e da Comissão sobre a situação do sistema financeiro mundial e seus efeitos sobre a economia europeia.
Jean-Pierre Jouyet, Presidente em exercício do Conselho. – (FR) Senhora Presidente, Senhor Comissário, Senhoras e Senhores Deputados, estamos a presenciar o fim de uma era. Os próximos anos irão alterar a configuração da finança mundial tal como a conhecemos. Não é apenas à crise nos EUA que temos de fazer face, mas a uma crise que afecta o sistema financeiro internacional e que não poupa nenhuma região do mundo.
Desde há vários anos, vozes críticas têm-se feito ouvir para denunciar os crescentes desequilíbrios existentes no sector financeiro: uma exposição desrazoável aos riscos por parte de muitos intervenientes do mercado, a relativa incapacidade dos controladores financeiros para conter a rápida introdução de produtos financeiros cada vez mais complexos, e – como o Senhor Comissário irá sem dúvida referir – um gosto, demasiado pronunciado nalguns, pela ganância. Os resultados estão à vista. O sector financeiro dos EUA está emerso num turbilhão e as autoridades norte-americanas são forçadas a intervir de forma sempre crescente para evitar uma crise em grande escala. A Europa e o resto do mundo estão a sofrer as consequências desta crise sem precedentes desde a década de 1930.
A Presidência francesa está convicta de que os acontecimentos dos últimos dias reforçam a necessidade de uma Europa forte e unida no domínio económico e financeiro. Temos, em primeiro lugar, de encontrar respostas imediatas para as turbulências financeiras. Com o Banco Central Europeu, a União Económica e Monetária dispõe de um banco central poderoso, que soube intervir com rapidez, determinação e eficácia quando as tensões estiveram ao rubro, em estreita colaboração com os outros grandes bancos centrais. É um importante trunfo nestes tempos de turbulência e devemos saudar a acção do Banco Central Europeu, que está pronto a intervir em qualquer circunstância.
Face à aceleração da turbulência nos últimos dias, as autoridades reguladoras dos mercados na maioria dos Estados-Membros decidiram, à semelhança das autoridades americanas, proibir temporariamente as vendas a descoberto. É uma medida de emergência, mas é bem-vinda, já que pode contribuir para acalmar a tensão nos mercados.
Presentemente, não prevemos adoptar uma iniciativa do mesmo tipo da que acaba de ser anunciada pelas autoridades federais americanas relativamente à recompra em grande escala de produtos "tóxicos" detidos pelos intervenientes financeiros, e o Senhor Comissário Almunia pronunciou-se de forma muito pertinente a este respeito.
O sistema financeiro da União continua globalmente robusto, não requerendo portanto este tipo de medidas, mas devemos permanecer vigilantes e nenhuma medida pode ser excluída em nome de uma qualquer ideologia. O realismo e o pragmatismo são a ordem do dia. Se for necessário, teremos de fazer face a eventuais riscos sistémicos utilizando todos os meios à nossa disposição.
As intervenções de emergência dos bancos centrais e dos reguladores são cruciais, mas todos os peritos reconhecem que não podem resolver a crise por si só. É necessário que os Europeus assumam as suas responsabilidades e intervenham nos outros domínios em causa.
Temos de dar resposta ao abrandamento económico. Este foi o tema da abordagem europeia comum adoptada pelos Ministros da Economia e das Finanças no Conselho informal de Nice. Os Ministros, em conjugação com a Comissão e o Presidente do Banco Central Europeu decidiram deixar os estabilizadores automáticos funcionar livremente em matéria orçamental nos Estados-Membros que dispõem de margem de manobra.
Aprovaram também um plano de financiamento das PME europeias no montante de 30 mil milhões até 2011, a providenciar pelo Banco Europeu de Investimento, o que dará ao sector um apoio substancial, já que, paradoxalmente, embora a crise financeira seja menos pronunciada na Europa do que nos EUA, ela comporta igual número de riscos para a economia real. Um sistema financeiro estável e bancos sólidos podem ser chamados a restringir ou aumentar o custo do crédito conforme necessário, nomeadamente no caso das PME. Era pois necessária uma acção directa no que respeita a estas últimas.
Temos igualmente de reformar o nosso sistema financeiro segundo dois eixos principais: o primeiro eixo é uma acção legislativa e regulamentar rápida para restabelecer a transparência do sistema financeiro e responsabilizar os intervenientes financeiros. Foi neste sentido que, em 13 de Setembro de 2008, os Ministros mostraram a sua determinação em acelerar a aplicação do roteiro aprovado em 2007 para responder aos primeiros sinais da crise financeira. Este roteiro estabelece quatro acções-chave para fazer face às turbulências financeiras: transparência, regras prudenciais, valorização de activos e funcionamento dos mercados, incluindo as agências de notação.
É tempo agora de passar aos actos no controlo das agências de notação, na revisão dos controlos exercidos sobre os bancos, na adaptação das normas de contabilidade, que desempenharam sem dúvida um papel pro-cíclico no sector financeiro. Esta é uma prioridade fundamental da Presidência francesa, que iremos debater no próximo Conselho Europeu. Creio – mas o Comissário confirmá-lo-á – que a Comissão irá propor muito em breve a alteração das directivas em vigor desde 2006 relativas às exigências em matéria de fundos próprios.
Esta é uma das medidas actualmente em curso nas diferentes áreas para responder à turbulência financeira, o que, evidentemente, também inclui as recentes recomendações formuladas pelo Fórum para a Estabilidade Financeira. Sei que a Comissão poderá apresentar estas propostas no mais curto prazo e contamos com o Parlamento para se chegar a um acordo com o Conselho em primeira leitura, antes do termo da presente legislatura, sobre estas propostas urgentes.
Espera-se igualmente da Comissão, dentro de algumas semanas, uma proposta relativa às agências de notação, que dará seguimento ao pedido formulado pelo Conselho dos Ministros das Finanças em Julho de 2008 e, também a este respeito, conto com o Parlamento para se chegar a um acordo sobre esta proposta ambiciosa com a maior brevidade possível.
Registo igualmente com satisfação o facto de ter sido decidido estabelecer um grupo de trabalho para estudar a forma como a supervisão prudencial dos bancos e das companhias de seguros deve tomar em consideração o carácter cíclico das evoluções, nomeadamente no que respeita aos capitais. Daqui deverão resultar também medidas concretas.
Estas são as componentes essenciais de uma reforma do sector financeiro, que serão muito provavelmente acompanhadas de outras iniciativas, à medida que a reflexão europeia sobre a crise financeira prossegue. O Parlamento deve empenhar-se a fundo nesta reflexão e a Presidência toma nota com grande interesse dos recentes contributos da vossa Assembleia. Estou a pensar, nomeadamente, nos fundos de retorno absoluto, os hedge funds, a respeito dos quais alguns peritos dizem que podem ser as próximas vítimas da crise. Estou a pensar também – como referi há pouco – na questão das normas de contabilidade, mas também na questão das remunerações no sector financeiro, das quais nos devemos ocupar sem demora.
Dizer – como o ouvi da parte de alguns responsáveis europeus – que devemos prosseguir a nossa abordagem de laisser-faire e que não é necessária qualquer regulamentação é um erro. É mais do que um erro: é um atentado à estabilidade do sistema financeiro, é um atentado à razão. Vou ser claro a este respeito: se for preciso reflectir sobre uma regulamentação dos fundos de retorno absoluto, a União Europeia tem de o fazer. Temos de reflectir sobre a transparência dos riscos, sobre o poder de controlo dos reguladores e, também, sobre as remunerações neste tipo de instituições.
O segundo eixo fundamental é o reforço do nosso dispositivo de supervisão financeira. Os Ministros da Finanças saudaram o acordo dos comités europeus de reguladores sobre a harmonização, até 2012, das exigências relativas aos dados transmitidos pelos bancos europeus às autoridades de supervisão. São os primeiros resultados significativos, mas têm de ser seguidos de outros, e os Ministros acordaram em prosseguir os seus esforços para melhorar a coordenação do controlo e da supervisão dos intervenientes financeiros. A Presidência está disposta a trabalhar com o Parlamento e a Comissão para reforçar a integração da supervisão e do controlo prudencial sobre grupos que têm um cariz cada vez mais transfronteiriço. A União deve dotar-se de um sistema de supervisão mais eficaz e mais integrado, a fim de estar mais bem equipada para enfrentar as crises financeiras.
Senhoras e Senhores Deputados, a França preside ao Conselho da União Europeia num momento de grande turbulência. Nestas circunstâncias difíceis, temos plena consciências das nossas responsabilidades. Chegou a hora de tomar decisões importantes no que diz respeito à organização do nosso sistema financeiro, ao seu lugar na economia europeia e ao seu papel, que deve continuar a ser o financiamento das empresas e dos particulares.
A União não esteve inactiva durante estes últimos meses. A Presidência pode, portanto, apoiar-se nas reflexões feitas e nos trabalhos já realizados pela Comissão neste domínio, bem como no trabalho de alguns peritos, como é o caso, em França, do Sr. René Ricol.
O Conselho Europeu de Outubro oferece uma oportunidade para se estabelecer orientações rigorosas a nível europeu: esse é o nosso objectivo. É evidente que a Europa não deve agir sozinha. Deve ser proactiva e impulsionar uma nova cooperação internacional, como declarou ontem o Presidente Sarkozy nas Nações Unidas. Propomos igualmente organizar, até ao final do ano, uma reunião internacional que envolva o G8 e as suas autoridades de regulação financeira. O nosso objectivo é ajudar a produzir os primeiros princípios e as novas regras comuns a nível internacional para uma revisão do sistema financeiro internacional.
Através deste tipo de iniciativa, a União Europeia demonstra a importância que atribui a uma governação mundial renovada e equilibrada. A resposta europeia e internacional deve ser concebida a curto, médio e longo prazo. A curto prazo, precisamos de intervenções de emergência; a médio prazo, de uma revisão da nossa legislação; e, a longo prazo, de uma reflexão mais global sobre o papel do nosso modelo económico em termos de crescimento e emprego e da prossecução das reformas estruturais, que continuam a ser essenciais.
Com isto concluo a informação que queria transmitir hoje à vossa Assembleia.
Joaquín Almunia, Membro da Comissão. − (EN) Senhora Presidente, a sucessão de acontecimentos que afectaram os mercados financeiros no ano que passou e, em especial, nos últimos dias, assume uma dimensão que excede tudo o que até aqui conhecíamos. Há quem pense - e eu concordo - que esses acontecimentos irão provocar alterações de monta no funcionamento do sistema financeiro internacional.
Desde o início da crise, em Agosto de 2007, os prejuízos conhecidos elevaram-se a mais de 500 mil milhões de dólares americanos, o que equivale ao PIB de um país como a Suécia. Infelizmente, estima-se que o montante final seja consideravelmente superior.
A aceleração, nas últimas semanas, dos prejuízos declarados nos EUA e o consequente declínio da confiança dos consumidores colocaram grandes instituições financeiras à beira do colapso. Nos casos em que a queda de uma dessas instituições teria provocado risco sistémico - dito de outro modo, teria colocado em risco todo o sistema financeiro - foi necessário proceder a operações de salvamento de emergência.
Algumas dessas operações assumiram a forma de intervenções públicas, como as que o Tesouro e a Reserva Federal americanos levaram a cabo para evitar a falência da maior companhia de seguros a nível mundial, a AIG, ou das instituições de crédito hipotecário Fannie Mae e Freddie Mac que, em conjunto, subscrevem metade de todas as hipotecas dos Estados Unidos.
Outras intervenções foram realizadas como aquisições privadas - foi o que aconteceu quando o Banco da América adquiriu o banco de investimento Merrill Lynch.
Para outras instituições como o banco de investimentos Lehman Brothers e umas duas dezenas de bancos regionais norte-americanos a única solução possível foi a falência. Em suma, assistimos a uma transformação radical do cenário relativo ao sector bancário dos EUA.
Em consequência, chegou-se a um ponto em que o sistema financeiro norte-americano enfrenta um grave problema de falta de confiança. Segundo as autoridades americanas, neste momento já não é viável optar por uma balões de oxigénio em massa. Impõe-se uma solução sistémica urgente.
A curto prazo, todos aguardamos uma resposta que devolva a confiança e estabilize os mercados.
O plano que o Secretário do Tesouro americano, Henry Paulson, anunciou na semana passada parece uma iniciativa positiva. Em poucas palavras, o Secretário do Tesouro dos Estados Unidos propõe criar um fundo federal que permita remover dos balanços dos bancos os activos ilíquidos - os títulos hipotecários que se encontram na base dos problemas com que nos defrontamos. Essa medida permitiria afastar a incerteza e centrar de novo o mercado nos “fundamentais”. No entanto, para que a proposta tenha sucesso os seus pormenores devem ser definidos de forma adequada e rápida.
Repare-se que estamos a falar de um plano estabelecido para os EUA, adaptado às circunstâncias dos EUA, onde - não o esqueçamos - teve início a crise e o sector financeiro foi mais gravemente afectado. Mas compete a todos analisar as razões da crise. Todos temos de arcar com as consequências e de reagir à situação actual.
Para o fazer, há que começar por compreender como foi possível chegar a este ponto. As origens da turbulência que agora vivemos encontram-se nos desequilíbrios constantes na economia mundial, os quais permitiram um ambiente de elevada disponibilidade de liquidez a par de uma avaliação de riscos deficiente.
A interconexão dos mercados financeiros mundiais, o elevado nível de alavancagem e o recurso a técnicas e instrumentos financeiros inovadores e complexos, cujo funcionamento era mal conhecido, levaram a que esses riscos alastrassem a todo o sistema financeiro internacional, a uma escala nunca antes vista.
O que agora vemos claramente é que os intervenientes no mercado, mas não esqueçamos também as entidades reguladoras e supervisoras, foram incapazes de compreender a extensão dos riscos da situação, não tendo conseguido, em consequência, impedir os efeitos que agora se verificam.
É certo que, nos meses que antecederam a crise, o FMI, o Banco Central Europeu e a Comissão Europeia, entre outros, chamaram a atenção para estes riscos subjacentes. Sabíamos que a situação era insustentável mas o que não sabíamos e ninguém podia prever era quando, como e com que violência rebentaria a crise provocada pelas crescentes falhas no sector das hipotecas de alto risco.
Assistimos agora a um processo inverso ao dos últimos anos; neste momento o sistema financeiro vê-se a braços com a necessidade de desavalancagem. A alavancagem excepcionalmente elevada e a estreita ligação entre riscos tornam mais difícil ainda resolver agora o problema criado. A falta de transparência no sistema e a incapacidade das entidades supervisoras para traçar um retrato da situação rigoroso e completo provocaram uma dramática queda da confiança.
O sector financeiro foi gravemente atingido, pois o nervosismo dos bancos acabou com a liquidez no mercado interbancário.
Mercados de crédito de importância fulcral mantêm-se a perturbados e verificou-se recentemente nova procura dos investidores por produtos de qualidade, acompanhada de maior diferenciação dos prémios entre o rendimento das obrigações de referência e o rendimento de investimentos de algum risco.
Graças à intervenção dos bancos centrais, rápida e coordenada - e salientaria o papel do BCE - conseguimos evitar uma escassez de liquidez de maior gravidade. Todavia, os bancos continuam sob pressão. A crise de confiança provocou a queda dos preços dos activos, agravando a tensão sobre os balanços dos bancos. Assim, e tendo em conta também a situação no mercado interbancário, os bancos sentem dificuldade em recapitalizar.
Na Europa a situação não é tão severa e, para já, os Estados-Membros não consideram necessário um plano semelhante ao americano.
A médio prazo, é óbvio que se impõe uma reacção estrutural mais abrangente. Os acontecimentos mais recentes nos mercados financeiros tornaram muito clara a necessidade de reformular o actual modelo de regulação e supervisão.
A curto prazo há que reparar rapidamente as falhas do enquadramento actual, objectivo para o qual - e apoio plenamente a posição do Conselho - contribuem, com todos os elementos necessários, o roteiro de acções regulamentares do Conselho ECOFIN e as recomendações do Fórum de Estabilidade Financeira. Como é do conhecimento dos senhores deputados, estão aí incluídas iniciativas concretas relativas a transparência acrescida para investidores, mercados e autoridades de regulamentação; requisitos de capital revistos para as instituições bancárias e maior clareza do papel das agências de notação de risco de crédito.
Os trabalhos avançam na Comissão, que dentro em breve apresentará propostas relativas à revisão da Directiva Requisitos de Capital - na próxima semana - e nova legislação relativa às agências de notação de crédito, espero que antes do fim do mês de Outubro. Tendo em conta, porém, os últimos desenvolvimentos, é provável que tenhamos de explorar outras questões que entretanto surgiram.
Prosseguiremos a reflexão sobre outras acções a tomar para garantir a estabilidade financeira e para corrigir as razões que explicam a crise e, neste aspecto, subscrevo sem reserva as palavras de agradecimento pronunciadas pela Presidência do Conselho relativamente aos contributos dos senhores deputados.
Passaria, agora, às repercussões da crise do sector financeiro na economia - a economia real. Não restam dúvidas de que os acontecimentos no sector financeiro têm afectado a economia real, e as pressões inflacionistas provocadas pelo preço cada vez mais elevado do petróleo e de outras matérias-primas combinadas com drásticas correcções no mercado imobiliário nalguns Estados-Membros agravam a situação. Esta conjugação de choques reflectiu-se directamente na actividade económica através de custos mais elevados e efeitos negativos sobre a riqueza e, indirectamente, através de uma implacável erosão da confiança económica, de onde resultou um abrandamento da procura interna numa altura em que também a procura externa é menor.
Os principais indicadores relativos à actividade económica mostram uma desaceleração acentuada no movimento de crescimento subjacente tanto na UE como na zona euro. Perante este cenário, o crescimento do PIB para este ano foi revisto em baixa, calculando a nossa previsão intercalar uma queda acentuada, para 1,4% na UE e para 1,3% na zona euro. Ao mesmo tempo, as previsões de inflação para este ano foram revistas em alta, situando-se em 3,8% para a UE e 3,6% para a zona euro. No entanto, a inflação poderá registar alguma alteração, à medida que os efeitos de aumentos passados nos preços da energia e dos bens alimentares começarem a esbater-se nos próximos meses. É provável que esta tendência seja ainda reforçada por uma correcção em baixa dos preços do petróleo e outras matérias-primas, embora estes dados careçam de confirmação.
Em termos gerais, a situação e perspectivas económicas mantêm-se muito incertas. As perspectivas de crescimento apontam para uma redução, enquanto as perspectivas de inflação apontam para um aumento. As incertezas são maiores ainda no que respeita à evolução económica no próximo ano, mas estimamos que o crescimento quer na UE quer na zona euro se manterá relativamente fraco.
Como reagir a este abrandamento económico? A melhor resposta será recorrendo a todos os instrumentos políticos ao nosso dispor.
Primeiro, no que se refere à política orçamental, há que respeitar o nosso compromisso perante a disciplina fiscal e as regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento deixando, ao mesmo tempo, os agentes estabilizadores automáticos desempenharem o seu papel. Nesta matéria a reforma do pacto, de 2005, está a revelar-se de grande utilidade.
Em segundo lugar, para reforçar a confiança de consumidores e investidores a curto prazo e, a longo prazo, aumentar a resiliência e dinamismo das nossas economias, será crucial um empenhamento claro em executar reformas estruturais, tal como definidas no âmbito da Estratégia de Lisboa e nos programas de reforma nacionais. Medidas tendentes a reforçar a concorrência nos mercados retalhistas e da energia e melhorar o funcionamento dos nossos mercados de trabalho seriam, nesta fase, especialmente positivas.
Finalmente, é mais urgente do que nunca, como já afirmei, melhorar a regulação dos mercados financeiros e cumprir as metas do roteiro ECOFIN. Uma solução eficaz e célere para os difíceis desafios que se nos deparam podia fazer muito para devolver a confiança mais rapidamente do que o esperado e limitar os danos causados às nossas economias.
Em cada uma destas áreas políticas as nossas acções serão mais eficazes e eficientes se as coordenarmos a nível da zona euro mas também a nível da União Europeia.
Teremos, inevitavelmente, de ultrapassar a resistência de alguns Estados-Membros relativamente a uma acção conjunta; no entanto, o consenso obtido na última reunião informal do ECOFIN, em Nice, pode ser aprofundado e desenvolvido.
Os países europeus enfrentam desafios comuns. Poderemos ultrapassá-los de uma forma mais eficaz se trabalharmos juntos na procura de soluções comuns. Aqui, a União Económica e Monetária é um trunfo extraordinário, e há que explorar as oportunidades que nos proporciona para reforçar a coordenação, dentro dos parâmetros que propusemos no nosso relatório e comunicação EMU@10 de Maio passado.
Todavia, os acontecimentos tornaram bem claro que uma acção interna europeia não é suficiente para enfrentar os desafios globais. Temos de reforçar a acção externa comum no Fórum de Estabilidade Financeira, no Comité de Basileia, no G7, e temos, bem assim, de prestar maior atenção ao papel futuro do Fundo Monetário Internacional.
Numa perspectiva mais longínqua, temos de pensar como moldar o futuro dos nossos sistemas financeiros e de governação global, e nesse sentido o papel da União Europeia é fulcral. A Europa pode ser o motor do reforço da coordenação global e deve assumir um papel de liderança nos debates internacionais sobre o assunto, o que exige que, primeiro, os países europeus trabalhem juntos e encontrem soluções internas.
Alexander Radwan, em nome do Grupo PPE-DE. – (DE) Senhora Presidente, Senhor Presidente em exercício do Conselho, Senhor Comissário, Senhoras e Senhores Deputados, ao ouvir a declaração que o Senhor Comissário acabou de proferir, senti-me como se estivesse no filme errado. O Senhor Comissário salientou repetidamente que se está a agir de uma forma célere e rápida. Na realidade, a única coisa que avançou com celeridade nas últimas semanas, meses e anos foi o mercado, que é frequentemente invocado nos nossos debates regulares neste Hemiciclo. O facto é que o mercado regulou o problema dos bancos de investimento por si só de uma forma muito rápida. Nós não fomos capazes de reagir com a mesma celeridade.
"Celeridade" não é certamente o termo que podemos usar quando olhamos para o Conselho, e sobretudo para a Comissão. E agora estamos a ser gentilmente convidados pelos americanos a pagar uma parte. Não quero neste momento tecer comentários e acho que é suficiente, nesta fase, acompanhar os acontecimentos. No entanto, espero do Conselho – pois não estou seguro de que a Comissão Barroso esteja à altura desta tarefa – que garanta, pelo menos, que iremos ultrapassar a resistência americana e britânica à transparência dos mercados financeiros. Basta-me apenas recordar-vos da Presidência alemã, quando o Presidente Sarkozy e a Chanceler Merkel apresentaram uma iniciativa e a Comissão Barroso permaneceu imóvel, perguntando quem eram afinal Sarkozy e Merkel, e não tomou qualquer iniciativa.
"Celeridade" não é realmente um termo que possamos usar, e basta-me apenas recordar-vos a Enron e a Parmalat. Nessa altura, o Parlamento Europeu aprovou um importante relatório elaborado pelo Senhor Deputado Katiforis – do qual eu fui o relator-sombra – sobre a questão das agências de notação de risco. Isso aconteceu em 2003 e agora, em Outubro de 2008, a Comissão pode muito bem apresentar propostas mas a IOSCO (Organização Internacional das Comissões de Valores Imobiliários) já está a dizer que não nos devíamos desviar das normas americanas e da Securities and Exchange Commission, pois de outro modo o sistema financeiro internacional entrará em colapso.
A Europa deve seguir o seu próprio caminho nesta matéria, e é por isso que não quero realmente saber o que a SEC está a propor, e se a Comissão planeia avançar na mesma direcção que a SEC tudo o que posso dizer é que a agasalhem bem. Temos de fazer o que achamos que está certo, e os americanos podem depois seguir-nos. É só isto o que tenho a dizer sobre agências de notação.
Foi dito que devíamos encarregar-nos da revisão de Basileia II numa leitura. Espero que o representante do Conselho esteja a ouvir, pois já o havia referido. Podemos fazê-lo numa leitura, desde que o Conselho desista de se opor a um regime de supervisão europeu. O que o Conselho conseguiu até agora com a sua cooperação mais estreita com as autoridades de supervisão europeias é lamentável. Nice baseava-se na cooperação intergovernamental. Assim sendo, o Conselho devia por uma vez deixar de olhar o seu próprio umbigo e pensar numa perspectiva europeia.
Os hedge funds foram também referidos, bem como os capitais privados. O Senhor Comissário McCreevy disse neste Hemiciclo ainda esta semana que não devemos agir com precipitação. Ora nós podemos acusar o Senhor Comissário McCreevy de muita coisa mas não de ser precipitado.
(Protestos e aplausos)
Tenho atacado regularmente o Senhor Comissário neste Hemiciclo sobre a questão dos hedge funds e dos capitais privados. Temos de nos assegurar que a Comissão apresentará agora a conveniente análise e não permanecerá num estado de negação. Isto deixou de ser um problema do Senhor Comissário McCreevy e passou a ser um problema do Senhor Barroso.
(Aplausos)
Seria para mim um prazer que deixássemos agora claro aos Estados Unidos que a SEC – a Securities and Exchange Commission – devia arrumar de uma vez por todas a sua casa. A Siemens está a ser sujeita a uma rigorosa investigação, mas ninguém olha para os Estados Unidos. Espero que a Comissão e o Conselho nos permitam estabelecer um rumo para a política europeia neste domínio.
(Aplausos)
Martin Schulz , em nome do Grupo PSE. – (DE) Senhora Presidente, ouvimos com muita atenção o senhor deputado Radwan. A campanha eleitoral da Baviera está a lançar a sua longa sombra. Sim, Senhor Deputado Radwan, parte do que disse está absolutamente correcto. Foi o mercado quem regulou, mas é o contribuinte americano que terá de pagar a conta. É ao Estado que cabe pagar o preço.
Actualmente estamos a assistir não só à falência dos bancos de investimento e grandes seguradoras, mas também à falência de uma filosofia económica que nos foi "vendida" ao longo de vários anos: uma filosofia que reclama que, numa economia supostamente moderna, o crescimento e a prosperidade são gerados pela especulação, e não pelo mundo moderno. É à falência deste sistema que estamos agora a assistir.
(Aplausos)
Por acaso, Senhor Deputado Radwan, recordamo-nos com muita clareza do relatório Katiforis. O senhor deputado é um político astuto, tenho que reconhecê-lo, e vai concorrer às eleições do Parlamento do Estado da Baviera no domingo. Desejo-lhe boa sorte. Contudo, quem travou o relatório Katiforis foi o senhor deputado, e isso é algo de que nos recordamos claramente.
O Senhor Comissário Charlie McCreevy não está aqui, e é pena. O Senhor Comissário Joaquín Almunia apresentou uma análise muito sólida, e pedia-lhe que informasse o seu colega, o Senhor Comissário McCreevy, sobre as medidas que são necessárias e que devemos agora adoptar. Não sei onde ele está. Talvez esteja de novo na pista de corrida, ou talvez as agências de apostas em pistas de corrida estejam melhor regulamentadas do que os mercados financeiros internacionais. Contudo, uma coisa é clara: esperamos que a Comissão adopte as medidas possíveis e necessárias, e que isso ocorra até ao final do ano, ou o mais tardar na Primavera.
Tal implica, por exemplo, a adopção de normas para as agências de notação de risco e uma actuação muito célere nesta matéria. É também vital, e isto é muito importante, dissociar os prémios da City dos lucros especulativos de curto prazo. Se um gestor souber que irá receber 5% de mil milhões que ganhar em lucros especulativos, uma vez que o seu prémio está associado a estes mil milhões para especular, a natureza humana fará com que ele tente obter esses mil milhões em lucros a qualquer custo e por quaisquer meios, mesmo que isso resulte na perda de dezenas de milhares de empregos, algo que vimos acontecer em todo o mundo nas últimas décadas.
Sem mexerem um dedo, os gestores financeiros – os jovens espertos que encontramos aqui nos corredores – estão a destroçar empresas inteiras e centros de negócios na totalidade, com todas as maleitas sociais que isso implica. O custo desta devastação está incluído nos 700 mil milhões que os contribuintes americanos terão agora de investir para salvar os principais bancos e seguradoras. O amadorismo da governação nos Estados Unidos está patente no facto de, mesmo numa crise maciça como esta, serem estas grandes empresas as que são salvas, com um custo para os contribuintes comuns de mais de 700 milhões de dólares provenientes do orçamento dos Estados Unidos. Infelizmente, os destinos destes contribuintes comuns e das respectivas dívidas e hipotecas não constam do plano de salvação elaborado pelo Governo dos Estados Unidos. Eis mais um exemplo perfeito de como se privatizam os lucros e nacionalizam os prejuízos. Também isto tem de acabar.
(Aplausos)
Ouvimos falar de tudo isto no debate de segunda-feira, e tenho quase a impressão de que devíamos estar a distribuir fichas no Grupo PPE-DE para filiação no Partido Social-Democrata. Parece que eles não conseguem mudar de opinião com a necessária rapidez, e devo dizer que os liberais são ainda piores.
No debate de Novembro passado sobre o papel da União Europeia na globalização fiz a seguinte observação: o capitalismo selvagem que domina os mercados financeiros está a pôr em risco economias inteiras, e agora até a própria economia dos Estados Unidos, e precisa de regras internacionais. Precisamos de supervisão, de transparência e de restrições ao poder dos mercados financeiros. O líder do Grupo ALDE respondeu-me o seguinte: "Senhor Presidente, acabámos de ouvir a linguagem do passado". Pelo menos ele não está presente na sessão de hoje, o que evidentemente aumenta a sua qualidade. Contudo, as minhas afirmações não eram uma linguagem do passado. Hoje, mais do que nunca, o controlo e a supervisão governamentais de um mercado desregulamentado – que não respeita nada nem ninguém – são o caminho que temos de trilhar.
Quero por isso acrescentar ainda algo, se me permitem. É claro que devemos agir com celeridade, mas também o devemos fazer num domínio que está mais próximo do meu coração e dos corações dos meus colegas do Parlamento Europeu. A bolha especulativa não vai rebentar: mesmo que proibamos de momento as vendas de contratos de futuros, eles vão voltar. Outra coisa que iremos forçosamente voltar a ver são investidores encorajados a especularem, por exemplo, com a subida dos preços dos alimentos. O preço dos alimentos sobe quando existem menos alimentos disponíveis, o que significa que quem tem interesse em alimentos a preços elevados se deve assegurar de que a oferta de alimentos é reduzida. No entanto, a escassez de alimentos significa fome no mundo, e se tivermos um sistema que permita que a fome em algumas regiões do mundo gere lucros noutras regiões, o nosso pacote de emergência de 700 mil milhões de dólares não irá ajudar-nos. Mais cedo ou mais tarde este sistema, com toda a sua perversidade, irá ter consequências amargas para toda a Humanidade.
O que estamos aqui a debater não são, por conseguinte, necessidades de curto prazo, mas sim a forma como podemos garantir o desenvolvimento social humano a longo prazo.
Silvana Koch-Mehrin, em nome do Grupo ALDE. – (DE) Senhora Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, a crise financeira global alastrou aos mercados com consequências imprevisíveis. Alguns poderão sentir uma certa satisfação ao verem os banqueiros caírem em desgraça e perderem os seus empregos, mas tal atitude revela falta de visão, pois os verdadeiros prejudicados não serão os patrões das empresas ou os corretores, mas sim as famílias vulgares, dado que são elas que serão mais duramente atingidas pelas restrições ao crédito e o colapso no valor das acções e poupanças. É a sua segurança financeira que é desfeita quando o valor das pensões e das poupanças é posto em risco.
É por isso essencial fazer uma análise rigorosa da crise financeira e das suas causas, de forma a garantir que não volta a acontecer, e regozijo-me por estarmos hoje a fazer exactamente isso. O senhor deputado Schulz usou a sua intervenção para nos mobilizar contra os mercados. Tendo em conta as previsões que ele fez em Novembro último, e que teve a gentileza de nos recordar, isto poderá dar-lhe uma oportunidade de obter algum rendimento extra como oráculo. Porém, o que faz mover os mercados é o dinheiro, e não ar quente, e ele tem de o admitir.
A resposta adequada à actual crise não é afastarmo-nos da livre iniciativa, pois são as empresas que criam empregos e prosperidade. Será que os mercados financeiros precisam realmente de mais legislação? Ludwig Erhard, o pai do milagre económico alemão, resumiu isso com elegância. Disse ele que o Estado devia estabelecer as regras da economia e do sistema financeiro mas, tal como um árbitro, não devia envolver-se no jogo. O que isto significa, evidentemente, é que deve agir contra faltas e infracções às regras.
A legislação é adequada e necessária para evitar excessos, mas não é à economia de mercado que deve ser imputada a culpa da crise. A culpa é dos que se recusam a respeitar enquadramentos e normas. Há anos que os peritos têm vindo a alertar contra os empréstimos de alto risco, os créditos não garantidos e uma bolha à espera de rebentar nos mercados financeiro e imobiliário. Precisamos de regras comuns e transparentes para a globalidade da Europa e para o mundo. Sim, precisamos de controlos internacionais, mas com noção das proporções. Não é positivo para ninguém imobilizarmos os movimentos de capitais com mais regras e despoletarmos uma recessão económica.
Precisamos, sobretudo, de restaurar a confiança num mercado livre e aberto. A estabilidade económica das pessoas na Europa e no mundo depende de mostrarmos a nós próprios que somos capazes de agir. No entanto, os mercados internacionais não irão parar enquanto esperam as decisões da Europa, nem irão esperar que o Parlamento tome as suas posições.
Senhor Comissário, Senhor Ministro Jouyet, o meu grupo espera que tomem medidas rápidas, racionais e bem-sucedidas, e que o façam já.
Eoin Ryan, em nome do Grupo UEN. – (EN) Senhora Presidente, o Presidente do Banco Central Europeu, Jean-Claude Trichet, afirmou recentemente que, quando o mercado estabilizar, não voltaremos à situação habitual mas encontraremos, antes, uma nova normalidade.
Tendo em consideração as falhas e fraquezas no mercado e instituições que foram revelados de forma tão terrível no último ano, qualquer tentativa de afastamento dos abusos e erros do passado não pode ser senão bem-vinda. A crise financeira provocou um pânico devastador mas teve o mérito de realçar a necessidade de eliminar situações menos claras e de introduzir transparência e de nós, legisladores, regulamentarmos as actividades. Há, todavia, que evitar o pânico, pois o pânico não pode conduzir a decisões acertadas.
Nos EUA, da luta para evitar a catástrofe começam a surgir mudanças radicais no cenário da alta finança. As nossas instituições mantiveram-se mais firmes do que as dos Estados Unidos - o que é compreensível, já que a crise teve origem além-Atlântico - mas certos casos impedem-nos de pensar que somos invulneráveis. Para garantir, de futuro, a estabilidade dos nossos mercados, temos de lançar reformas estruturais e sistemáticas e de estar preparados para agir com celeridade. Três coisas podem acontecer ou já aconteceram, como as reformas - por exemplo, garantir que os bancos centrais impedem a corrida aos bancos e instituições financeiras - e, aqui, já se verificou uma actuação significativa. Em segundo lugar, os tesouros têm de impedir que haja razão para essas corridas aos bancos, nomeadamente quando existem activos de alto risco nos balanços das instituições financeiras. Por fim, é fundamental recapitalizar o sistema financeiro.
A fase inicial da crise já passou. Os efeitos na banca e a resposta política ao trauma inicial não serão visíveis durante algum tempo. No entanto, agora há que garantir que a nova realidade financeira que está a emergir da crise é forte e saudável. Para isso há que ir às causas da crise e remover os activos de alto risco e limpar os balanços financeiros. É também imprescindível, para conseguirmos sair deste pântano, a bem da robustez económica tanto localizada como global, mostrar que o sistema financeiro dispõe de capital suficiente. Saber se o capital deve provir de uma injecção pública ou privada ou de uma combinação dos dois é outra coisa, mas o certo é que temos de encontrar uma solução a breve prazo.
Não sabemos ainda qual será o efeito pleno e perdurável da crise financeira mundial e suas consequências nos mercados europeus. Sabemos no entanto que, para podermos sair desta crise de cabeça erguida e para termos a certeza de que investidores, mercados e cidadãos gozam de protecção na nova normalidade que emergir, temos de manter a calma, mesmo em época de dúvida e turbulência, e tomar medidas concretas para aplicar reformas estruturais e sistemáticas que assegurem a saúde do nosso sistema europeu e o bem-estar financeiro dos cidadãos dos países europeus e de todo o mundo.
Francis Wurtz, em nome do Grupo GUE/NGL. – (FR) Senhora Presidente, se os principais líderes europeus quisessem ilustrar o fosso que os separa dos cidadãos europeus, bastar-lhes-ia ter a mesma reacção que tiveram a propósito da crise financeira, depois da reunião dos Ministros das Finanças de 14 de Setembro de 2008.
Em que consistem de facto as principais medidas anunciadas, além de um bem-vindo, mas insuficiente, aumento dos empréstimos do BEI às pequenas e médias empresas?
Podem ser resumidas em três pontos. Em primeiro lugar, no que se refere à esperança de um estímulo orçamental, cito Jean-Claude Juncker: "excluímos a adopção de um plano de relançamento europeu". Vamos aplicar o Pacto de Estabilidade, todo o Pacto e nada mais do que o Pacto.
Em seguida, no que diz respeito ao processo de desregulamentação em curso, cito Christine Lagarde: "não devemos permitir qualquer abrandamento das reformas estruturais"; Jean-Claude Trichet: "tudo o que possa ser feito para melhorar a flexibilidade da economia é suficientemente bom para nós"; e Jean-Claude Juncker: "é preciso reformar o mercado de trabalho e os mercados de bens e serviços. A competitividade tem de ganhar mais espaço".
Finalmente, quanto à questão que aflige todos os espíritos – quem deve pagar a factura? Cito de novo Jean-Claude Trichet: "as supervisões bancárias não devem ter exigências desproporcionadas relativamente aos estabelecimentos de crédito"; e, por outro lado, de acordo com Jean-Claude Juncker: "tudo deverá ser feito para que os salários não derrapem".
Gostaríamos de lhes dizer o seguinte: saiam da vossa bolha e tentem colocar-se na posição das pessoas, que vêem, de um lado, os Ministros das Finanças mover céu e terra para os grandes especuladores mundiais – só do BCE saíram 110 milhões de euros – e, do outro lado, os trabalhadores que se encontram em risco. À força de tentarem tranquilizar os mercados, estão a desesperar as empresas.
A verdade é que, em nome da livre circulação de capitais e da famosa economia de mercado aberta, com a sua livre concorrência, os líderes financeiros alimentaram colectivamente mecanismos diabólicos que eles próprios já não controlam. Permitam-me recordar-vos que, cinco meses após o desencadear da crise do subprime, do crédito hipotecário de alto risco, o Sr. Trichet, em representação dos dez principais bancos centrais mundiais, ainda falava apenas de simples "correcções de mercado" e anunciava "um crescimento robusto, ainda que possa haver uma ligeira desaceleração". Três meses mais tarde, instava a Comissão dos Assuntos Económicos e Monetários do Parlamento a "dar ao sector privado uma oportunidade de se auto-regulamentar". Que perspicácia! Se um sistema vê escaparem-lhe desta forma as suas próprias criaturas, é porque está numa crise existencial.
É por isso que, se quisermos evitar novos colapsos, cada vez mais dolorosos, temos de ter a coragem de fazer rupturas. Em primeiro lugar, temos de romper com a concepção da produtividade baseada na redução dos custos salariais e das despesas sociais. É preciso inverter a tendência contínua de reduzir a quota-parte dos salários no valor acrescentado. Não é aí que está a origem da inflação, mas nas acções imorais dos operadores financeiros.
Em segundo lugar, temos de pôr fim à dependência absoluta dos mercados financeiros para financiar a economia, pois aqueles já não estão a financiá-la, mas a intoxicá-la. O Banco Central Europeu tem um papel decisivo a desempenhar na orientação do dinheiro para uma economia socialmente eficaz, uma economia que crie postos de trabalho, que promova a formação e desenvolva os serviços públicos, que garanta uma produção sustentável e serviços úteis, que reserve um lugar à investigação e ao desenvolvimento, respeite as empresas públicas e o interesse geral e coloque a cooperação acima da guerra económica.
Para tal, no entanto, é necessário alterar a missão do Banco Central Europeu. O BCE deve refinanciar os bancos com taxas de juro muito diferentes, dependendo do facto de os empréstimos se destinarem a beneficiar a economia saudável que acabo de descrever ou, pelo contrário, se destinarem a operações financeiras malsãs. As condições de acesso aos créditos devem ser vantajosas no primeiro caso e extremamente dissuasivas no segundo. Ao mesmo tempo, é necessário estabelecer controlos rigorosos sobre os bancos e os fundos e instituir uma taxa sobre os movimentos de capitais financeiros. Finalmente, é necessário iniciar os trabalhos tendentes à reforma radical das instituições económicas internacionais, tal como solicitado recentemente pelo Presidente Lula da Silva no seu discurso perante as Nações Unidas.
Em terceiro lugar, é preciso pôr fim à presunção e à condescendência de uma pequena elite que explica aos cidadãos que a única opção válida é a sua. Se pudéssemos, pelo menos, discutir seriamente tudo isto com um espírito aberto e um grande sentido de responsabilidade, então a crise teria, pelo menos num aspecto, servido para alguma coisa.
Hanne Dahl, em nome do Grupo IND/DEM. – (DA) Senhora Presidente, a primeira notícia que ouvi ao ligar o rádio do meu automóvel a caminho do aeroporto na segunda-feira de manhã, foi de que o meu banco está a atravessar uma crise financeira grave. Felizmente sou apenas aforradora, pelo que não irei perder dinheiro, mas os accionistas estão inconsoláveis. A crise financeira mundial chegou ao meu pequeno banco. O cerne do problema está no desenvolvimento da globalização, principalmente no direito de livre circulação dos capitais através das fronteiras. Pudemos constatar uma especulação nunca antes vista, sem outro objectivo que não fosse os lucros de alguns titulares. Esta prática apenas prejudica a economia real, como podemos observar actualmente, com especulações no mercado imobiliário nos Estados Unidos que estão a despoletar uma crise financeira internacional.
Consequentemente é preciso acabar com a ideia de que a livre circulação de capitais promove o crescimento e a riqueza. Esta livre circulação apenas beneficia os especuladores e quem foge aos impostos. Permito-me afirmar que o cidadão comum que pretende investir em empresas e financiar a compra e venda de mercadorias consegue viver com os controlos que visam aquelas pessoas movimentam somas avultadas através das fronteiras e os objectivos com que o fazem. O controlo sobre a movimentação de capitais daria uma maior visão à democracia e uma oportunidade de influenciar.
Qual é, então, a solução para a crise imediata? Uma rede de segurança financiada pelos contribuintes irá, sem dúvida, aumentar a política externa agressiva e especulativa no sector financeiro e promover a pior forma de capitalismo. São os próprios bancos que devem “arrumar a casa” deixada pelos colapsos e pelas crises; não é algo que compete aos bancos centrais nacionais e, consequentemente, aos contribuintes. O consultor financeiro dinamarquês Kim Valentin sugere a criação de um fundo de emergência financiado pelos próprios bancos. É crucial que a contribuição dos bancos para o novo fundo seja suficientemente grande para que estes tenham interesse em supervisionar-se uns aos outros e de intervir quando uma crise paira no ar, visto eles próprios terem de suportar o custo necessário à resolução do problema.
Proponho que a UE determine regras rígidas sobre a dimensão do fundo de emergência dos bancos. Este aspecto permitiria igualmente satisfazer o desejo do Secretário-Geral das Nações Unidas Ban Ki-moon em relação a uma política económica global responsável. Os bancos devem deixar de se comportar como crianças que nunca sofreram uma queda e que não sabem que se podem magoar se caírem.
Piia-Noora Kauppi (PPE-DE). - (EN) Senhora Presidente, não concordo com os meus colegas, que culpam a Comissão por não ter actuado. Penso que o maior erro que a Comissão podia ter cometido teria sido pensar que a solução certa consiste sempre em regulamentar mais. Todas as propostas da Comissão devem ser proporcionadas, equilibradas e bem dirigidas.
Até agora, a forma como a Comissão reagiu sempre me satisfez e confio em que dispõe dos instrumentos necessários para aperfeiçoar a moldura regulamentar dos serviços financeiros. Os aperfeiçoamentos devem estribar-se, antes de mais, na legislação já existente e nas bases jurídicas. Numa segunda fase há que pensar em instrumentos jurídicos não vinculativos e só em último caso, se não se verificar progresso, devemos então passar a nova legislação de natureza jurídica.
Creio que, por vezes, há alguma tendência para esquecer tudo o que já alcançámos na Europa. Desde 2000 procedemos a uma profunda revisão da legislação relativa aos serviços financeiros e já actualizámos muitos dos regulamentos mais importantes. Dispomos, na Europa, de um enquadramento jurídico moderno e sofisticado. Penso que na América muitos o seguem, pelo que não me parece que seja necessário modificar radicalmente a nossa abordagem.
Diria ainda que, obviamente, há que reconhecer que o enquadramento regulamentar não é tão bom quanto seria desejável. Seria conveniente desenvolver - partindo do roteiro do ECOFIN - os métodos de trabalho das instituições supervisoras na Europa, mas tendo sempre em mente a escala mundial. Não esqueçamos que a indústria financeira é, porventura, a mais globalizada no mundo actual e que não podemos agir no vazio. Não esqueçamos que alimentamos estreitos laços com o mundo exterior e que devemos tentar desenvolver normas, formas de reconhecimento mútuo e maior convergência com os actores transatlânticos - única forma de abrirmos a concorrência -, assim como devemos desenvolver regras muito sólidas de protecção dos clientes no retalho e garantir que essas iniciativas tenham seguimento.
Para terminar, uma palavra ainda sobre o Banco Central Europeu, a quem devemos agradecer. O BCE trabalhou de modo notável. As consequências para a economia europeia, em termos quer de economia financeira quer de economia real, teriam sido bastante mais graves sem o seu óptimo trabalho em termos de liquidez. O BCE merece, por isso, as nossas felicitações.
Pervenche Berès (PSE). – (FR) Senhora Presidente, Senhor Ministro Jouyet – lamentamos a ausência da ministra responsável por estas questões –, Senhor Comissário, os Socialistas são defensores do mercado, mas sabem que, em qualquer mercado, há intervenientes honestos e há ladrões, o que significa que é necessário uma força de polícia. É espantoso constatar que, quando se tenta pôr em prática uma força de polícia moderna para fazer face a ladrões modernos, se é de repente acusado de arcaísmo.
Precisamos de uma supervisão e de uma regulação modernas. Não há grande risco de nos precipitarmos e adoptarmos uma legislação inadequada ou precipitada do tipo Sarbanes-Oxley, pois já decorreu mais de um ano desde o desencadear da crise. Quando o Comissário Charlie McCreevy se dirigiu à Comissão dos Assuntos Económicos e Monetários, em 11 de Setembro de 2007, apontou o dedo às agências de notação como os principais culpados. Decorrido mais de um ano, continuamos sem uma proposta. Não creio que isto corresponda ao princípio de uma melhor regulamentação.
Quanto ao roteiro elaborado em Outubro e Dezembro de 2007, tenho-o aqui e verifiquei-o, ponto por ponto. Francamente, em primeiro lugar, este roteiro talvez não tenha sido concebido para o nível de crise que estamos a viver hoje e, em segundo lugar, quando vejo o modo como o calendário foi respeitado, haveria muita coisa a dizer a este respeito.
O Presidente francês anunciou-nos um plano: vai denunciar os responsáveis e reunir toda a gente em torno da mesa para discutir. Mas que vai ele discutir? Retomar o roteiro elaborado pelo Fórum para a Estabilidade Financeira e que ninguém consegue pôr em prática, porque ninguém nesse Fórum tem autoridade para o fazer?
Propõe tudo isto, mas a sua reacção inicial à crise foi correr para Londres, no Outono de 2007, para validar a estratégia de Gordon Brown, que queria criar um sistema de alerta precoce, em vez de reforçar a capacidade da Europa de fazer face ao problema, uma abordagem que o Presidente Durão Barroso defende presentemente em Washington. Espero que consiga persuadir o seu Comissário Charlie McCreevy, a fim de que a intervenção europeia em termos de regulação e supervisão dos mercados financeiros seja tão vigorosa quanto necessário.
(O Presidente retira a palavra à oradora)
(Intervenção com o microfone desligado do senhor deputado Purvis sobre o tempo de uso da palavra)
Presidente. – Lamento. Interrompi a senhora deputada Kauppi e a senhora deputada Berès. Geralmente sou uma pessoa justa, senhor deputado Purvis.
Daniel Dăianu (ALDE). - (EN) Senhora Presidente, serão a ganância, a euforia e o dinheiro fácil os únicos culpados de toda esta confusão? Então e as falhas do modelo "criação-e-cessão" de crédito, que nos colocou à beira do risco sistémico? Então e os esquemas de pagamento pouco éticos, que estimularam a assunção negligente de riscos? Então e a atribuição da classificação de investimento (investment-grade) a valores que afinal nada valiam? Então e os conflitos de interesses? Então e os bancos que enveredaram por transacções comparáveis a jogos de roleta? Então e o sector dos bancos-sombra, com a sua alavancagem e especulação extremos? Porque é que os decisores políticos não aprenderam com as crises anteriores, apesar de terem sido enviados ásperos avisos? Basta recordar o que disseram, anos atrás, Lamfalussy, Gramlich, Volcker ou Buffett.
O argumento de que a regulação asfixia a inovação financeira é, simplesmente, ridículo. Nem toda a inovação financeira é sólida. Será de tolerar um esquema Ponzi, à escala quase internacional, que durante a década passada se desenvolveu com base em produtos tóxicos? O que está em jogo é a ausência de regulação e supervisão adequadas, assim como fraco conhecimento dos mercados financeiros, do seu modo de funcionamento e do risco sistémico. Mercados livres não são sinónimo de mercados desregulados. A correcção vai ser muito dolorosa, em especial nos Estados Unidos, mas a Europa não está imune ao abrandamento económico. Sendo os mercados globais, as soluções não podem ser fragmentadas. Para restaurar a confiança impõe-se coordenação internacional.
(A Presidente retira a palavra ao orador)
PRESIDÊNCIA: COCILOVO Vice-presidente
Roberts Zīle (UEN). – (LV) Penso que podemos usar uma frase conhecida para descrever a situação dos mercados financeiros: "a festa acabou e agora estamos na manhã do dia seguinte". Alguém irá pagar um pesado preço pelos problemas de estômago mas existem, como é evidente, alguns países e empresas que irão tirar proveito desta situação extremamente grave. Por outras palavras, existem vários recursos energéticos, e sobretudo países desenvolvidos e empresas, que canalizaram os seus lucros suplementares para esse fim, e isto irá também claramente mudar o centro e o equilíbrio da influência política no mundo. Em meu entender, na Europa são os pequenos novos Estados-Membros da UE que estão mais vulneráveis a esta situação. Os erros feitos nas políticas estruturais e fiscais numa altura de grande crescimento económico estão agora a fazer correr riscos económicos e sociais evidentes à maioria destes países, incluindo o meu próprio país, a Lituânia.
O grande volume de créditos pessoais em euros concedidos pelos bancos da zona euro, a grande proporção de capitais de não-residentes no sector bancário e o rápido aumento dos salários, expressos em euros, para o nível médio da Europa poderão levar a uma revalorização das moedas nacionais. Nesse caso, o reembolso a longo prazo das instituições financeiras na zona euro poderá tornar-se um novo ónus para os cidadãos e empresas desses Estados-Membros. Se os limites de flutuação da taxa de câmbio de uma divisa nacional forem alargados relativamente ao euro, a inflação, que atinge já um valor elevado, poderá ganhar terreno e adiar ainda mais a entrada de novos Estados-Membros na zona euro.
Caso o montante total dos créditos pessoais a serem pagos aos bancos se somem a uma percentagem do PIB com dois dígitos, os cidadãos desses países não se sentirão optimistas. Tal irá, por sua vez, criar um acentuado pessimismo político e terá impacto na opinião pública no que se refere à União Europeia enquanto instituição, com todas as consequências daí decorrentes, em termos políticos, também para o Parlamento nos novos Estados-Membros.
John Whittaker (IND/DEM). - (EN) Senhor Presidente, a crise financeira grassa e os países da zona euro enfrentam a recessão. A resposta, repetem-nos, reside em maior regulação que permita ao sector financeiro funcionar melhor.
Mas temos em mãos um problema agora, e mudar as regras do jogo depois de conhecido o problema não nos vai ajudar a resolvê-lo.
Insto os senhores deputados a pensarem numa reacção de um cariz totalmente diferente às actuais dificuldades económicas, que são um sinal de que não podemos continuar nesta situação e de que, graças a empréstimos demasiado baratos e a importações demasiado baratas, temos estado a viver acima das nossas possibilidades e não podemos continuar a consumir a este ritmo.
O ajustamento será doloroso mas necessário. Nos tempos que correm, aliás, outra mensagem é ainda mais pertinente, embora estas instituições não a oiçam. Essa mensagem é que a UE não pode prosseguir com os seus programas legislativos em massa em nome, por exemplo, da saúde e segurança, da protecção do consumidor, da igualdade social, pois o efeito mais visível desses programas é um aumento de custos e a asfixia da actividade produtiva de que depende a nossa prosperidade.
Em tempos tão difíceis como os que vivemos a única mensagem a que devemos dar importância é de que os países europeus já não conseguem suportar a União Europeia, as suas instituições e a sua extraordinária profusão de legislação.
José Manuel García-Margallo y Marfil (PPE-DE). – (ES) Senhor Presidente, atendendo à grande variedade de opiniões expressas pela minha bancada, vou tentar ser muito claro.
Em primeiro lugar, a actual crise não é uma maldição bíblica nem um castigo dos deuses. Os mercados falharam e estas falhas determinaram intervenções que teriam deliciado o próprio Keynes. Se os mercados falharam, então temos de corrigir o que falhou nos mercados; por outras palavras, temos de fazer algo.
Este algo envolve várias coisas. Em primeiro lugar, temos de administrar um tratamento de choque para fazer o doente sair do seu coma actual. Recordo à Comissão e ao Conselho que, embora os problemas de liquidez possam ser resolvidos pelo Banco Central Europeu, os problemas de solvência são algo que afecta directamente o Conselho, a Comissão e os Estados-Membros.
Em segundo lugar, para impedir que isto aconteça de novo, precisamos de saber o que falhou nos mercados e que princípios devemos restabelecer. Houve um fracasso na gestão do risco, na governança e, finalmente, na ética.
Isto significa que temos de restabelecer alguns princípios básicos: transparência nos produtos, nas empresas e nos mercados; responsabilidade dos gestores; confiança entre a economia financeira e a economia real, e o papel central da política.
Concordo com o Conselho quando este afirma que os tempos da desregulação total acabaram. Nem os mercados nem a indústria podem auto-regular-se.
A receita final – que é necessária para vacinar o paciente e garantir que o mesmo não aconteça de novo ou de qualquer outra forma – é que temos que continuar com a integração do mercado. Temos de conseguir uma dimensão suficientemente crítica, como fizeram nos Estados Unidos. Temos de criar uma democracia do euro de modo a que a nossa moeda possa ter alguma influência no mundo numa crise que é global. Finalmente, temos de rever o quadro regulador e o quadro de supervisão, que foi o que falhou.
Por esse motivo, não concordo com uma legislação branda, com códigos de conduta ou com auto-regulação. Cabe a todos nós darmos uma resposta ao nosso povo que é, afinal, quem, em última análise, irá pagar o preço.
Elisa Ferreira (PSE). - Num minuto que conclusões tirar sobre a presente crise? Ela é o fruto da opção de não vigiar adequadamente a actividade dos mercados financeiros. A regulação competente não mata o mercado, pelo contrário, é indispensável à sua sobrevivência. Há actores que são responsáveis pelas perdas, porém hoje são os cidadãos quem paga a factura dos seus excessos e das falhas da supervisão pública.
O alerta fora dado há muito. O relatório Rasmussen, que este Parlamento aprovou ontem por larguíssima maioria, faz propostas precisas sobre riscos de alavancagem excessiva, a falta de transparência, os conflitos de interesse, mas ele resulta do trabalho do Grupo Socialista que foi iniciado anos antes de se iniciar a crise de 2007.
O relatório de iniciativa de Ieke Van Den Burg e Dăianu vai no mesmo sentido. A União Europeia é um parceiro maior do contexto internacional, e eu cumprimento o Comissário Almunia pelos anúncios que trouxe aqui hoje; mas será que o Comissário McCreevy os partilha? A paralisia que a Comissão tem tido em relação a estas matérias não tem justificação possível. O Parlamento faz o que lhe cabe. Saibam também as outras instituições agir de forma equivalente.
Margarita Starkevičiūtė (ALDE). - (EN) Senhor Presidente, é uma pena que o senhor deputado Schulz já não esteja presente. Queria dizer-lhe que me parece demasiado cedo para indicarmos quem irá à falência porque ninguém sabe quem são os investidores finais nos activos tóxicos. Talvez sejam bancos com participação do Estado.
Gostaria, ainda assim, de convidar a termos uma visão mais abrangente da situação e de recordar que o Parlamento, logo no início deste ano, apresentou algumas propostas válidas que o Conselho e a Comissão rejeitaram. Em primeiro lugar, solicitávamos que a gestão económica a nível da UE fosse alinhada com os acontecimentos a nível mundial e instávamos a uma actualização das orientações económicas. Sugeríamos, depois, uma aplicação vigorosa das regras da concorrência da União, não permitindo o aniquilamento das pequenas e médias empresas nem a criação de monstros demasiado grandes. Temos de promover e preservar a nossa cultura de empresa nacional e tradicional, pois a divisa da União Europeia é "unidade na diversidade".
John Purvis (PPE-DE). - (EN) Senhor Presidente, tenhamos esperanças de que as propostas americanas de compra de activos tóxicos resultem pois, se tal não acontecer, também nós seremos contagiados por eles. Gostaria que o Senhor Presidente em exercício do Conselho, Jean-Pierre Jouyet, e o Senhor Comissário Joaquín Almunia nos garantissem que as nossas defesas estão a postos. Estarão os nossos credores de último recurso preparados para enfrentar o pior que possa suceder nas circunstâncias actuais? Passamos de um problema de liquidez para um problema de solvência.
É certo que, a seu tempo, teremos de rever as nossas defesas em termos de regulação, mas não podemos fazê-lo de forma precipitada, no calor da crise. Correríamos o risco de exagerar, de impor condições desnecessárias, dirigidas ao alvo errado, draconianas, que apenas iriam prejudicar as perspectivas de investimento nas nossas economias e os futuros postos de trabalho.
O mais vital e urgente agora é restaurar a confiança. Senhor Comissário Almunia, fez diversas referências a esta necessidade. Veremos como conseguimos dar-lhe resposta.
Eu instaria os líderes das economias mais importantes da América, Europa, Médio e Extremo Oriente a encontrarem-se dentro em breve para garantir ao mundo, sem hesitações, que todos os meios para apagar as chamas serão convocados, onde quer que as chamas irrompam. Só depois de apagadas as chamas e as brasas poderemos fazer a autópsia da situação e pensar em medidas para evitar que volte a acontecer.
A confiança é a base em que assenta um sistema financeiro próspero e uma próspera economia global. Cabe agora aos líderes políticos ao mais alto nível (uma cimeira, em suma) das economias de mercado livre juntarem-se - sem desculpas, hesitações ou discussões – e assumirem plena responsabilidade por restaurar a confiança.
Wolf Klinz (ALDE). - (DE) Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, o Secretário do Tesouro Henry Paulson considerou as últimas semanas como um período de "humilhação" para os Estados Unidos quando anunciava o seu pacote de emergência num montante máximo de 700 mil milhões de dólares destinados ao paralisado sector financeiro do país.
A situação nos Estados Unidos é de facto alarmante. O sistema financeiro americano, com os seus bancos de investimento, hedge funds e produtos estruturados não sujeitos a uma supervisão bancária normal, e com as suas numerosas operações comerciais realizadas por empresas com uma única razão social que não aparecem em nenhum balanço, entrou virtualmente em colapso. É pouco provável que ressuscite muito rapidamente no seu formato original. Os últimos dois bancos de investimento puro – Goldman Sachs e Morgan Stanley – mudaram agora para a banca comercial. A promessa de dinheiro barato para todos que alimentava um cada vez maior crescimento, mais lucros e mais liquidez revelou-se uma ilusão: este tipo de movimento perpétuo simplesmente não existe. Um nível de vida elevado para todos, alimentado pelo endividamento e capaz de proporcionar um carro, uma casa e tudo o resto numa fase precoce da vida não pode manter-se a longo prazo. A economia real apanhou-nos. Sem emprego não pode haver poupança, e sem poupança não há investimento, e sem este não há crescimento sustentável.
Os europeus devem aprender com o desastre dos Estados Unidos. Não existe alternativa à consolidação orçamental, pois o dinheiro não cresce nas árvores. Uma disponibilização de dinheiro barato em abundância, que é o que os socialistas estão sempre a pedir ao BCE, não resolve o problema, apenas o agrava.
A Comissão devia pôr em prática as propostas apoiadas pelo Parlamento Europeu no que se refere à titularização, manutenção de produtos estruturados na contabilidade dos ordenadores, maior supervisão, um código de conduta para os operadores do mercado e diversas outras medidas tão rapidamente quanto possível, embora com noção das proporções e com diligência.
Jean-Paul Gauzès (PPE-DE). – (FR) Senhor Presidente, Senhor Ministro Jouyet, Senhor Comissário, gostaria de começar por agradecer ao Senhor Ministro a sua disponibilidade e a grande competência que revela em todas as áreas.
A Europa não pode continuar a sofrer periodicamente as consequências de crises que têm a sua origem no capitalismo americano. Isto mesmo foi dito muito claramente por oradores anteriores. Esta posição não é de hostilidade para com os Estados Unidos. É fruto de uma constatação óbvia: a crise é o resultado de disfuncionamentos graves que exigem medidas enérgicas. A auto-regulação não é suficiente.
Hoje, porém, a crise é mundial. O Senhor Ministro Jouyet referiu há pouco que é necessário adoptar novas medidas – legislação e regulação – e proceder à avaliação dos balanços e da solvabilidade dos bancos, dos fundos soberanos, das remunerações, da transparência, da supervisão e das normas de contabilidade. Tudo isto deve ser aprofundado e melhorado.
Como também já foi dito muitas vezes, é necessário restabelecer a confiança no sistema financeiro, que é uma parte integrante da vida económica. Discordo das críticas que foram expressas e creio que, neste contexto, a Presidência francesa foi rápida a reagir. As propostas apresentadas pelo Presidente Sarkozy, falando em nome da União Europeia, transmitiram um sinal forte em Nova Iorque e a reunião alargada do G8 que propôs permitirá reunir à volta da mesa os diversos intervenientes económicos do mundo, o que constitui um passo verdadeiramente importante.
A fim de elaborar regras mundiais, não podemos simplesmente resolver as questões na Europa. É necessário, evidentemente, que haja progressos na Europa e, neste contexto, podemos lamentar uma certa lentidão. Mas é preciso também que as regras sejam elaboradas a nível mundial. A economia é mundial, pelo que as regras também devem ser mundiais.
Há ainda muito trabalho pela frente e estou confiante em que as medidas anunciadas há pouco pelo Senhor Ministro Jouyet garantirão que, durante as próximas semanas e os próximos meses, serão encontradas possíveis soluções. Seria ilusório pensar que estas questões podem ser resolvidas em poucos minutos.
Karsten Friedrich Hoppenstedt (PPE-DE). - (DE) Senhor Presidente, nos últimos dias assistimos a uma grande turbulência no sistema financeiro dos Estados Unidos, para pôr a questão de uma forma eufemística. Uma das principais notícias foi o facto de a empresa Lehman Brothers Holdings ter sido obrigada a requerer a falência e a protecção dos credores. Neste contexto gostaria de abordar dois aspectos. Em primeiro lugar, os Estados Unidos estão a planear um pacote de apoio maciço. Contudo, tal não porá termo à crise nem nos protegerá de novas surpresas à medida que se continuam a desenrolar os acontecimentos.
Em segundo lugar, é verdade que é necessário determinar quais os mecanismos regulatórios que podiam ser melhorados e são susceptíveis de proporcionar uma maior transparência. Infelizmente, contudo, uma maior e melhor regulação não excluirá todas as desagradáveis surpresas que poderão ocorrer nos mercados financeiros no futuro, porque não estamos familiarizados com todos os mecanismos bancários existentes.
Porque é que digo isto? Deixem-me dar-vos um exemplo. Podem, por exemplo, surgir surpresas nos acordos de compensação entre bancos, que são muito importantes para minimizar os riscos. É claro que os bancos apenas podem tomar em consideração acordos de compensação na avaliação de riscos se a lei os obrigar a cumprirem tais acordos. Será que melhores regras no futuro poderiam eliminar qualquer incerteza sobre a validade dos acordos de compensação? Penso que não. Por conseguinte, nem mesmo uma legislação sólida e fiável impedirá surpresas desagradáveis no futuro.
Manuel António dos Santos (PSE). - Senhor Presidente, a actual crise financeira, que a curto prazo será económica e que não deixará de ser social, eventualmente política, era antecipável porque era previsível. Foi pena que o dogmatismo ultraliberal e a economia da especulação financeira, a chamada "economia do diabo", tenham vencido as concepções sociais e a economia do empreendedorismo e da acção, que é a única capaz de gerar riqueza e estar ao serviço dos cidadãos.
A regulação falhou, disse recentemente o Comissário Almunia. Ora, se falhou, deve ser radicalmente substituída depois de penalizada. A crise do sistema financeiro mundial é estrutural, também disse o Comissário Almunia. Porque é assim, não chega a mera utilização dos instrumentos políticos que temos hoje à nossa disposição. A atitude do Banco Central Europeu, que insiste na aplicação de remédios que a actual doença recusa, o autismo panglossiano de alguns membros do Conselho Ecofin, que se mostravam há 15 dias apenas surpreendidos com a dimensão da crise, a atitude do Comissário McCreevy, que propõe mudar alguma coisa para que tudo fique na mesma, são inaceitáveis.
A Comissão tem hoje a responsabilidade de utilizar todos os seus instrumentos e de pressionar os Estados-Membros a criarem instrumentos novos. E passa sobretudo essa responsabilidade por atender às recomendações correctas e ambiciosas que o Parlamento Europeu lhe remeteu na sequência do relatório Rasmussen.
Dumitru Oprea (PPE-DE). - (RO) Dizem que podemos fugir, mas que não nos podemos esconder da globalização. O mesmo se aplica aos mercados financeiros mundiais. Enquanto havia lucro a nível mundial, havia normalidade; agora que há perdas, é por culpa do capitalismo. Na nossa opinião, a culpa recai em grande medida sobre o Estado que se esqueceu de uma das suas principais infra-estruturas, a financeira, que é tão importante como as estradas, as ferrovias e as linhas aéreas.
O que os Estados Unidos e a União Europeia, assim como os Estados-Membros, estão agora a tentar fazer, é lançar as bases para uma nova infra-estrutura: a infra-estrutura financeira global. Infelizmente, a intervenção estatal chega um pouco tarde. Isto não é uma nova regulamentação, mas sim uma fluidificação, uma supervisão dos fluxos financeiros globais, e todos os Estados devem participar na mesma, permitindo assim que o sistema financeiro recupere credibilidade.
Proinsias De Rossa (PSE). - (EN) Senhor Presidente, na segunda-feira o Comissário Charlie McCreevy disse-nos que os fundos especulativos e as participações privadas não eram a causa da turbulência que hoje vivemos. No Guardian de hoje afirma-se que se soube ontem que o milionário John Paulson é um dos patrões de fundos especulativos que tem estado a vender a descoberto participações em bancos do Reino Unido e que, após uma transacção de cerca de mil milhões de libras esterlinas, as acções desses bancos caíram a pique. A empresa que dirige, a Paulson & Co, sedeada em Nova Iorque, foi a sociedade gestora de fundos de alto risco que mais arrecadou no ano passado, depois de ter jogado em hipotecas de alto risco que posteriormente, com a contracção do crédito, se revelaram tóxicas. A Paulson & Co comprou participações de quatro bancos britânicos bem conhecidos, incluindo o HBOS, que na semana passada, na sequência do colapso repentino das suas acções, foi obrigado a aceitar uma OPA de emergência por parte do Lloyds TSB.
Se o Senhor Comissário McCreevy não tem capacidade para regular todas as instituições financeiras devia ser afastado. A Comissão é responsável por garantir que essas instituições não roubam os fundos de pensões, o produto da poupança ou do trabalho. Há que pôr cobro a essas actividades e a única forma de o fazer é impondo transparência e regulação nesse domínio. A chamada "mão invisível" do mercado é, na realidade, uma mão de larápio e, quanto mais invisível é, mais bolsas rouba.
Presidente. – Penso que o senhor deputado De Rossa propõe que se ofereça uma assinatura do jornal The Guardian ao Senhor Comissário McCreevy. A Mesa irá tratar do assunto.
Olle Schmidt (ALDE). – (SV) Senhor Presidente, temos todas as razões para reagir a esquemas irrazoáveis de compensação e concessão de bónus. Penso que todos fazemos isso e é perfeitamente compreensível, mas eu diria, ainda assim, depois de ouvir atentamente o debate, que não é com retórica política estridente que se resolvem crises financeiras globais. Não dêem a impressão de que estão a precipitar-se e a aumentar o pânico que assolou os mercados financeiros a semana passada. Isso é algo que não deve acontecer nesta Câmara. Temos de ser razoáveis, temos de ser sensatos. Essa é a responsabilidade que nos foi dada pelos nossos eleitores. Meus amigos, temos de adoptar uma posição equilibrada, temos de criar regras e leis boas e eficazes que possibilitem o crescimento e a auto-regulação. Fico preocupado quando oiço esta retórica estridente. Fico inquieto e receoso de que nos conduza a uma comunidade financeira excessivamente regulamentada e incapaz de produzir o crescimento de que todos tanto precisamos. Os nossos eleitores estão à espera de crescimento e de perspectivas de criação de mais empregos.
Jean-Pierre Audy (PPE-DE). – (FR) Senhor Presidente, Senhor Presidente em exercício do Conselho, Senhoras e Senhores Deputados, escutei com estupefacção os pontos de vista expressos pelos socialistas e comunistas, que nos dizem que é a falência do sistema. Têm obviamente a memória curta, eles que, no século XX, levaram à falência todas as economias que administraram. O problema é mundial e a resposta deve, portanto, ser europeia.
Relativamente à questão financeira, Senhor Comissário, gostaria de saber se vai ou não aplicar o n.º 6 do artigo 105.º do Tratado que institui a Comunidade Europeia, nos termos do qual o Conselho, deliberando por unanimidade, sob proposta da Comissão pode conferir ao Banco Central Europeu uma missão no que diz respeito à supervisão prudencial das instituições de crédito. Creio que, hoje, os cidadãos consideram que já é tempo de exercermos uma fiscalização sobre as disposições em vigor para a supervisão prudencial dos sistemas financeiros. Não podemos construir um mercado interno se não dispusermos de uma política de regulação europeia.
Dariusz Rosati (PSE). - (EN) Senhor Presidente, a crise veio demonstrar que o sistema financeiro mundial está gravemente minado. Primeiro, as entidades de supervisão não conseguiram impedir o comportamento irresponsável dos investidores. Assistimos ao desenvolvimento de novos instrumentos financeiros que não são suficientemente transparentes e não permitem uma avaliação do risco adequada. Depois, os proprietários e accionistas das instituições financeiras não vigiaram adequadamente os directores das suas instituições, que pagavam a si próprios salários e bónus exorbitantes, e afinal para quê? Para levarem à falência essas instituições!
É urgente agir, no mínimo, nestas duas áreas. Não queremos que o cenário de derrocada da América se repita na Europa. Não queremos, na Europa, uma situação em que os presidentes dos conselhos de administração dos grupos financeiros saem impunes, com milhões de dólares nos bolsos, enquanto aos contribuintes resta pagar a conta. Esperamos da Comissão medidas sérias para combater a situação.
Jean-Pierre Jouyet, Presidente em exercício do Conselho. – (FR) Senhor Presidente, gostaria de agradecer às Senhoras e aos Senhores Deputados este apaixonante debate. Poderíamos ficar aqui durante horas, pois o assunto merece efectivamente muitos debates e as reflexões que expuseram foram fascinantes. Infelizmente, porém, o nosso tempo é limitado.
Retiro as seguintes conclusões. Em primeiro lugar, no que diz respeito à abordagem do laissez-faire e à ausência de regulamentação, tendo em conta as reservas inerentes à minha função, creio que me exprimi de forma muito clara. Em minha opinião, é evidente que temos de ir além do debate entre "regulamentação" e "ausência de regulamentação". A desregulamentação financeira é, hoje, um conceito obsoleto. Uma regulação financeira forte e moderna será a solução a partir de agora. Terá de ser adaptada; temos de ir além daquilo que foi feito até agora.
Este é o primeiro ponto que queria sublinhar e, quanto a isto, sou extremamente claro. Escutei também com atenção as palavras da senhora deputada Koch-Mehrin e reitero aquilo que afirmou, nomeadamente, que a regulamentação não é inimiga do mercado. A cada um as suas responsabilidades. Cumpre às autoridades públicas regulamentar e adaptar as regras em vigor, pois o que está em jogo é a estabilidade do sistema, é a protecção dos pequenos aforradores e é a protecção dos depositantes. Gostaria igualmente de dizer ao senhor deputado Wurtz: também o emprego e o crescimento, que têm um impacto directo na economia real, são ameaçados por esta crise. Por isso, temos de agir, inclusive a favor dos menos abastados, e rapidamente.
A minha segunda convicção é que a Europa deve agir no quadro de uma cooperação internacional reforçada. Não há alternativa. Como já foi dito, a Europa deve fazer ouvir a sua voz, caso contrário, ficaremos sujeitos aos efeitos das soluções norte-americanas. Já aconteceu com a legislação Sarbanes-Oxley. Vimos as consequências que isso teve para algumas empresas europeias; vimos o efeito que teve sobre as normas de contabilidade e as normas de mercado.
Podemos começar a partir de agora. A única vantagem que temos é que, hoje, a Europa tem a possibilidade, como o Comissário Almunia e o Presidente Sarkozy sublinharam, de se afirmar claramente, de fazer ouvir a sua voz na cena internacional, de tomar as rédeas e ganhar vantagem. Exorto os Europeus a coordenarem-se entre si para que a União tenha uma presença forte na cena internacional e a procederem a uma reflexão sobre a arquitectura financeira internacional e sobre os organismos de regulação a nível internacional.
Porque, se nenhuma iniciativa internacional for tomada, não podemos queixar-nos de não termos outra solução senão recorrer aos fundos soberanos, que de resto queremos manter. Não quero emitir quaisquer juízos, mas é necessário que haja uma certa coerência a este respeito. Temos de saber o que queremos fazer e que, se a Europa não agir, teremos de recorrer a outros fundos para estabilizar o sistema financeiro.
A minha terceira convicção prende-se com um aspecto que já foi mencionado por vários oradores, incluindo o senhor deputado Schulz. É verdade que temos de abordar a questão das remunerações e o problema dos lucros ligados a actividades cíclicas de mercado. A questão das remunerações dos operadores de mercado também deve ser vista no contexto desta reflexão internacional. Não sou o primeiro a dizê-lo. Gordon Brown também já o disse antes. Parece-me lógico e importa fazer uma reflexão aprofundada sobre esta questão.
Parece claro que não se trata apenas de uma crise económica e financeira, trata-se também de uma crise de ética e responsabilidade. Trata-se de uma crise da ética económica e diz respeito a todos os intervenientes e todos os responsáveis políticos, seja qual for a sua filiação. Como o senhor deputado Wurtz e outros oradores sublinharam, a finança deve continuar ao serviço da economia e a economia não deve ser vítima da finança.
Como já referi, é necessário reflectir sobre o papel das instituições financeiras e o roteiro adoptado pelos Ministros das Finanças com base em propostas da Comissão. Falemos de avanços concretos. À senhora deputada Berès, direi que temos de ir mais longe e, no que diz respeito ao calendário, agir com rapidez. Reitero as palavras do Senhor Comissário Almunia, quando disse que a Comissão tem de agir com muita rapidez porque o que está em jogo, e com isto concluo este ponto, é o restabelecimento da confiança.
Mesmo que a Europa seja menos afectada, é importante que transmitamos mensagens de confiança. Isto significa acção, cooperação internacional, não ter receio de adaptar as regras, agir com rapidez e ter propostas sobre a mesa com vista ao Conselho Europeu de 15 de Outubro, aplicar as propostas apresentadas pelo Parlamento e, como já foi referido, estarmos conscientes do facto de que estarmos a lidar com transacções que afectam não só a liquidez, mas também a solvabilidade de todo o sistema financeiro.
Agora, é a confiança económica que impulsionará o crescimento e é por isso que temos de agir com grande firmeza, sem dogmatismo, e utilizar toda a panóplia de instrumentos à nossa disposição.
Joaquín Almunia, Membro da Comissão. − (EN) Senhor Presidente, concordo com quem aqui afirmou que temos de reagir; que temos de reagir a uma grande mudança no nosso sistema financeiro; que temos de aprender com os erros do passado; e que enquanto instituições europeias temos de colaborar porque todos sabemos que, sem colaboração interinstitucional, não é possível ter êxito. É imperativo também que essa reacção inclua colaboração com as outras peças deste tabuleiro, e todos sabemos que me refiro a sistemas financeiros globais. Se não o fossem não estaríamos a sentir as repercussões que sentimos, o que nos força a não esquecer que a nossa liderança, as nossas iniciativas e as nossas decisões devem obter elevado nível de consenso por parte dos outros parceiros e dos outros actores. A tal não acontecer, sejamos francos, teremos de pagar o preço de uma enorme ingenuidade e não seremos competitivos na indústria financeira. A verdade é que temos de continuar a ser competitivos - não só eficientes, não só rigorosos, não só capazes de aprender com o passado, mas também competitivos.
Como disse já nas minhas observações iniciais - e concordo com a Presidência - entendo, por reacção a curto prazo, aplicar plenamente o roteiro do ECOFIN tão cedo quanto possível - e estamos no bom caminho, Senhora Deputada Pervenche Berès. A avaliação feita algumas semanas atrás, em Nice, mostra que estamos na via certa ao adoptar as decisões desse ECOFIN. Na próxima semana apresentaremos propostas para a directiva relativa a requisitos de capital e, algumas semanas mais tarde, para a directiva relativa a agências de notação de crédito.
Também a adopção tão breve quanto possível da Directiva “Solvência II” pelo Parlamento e o Conselho é da maior importância. Mas, para lá das fronteiras da UE, o Fórum de Estabilidade Financeira tem de prosseguir uma intensa actividade; é, actualmente, uma instituição da maior relevância - no quadro dos comités Lamfalussy de nível 3. Sentimos - Parlamento, Comissão e espero que também o Conselho -, profunda preocupação com a ineficácia de algumas reacções a este nível, e estou a falar de instituições essenciais que deviam ser muito mais eficientes do que quando foram criadas há alguns anos - Comité de Basileia, Conselho das Normas Internacionais de Contabilidade. Como afirmou o Presidente em exercício do Conselho, Jean-Pierre Jouyet, este ponto é fulcral. Não estamos, portanto, sós. Temos de reagir rápida e eficazmente e de levar em consideração os grandes problemas que se nos deparam, ao mesmo tempo que garantimos que as nossas acções de liderança são seguidas por outros, como sabemos que acontece em muitos outros domínios regulamentares.
De um ponto de vista estrutural, lamentavelmente, não podemos tomar agora todas as decisões. Mas reconheço que é verdade que a relação entre regulação e mercados terá de mudar na sequência da crise. É óbvio que, entre outras falhas, também a regulação não funcionou adequadamente.
Creio que todos concordamos na necessidade de estabelecer uma relação mais forte, a todos os níveis, com as autoridades dos Estados Unidos, não só enquanto Comissão ou ramos executivos mas também entre o Parlamento e o Congresso, neste momento actor principal na solução dos problemas específicos dos EUA. Temos de reagir a nível multilateral. A verdadeira origem de todas as falhas nos sistemas financeiros - o excesso de liquidez, o excesso de risco incorrido por diversos actores, a fraca aversão ao risco a que assistimos, a cupidez, nas palavras do Senhor Presidente Jouyet – reside nesses desequilíbrios globais que as instituições globais não conseguiram resolver até agora. Enquanto europeus, temos de nos unir, agir e convencer os outros parceiros a nível mundial que, se não conseguirmos ajustar devidamente esses desequilíbrios globais, teremos de futuro mais problemas decorrentes dos mesmos desequilíbrios. Ao mesmo tempo impõe-se, dentro da UE, maior coordenação, mais clara e mais eficiente.
Vivemos numa união económica e monetária. Temos um mercado interno, temos um plano de acção para integração dos serviços financeiros, mas esbarramos ainda com obstáculos internos e ineficiência. Há que ter consciência de que é necessária mais integração europeia e não mais reacções nacionais ou atitudes defensivas por parte dos Estados-Membros.
Para além disso, há que estar consciente dos desafios que temos pela frente, que se estendem a médio e longo prazo, e num ambiente tão hostil convém preservar o Pacto de Estabilidade e Crescimento, a Estratégia de Lisboa e as estratégias relativas a energia e clima, que neste momento assumem extrema importância. Não podemos esquecer que estamos perante difíceis desafios a curto prazo, do ponto de vista dos mercados financeiros, e simultaneamente perante os grandes reptos que, a médio e longo prazo, se perfilam para a economia e para o nosso futuro.
Mais uma palavra apenas sobre um aspecto que não constava do roteiro mas será incluído na ordem de trabalhos do próximo ECOFIN e a que a Comissão vai dar pleno apoio: há que pensar no sistema de remuneração dos executivos, directores e presidentes dos conselhos de administração e de todos quantos podem criar tendências e tomar decisões sobre os mercados. Posso dizer o seguinte, e dirijo-me também ao Conselho: em 2004 a Comissão, nomeadamente o meu colega Charlie McCreevy, apresentou uma recomendação onde se instava os Estados-Membros a adoptarem decisões nesta matéria, a fim de se evitar incentivos que acabassem por ter consequências negativas. Temos estado a tentar perceber o que aconteceu desde então, nos últimos quatro anos. Apenas um dos 27 Estados-Membros reagiu positivamente a essa recomendação. Em consequência, a reacção actual da Comissão é de plena concordância com esse consenso, para que também essas importantes questões sejam abordadas.
Presidente. − Está encerrado o debate.
Declarações escritas (Artigo 142º)
Sebastian Valentin Bodu (PPE-DE), por escrito. – (EN) O sistema financeiro dos Estados Unidos viu-se abalado nos últimos dias, com a falência do banco Lehman Brothers e a aquisição que o banco de investimentos Merrill Lynch se viu obrigado a aceitar por parte do Bank of America, receando colapso semelhante. O índice Dow Jones caiu 4,4% em 15 de Setembro e, dois dias mais tarde, registou nova queda de 4,1%. A quebra dos índices de acções em todo o mundo, entre 15 e 17 de Setembro, provocou um prejuízo para os investidores da ordem dos 3, 6 biliões de dólares americanos. O valor das acções da seguradora AIG caiu mais de 90%, passando de 72 dólares americanos no ano passado para 2,05. O governo dos Estados Unidos teve de assumir o controlo da AIG injectando, em 16 de Setembro, 85 mil milhões de dólares. Todos estes acontecimentos apontam para a maior crise financeira que os EUA enfrentam desde a Grande Depressão. Ocorreram uma semana depois de o governo federal dos Estados Unidos ter assumido o controlo dos grandes bancos hipotecários Fannie Mae e Freddie Mac. O problema reside no facto de a Lehman Brothers e a AIG deverem muitos milhões de dólares a credores, não só nos Estados Unidos, mas também na Europa. Terá a Europa capacidade para absorver o choque decorrente da sua indissolúvel ligação com o mercado americano? Serão os 36,3 mil milhões de euros que o BCE e o Bank of England injectaram no mercado suficientes para dissipar o perigo?
Zbigniew Krzysztof Kuźmiuk (UEN), por escrito. – (PL) Gostaria de chamar a atenção da Câmara para as seguintes questões.
1. O Governo dos EUA e a Reserva Federal atribuíram, até agora, cerca de 1 trilião de USD para combater os efeitos da crise financeira. O chamado pacote Paulson contém propostas adicionais calculadas em mais 700-800 mil milhões de USD. Isto sugere que a actual crise é comparável à depressão de 1929.
2. Além disso, o BCE disponibilizou cerca de 750 mil milhões de USD, para aumentar a liquidez, ao passo que o Banco de Inglaterra libertou aproximadamente 80 mil milhões de USD. Estes movimentos proporcionam uma confirmação adicional de como se considera grave a situação dos mercados financeiros da Europa.
3. Todas as medidas mencionadas indicam que voltam a ser apreciadas as intervenções enérgicas e decisivas do governo. Inclusive os economistas mais liberais reconhecem a necessidade de introduzir regras para resistir à crise e estão realmente preparados para aceitar o envolvimento nestes processos de governos e instituições financeiras internacionais.
4. As proporções e a extensão desta crise irão ter um impacto negativo no rumo das transacções na economia real. Isto irá ter como resultado a recessão da economia dos EUA, o que significa um crescimento económico negativo, bem como uma desaceleração do crescimento económico na Europa.
5. Tendo em conta esta situação, é imperativo que todos os países reforcem as instituições que proporcionam uma supervisão financeira. Isto é particularmente verdadeiro no que respeita à UE. Cumpre que estas instituições tenham capacidade para exercer uma supervisão mais forte sobre as actividades dos principais bancos, dos fundos de investimento e organismos de seguros. Uma supervisão mais forte é o único processo de melhorar a segurança financeira e assegurar estabilidade financeira no futuro.
Esko Seppänen (GUE/NGL). - (FI) Sabemos agora que o Estado é necessário como garante financeiro, e não apenas militar, do capitalismo. O Governo dos Estados Unidos da América, a pátria do capitalismo predatório, privatizou os lucros da especulação e está agora a socializar os maiores prejuízos da história da sua economia obtidos pela banca através de especulação.
Raubtier (predador) é a palavra alemã para esse tipo de capitalismo, a qual se baseia numa outra palavra, Raubgier (rapacidade), que, por sua vez, é próxima de Raub (roubo). Ambas são mais adequadas.
Os aforradores que, em todo o mundo, se prepararam para necessidades futuras ver-se-ão despojados do valor de algumas das suas economias nos próximos anos, quando, na sequência dos acontecimentos da semana passada, a economia mundial se inflacionar e/ou entrarmos em declínio económico. É difícil imaginar como é que os Estados Unidos poderiam, de outra forma, pagar as enormes dívidas em que estão agora a incorrer e como é que, numa altura de inflação e de enfraquecimento do valor do dinheiro, poderão responder à sua própria capacidade diminuída de saldar as suas dívidas e de normalizar os seus activos sobrevalorizados.
As bombas-relógio permitidas pelo Governo norte-americano e engendradas pelos bancos comerciais terroristas do capitalismo predador, baseadas como são em operações de permuta, na embalagem virtual dos produtos financeiros, na insolvência de clientes que não são dignos de crédito e em falsos empréstimos sobre apólices de seguros, explodiram na cara dos contribuintes e o resto do mundo está a pagar o preço disso.