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Processo : 2008/2631(RSP)
Ciclo de vida em sessão
Ciclos relativos aos documentos :

Textos apresentados :

RC-B6-0521/2008

Debates :

PV 08/10/2008 - 22
CRE 08/10/2008 - 22

Votação :

PV 09/10/2008 - 7.9
Declarações de voto
Declarações de voto

Textos aprovados :

P6_TA(2008)0471

Relato integral dos debates
Quarta-feira, 8 de Outubro de 2008 - Bruxelas Edição JO

22. Suspensão da ronda de Doha da OMC (debate)
Vídeo das intervenções
Ata
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  Presidente. - Segue-se na ordem do dia a declaração da Comissão sobre a suspensão do ciclo de Doha da OMC.

 
  
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  Mariann Fischer Boel, Membro da Comissão. – (EN) Senhora Presidente, presumo que hoje contava ver aqui o Comissário Mandelson mas, como provavelmente já é do seu conhecimento, Peter Mandelson deixou a Comissão e coube-me a mim substituí-lo. Faço-o, todavia, com prazer, já que trabalhei nas negociações da OMC em Genebra, na qualidade de responsável pelo sector agrícola.

Apesar de as negociações de Julho, em Genebra, não terem tido êxito, o ciclo de Doha não foi suspenso. Pelo contrário, tem estado bastante activo, inclusive nas últimas semanas, e é nossa intenção contribuir de modo construtivo para esse processo para que as negociações a nível ministerial possam ser plenamente retomadas, assim que tenham sido concluídos os estudos técnicos neste momento em curso nos países interessados sobre as questões problemáticas pendentes.

As negociações de Julho permitiram algum progresso concreto. O pacote que daí saiu permite esperar um resultado equilibrado, que respeita as principais exigências da União Europeia relativamente à agricultura mantendo, ao mesmo tempo, vantagens interessantes para a nossa indústria de transformação.

Foi possível obter as linhas gerais do acordo em diversas temáticas fundamentais, incluindo a redução global do apoio interno ao sector agrícola, gerador de distorções, a meta de conseguir que países desenvolvidos e em desenvolvimento se abstenham de proteger um número limitado de produtos específicos e sensíveis das reduções pautais, a "fórmula suíça" utilizada para determinar reduções pautais para produtos industriais, e flexibilidade para os países em desenvolvimento, que poderão proteger dessas reduções determinados produtos industriais. Segundo a avaliação da Comissão, esse pacote é favorável às empresas e consumidores europeus e permitiria garantir uma moldura jurídica internacional para a agricultura consonante com a reforma de 2003. Para nós, o pacote contém um verdadeiro potencial de desenvolvimento para os países mais pobres do mundo.

Um ciclo concluído sobre as bases que acabo de expor reduziria as pautas aduaneiras mundiais para metade; além disso, os países em desenvolvimento poderiam contribuir para um terço da poupança enquanto os benefícios, em termos de acesso ao mercado, constituiriam os outros dois terços do pacote. Ao mesmo tempo, seria assim possível garantir que as economias da OCDE acompanhassem a iniciativa europeia, proporcionando aos países menos desenvolvidos acesso isento de direitos e sem contingentes aos seus mercados – trata-se daquilo a que costumamos chamar iniciativa "tudo menos armas".

Um acordo ter-nos-ia também permitido garantir a reforma do sector agrícola nos Estados Unidos. Os Estados Unidos teriam, nesse caso, de reduzir o seu apoio interno ou subsídios, geradores de distorções, para 14,5 mil milhões de dólares. Na ausência de acordo, esses subsídios poderão, ao abrigo da nova legislação para o sector agrícola, elevar-se a 48 mil milhões de dólares. Acresce que os nossos interesses ficariam salvaguardados também porque disporíamos de protecção jurídica internacional permanente para a nossa Política Agrícola Comum reformulada.

Um acordo que assentasse nestes fundamentos faria dos países emergentes guardiães do sistema multilateral de comércio, o qual tem de ser preservado mas tem, também, de ser reforçado. Esses países ficariam mais firmemente ligados ao sistema de comércio mundial baseado em regras, essencial para o futuro.

Foi, portanto, decepcionante verificar a impossibilidade de concluir em Julho as negociações sobre as modalidades de Doha devido ao desacordo que persiste num ponto muito específico do sector agrícola. Trata-se, nomeadamente, dos mecanismos especiais de salvaguarda para a agricultura para os países em desenvolvimento, os chamados MES, em particular no âmbito do G7. A Índia e a China não chegaram a acordo com os EUA quanto aos preços de desencadeamento e medidas correctivas a aplicar para a referida salvaguarda na eventualidade de ser utilizada em violação das taxas aplicadas antes do ciclo de Doha.

Desde o início de Setembro que vêm sendo mantidos contactos a nível de funcionários superiores com o intuito de solucionar essa persistente diferença de opiniões mas, até agora, ainda não obtivemos resultados satisfatórios. Embora a União Europeia se mantenha firmemente empenhada, neste momento não é fácil prever a evolução da situação nas próximas semanas.

Como habitualmente, vamos prosseguir o diálogo com o Parlamento e, obviamente, contamos desde já com o vosso apoio.

 
  
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  Georgios Papastamkos, em nome do Grupo PPE-DE.(EL) Senhor Presidente, o custo do colapso das negociações da Ronda de Doha não deve ser contabilizado unicamente em termos de oportunidades perdidas, lucros perdidos e agravamento do clima de incerteza económica. O custo sistémico e o custo institucional são igualmente cruciais. Refiro-me ao golpe que pode infligir na credibilidade da OMC.

Obviamente, todos queremos chegar a um acordo, mas não um acordo a todo o custo que não tenha em conta os interesses da UE. Uma conclusão bem sucedida da actual ronda de negociações pressupõe um acordo abrangente, ambicioso e equilibrado. Por isso, pedimos concessões substanciais tanto da parte dos nossos parceiros comerciais desenvolvidos como dos países dinamicamente em desenvolvimento.

Assim, exortamos a Comissão a que futuramente adopte uma atitude negocial decisiva. Houve uma reforma da PAC. Pergunto-lhes: essa reforma foi utilizada como uma ferramenta negocial? Longe disso: a Comissão avançou unilateralmente com uma série de ofertas adicionais e vãs para o sector agrícola.

Há muitas perguntas que eu poderia fazer ao Comissário responsável pela agricultura. Farei apenas uma: a questão das indicações geográficas faz parte integrante das negociações agrícolas?

O nosso empenho num sistema de comércio multilateral pode ser dado como certo. Aguardamos com expectativa uma governança comercial que garanta uma gestão efectiva da globalização e uma redistribuição mais justa dos seus benefícios.

Para concluir, gostaria de dizer que pessoalmente acredito que a conclusão negativa – ou seja, a eliminação das barreiras no quadro da OMC – não foi devidamente apoiada pela necessária integração positiva em termos de convergência sistémica regulamentar.

 
  
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  Erika Mann, em nome do Grupo PSE. – (DE) Senhora Presidente, como sabemos, pela nossa experiência, as rondas de comércio mundial são muito complexas. Gostaria de agradecer à Comissão, pois, tal como nós, deputados ao Parlamento Europeu, constatámos muitas vezes nas conversações durante a última ronda de negociações, em Genebra, esta instituição pautou-se, até ao fim, por uma conduta muito equilibrada, tendo a Comissária, na sua área de competência, demonstrado não só a necessária flexibilidade mas também uma grande empatia para com os países em desenvolvimento mais pobres, facto que nos foi constantemente realçado nas negociações. Nesta medida, não foi a União Europeia que foi, desta vez, exposta na praça pública, mas sim outros países, que foram, na realidade, parceiros de negociação muito mais difíceis.

Lamento que, confrontados com a actual crise financeira, nos demos conta de que precisamos de mais regras internacionais e multilaterais, pois estas regras formam um espartilho que tornará possível, aos países mais pobres, integrarem-se, por um lado, enquanto os países mais ricos também serão capazes de garantir que o seu povo beneficia com este facto, e que as normas são fixadas, por outro. O que lamentamos, de facto, é que esta seja, aparentemente, a razão pela qual esta ronda de comércio mundial não pode ser concluída até o final do ano. Devíamos livrar-nos deste equívoco.

Talvez seja melhor assim, na medida em que vamos enfrentar toda esta situação com o novo Parlamento e a nova Comissão, e após as eleições nos Estados Unidos, em vez de termos tudo feito a qualquer preço. O meu grupo gostaria de recomendar cautela, em vez de levar esta ronda a uma conclusão, faça chuva ou faça sol.

Senhora Comissária, tenho um pedido a fazer-lhe: independentemente do que negociar ou do que venha a acontecer, por favor, informe o Parlamento em tempo útil, e certifique-se também de que, quer obtenhamos a aprovação do Tratado de Lisboa ou não, nos debrucemos novamente sobre a questão de criarmos, talvez, uma espécie de «quase Tratado de Lisboa» relativamente à área do comércio.

 
  
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  Ignasi Guardans Cambó, em nome do Grupo ALDE.(ES) Senhora Presidente, alguns de nós testemunhámos os verdadeiros esforços realizados por todos os participantes na Cimeira Ministerial de Julho da Ronda de Doha, concretamente os esforços da União Europeia, muito dignamente representada pelo Comissário Mandelson. Também foi apreciada, nas negociações em Genebra, a presença da Senhora Comissária que hoje nos acompanha. E, por isso, houve uma sensação de frustração, que nos foi dado viver em primeira mão, ao ver que, afinal, todos esses esforços e energia não produziram nenhuns resultados concretos, ainda que tivessem chegado a um grau de aproximação que levava a crer que se poderia obter algum tipo de resultado.

Na proposta de resolução que hoje apresentamos, e que será votada nesta Câmara, manifestamos o nosso compromisso enquanto Parlamento com o que ali se alcançou. Instamos a que o que ali foi alcançado, embora não fosse realmente um compromisso único, constitua a base sobre a qual se começará agora a trabalhar, de modo a que aqueles esforços não sejam desperdiçados. Solicitamos, com um espírito de ingenuidade, com um toque de ingenuidade, que a Ronda de Doha seja concluída com a possível brevidade.

É possível, provável mesmo, que alguns considerem essa nossa declaração ingénua, tanto mais que o principal negociador europeu nem sequer acreditava nela o suficiente e regressou ao seu país, deixando todas as negociações em nome da Europa nas mãos de alguém que nada sabe sobre o que está em cima da mesa, apesar das futuras capacidades que possa ter.

É verdade, pois, que há muita ingenuidade na nossa proposta de resolução, mas também é um facto que temos de ser muito claros e firmes. Sem a conclusão da Ronda de Doha, são os países em desenvolvimento que ficam a perder. Se a Ronda de Doha não for concluída, a abordagem multilateral fica seriamente comprometida e, sobretudo numa situação de incerteza global como a que hoje estamos a viver, enquanto não se concluir a Ronda de Doha, não se poderá tratar as outras questões da agenda mundial, como as alterações climáticas e o aumento dos preços dos géneros alimentícios.

Há outras frentes por resolver e nenhuma delas poderá ser resolvida se não fizermos um esforço para concluir esta ronda de negociações. O Parlamento continuará empenhado neste objectivo.

 
  
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  Caroline Lucas, em nome do Grupo Verts/ALE. – (EN) Senhora Presidente, apraz-me verificar que, nos últimos anos, este Parlamento se tornou muito mais crítico relativamente ao ciclo de Doha. A resolução comum sobre a mesa reflecte fielmente a declaração da Conferência Parlamentar de Setembro, que expressa grave preocupação quanto ao reduzido conteúdo em matéria de desenvolvimento que resta nas negociações de Doha e critica duramente os seus processos de resolução cada vez mais exclusivos.

Permitam-me acrescentar que, no espírito da declaração dessa Conferência Parlamentar, espero que a alteração apresentada pelo Grupo PPE-DE e o Grupo UEN, que apela a acordos de comércio livre bilaterais do tipo OMC+, não seja amanhã aprovada. Os acordos de comércio livre bilaterais são o contrário, precisamente, de um multilateralismo operante e os Verdes não poderão apoiar a resolução se essa alteração for aceite.

O que me choca neste debate e, sobretudo, na resolução, é que ninguém tem coragem para enunciar uma simples verdade: as negociações do ciclo de Doha como as conhecemos estão encerradas. É possível que a suspensão dure até à Primavera de 2010. É quase certo que os novos negociadores dos EUA, da Comissão, da Índia não irão retomar as mesmas velhas soluções milagrosas de Julho de 2008, que, mesmo nessa altura, não resultaram. Estamos perante uma verdadeira oportunidade, uma oportunidade única, para avaliar aquilo que falhou, nos últimos sete anos, nas negociações de Doha e para estabelecer uma agenda comum mais justa e, ao mesmo tempo, um processo mais aberto e democrático que possa congregar o pleno apoio de todos os membros da OMC, em particular os menos desenvolvidos.

 
  
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  Seán Ó Neachtain , em nome do Grupo UEN. – (GA) Senhora Presidente, já vai sendo tempo de mudarmos o nosso modo de participar nas conversações de comércio mundial. Tornou-se evidente que o sistema e o nosso envolvimento nele já não funcionam. Falhámos em Cancun, em Hong Kong e de novo em Genebra.

Tudo se baseia no seguinte: estamos a tentar criar, na Europa, um pacote que envolverá a venda das nossas fontes de alimentos – precisamente os alimentos que estamos a fornecer. O anterior Comissário Mandelson fez todos os esforços para destruir a política agrícola de modo a fomentar um sistema de comércio global. A resposta não é essa. De onde virão os nossos alimentos quanto tivermos de os importar? A Europa precisa de ter cuidado e temos de proteger o nosso abastecimento alimentar.

Mudámos a nossa política agrícola mas, a menos que a agricultura seja retirada da agenda do comércio global, esta não fará progressos nem, na realidade, será bem sucedida. É tempo de se fazer alguma coisa, como já se disse em muitas ocasiões.

 
  
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  Helmuth Markov, em nome do Grupo GUE/NGL. – (DE) Senhora Presidente, Senhora Comissária, caros colegas, quando se negoceia durante sete anos sem conseguir chegar a uma conclusão, nessa caso, temos de fazer um pouco de autocrítica e perguntar a nós próprios quais foram os erros que cometemos, independentemente dos erros incorridos por outros países e por outras partes das negociações.

Penso que é possível fazer uma lista – não necessariamente para se aplicar a todos, mas talvez a exortação no sentido de eliminar tarifas e abrir mercados não seja um bom instrumento para os países em desenvolvimento, pois estes perderiam o rendimento de que necessitam para os seus próprios orçamentos e não têm forma de o obter a partir de outra fonte. Nesse caso, não seria possível haver cuidados de saúde, educação ou desenvolvimento de infra-estruturas nestes países.

Para alguns destes países, um acordo de comércio livre, seja de que tipo for, não é o modelo correcto, tendo eles interesse em concluir um acordo comercial, mas na base do SPG +. Talvez seja verdade que, àquele nível de desenvolvimento, muitos países precisam de desenvolver, primeiro, uma economia independente. Afinal, a União Europeia, ou alguns países europeus, desenvolveram as suas economias em mercados fechados.

Se o resultado não for atingido, deve-se perguntar por que razão isso acontece. A Ronda de Doha foi inicialmente vinculada aos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio. Não partilho da opinião do senhor deputado Ó Neachtain: entendo por que muitos países dizem que sentem que as negociações em curso servem exclusivamente para permitir que empresas, que operam à escala global, se tornem ainda mais globais, e é isso que a estratégia «Europa Global» também diz. Este aspecto tem um efeito negativo sobre os pequenos produtores regionais. Aliás, tem também um efeito negativo sobre os pequenos produtores locais.

Faz parte da razão de ser da União Europeia, faz parte do seu imperativo, que avancemos. Assim sendo, talvez seja necessário considerarmos a possibilidade de uma táctica negocial diferente. Espero que a nova Comissária aproveite essa oportunidade. Vem de fora, tem experiência negocial. Embora possa não ter os conhecimentos necessários em matéria comercial, tem uma equipa competente e talvez aproveite a oportunidade para, no âmbito do mandato, actuar de maneira diferente do anterior Comissário – e, aí, nós teremos, efectivamente, uma oportunidade!

 
  
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  Derek Roland Clark, em nome do Grupo IND/DEM. – (EN) Em questões comerciais, a UE gosta especialmente de dar lições aos outros. Recordam-se da guerra da banana com os Estados Unidos, que durou seis anos? Aconteceu quando a UE concedeu acesso especial ao mercado às suas ex-colónias das Caraíbas. O actual Director-geral da OMC é o ex-Comissário responsável pelo comércio, Pascal Lamy. Não haverá aqui conflito de interesses? Afinal, a sua pensão da UE pode depender do facto de não atacar as políticas da União. Poderá ter considerado esse factor durante as tentativas de negociação entre os blocos comerciais?

Peter Mandelson culpou os subsídios agrícolas dos EUA pelo colapso do ciclo de Doha. Quem tem telhados de vidro não atira pedras aos vizinhos! Durante décadas a Política Agrícola Comum encheu os bolsos dos agricultores da União com subsídios fabulosos. Essa política contribuiu tanto para o fracasso das negociações comerciais como outras causas. De qualquer forma, julgo que a última coisa que a Europa devia fazer, numa altura de fome e de crise financeira a nível mundial, é jogar contra outras regiões nas guerras comerciais.

 
  
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  Jean-Claude Martinez (NI). - (FR) Senhora Presidente, Senhora Comissária, a actual crise financeira mostra bem que, quando o problema é planetário, é necessária uma acção planetária. Tal é particularmente verdade no domínio da agricultura e no domínio alimentar. Eis a razão pela qual foi criada, nomeadamente, a Organização Mundial do Comércio (OMC) - com a qual estamos de acordo -, que tenta definir regras planetárias.

Acontece que as coisas não correm exactamente como gostaríamos, pois estamos perante o seguinte problema: há que conciliar duas coisas, o comércio livre necessário, sobre o qual todos estão de acordo, mas também as protecções não menos necessárias. E a protecção das economias e das agriculturas nacionais não é sinónimo de proteccionismo.

Para isso, o caminho que temos trilhado desde há sessenta anos a esta parte, desde o GATT, é um caminho desequilibrado, que passa pela redução dos direitos aduaneiros, tendo por objectivo a sua supressão. Acontece que, tecnicamente, é difícil reduzir os direitos aduaneiros. Prova disso é a de que existe toda uma série de fórmulas matemáticas para o efeito: a fórmula sul-coreana, a fórmula europeia, ou, a mais conhecida, a fórmula suíça. Não funciona muito bem, pois os produtos não são unitários. São compostos de muitos elementos, com regras de origem muito diferentes, e reduzir tecnicamente os direitos aduaneiros não é tão simples como se pode pensar. Estamos portanto num impasse técnico, do qual tentamos sair através de negociações políticas.

Ora, acontece que os cientistas inventaram uma nova tecnologia aduaneira: a tecnologia dos direitos aduaneiros dedutíveis pelos exportadores sobre a economia do Estado importador. Concretamente, esse direito aduaneiro dedutível transforma-se num crédito aduaneiro igual ao montante do imposto aduaneiro que o exportador suportou no país importador.

Esse crédito aduaneiro possui três características: é reembolsável, negociável e bonificável. É reembolsável: no momento em que o exportador vai comprar ao importador, pode deduzir o direito aduaneiro que suportou. É negociável porque, se a empresa exportadora que suportou um certo montante de direitos aduaneiros não precisa de comprar nada ao importador, negocia o seu crédito aduaneiro no mercado bolsista ou no banco. É bonificável: se queremos ajudar os países em desenvolvimento, o importador pode oferecer um montante de crédito aduaneiro superior ao montante dos direitos aduaneiros.

Pois bem, com esta técnica, criamos uma moeda de comércio internacional cuja massa monetária é igual ao montante dos direitos aduaneiros existentes. A União Europeia, por exemplo, ofereceria 13 mil milhões de euros de moeda internacional no domínio comercial.

 
  
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  Mairead McGuinness (PPE-DE). - (EN) Senhora Presidente, tal como outros intervenientes, também eu estive em Genebra e me senti estupefacta e por vezes, até, divertida com o funcionamento da OMC. No caso em apreço, isso não aconteceu.

Por uma vez, a Política Agrícola Comum não foi directamente atacada, o que é positivo. Mas a agricultura em termos gerais manteve-se, sem dúvida, entre os assuntos prioritários. As negociações fracassaram porque a Índia e a China pretendiam proteger os seus agricultores de vagas de importações de produtos agrícolas. Valerá a pena recordar as palavras do responsável indiano pelo comércio, Kamal Nath: "Não podemos aceitar este desafio por uma questão de segurança de modos de vida". A Índia considerou vital a protecção da sua vasta e relativamente pobre população rural e agrícola e entendeu que o acordo da OMC não serviria os seus interesses.

Este processo arrasta-se há sete anos. Peter Mandelson abandonou o barco, após quatro anos ao leme. Na minha opinião, não foi suficientemente atento às preocupações dos agricultores, nomeadamente os da União Europeia, e à indústria alimentar, e ignorou-as afirmando que a parte do desenvolvimento da agenda se encontrava no centro das preocupações. As suas propostas teriam arrasado o sector de pecuária da UE, não em benefício do mundo em desenvolvimento mas de economias emergentes com baixos custos e dos seus extensos ranchos. Como já tive ocasião de dizer, agora Peter Mandelson saiu de cena e pergunto-me se terá reparado nos sinais que apontavam para um agravamento da situação. Se estava assim tão preocupado com o desenvolvimento, por que motivo não ficou no seu posto até concluir essa tarefa?

A segurança alimentar constitui, actualmente, uma das grandes prioridades políticas. Os preços das matérias-primas sofrem grandes flutuações. Soube que o mercado de cereais entrou hoje em queda. Temos de nos interrogar se esta será a melhor forma de garantir segurança alimentar para todos os consumidores a preços razoáveis. Mais importante ainda, temos de analisar a nossa política de desenvolvimento e perceber por que não conseguimos investir em agricultura no mundo em desenvolvimento. Cheguemos a acordo, sim, mas um acordo justo e equilibrado.

 
  
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  Kader Arif (PSE). (FR) Senhora Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, desde 2001 que os países em desenvolvimento negoceiam no âmbito da OMC uma ronda anunciada como a ronda do desenvolvimento. Agora, face a uma súbita e devastadora crise alimentar, que alerta o mundo para a urgência de encontrar uma solução global e equilibrada a longo prazo, estes países esperam uma resposta clara da nossa parte para garantir a sua segurança alimentar.

Queria reafirmar que, se a ronda continuasse a centrar-se no acesso ao mercado a qualquer preço, não alcançaríamos o nosso objectivo. Sabemos também que, quanto mais se adiar a assinatura de um acordo de desenvolvimento, mais remotas serão as perspectivas de alcançar os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio e, infelizmente, já levamos um grande atraso nesta matéria.

Face a esta situação de crise, solicitamos que seja encontrada o mais rapidamente possível uma solução política para o mecanismo de salvaguarda especial, a fim de se criar um instrumento eficaz de protecção para os pequenos agricultores dos países pobres. É um passo indispensável antes de prosseguir negociações sobre outros aspectos, e espero que o recente reinício das conversações sobre a agricultura e o acesso ao mercado dos produtos não agrícolas (NAMA) permita progressos neste domínio.

Antes de concluir, gostaria de mencionar as alterações apresentadas ao texto da resolução comum. O Grupo Socialista no Parlamento Europeu apelará evidentemente ao voto a favor da alteração 2, que é absolutamente essencial para aumentar os direitos do Parlamento no domínio do comércio internacional.

Apoiamos também as alterações apresentadas pelo Grupo dos Verdes/Aliança Livre Europeia, mas não podemos aceitar a alteração proposta pelo Grupo do Partido Popular Europeu (Democratas-Cristãos) e dos Democratas Europeus, por considerarmos não ser apropriado, nesta resolução sobre as negociações multilaterais, apelar à celebração de novos acordos bilaterais regionais, pois sabemos que estes são normalmente negociados em detrimento dos mais fracos.

 
  
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  Jorgo Chatzimarkakis (ALDE). – (DE) Senhora Presidente, Senhora Comissária, deparamo-nos novamente – uma vez mais – com uma ronda de Doha que fracassou. Será que a OMC anda, agora, a aborrecer o mundo? Certamente que não! Nós estivemos realmente à beira de um acordo. Não havia muita coisa para fazer, mas, no último momento, precisamente a Índia e a China provocaram o falhanço das conversações. Este facto deixa muito claro que as conversações não falharam por razões técnicas, mas sim devido a uma posição de carácter político. Fica, pois, demonstrado que o novo centro de poder em termos de ronda do comércio mundial se situa na Ásia e já não tanto na Europa.

O papel da China é importante, dado que a China, até agora, sempre esteve empenhada no livre comércio, mas tudo leva a crer que, de repente, passou a ter uma nova agenda.

Mesmo assim, gostaria de endereçar sinceras felicitações à Comissão – a si, Senhora Comissária – e também ao Senhor Comissário Mandelson, pelo papel positivo desempenhado pela União Europeia. Ao contrário do que aconteceu em Hong Kong, estivemos envolvidos nas negociações, fomos pró-activos e estivemos dispostos a fazer compromissos. É, de facto, aborrecido que o Senhor Comissário Mandelson esteja de saída nesta altura, pois este facto significa que temos de mudar de cavalos a meio da viagem. O Comissário era um bom negociador e não nos dava descanso no Parlamento. Lady Ashton vai ter o seu desempenho sempre comparado com o dele. Votos de muito boa sorte!

 
  
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  Nils Lundgren (IND/DEM). - (SV) Senhora Presidente, sou um acérrimo eurocéptico, mas há dois domínios em que a UE deve desempenhar um papel central a nível internacional – a política comercial e a política ambiental. Estamos agora a falar de política comercial.

O comércio livre a nível global é a chave para a prosperidade económica de todos os países do mundo, especialmente dos mais pobres. O fracasso das negociações da ronda de Doha este Verão foi, por isso, muito grave, cabendo agora à UE, a maior organização comercial do mundo, tomar uma nova iniciativa. É, pois, profundamente lamentável que Peter Mandelson, o nosso mais competente membro da Comissão, deixe o seu cargo como Comissário responsável pela política comercial da UE. Isto, ao mesmo tempo que a economia mundial é ameaçada por uma crise financeira devastadora.

Num contexto como este, o Governo do Reino Unido propõe um substituto que claramente não está à altura da tarefa. Cumpre agora ao Parlamento Europeu garantir que tenhamos um Comissário do Comércio forte e competente neste momento perigoso da história. Assumamos essa responsabilidade!

 
  
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  Robert Sturdy (PPE-DE). - (EN) Senhora Presidente, permita-me que comece por recordar à Senhora Comissária a situação na sequência da saída de Peter Mandelson. Na minha opinião, ao deixar o posto que ocupava, deixou cair, por assim dizer, a UE. A nossa posição é muito delicada. A Senhora Comissária acabou de referir que esta é uma oportunidade única para relançar o ciclo de Doha. Sem Peter Mandelson ao leme - e muitas vezes o critiquei no passado mas, pelo menos, tinha capacidade intelectual e competência, na qualidade de ex-ministro do comércio, para prosseguir a luta - sinto que estamos em apertos.

Senhora Comissária, dispõe-se a assinar, na próxima semana, o que foi decidido sobre acordos de livre comércio? Salvo o respeito que me merece, que conhecimento tem a Senhora Comissária sobre o assunto? Não esteve envolvida nas negociações nem na redacção desses acordos. Pela minha parte, não me recordo de termos falado do assunto quando me coube elaborar o relatório sobre os mesmos.

Por outro lado, poderá a Comissão garantir a esta Assembleia que haverá uma verdadeira audição quando a Baroness Ashton se apresentar perante a Comissão do Comércio Internacional? Se decidir realizá-la num dia em que ninguém possa estar presente, se a convocar para a próxima semana ou, por exemplo, para uma segunda-feira, dia muito difícil para os deputados, prepare-se para enfrentar a ira do Parlamento! Lembre-se do que aconteceu à Comissão Santer! Entendo que a Baroness Ashton merece uma verdadeira audição, com todas as honras e, como já outros oradores afirmaram, é fundamental que tenhamos um Comissário competente à frente desta pasta.

Assim, Senhora Comissária, não sei se estaremos a falar da mesma coisa. Disse que a legislação agrícola dos Estados Unidos está a ser reformulada. Deve estar a brincar! Ontem mesmo Obama informou que vai ser ainda mais proteccionista do que antes e o candidato republicano sustentou a mesma posição. Da América só há a esperar grande proteccionismo. Pense no seguinte: alguém referiu a existência de uma crise alimentar. Eu queria tornar muito claro a este Parlamento que não há qualquer crise alimentar. Actualmente, o preço do trigo é inferior em 40 euros por tonelada ao seu custo de produção.

Senhora Presidente, um ponto de ordem muito rápido. O que se passa lá fora, há circo? O que está a acontecer nada tem a ver com o debate de hoje. Há um circo? Um restaurante? Um clube? É preciso perceber o que se passa. Seria aconselhável apresentar o caso à Conferência dos Presidentes para se poder pôr termo à confusão que reina fora deste Hemiciclo.

 
  
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  Presidente. - Tomámos nota dos seus comentários, Senhor Deputado Robert Sturdy.

 
  
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  Harlem Désir (PSE).(FR) Senhora Presidente, Senhora Comissária, Senhoras e Senhores Deputados, o que é que está em jogo, agora, no âmbito destas negociações da OMC? Não creio que seja o destino, por muito nobres que sejam estas personalidades, de Peter Mandelson ou da Baroness Ashton. Nem sequer tenho a certeza de que o mais importante seja a questão das tarifas industriais, das tarifas agrícolas e do acesso ao mercado. Evidentemente, todos nós desejamos que o acordo seja sólido, seja equilibrado para a Europa, mas penso que há aqui duas questões principais.

A primeira é a preservação de um quadro multilateral para as trocas comerciais. Podemos ver o quanto a ausência deste quadro noutro domínio da globalização – os mercados financeiros – custa em termos de riscos para a economia, para os cidadãos e para as nossas sociedades. É isto que está em jogo, pois, se estes seis anos de negociações resultarem num fracasso, sabemos que são os acordos bilaterais que virão substituir-se progressivamente ao quadro da OMC. É um quadro imperfeito. Queremos reformar a OMC – dizemo-lo na nossa proposta de resolução –, queremos também que outras dimensões ligadas ao comércio sejam tidas em consideração, nomeadamente as dimensões ambientais, para fazer face ao impacto sobre as alterações climáticas e as regras sociais. É absolutamente fundamental. No entanto, não é dissolvendo o quadro multilateral mas reforçando-o que conseguiremos organizar melhor este aspecto da globalização.

A segunda questão – que não irei desenvolver porque já foi tratada pelo meu colega, senhor deputado Arif – é o reequilíbrio das regras que foram estabelecidas durante a Ronda do Uruguai, quando da criação da OMC, para melhor reflectir as diferenças de níveis de desenvolvimento, a situação dos países menos desenvolvidos, a situação dos países em desenvolvimento. Também mencionou esta questão, Senhora Comissária, com o pedido de uma iniciativa do tipo "tudo menos armas", com uma cláusula de salvaguarda para os produtos sensíveis. É necessário, pois, a este respeito, definir regras – não necessariamente regras de comércio livre – que tenham em conta cada situação. Queremos um comércio justo, para que, precisamente, não se trate apenas da lei da selva.

São estas, creio, as duas questões principais em que os negociadores europeus devem concentrar-se. É natural que foquem a atenção noutras áreas, como a agricultura, os serviços – embora não pondo em causa o direito dos países em desenvolvimento a regular os serviços públicos – e as tarifas industriais, mas não em detrimento do êxito desta ronda de desenvolvimento.

 
  
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  Daniel Varela Suanzes-Carpegna (PPE-DE).(ES) Senhora Presidente, gostaríamos de ver o Comissário Mandelson ainda aqui presente, no seu lugar, em vez de ter saído disparado como saiu, o que mais pareceu o golpe de misericórdia da União Europeia à Ronda de Doha.

A crise financeira mundial não augura um futuro promissor para Doha. O fracasso nestas negociações, por sua vez, tenderá a agravar a situação económica mundial, e são os países menos desenvolvidos que mais pagarão por isso. A OMC é necessária; a regulação do comércio internacional é imprescindível. A regulação é hoje um factor-chave na globalização, como estamos a ver. Impõe-se, por conseguinte, alcançar um acordo no âmbito da ronda de negociações de Doha.

Haverá que reflectir sobre a melhoria do funcionamento e da legitimidade da OMC, e sobre o papel, nesta ronda de negociações, dos países "emergentes", que se armam ora em países em desenvolvimento ora em países desenvolvidos, conforme lhes convém. Como se afirma na proposta de resolução, o diálogo não deve ser só Norte-Sul mas também Sul-Sul.

A União Europeia deu passos muito significativos nestas negociações, mais que outros. Também os demos em iniciativas como a iniciativa Tudo menos armas. Outros terão igualmente de avançar nessa direcção e, no entretanto, tratemos de concluir os acordos de associação pendentes, como com o Mercosur, que são essenciais neste contexto.

 
  
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  Carlos Carnero González (PSE).(ES) Senhora Presidente, o debate de hoje está certamente a pôr em evidência alguns pontos de consenso importantes. Um deles é que, em resposta à crise que estamos a viver, o que faz falta é mais regulação e regulação multilateral.

Se nos fixarmos nas finanças, é de todo em todo indesejável, até para o pior dos nossos inimigos, que o Fundo Monetário Internacional ou o Banco Mundial desempenhem um papel de liderança. Limitam-se a fazer previsões catastróficas e mostram que têm cada vez menos voz activa em relação ao que se passa, e a sua influência e o seu peso, na prática, são imprevisíveis.

Se assim é, e já que dispomos de um instrumento como a Organização Mundial do Comércio, o que temos a fazer é usá-lo. Hoje mais do que nunca faz falta regulação, mas hoje mais do que nunca precisamos de uma economia real, ao contrário de uma economia financeira e especulativa. O comércio de bens e serviços é economia real, e o crescimento económico orientado para a criação de emprego assenta na economia real.

Por isso, não partilho do ponto de vista de que a crise torna manifestamente mais difícil concluir a Ronda de Doha, bem pelo contrário: qualquer governo responsável deve fazer um verdadeiro esforço para concluir esta ronda de negociações, seja do Norte ou do Sul, seja um país em desenvolvimento ou um país desenvolvido.

Creio que temos um mercado global, e fazem falta mãos visíveis. Neste caso, as da Organização Mundial do Comércio. Teremos de melhorar a forma como esta funciona, teremos de colocar a tónica, já se vê, essencialmente num modelo de desenvolvimento e não tanto num modelo de comércio livre, e teremos, obviamente, de ter vontade política. Presumo que a União, com a nova Comissária, continuará a tê-la.

 
  
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  Béla Glattfelder (PPE-DE). - (HU) Peter Mandelson está a abandonar o barco que se está a afundar e a deixar a ponte de comando. Está a desertar de um navio que ele próprio dirigiu contra um icebergue. Foi um erro fazer essas concessões extravagantes, especialmente na agricultura, logo no começo das negociações. Isto não deu qualquer incentivo aos nossos parceiros comerciais para que, por sua vez, fizessem concessões. Expusemo-nos ao ridículo, pois, ao mesmo tempo que estamos a desfazer-nos da Política Agrícola Comum, os outros parceiros negociais protegem a sua própria política agrícola e reforçam a posição da agricultura na América.

As negociações da OMC não podem prosseguir a partir do ponto em que foram deixadas. As negociações só podem continuar se abrangerem também as questões ambientais. De outro modo, uma maior liberalização do comércio mundial conduzirá a uma devastação ainda mais agressiva do ambiente e à aceleração da mudança climática. Estará certo, quando bruscamente nos vemos em plena crise financeira e alimentar, sacrificar a segurança alimentar da Europa e a sua agricultura apenas para que os nossos bancos falidos fiquem em melhores condições de exportar os seus serviços mal orientados?

 
  
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  Czesław Adam Siekierski (PPE-DE). - (PL) Senhora Presidente, a União Europeia tem estado a introduzir modificações significativas na política agrícola comum. Esta reforma tem tido o efeito de restringir a produção agrícola. Isso é especialmente evidente no mercado do açúcar, mas não apenas nesse mercado. Reduzimos o nível de apoio aos nossos agricultores. Em que medida se traduziu isso num aumento do valor acrescentado, em que países e em relação a que grupos sociais e profissionais?

Gostaria de perguntar à Senhora Comissária o que foi que a União Europeia recebeu em troca. Uma outra pergunta é: qual o impacto dos sinais de uma crise alimentar mundial nas negociações da OMC? Irá a actual crise financeira, que afectará sem dúvida o estado da nossa economia, ter repercussões nas negociações a nível da OMC?

 
  
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  Mariann Fischer Boel, Membro da Comissão. – (EN) Senhora Presidente, começaria por tentar explicar a nossa decepção ao fim de dez dias de intensas negociações em Genebra. Sentimos que estávamos quase a chegar a acordo sobre produtos agrícolas e NAMA, na certeza de que se tratava, afinal, daquilo que poderia determinar a aceitação de todo o pacote pela União Europeia.

Como responsável pela agricultura, devo dizer que, para mim, foi muito estimulante ver que, pela primeira vez, a agricultura europeia não foi acusada de provocar o fracasso das negociações. E isso deveu-se ao facto de termos feito o trabalho de casa no sector agrícola com a reforma da nossa Política Agrícola Comum, primeiro através da grande reforma de 2003 e, depois, de todas as reformas subsequentes. Pudemos, portanto, reduzir em 80% o nosso apoio interno gerador de distorções ao comércio sem, no entanto, prejudicar o nosso sector agrícola. Simultaneamente, conseguimos vincular as reformas ao sistema de comércio multilateral. O que obtivemos não foi um acordo a qualquer preço; foi um acordo que estabeleceu um equilíbrio entre essas duas áreas. A nossa justificação perante o Conselho é que negociámos com base no mandato que o próprio Conselho tinha conferido aos negociadores. No caso da agricultura, esse mandato consistia simplesmente em não enveredarmos por nova reforma no sector agrícola.

Concordo em que o sistema multilateral é importante e necessário, já que apenas enquadrados pelo sistema multilateral poderemos disciplinar, por exemplo, o apoio interno gerador de distorções e todas as outras questões não comerciais. Isso nunca poderá ser feito em negociações bilaterais, pelo que temos de nos ater aos valores do sistema multilateral.

Devo também esclarecer que, nessas negociações, nunca visámos o mercado dos países em desenvolvimento. Antes pelo contrário, e por isso foi tão importante o mecanismo especial de salvaguarda, como referi na minha primeira intervenção, para proteger produtos especiais dos países em desenvolvimento. Além disso, já em 2002 tínhamos aplicado o acordo "tudo excepto armas", o que significa que, hoje, a União Europeia é, de longe, o maior importador de produtos de base agrícolas a nível mundial. Importamos mais do que o Canadá, os Estados Unidos, a Austrália e o Japão juntos. Portanto, abrimos os nossos mercados no sector agrícola a esses países.

Esta noite também já aqui se falou de segurança alimentar. Há que perceber que segurança alimentar consiste em produção interna e em importações. Se atentarmos no sector agrícola da União Europeia, perceberemos que nunca teríamos conseguido uma posição tão forte como a actual se dispuséssemos de um mercado agrícola fechado. Pensando apenas no país da Presidência, verifica-se hoje um superavit da balança comercial de 7 mil milhões de euros em produtos de base agrícolas. Se os nossos mercados fossem fechados, nunca conseguiríamos escoar internamente os nossos produtos de elevada qualidade, pois seríamos punidos por nos estarmos a proteger. E outros fariam o mesmo, o que nos impediria de aproveitar as oportunidades proporcionadas por mercados emergentes e cada vez mais abertos aos nossos produtos de alta qualidade. Portanto, uma abordagem equilibrada é, sem dúvida, a mais correcta.

Também as indicações geográficas foram abordadas, mas não as referi na minha intervenção inicial por razões de tempo e devido ao facto de a Presidente controlar rigorosamente tais limites. As indicações geográficas são um ponto fundamental para a União Europeia e tornámos muito claro aos nossos parceiros de negociações que nunca poderemos assinar um acordo que não satisfaça as nossas exigências em termos dessas indicações, que assumem grande relevância, nomeadamente para os produtos mediterrânicos de elevada qualidade.

Dirijo-me agora à senhora deputada Mairead McGuinness para uma rápida resposta. Tem razão quando afirma que há décadas vimos deixando um pouco de parte a nossa prioridade de ajuda ao desenvolvimento no sector agrícola. Agora que os preços aumentam abruptamente - não os preços dos produtos de base, que estão em queda, como já vimos hoje, mas os preços das sementes e dos adubos - propusemos ajudar os países menos desenvolvidos, os países mais pobres do mundo, de modo a que possam comprar sementes e adubos. O Parlamento está agora a discutir a nossa proposta de disponibilizar mil milhões de euros e espero que essa forma de ajudar os países em desenvolvimento a alimentar as respectivas populações e a evitar os movimentos migratórios de áreas rurais para as cidades seja aprovada. Por favor, tenham em mente o nosso objectivo, que é da maior importância.

 
  
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  Presidente. - Nos termos do n.º 2 do artigo 103.º do Regimento, declaro que recebi seis propostas de resolução(1) para encerrar o debate.

Está encerrado o debate.

A votação terá lugar amanhã.

Declarações escritas (Artigo 142.º)

 
  
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  Daniel Dăianu (ALDE), por escrito. – (EN) O malogro do ciclo de negociações comerciais de Doha pode ser considerado prenúncio do que vai acontecer numa altura em que a cada vez mais profunda crise financeira coloca um terrível peso sobre a capacidade dos governos para obedecerem às normas acordadas. Foram aqui elogiadas as vantagens do comércio livre num cenário de mercados de cariz cada vez mais global. Mas o comércio livre tem de ser justo e acompanhado por um sistema internacional que ajude os países mais pobres a desenvolverem-se. Rendimentos cada vez mais desiguais nas economias mais ricas, a par do seu receio do poder crescente de algumas economias emergentes, instigam ao proteccionismo. Do mesmo modo, a luta para controlar os recursos esgotáveis e obter matérias-primas a preços reduzidos incentivam a tendência para restringir o comércio em muitos países.

Não podemos esquecer que a geopolítica se torna cada vez mais complexa. Cabe à UE assumir a liderança para suavizar as repercussões das crises actuais, impedindo o colapso real do sistema comercial multilateral e do sistema financeiro. Tal liderança implica, entre outros aspectos, uma reforma das instituições financeiras internacionais, envolvendo as potências emergentes mundiais (BRIC) na governação dos problemas económicos mundiais e na reforma das estruturas internacionais que regulam os fluxos financeiros. No final do século XIX, um sistema internacional que fomentava a livre circulação de bens e capitais falhou e permitiu o surgimento de uma terrível guerra na Europa. Não esqueçamos nunca estes factos históricos.

 
  

(1) Ver acta.

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