Presidente. - Segue-se na ordem do dia a discussão conjunta sobre:
- o relatório (A6-0403/2008) da deputada Sophia in 't Veld, em nome da Comissão das Liberdades Cívicas, da Justiça e dos Assuntos Internos, que contém uma proposta de recomendação do Parlamento Europeu ao Conselho sobre a celebração de um acordo entre a União Europeia e a Austrália sobre o tratamento e transferência dos dados referentes aos passageiros (dados PNR) provenientes da União Europeia, das transportadoras aéreas para o serviço das alfândegas australiano (2008/2187(INI)); e
- a pergunta oral (O-0100/2008) apresentada pelos deputados Sophia in 't Veld, Martine Roure, Philip Bradbourn e Sylvia-Yvonne Kaufmann, em nome da Comissão das Liberdades Cívicas, da Justiça e dos Assuntos Internos, à Comissão, sobre os registos de identificação dos passageiros ("Passengers Name Record" - PNR) na UE (B6-0476/2008).
Sophia in 't Veld, relatora. − (EN) Senhor Presidente, começarei com mais uma observação sobre a ausência do Conselho, pois nas minhas notas para o discurso figuravam alguns comentários sobre a boa cooperação entre o Parlamento e o Conselho, o diálogo, o espírito do Tratado de Lisboa, etc., mas a verdade é que o Conselho também está ausente neste debate. Considero isto absolutamente lamentável, pois é o Conselho que tem forçado a tónica em relação a uma política de registo de identificação dos passageiros, ou PNR, pelo que tem necessariamente de responder às questões que se levantam, e não está presente! O Conselho fez publicamente promessas solenes de envolver o Parlamento Europeu, mas vemos agora o que valem as promessas do Conselho – nada! Creio que esta atitude é uma afronta não para o Parlamento Europeu, mas para os cidadãos que têm direito a respostas e a um processo decisório transparente. Assim sendo, Senhor Presidente, transmita, por favor, o meu descontentamento aos representantes da Presidência.
Este é um debate conjunto sobre, por um lado, as propostas para o registo de identificação dos passageiros na UE, e, por outro, o acordo entre a União Europeia e a Austrália sobre PNR. Os problemas são essencialmente os mesmos, problemas esses que já foram levantados aquando do acordo com os EUA e, mais tarde, com o Canadá.
Uma das principais questões prende-se com a limitação dos objectivos, porque tudo o resto decorre daí – limitação de objectivos ou, por outras palavras e para começar, a justificação da proposta. Neste momento, tudo está errado com a justificação, tudo está errado com a limitação dos objectivos. Passo a explicar.
Para começar, a subsidiariedade: a Comissão e o Conselho afirmam que o objectivo da proposta é a harmonização dos sistemas nacionais. Contudo, apenas alguns Estados-Membros – creio que são três até à data – têm, ou um sistema PNR em vigor, ou planos para criar um. Por conseguinte, a proposta não poderá, provavelmente, harmonizar sistemas nacionais, uma vez que são inexistentes. Apenas cria a obrigação de todos os Estados-Membros criarem um sistema para a recolha de dados PNR. Chamaria a isto “lavagem política”, porque o que quer que não consigamos alcançar a nível nacional, tentamos fazê-lo pela porta do cavalo da UE. Sou extremamente europeísta, mas não gosto desta forma de proceder.
Além disso, a Comissão propôs um sistema descentralizado, de modo que o valor acrescentado europeu é ainda menos evidente, para além de que se cria uma manta de retalhos de regras e sistemas que não são nada funcionais para as transportadoras e nada transparentes para os cidadãos.
O objectivo declarado na proposta da Comissão é identificar pessoas que têm, ou possam ter, ligações com acções terroristas ou com o crime organizado, bem como os seus associados, criar e actualizar indicadores de risco, e providenciar informações sobre padrões de viagens e outras tendências relacionadas com ataques terroristas para serem utilizadas em investigações criminais e acções penais contra ataques terroristas e o crime organizado.
A Comissão, na sua proposta, afirma que a UE tem sido capaz de avaliar o valor dos dados PNR e de compreender o seu potencial para efeitos de controlo da aplicação da lei. Porém, até à data, não vimos quaisquer provas concretas que possam fundamentar semelhante afirmação. Qualquer prova dada até agora pelos EUA é episódica e, para ser honesta, a informação que recebemos de várias agências governamentais dos EUA ao longo do último ano, sensivelmente, apenas parecem demonstrar que a recolha maciça e tratamento de dados PNR não tem qualquer utilidade.
Procedeu-se apenas a uma única avaliação do sistema PNR dos EUA, que não apurou os resultados. Na realidade, um relatório recente custeado pelo DHS (Departamento da Segurança Interna) levanta dúvidas substanciais sobre a utilidade da supervisão comportamental como instrumento para identificar potenciais terroristas. Isto é fácil de compreender, pois como é que vão elaborar perfis de risco com base nos dados PNR? É um disparate de todo o tamanho. Como é que se vai determinar se alguém tem más intenções com base no seu número de telefone ou no seu número de cartão de crédito? Por outras palavras, o objectivo declarado na proposta da Comissão é comprovadamente inválido e infundado e, no entanto, é essa a base de trabalho do Conselho.
A Comissão e o Conselho parecem estar confusos quanto ao que pode, ou não, ser feito com os dados PNR. Os dados contidos nos Registos de Identificação dos Passageiros (PNR) tendem a obter informação muito sucinta e, em média, não existem mais do que 10 domínios, com informação muito básica. Ora, não se compreende como é que estes dados poderão alguma vez servir para identificar pessoas que representam um risco elevado.
As autoridades responsáveis pela aplicação da lei já possuem os poderes necessários para obter dados PNR, numa base casuística, no quadro de uma investigação ou de uma acusação respeitante a suspeitos conhecidos e possíveis associados. Portanto, a proposta da Comissão limita-se simplesmente a anular a obrigação de conseguir um mandado e uma justificação. Conclui-se então que se as autoridades responsáveis pela aplicação da lei precisam de novos poderes, cabe-lhes demonstrar quando e como os poderes existentes passaram a ser insuficientes. Até à data, nunca obtivemos uma resposta a essa pergunta.
Já temos uma directiva API (Informações Antecipadas sobre os Passageiros), as quais podem de facto ser utilizadas para a identificação de pessoas e também para incluir pessoas numa lista de observação. Isto não é possível com os dados PNR. Ora, se temos a directiva API, por que precisamos de mais? Também não foi demonstrado.
A análise sistemática automatizada de PNR de todos os passageiros pode ser útil para outros objectivos, por exemplo, para combater o tráfico de drogas ou a imigração ilegal. Podem ser objectivos muito legítimos e válidos, mas sejamos claros e não falemos sobre prevenção de ataques terroristas - isso é completamente diferente.
Se a Comissão e o Conselho tencionam alargar o âmbito da proposta para abarcar outros objectivos, como acabei de dizer, deverão então esclarecer em pormenor, para cada objectivo anunciado, qual o uso que será dado aos dados PNR. Por outras palavras, pode fazer-se uso dos dados PNR de forma muito específica no quadro de uma investigação concreta e em curso. Pode fazer-se uso dos dados PNR para uma análise sistemática automatizada, por exemplo, contra o tráfico de droga, mas nesse caso não será preciso armazenar os dados. Precisamos pois de saber exactamente qual é o objectivo.
Isto leva-me à questão, digamos, da base jurídica, porque se lerem o pequeno documento relativo aos PNR Austrália-UE – e isto aplica-se também aos PNR EUA-UE – este não trata apenas do combate ao terrorismo e ao crime organizado, incide também sobre a imigração, riscos para a saúde pública, objectivos administrativos, alfândegas, supervisão e responsabilização da administração pública. Isto não tem nada a ver com o combate ao terrorismo.
A Comissão e o Conselho escolheram um instrumento do terceiro pilar para a proposta de criação de um sistema de dados PNR na UE e também para os acordos com outros países, mas o terceiro pilar prende-se com a cooperação policial e judiciária no seio da União Europeia. Não incide sobre segurança noutros países.
A Comissão pode justificar-se dizendo que, indirectamente, se fornecermos dados aos americanos, australianos e à Coreia do Sul, por exemplo, beneficiaremos com isso em termos de segurança. Isso pode muito bem ser verdade, mas então gostaria de compreender onde é que a saúde pública entra. Onde é que entra a imigração? Onde é que entram a supervisão e a responsabilização da administração pública? Não têm nada a ver com o assunto.
Não vou debruçar-me sobre todos os outros pormenores da implementação, mas a questão do objectivo e da justificação necessita antes de mais de receber uma resposta, pois a pretensão de que tem sido de grande utilidade no combate ao terrorismo não foi fundamentada até à data: continuamos à espera de provas, e confesso que gostaria muito de as ter. E se depois não vier a ficar provado, deveremos então voltar a analisar a proposta.
Jacques Barrot, Vice-Presidente da Comissão. - (FR) Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, assistimos a uma verdadeira acusação. Não sei se vou responder a todas essas perguntas, mas, antes de mais, quero agradecer-lhe, Senhora Deputada Sophia in 't Veld, pela ocasião que nos proporciona para falarmos do acordo PNR entre a Austrália e a União Europeia, acordo esse celebrado em 30 de Junho.
Esse acordo é resultado de negociações iniciadas em Março deste ano e conduzidas pela Presidência eslovena, assistida pela Comissão. O acordo é válido por um período de sete anos. Destina-se a garantir a segurança jurídica dos transportadores aéreos e dos sistemas de reservas no seio da União Europeia em matéria de transferência dos dados PNR para os serviços aduaneiros australianos, em conformidade com a lei sobre a protecção dos dados da União.
O acordo inclui compromissos importantes com vista a ter em conta as preocupações em matéria de protecção dos dados, do direito das pessoas a acederem às informações pessoais armazenadas após esse acordo, do direito das pessoas, independentemente da sua nacionalidade, a apresentarem queixa, junto do comissário australiano responsável pela vida privada, sobre a maneira como os seus dados são tratados.
O Parlamento sempre defendeu a transferência dos dados PNR com base no sistema dito «push». Após o período de segurança, os dados PNR apenas serão transferidos para as alfândegas australianas com base no referido sistema «push». Por outras palavras, os serviços aduaneiros australianos não serão autorizados a aceder a esses dados directamente a partir das bases de dados. O acordo inclui também cláusulas de salvaguarda importantes relativamente à conservação dos dados PNR, à transferência desses dados para outras agências ou para países terceiros, assim como uma clara referência às finalidades para as quais os dados podem ser utilizados.
Quanto à finalidade dos dados PNR, o projecto de recomendação afirma que a mesma não está em conformidade com o artigo 8.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Responderei a isso dizendo que o acordo estipula que os dados PNR podem ser tratados para três fins. E especifica esses três fins: a luta contra o terrorismo e os delitos a ele ligados, a luta contra os delitos graves de natureza transnacional - incluindo a criminalidade organizada - e, em terceiro lugar, evitar que as pessoas fujam aos mandados e às medidas de detenção provisória emitidos contra elas por essas mesmas infracções. Digamos que se pode afirmar que, neste caso, as finalidades foram especificadas.
Numa preocupação de clareza, o acordo estipula também que os dados PNR podem ser tratados caso a caso, quando necessário, para protecção dos interesses vitais da pessoa em causa. Ainda numa preocupação de clareza, o acordo estipula também que os dados PNR podem ser tratados caso a caso, quando esse tratamento é exigido por decisão judiciária, por exemplo em caso de o tratamento dever ser realizado para verificar que os dados PNR são tratados em conformidade com a lei australiana em matéria de direitos humanos.
Gostaria de lhes dizer que, no futuro, estarei muito atento a que o Parlamento seja convenientemente associado a esse tipo de negociações. Estou perfeitamente consciente da necessidade de os informar bem. Assim, parece-me que foi tomado um certo número de garantias quanto à finalidade dos dados, à sua utilização e ainda à sua conservação. Dito isto, tentei ser objectivo e penso, no entanto, que este acordo era necessário. E como temos um parceiro atento, que possui uma autoridade incumbida de zelar pela protecção desses dados, creio, apesar de tudo, que temos razões para esperar que este acordo venha a ser aplicado no total respeito da protecção dos dados.
E passo agora ao ponto mais importante, se assim posso afirmar, à questão oral que me foi dirigida e que, como é óbvio, levanta todo este problema do Registo de Identificação dos Passageiros (PNR). O terrorismo internacional e a criminalidade representam uma ameaça séria, pelo que a recolha e a análise dos dados PNR surgiram, é um facto, como um instrumento útil ao combate ao terrorismo e à criminalidade. Os dados PNR constituem efectivamente informações comerciais fornecidas pelo passageiro à transportadora numa base voluntária. São informações recolhidas pelas transportadoras para pôr em prática os seus sistemas de reserva.
Recentemente, alguns países começaram a exigir que as transportadoras lhes transmitam os dados PNR para os utilizarem na prevenção e na luta contra o terrorismo e a criminalidade grave, como o tráfico de seres humanos e o tráfico de droga. Entre esses países figuram os Estados Unidos, o Canadá, o Reino Unido, a Austrália, a Nova Zelândia e a Coreia do Sul. Estes são alguns dos países terceiros - não é o caso do Reino Unido -, que começaram a exigir que as transportadoras lhes transmitissem os dados PNR.
Alguns Estados-Membros estão a avançar com processos legislativos nesse mesmo sentido, ou a avaliar a possibilidade de dar início a um processo legislativo: a França, a Dinamarca, a Suécia e a Bélgica. Outros países começaram a pensar em utilizar os dados PNR. Mas estamos numa fase inicial.
Haveria que ter em conta o facto de o PNR não passar de um instrumento que deve ser usado pelas autoridades repressivas juntamente com outros instrumentos e informações, pois a questão levantada, de saber qual é a verdadeira utilidade de tal utilização, só pode ser analisada a partir do momento em que as autoridades policiais não utilizam apenas o PNR, mas sim o PNR em conjunto com outros instrumentos.
Evidentemente que é muito mais difícil perceber exactamente qual a utilidade dos dados PNR. Contudo, alguns países que utilizaram os dados PNR demonstraram de facto, ao que parece, que o PNR constituía um instrumento muito útil no combate ao terrorismo e à criminalidade. Os sistemas de PNR foram avaliados pelas autoridades de todos os países. Os resultados de tais avaliações são, no seu conjunto, positivos e confirmam a eficácia do recurso aos sistemas de PNR.
Na preparação da sua proposta relativa ao PNR europeu, a Comissão esteve em contacto estreito com as autoridades policiais dos Estados-Membros. E a Comissão foi claramente convencida pela prova fornecida pelos Estados-Membros. A maior parte das provas têm origem em informações confidenciais e não podem ser partilhadas abertamente. O Parlamento procedeu a uma audição sobre o PNR, durante a qual quatro Estados-Membros e três países terceiros apresentaram a sua utilização do PNR e testemunharam o seu êxito. No entanto, dada a natureza confidencial e sensível dessas informações, a audição realizou-se à porta fechada.
Gostaria de dizer algumas palavras sobre os métodos automatizados de análise, pois trata-se de uma questão que, sem qualquer dúvida, se coloca. É um facto que o PNR é, normalmente, analisado automaticamente com base nos indicadores de riscos, mas insisto no seguinte ponto: a Comissão quer a garantia de que tal análise automatizada nunca conduzirá a uma decisão que afecte directamente o indivíduo. O resultado da análise automatizada deve sempre ser analisado uma segunda vez, manualmente, por um oficial especializado.
A proposta da Comissão sugere que os dados PNR sejam utilizados para impedir e combater o terrorismo e a criminalidade organizada, e, nomeadamente - facto que os senhores reconheceram -, o tráfico de droga e de seres humanos. Acrescento que o PNR poderia ser útil no combate contra outros crimes graves, sem ter nada a ver com a criminalidade organizada. Contudo, limitámos a proposta à criminalidade organizada por razões de proporcionalidade.
Alguns Estados-Membros consideram que o PNR pode, de uma forma geral, ser utilizado para combater a imigração ilegal, para apoiar a saúde pública e para a segurança aérea. No combate à imigração clandestina, o PNR seria útil pois, de facto, dispõe de dados muito mais rapidamente do que os dados relativos às informações antecipadas sobre os passageiros (API). Na segurança aérea, o PNR poderia ser útil se o sistema de PNR desse a possibilidade de recusar o embarque a um potencial terrorista ou a um criminoso, mas a proposta da Comissão não dá esses poderes.
Relativamente à saúde pública, o PNR poderia ser útil na prevenção de doenças potencialmente epidémicas. Se um passageiro descobre que tem uma doença potencialmente epidémica, o PNR pode ser utilizado para comunicar com os restantes passageiros do mesmo avião e aconselhá-los. Mas, mais uma vez, a proposta da Comissão não foi a esse ponto porque a proporcionalidade não estava demonstrada. Lamento sinceramente não estar totalmente de acordo convosco, mas parece-me que as finalidades descritas na proposta são suficientemente concretas para assegurar uma segurança jurídica, aliás desejável.
Os senhores referiram também a subsidiariedade e interrogaram-se sobre se era necessária uma iniciativa da União Europeia. A Comissão considera necessária essa proposta da União Europeia. Três Estados-Membros já publicaram uma legislação nacional sobre o PNR, e diversos Estados-Membros utilizam já o PNR de outras formas. Uma comparação dos sistemas mostra muitas divergências no que respeita tanto às obrigações impostas às transportadoras, como às finalidades.
Tais divergências complicam a vida dos passageiros e levantam, evidentemente, problemas às transportadoras. A proposta aspira portanto a harmonizar as obrigações das transportadoras e a fornecer regras uniformes aos Estados-Membros que utilizam o PNR, e, simultaneamente, a obrigá-los a respeitar os nossos mecanismos de protecção dos dados.
Além disso, a proposta permitirá uma cooperação mais eficaz entre as polícias. Sobretudo, a Comissão pensa que, nos tempos actuais, o terrorismo internacional e a criminalidade representam ameaças graves, que têm de ser tomadas medidas para resolver esses problemas, respeitando simultaneamente, como é óbvio, os direitos humanos e os direitos fundamentais.
Os senhores referiram também a escolha de uma arquitectura descentralizada para a recolha de dados, dizendo: «Mas será que, ao escolhermos um sistema descentralizado, não estamos a perder o nosso direito de consulta?». A Comissão analisou a alternativa entre um sistema centralizado e uma arquitectura descentralizada e, durante as consultas aos Estados-Membros, tornou-se evidente que o tratamento dos dados PNR exige a utilização de informações muito sensíveis com origem na recolha. Então, os Estados-Membros, como é óbvio, não se sentiram dispostos a partilhar essa informação com uma unidade de PNR central europeia.
É um facto que um sistema centralizado seria mais barato, teria algumas vantagens, mas, por uma questão de realismo político, optámos por uma arquitectura descentralizada. Do ponto de vista da protecção dos dados, a opção descentralizada pode permitir também, a cada Estado-Membro, estabelecer cláusulas de salvaguarda claras relativas ao acesso e à troca de dados.
Para terminar, Senhor Presidente - pedindo desculpa por me ter alongado, mas era importante -, passo agora à questão do controlo democrático por parte do Parlamento Europeu e dos parlamentos nacionais. A Comissão refere, evidentemente, que a sua proposta será adoptada em conformidade com um processo de consulta. A Comissão pretende manter um contacto apertado convosco, Parlamento Europeu. Os parlamentos nacionais serão largamente associados ao processo, pois a proposta é ou será analisada na maioria dos parlamentos nacionais. As autoridades de protecção dos dados serão associadas ao sistema de PNR e incumbidas do controlo independente dos sistemas.
Eis a razão por que, Senhora Relatora, Senhora Deputada Sophia in 't Veld, reconheço que as suas objecções são sérias. Esforcei-me por lhe responder honestamente. Todavia, penso que este quadro europeu é útil se não queremos que, neste domínio, todos os Estados-Membros enveredem por um caminho totalmente divergente no que respeita ao PNR e, seguramente, com o risco de não respeitarem um certo número de regras sobre a protecção dos dados.
Quanto à utilidade, é um facto que há que definir muito bem as utilizações, que prestar muita atenção ao bom uso desses dados, mas é também um facto que, na luta contra a criminalidade organizada, precisamos tanto de ser mais eficazes que tenho tendência para pensar que não devemos negligenciar qualquer meio suplementar. Eis o que quis dizer, muito simplesmente, em resposta às vossas interpelações, que ouvi com muito cuidado.
Presidente . − Gostaria de agradecer sinceramente à relatora pela sua introdução e pela explicação pormenorizada. Gostaria igualmente de informar a relatora de que, embora seja determinada pelo Parlamento Europeu, a ordem do dia é proposta pela Conferência dos Presidentes. A decisão sobre o lugar que cada ponto ocupa na ordem do dia determina se um representante do Conselho estará ou não presente. Na Conferência dos Presidentes não foi sugerido que este ponto fosse incluído num dia diferente, que não fosse segunda-feira. Regra geral, os representantes do Conselho não estão presentes nos nossos debates de segunda-feira. Por conseguinte, se a relatora tiver comentários a fazer relativamente a esta matéria, sugiro que os dirija ao líder do seu grupo, o qual poderia ter intervindo mas não o fez. Assim, hoje não está presente qualquer representante do Conselho, mas isso não representa qualquer desrespeito em relação ao Parlamento Europeu. As razões desta ausência são de natureza processual.
Sophia in 't Veld (ALDE). - (EN) Senhor Presidente, gostaria de responder, sucintamente, ao que acaba de dizer, pois considero que se trata de uma questão de cortesia e também de interesse político do Conselho estar presente, e tenho a certeza de que podiam prescindir de um ministro para vir até a esta Assembleia. Já houve debates nos últimos dois meses em que o Conselho esteve presente mas deixou o debate a meio.
Em minha opinião, isso é inaceitável e não me cabe a mim informar o meu grupo dessa situação. Cabe à Presidência desta Assembleia transmitir o nosso descontentamento à Presidência da União Europeia.
Presidente . − Muito obrigado. Tomei nota da sua insatisfação. No entanto, queira fazer o favor de dirigir qualquer queixa ao líder do seu grupo, o qual poderia ter assegurado o debate deste ponto na presença de um representante do Conselho. Contudo, não o fez. Não coloquei qualquer questão à senhora relatora, mas entendo que tenha comunicado as suas preocupações.
Philip Bradbourn, em nome do Grupo PPE-DE. – (EN) Senhor Presidente, como é óbvio, os Registos de Identificação de Passageiros não são um conceito novo para a segurança da aviação. Esta Assembleia já debateu, por muitas e diversas vezes, as deficiências e méritos dos mesmos.
Em geral, as minhas preocupações – independentemente de o sistema ser estabelecido entre os EUA, Canadá, Austrália ou no quadro da UE em geral – são: quem irá utilizar estes dados, para que serão utilizados e como serão protegidos? Na minha opinião, os sistemas PNR são um instrumento válido no combate ao terrorismo, mas há que garantir que o sistema não se converte, pura e simplesmente, numa outra ferramenta para conservar informações sobre os cidadãos. O objectivo dos PNR deverá ser o combate ao terrorismo, e devo dizer – lamento imenso – que o senhor Comissário, na sua intervenção introdutória, não me ofereceu garantias de que os objectivos se limitariam a esse aspecto em particular, como todos nós procuramos que seja. Deverão destinar-se exclusivamente a organizações cuja missão seja o combate ao terrorismo. As medidas contra o terrorismo não podem passar a ser uma desculpa para um sistema de recolha generalizada de dados pessoais. No fundo, cumpre-nos assegurar que estes sistemas não se desviam do objectivo para que foram concebidos, a saber, ajudar os serviços de segurança a identificar e a colocar debaixo de mira pessoas que constituem a grande ameaça.
Vejo com bons olhos os sistemas PNR, no quadro da nossa abordagem à luta contra o terrorismo, mas, também considero que é imperioso usarmos de flexibilidade nas nossas negociações com países terceiros. Cumpre-nos analisar a importante questão da protecção dos dados relativos aos cidadãos da UE e se – e em que moldes – esta informação é transmitida a outros.
Assim sendo, exorto esta Assembleia a encarar com seriedade a questão dos PNR, no quadro de um instrumento global para tornar os nossos céus mais seguros. Enquanto abordarmos a questão de forma proporcionada e reduzirmos o potencial de utilização indevida, os PNR poderão ser um instrumento vital para proteger o passageiro inocente e desmontar o potencial terrorista. Em conclusão, pessoalmente, sempre disse que estes sistemas me fariam sentir mais seguro a 35 000 pés de altura.
Roselyne Lefrançois, em nome do grupo PSE. - (FR) Senhor Presidente, estamos a debater hoje duas questões distintas: o acordo União Europeia-Austrália sobre a transmissão dos dados dos passageiros - PNR - e a criação de um PNR europeu. O acordo celebrado com a Austrália parece-nos muito mais aceitável do que outros acordos celebrados com outros países terceiros. É particularmente positivo o facto de os dados serem fornecidos anónimos e de a sua transferência e a sua posterior utilização serem limitadas.
Estamos particularmente satisfeitos com o facto de as autoridades australianas terem confirmado a inutilidade de recolher dados sensíveis como, por exemplo, as preferências alimentares. Contudo, mantemos alguns medos, pois a finalidade para a qual os dados podem ser utilizados está mal delimitada. O tempo de conservação dos dados e o número de dados exigidos parecem-nos também excessivos.
Por fim, considero essencial definir mais claramente a protecção dos dados de que beneficiarão os cidadãos europeus. Além disso, pedimos ao Conselho e aos Estados-Membros que reforcem o controlo democrático associando o Parlamento Europeu antes de os acordos serem finalizados.
As questões levantadas pelo acordo com a Austrália reflectem os problemas colocados pela criação de um PNR europeu. Não podemos contentar-nos em reagir a pedidos de países terceiros. A União Europeia deve dar o exemplo e proteger a sua tradição de protecção da vida privada. Recusamo-nos, pura e simplesmente, a decalcar o acordo PNR celebrado com os Estados Unidos a nível da União. Temos de realizar um debate aberto para saber se a utilização dos dados PNR é realmente útil e, se for esse o caso, em que condições.
Sarah Ludford, em nome do Grupo ALDE. – (EN) Senhor Presidente, compreendi que há uma nova regra, pelo menos para a Presidência do Conselho, a saber, não vêem às segundas-feiras! Sendo eu alguém que vem a Estrasburgo sem nenhuma vontade, gostaria muito que essa regra também se aplicasse a mim.
Como disse a relatora, os regimes para fazer uso dos dados PNR não são claros e não oferecem certeza jurídica, além de se incorrer no risco de parecer que estamos perante um Estado que controla em seu próprio benefício. A minha preocupação específica reside na prática de extracção de dados, bem como na definição de perfis de identidade e comportamentais. À parte questões de legitimidade e eficácia, preocupa-me o que acontecerá com uma pessoa seleccionada para ser objecto de uma atenção especial.
Isto poderá acontecer por se ter estado associado a alguém com interesse para a polícia. O Vice-Presidente Barrot diz que as acções no âmbito da aplicação da lei não podem ser desenvolvidas apenas com base no tratamento automatizado dos dados, mas o que acontece à primeira selecção de alguém que eventualmente poderá ter interesse investigar? Precisamos de ter uma garantia absoluta de que o rastreio de dados é apagado.
Se os dados são partilhados e armazenados, os perigos de uma sorte lamentável, como aconteceu a Maher Arrar, submetido a torturas durante sete meses depois de ser apanhado no aeroporto JFK, não podem ser vistos como imaginários.
Kathalijne Maria Buitenweg, em nome do grupo Verts/ALE. – (NL) Senhor Presidente, gostaria de responder às palavras do senhor deputado Bradbourn. Eu também não sou contra os Registos de Identificação de Passageiros (PNR) em si mesmos, muito embora, até certo ponto, dê essa impressão. O que interessa, e a esse respeito estou absolutamente de acordo com a relatora, é que é necessário ponderar cuidadosamente o modo como fazer melhor uso deste instrumento e quando se encontram realmente definidas utilidade e necessidade.
Neste contexto, gostaria de apresentar outra proposta à Comissão. O Senhor Comissário Barrot declarou que gostaria muito de trabalhar com o Parlamento Europeu, coisa que, pessoalmente, muito aprecio. Todavia, quando se trata de utilidade e necessidade, ainda temos de atar algumas pontas soltas, que creio serem o verdadeiro cerne do debate entre a Comissão, o Conselho e o Parlamento sobre este assunto.
Senhor Comissário, V. Exa. afirma que tem toda uma resma de avaliações que demonstram o elevado grau de utilidade. Tanto quanto sei, baseada no que li sobre o assunto, o PNR proporciona sobretudo informações sobre a migração e soluciona algumas questões, mas, pelo que me é dado entender, não fez realmente o que quer que seja em prol da luta contra o terrorismo. Terei todo o gosto, porém, em examinar esse assunto com o Senhor Comissário em qualquer altura.
Queria, portanto, sugerir que se efectue um estudo e que o Senhor Comissário se sente connosco à mesa para determinar a questão do estudo, que mandemos levar a cabo esse estudo e que depois o discutamos em pormenor. Em princípio, nada temos contra o PNR, mas queremos que os registos sejam tratados com cuidado, na linha dos princípios da nossa política de privacidade. Espero que o Senhor Comissário queira apoiar isto. Será que pode responder a esta questão?
Quanto ao acordo do Senhor Comissário com a Austrália, ele pode muito bem ser muito melhor do que outros acordos, como, por exemplo, o acordo com os Estados Unidos. No entanto, a questão que se põe é: que outros acordos estão ainda em preparação? O Senhor Comissário afirmou há momentos que, aconteça o que acontecer, nada disto devia cair nas mãos de autoridades repressivas. A esta luz, parto do princípio de que jamais iremos negociar com a Rússia ou a China. Em todo o caso, será que o Senhor Comissário pode confirmar isto, e talvez proporcionar-nos uma lista dos países com que já estão em curso negociações, de que não teremos conhecimento senão daqui a alguns meses?
Giusto Catania, em nome do Grupo GUE/NGL. – (IT) Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, os argumentos do Comissário Barrot não me convenceram de que haja um benefício real na utilização destes dados PNR. Ainda não há provas claras de que estes dados podem dar um contributo concreto para a luta contra o terrorismo e o crime organizado.
O facto é que, neste frenesim de identificar presumíveis terroristas, todos se tornaram suspeitos. Creio que alguns pontos precisam de ser esclarecidos no que se refere à utilização dos dados que serão recolhidos e à forma como vão ser tratados. Em contrapartida, assistimos muitas vezes – com base nas informações que temos à nossa disposição – a uma actividade arbitrária e indiscriminada em que os dados são frequentemente passados de mão em mão e nem sempre são transferidos correctamente.
Creio que esta ânsia de extorquir informações não ajuda à salvaguarda da nossa protecção pessoal. A precedência indevida da segurança sobre a liberdade resultou frequentemente na eliminação das garantias dos nossos direitos.
Carlos Coelho (PPE-DE). - Senhor Presidente, quero falar sobretudo sobre o acordo com a Austrália, quero felicitar a colega in 't Veld pelo excelente trabalho que fez no relatório e cumprimentar o Vice-Presidente Barrot pela boa negociação feita pela Comissão Europeia. O acordo com a Austrália é globalmente positivo. É um bom exemplo do imenso caminho que já se percorreu desde o início das primeiras discussões relativamente à questão PNR. O Parlamento Europeu considerou, então, inaceitável que houvesse lugar a transmissão de dados PNR se não fossem dadas garantias do nível de protecção de dados adequado e um respeito pelas regras comunitárias em vigor.
O presente acordo dá resposta à maioria das preocupações que levantámos e garante um nível adequado de protecção de dados. Primeiro, porque os cidadãos da União verão assegurada, por parte da lei australiana, a protecção da sua privacidade; segundo, porque está previsto um sistema que garante às pessoas, independentemente da sua nacionalidade ou residência, exercerem os seus direitos e terem acesso a um mecanismo de resolução de litígios - existe mesmo a possibilidade de haver a suspensão do afluxo dos dados no caso de incumprimento do acordo por parte das autoridades de protecção de dados; em terceiro lugar, a obrigação de uma reavaliação conjunta envolvendo as autoridades responsáveis pela protecção de dados; e, em quarto lugar, na questão dos dados sensíveis, folgo muito, congratulo-me pelos serviços aduaneiros declararem especificamente que não querem, nem necessitam, de dados de natureza sensível e concordo com a colega in 't Veld que isto é um bom exemplo para outros Estados.
Senhor Vice-Presidente da Comissão, não posso de deixar de lamentar que, quer o Conselho, quer a Comissão, não tenham cumprido a promessa feita neste plenário de manterem uma cooperação estreita com o Parlamento Europeu nesta matéria. Registo a declaração do Comissário Barrot de que no futuro isso não vai acontecer, mas a verdade é que mais um acordo foi concluído sem que o Parlamento tenha sido, em qualquer momento, informado, quer aquando da adopção do mandato, quer aquando da conclusão do acordo. Num acordo que afecta de forma tão directa os direitos fundamentais dos cidadãos, é essencial que haja legitimidade democrática. Ela não pode ser compensada por uma apreciação a posteriori e através de uma aprovação parlamentar a nível nacional uma vez que, como o Senhor Comissário bem sabe, este controlo nacional só está previsto em apenas 10 dos 27 Estados-Membros.
Até que o Tratado de Lisboa entre em vigor e o Parlamento Europeu possa ser associado de forma equitativa ao processo de revisão dos acordos relativos ao PNR esperemos que, pelo menos, o princípio da cooperação leal entre as instituições possa ser respeitado e esse é o meu apelo.
Stavros Lambrinidis (PSE). - (EL) Senhor Presidente, a propósito dos PNR europeus, o Senhor Comissário fez uma afirmação chocante: disse na sua proposta que se recusa a solicitar informações sobre passageiros estrangeiros que viajam para a Europa relativamente a questões como a imigração ilegal ou doenças, porque considera que isso não seria proporcionado.
Nesse caso, por que razão assinou um acordo com os Estados Unidos que permite facultar à administração norte-americana precisamente esse tipo de informação sobre cidadãos europeus? Basicamente, o Senhor Comissário admitiu que o acordo UE-EUA viola o princípio europeu da proporcionalidade.
O Senhor Comissário disse ainda outra coisa que é inexacta: repetiu diversas vezes no seu discurso que os dados PNR são úteis, mas não demonstrou como. Ora, a legislação europeia exige que esses dados sejam não só úteis mas também necessários. Se houve alteração na legislação europeia, diga-nos. Se não houve, então, é seu dever demonstrar que os PNR são necessários e não apenas úteis.
No que respeita à Austrália, que sentido faz debatermos hoje um acordo PNR com a Austrália que já foi celebrado e assinado? Esta não é uma pergunta teórica. Como é sabido, no caso dos Estados Unidos, ainda a tinta do acordo PNR nem tinha secado e já andavam a pressionar cada um dos países europeus e a regatear ainda mais informação do que a prevista no acordo PNR em troca da sua inclusão no famoso programa de isenção de vistos (Visa Waiver). Essa informação e esses dados pessoais estavam a ser solicitados fora dos limites estabelecidos no acordo PNR, limites que, embora sejam muito ténues, pelo menos existem.
Ainda há dois dias, numa cerimónia pomposa, o Presidente Bush admitiu a inclusão de seis países europeus nesse programa, mas declarou que não admitiria outros seis, entre os quais a Grécia. A pressão clara que está a ser exercida sobre determinados países europeus para que aceitem condições contrárias à sua Constituição e às suas leis, ou, pior ainda, para que adaptem a sua política externa aos desejos de um país terceiro – como ouvimos dizer no caso da Grécia – requer uma investigação imediata por parte da Comissão e uma intervenção e denúncia por parte do Conselho, o qual, infelizmente e para sua vergonha, não está hoje aqui presente.
Dumitru Oprea (PPE-DE). – (RO) A maneira como se fazem tentativas para reunir dados pessoais com vista a impedir a ocorrência de potenciais problemas ou incidentes pessoais (como afirmou, de facto, o Comissário Barrot: "a luta contra terroristas, crimes graves... coisas que poderão acontecer, não coisas que já aconteceram") representa uma violação gritante dos direitos humanos, para já não falar numa infracção da legislação nesta área no que respeita à protecção de dados pessoais e à livre circulação destes dados.
Consideramos que quando alguém toma decisões por outra pessoa, isso deve ser considerado à partida como uma violação dos direitos humanos ou então deve ficar acordado que a pessoa em questão tem de dar o seu consentimento, e isso apenas com base no pressuposto de que não haverá riscos para a segurança de terceiros. Esta estratégia do tipo castelo medieval apresentada durante a nossa discussão contradiz a estratégia utilizada em aeroportos, onde são utilizados sistemas abertos e seguros.
Silvia-Adriana Ţicău (PSE). – (RO) A decisão de criar um registo que contenha dados relativos aos passageiros refere que esses dados serão transmitidos no caso de voos da UE para países terceiros com os quais a União Europeia tenha assinado acordos sobre a protecção de dados pessoais. Senhor Comissário, V. Exa. referiu o facto de alguns Estados-Membros já terem executado a legislação específica a nível nacional. É importante que esta legislação seja aprovada de forma democrática, o que significa com a participação dos parlamentos nacionais.
Gostaria de chamar a sua atenção para o facto de que a legislação de um Estado-Membro afecta, efectivamente, a este respeito, os cidadãos de outros Estados-Membros. Por exemplo, se um cidadão romeno, para voar para a Austrália, necessitar de seguir uma rota internacional que parta de outro Estado-Membro, o cidadão romeno deverá ter conhecimento da legislação em vigor nesse Estado-Membro e, em particular, deverá dar o seu consentimento para que os seus dados pessoais sejam recolhidos e tratados. Tanto quanto sei, o Parlamento Europeu deverá ser chamado a participar, através do procedimento de comitologia, nos acordos que a Comunidade assina com países terceiros nesta área.
Manfred Weber (PPE-DE). – (DE) Senhor Presidente, gostaria apenas de tecer dois breves comentários. Em primeiro lugar, gostaria de solicitar ao Senhor Comissário que transmitisse a preocupação hoje aqui expressa aos Ministros da Administração Interna. Disseram-nos que os dados PNR nos oferecem oportunidades de combater a criminalidade. Com efeito, essa afirmação foi feita por muitos aqui no Parlamento. No entanto, a questão que nos preocupa é saber se é uma medida proporcionada. Estamos a armazenar milhões, ou mesmo milhares de milhões de dados durante 10 anos, por conta, talvez, de uma dezena de casos. Será proporcionado? É essa a preocupação que todos nutrimos.
O meu segundo comentário é o seguinte: não compreendo por que razão estamos a adoptar um sistema de dados PNR europeu. A proposta sobre a mesa envolve o desenvolvimento de 27 sistemas nacionais de dados PNR, e não de um sistema europeu de dados PNR. Se há Estados-Membros com uma necessidade tão premente deste instrumento para lutar contra a criminalidade, então sugerimos que os seus Ministros da Administração Interna se desloquem aos respectivos parlamentos nacionais para o discutirem e implementarem a esse nível. Discutir normas comuns para os dados é uma coisa – mas fazer disso um objectivo obrigatório para o Conselho «Justiça e Assuntos Internos» é outra. Pessoalmente, pressinto que os Ministros da Administração Interna não foram capazes de fazer avançar este dossiê a nível interno, a nível nacional, e, consequentemente, tentam agora fazê-lo através do Conselho. Por conseguinte, temos de dizer «não».
Bogusław Liberadzki (PSE). – (PL) Senhor Comissário Barrot, embora já não seja Comissário dos Transportes, congratulo-me com a oportunidade de debater este assunto consigo. De qualquer forma, o facto de ter trabalhado consigo durante esse período deixou-me excelentes recordações. Contudo, relativamente à transferência de dados, recordo as nossas discussões no seio da Comissão dos Transportes e do Turismo, onde abordámos temas como a segurança dos viajantes e a protecção dos dados pessoais para impedir que caiam em mãos erradas. Estas são questões decisivas. É por essa razão que considero que a divulgação dos dados, as circunstâncias e os receptores dos dados, o princípio da acessibilidade e os objectivos devem ser essenciais para este acordo.
Para nós, é sempre uma questão delicada lidar com os Estados Unidos. Sabemos que é um país importante. Contudo, apelo a que tenha em conta que os cidadãos europeus passam frequentemente por situações incómodas nos aeroportos. Não devemos esquecer esse facto. Obrigado.
Luis de Grandes Pascual (PPE-DE). – (ES) Senhor Presidente, Senhor Comissário, o terrorismo e a criminalidade grave organizada são fenómenos globais. Por conseguinte, os meios para os combater têm de ser proporcionais e eficazes.
Tomei boa nota das respostas que foram dadas às perguntas. Estas repostas foram muito acertadas: é verdade que é preciso exigir garantias e que essa é uma questão delicada. No entanto, também é verdade que é absolutamente indesculpável dar uma resposta globalizada e harmonizada.
As pessoas que vivem algo distanciadas do terrorismo estão mais preocupadas com as garantias individuais. Eu preocupo-me tanto com as garantias individuais como com as colectivas. É absolutamente vital que comecemos por onde pudermos. Se tivermos de começar pelo transporte aéreo, visto que as transportadoras já dispõem desses dados, então é por aí que devemos começar.
Vamos exigir garantias, vamos examinar o âmbito de aplicação e vamos começar pelos transportes internacionais. No entanto, cumpre observar que depois passaremos aos transportes domésticos, pois em muitos casos os terroristas não vêm de fora, mas de dentro. Perguntem-no aos Estados Unidos e a todos os demais; a realidade é esta e é assim que vamos ter de lidar com ela no futuro.
Jacques Barrot, Vice-Presidente da Comissão. - (FR) Senhor Presidente, agradeço a todos os deputados que se manifestaram e posso garantir-lhes que não deixarei de estar presente no Conselho que se realizará esta semana, onde transmitirei as observações aqui apresentadas.
Antes de mais, gostaria de recordar que pensamos que a utilidade do PNR não pode ser negligenciada no quadro da luta contra o terrorismo e da luta contra a criminalidade organizada. Alguns de vós reconheceram-no honestamente. Assim, não podemos passar sem este PNR, e devo dizer-lhes que o Comissário responsável pela luta contra a criminalidade organizada não está disposto a dispensar meios úteis. Mas há que fazer bom uso deles e, aqui, estou de acordo convosco: finalidade e proporcionalidade. Trata-se de cumprir a finalidade; assim, é preciso - como disse, aliás, a senhora deputada Sophia in 't Veld - que a finalidade seja concretizada e a proporcionalidade garantida. Relativamente a este ponto, quero responder ao senhor deputado Stavros Lambrinidis, que foi muito veemente: no acordo Estados Unidos/Europa, a finalidade é o terrorismo e a criminalidade. Ponto final parágrafo. O primeiro ponto, portanto: proporcionalidade e finalidade.
Fui muito sensível àquilo que muitos de vós disseram, Senhora Deputada Sarah Ludford, sobre a necessidade de eliminar os dados a partir do momento em que foram utilizados para o objectivo com que foram recolhidos. Tem toda a razão sobre esse ponto, há que evitar todo e qualquer tipo de armazenamento que possa mais tarde prestar-se a usos inaceitáveis no que respeita aos nossos direitos fundamentais.
Gostaria agora de me debruçar sobre o controlo democrático, antes de mais sobre as negociações com os países terceiros. Temos de ser muito claros, os artigos 24.º e 38.º da União Europeia estabelecem que, nas negociações internacionais, a Presidência conduzirá as negociações, assistida, eventualmente, pela Comissão. O artigo 24.º não obriga a Presidência a informar ou consultar o Parlamento, pelo que cabe à Presidência decidir, eventualmente, informar o Parlamento do desenrolar das negociações. Dito isto, a Comissão, após consulta da Presidência, e se surgir uma ocasião apropriada, pode manter o Parlamento ao corrente dos desenvolvimentos de tais dossiês. Posso garantir-lhes que, para já, nenhum outro país pediu uma negociação PNR, pelo que as coisas estão claras. Se fosse esse o caso, ao envolver-me em mais uma negociação enquanto novo Comissário neste domínio, estaria muito atento para solicitar à Presidência que esta me autorizasse a manter ao corrente a vossa comissão competente sobre o andamento das negociações. Quero assumir esse compromisso perante vós.
Em terceiro lugar - o senhor deputado Henri Weber acaba de o referir - 27 sistemas nacionais, sim, mas sistemas nacionais que não sejam demasiado divergentes entre si, e os parlamentos nacionais foram consultados nesse sentido. Tanto quanto sei, os parlamentos nacionais tiveram ocasião de se pronunciar e de nos enviar as suas observações. Tenho plena consciência, Senhor Presidente, de não estar a responder a todas as observações, mas algumas observações justificadas serão evidentemente tidas em conta. O que penso é que, digamos que não podemos prescindir - e estou a interpretar, de facto, o espírito do debate - de um meio à nossa disposição, se esse meio pode ser útil. Alguém afirmou que essa eficácia não ficou demonstrada. É um facto, mas, apesar de tudo, houve testemunhos, e, como já disse há pouco, na informação transmitida aqui no Parlamento, um certo número de testemunhos confirmaram que o PNR podia ser útil. Continuo convencido de que, no combate à criminalidade organizada, pode ser muito útil.
Dito isto, as finalidades têm de ser respeitadas. Há que evitar o armazenamento, pelo que é necessário um controlo muito rigoroso. É por isso que, em minha opinião, devemos associar - como afirmei no final - todos os organismos de protecção de dados. Assisti, na quinta-feira, a um encontro sobre o tema da protecção dos dados organizada pela maior parte dos organismos incumbidos dessa protecção de dados na Europa, e tive de facto a sensação de que passou a existir, nos Estados-Membros, uma preocupação cada vez maior em confiar a autoridades independentes e verdadeiramente susceptíveis de serem ouvidas o cuidado de proteger os dados.
Assim, eis o que queria dizer para concluir este debate extremamente interessante e útil para mim e que transmitirei aos Estados-Membros e aos seus Ministros. Comprometo-me a isso.
Sophia in 't Veld, relatora. − (EN) Senhor Presidente, gostaria de agradecer ao senhor Comissário a sua resposta, e será com todo o gosto que me sentarei com ele para falar de todos estes pormenores. Voltarei muito rapidamente à questão do objectivo, porque há muitas interpretações erradas sobre o que pode, ou não, ser feito com os dados PNR. Hoje em dia, os dados PNR já estão disponíveis sem um sistema PNR na UE, simplesmente com um mandado e uma justificação. Todavia, a necessidade de mais e ilimitados poderes não foi ainda provada. Logo, não contesto a utilidade dos dados PNR em si: contesto a utilidade desta recolha maciça e análise automatizada.
Não sou a única a ter esta opinião; estou bem secundada. As autoridades para a protecção de dados têm o mesmo ponto de vista, mas continuam a ser ignoradas. As transportadoras aéreas dizem-nos o mesmo. Os peritos em segurança dos aeroportos dizem-nos o mesmo, e passo a citar um relatório que foi encomendado pelo Departamento da Segurança Interna – e é com grande satisfação que o faço; diz o seguinte: “a identificação automatizada de terroristas através da extracção de dados ou qualquer outra metodologia conhecida não é viável como objectivo ”. Não fui eu que redigi isto. Trata-se de peritos em matéria de segurança a quem o Departamento de Segurança Interna encomendou um estudo.
Há provas da sua utilidade, como o Senhor disse, Comissário, mas trata-se de uma utilidade no domínio do combate ao tráfico de drogas ou imigração ilegal, ou ainda outros objectivos. Isto poderá surpreender-vos, mas eu nem sequer me oponho, em princípio, à utilização dos dados PNR para esses efeitos. Contudo, temos de ser muito rigorosos na definição dos objectivos de modo a assegurar proporcionalidade e garantir salvaguardas jurídicas adequadas.
Gostaria de concluir com uma nota muito pessoal. Desagrada-me bastante a forma como temos discutido a questão dos PNR ao longo já de cinco anos, com um Conselho e uma Comissão que dirigem o curso das coisas, mas adoptando uma atitude fugidia. Gostaria de dizer aos meus colegas, cidadãos irlandeses da UE que se partilham do meu desejo de acabar com este processo decisório não democrático e sem transparência, então, por favor, digam “sim” ao novo Tratado.