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Processo : 2009/2509(RSP)
Ciclo de vida em sessão
Ciclos relativos aos documentos :

Textos apresentados :

RC-B6-0037/2009

Debates :

PV 15/01/2009 - 10.2
CRE 15/01/2009 - 10.2

Votação :

PV 15/01/2009 - 11.2

Textos aprovados :

P6_TA(2009)0030

Relato integral dos debates
Quinta-feira, 15 de Janeiro de 2009 - Estrasburgo Edição JO

10.2. Guiné
Vídeo das intervenções
PV
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  Presidente. – Segue-se na ordem do dia o debate sobre seis propostas de resolução relativas à situação na Guiné(1).

 
  
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  Marios Matsakis, autor. − (EN) Senhor Presidente, a Guiné tem tido uma história muito agitada, estando os países europeus envolvidos, de uma maneira ou de outra, no seu trágico passado. Ocupada pelos portugueses no século XV, os seus cidadãos foram sujeitos ao comércio esclavagista no século XVI, que depois se prolongou. Em 1890, foi colonizada pela França. Depois da independência, em 1958, estabeleceram-se fortes laços com a União Soviética. O período pós-colonial foi largamente dominado pelo totalitarismo presidencial, sendo os seus dirigentes apoiados por um exército reconhecidamente bastante rudimentar.

A Guiné, embora abençoada com grandes riquezas minerais, nomeadamente ferro, alumínio, ouro, diamantes e urânio, é um dos países mais pobres do mundo. Estes minérios estão a ser explorados por companhias da Rússia, Ucrânia, França, Grã-Bretanha, Austrália e Canadá.

É conhecida a ocorrência de uma grande corrupção entre os seus funcionários, e os governos dos países a que pertencem essas companhias parecem preocupar-se muito pouco com o bem-estar dos cidadãos da Guiné, e só começam a queixar-se da chocante situação dos direitos humanos no país quando os seus interesses financeiros são afectados ou ameaçados.

Porém, presentemente há outro ditador no poder na Guiné, um jovem oficial do exército, o capitão Camara. Este lidera uma junta militar, que se comprometeu a libertar o país da corrupção e a melhorar os padrões de vida dos seus dez milhões de cidadãos. Para esse fim, foi constituído um Conselho Nacional para a Democracia e o Desenvolvimento, com 32 membros, para governar o país.

Não faço ideia se o capitão Camara é sincero nos seus intentos, ou se conseguirá melhorar a situação na Guiné. Mas uma coisa é certa: as coisas não podem ficar piores do que têm estado nas últimas décadas, durante as quais a Europa e o resto do mundo se contentaram em ficar de braços cruzados, a ver e a desfrutar dos benefícios da exploração mineral da Guiné. Assim, embora a priori eu me oponha às ditaduras militares, resta-me esperar que, num curto espaço de tempo, possa ocorrer uma transição para a democracia.

 
  
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  Jean-Pierre Audy, autor. - (FR) Senhor Presidente, caro Comissário Vladimir Špidla, caros colegas, em 22 de Dezembro de 2008, o Presidente da República da Guiné, Lanzana Conté, morre com 74 anos. Nessa noite de 22 para 23 de Dezembro, os seus parentes mais próximos afadigam-se para organizar um poder interino, rodeados de rumores de golpe de Estado.

Nesse momento exacto, serão sinceros esses homens que dirigem um país considerado pela Transparency International como um dos mais corruptos do mundo e que se apoiam num Estado de direito e numa democracia que nunca existiu verdadeiramente? Nesse preciso momento, pensarão eles que um simples oficial responsável pelo aprovisionamento de combustível do exército poderá tomar o poder? Nesse preciso momento, não terão lamentado terem trabalhado insuficientemente para instaurar um verdadeiro Estado de direito e uma verdadeira democracia, que teria permitido organizar essas preciosas eleições no prazo de 60 dias estipulado na Constituição?

Se o lamentaram, o capitão Moussa Dadis Camara e os seus amigos vão transformar, em poucas horas, esse lamento em remorso. Nessa quarta-feira, 24 de Dezembro, o capitão desconhecido proclama-se Presidente da República, é ovacionado por milhares de guineenses, e ostenta publicamente, em 25 de Dezembro, o apoio do governo civil., que se submete ao seu ultimato. Promete combater a corrupção e organizar eleições até 2010. Nomeia um homem sério para Primeiro-Ministro, um funcionário internacional deslocado no Egipto. Constata com satisfação que ninguém na Guiné o condena; os partidos políticos da oposição e a sociedade civil tomam nota da nova situação.

Nestas condições, será de condenar o golpe de Estado? Sim, caros colegas, devemos condená-lo! O Grupo do Partido Popular Europeu (Democratas-Cristãos) e dos Democratas Europeus, em nome do qual tenho a honra de falar, condena este golpe de Estado, embora não sejamos ingénuos e saibamos que as soluções políticas para sair de uma ditadura nunca são simples. Apelamos ao voto favorável à proposta de resolução comum apresentada pelos seis grupos políticos.

 
  
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  Erik Meijer, autor. (NL) Senhor Presidente, em 15 de Fevereiro de 2007, debatemos com carácter de urgência a violência de estado do ditador Lansana Conté, na Guiné. Este ditador chegou ao poder na sequência de um golpe de Estado, em 1984, e desde então tem-se mantido no poder. Considerava o país sua propriedade privada, com particular significado devido aos seus depósitos naturais de ouro, ferro e bauxite. A maior parte dos partidos não participou nas eleições organizadas sob o seu controlo, e a oposição oficial, temporariamente representada no parlamento, foi mais tarde forçada a partir.

Na sequência disso, as confederações sindicais CNTG e USTG tornaram-se as principais forças na luta pela democracia. A força de segurança presidencial, encabeçada pelo filho do ditador, respondeu à sua manifestação de protesto em 22 de Janeiro de 2007, matando 59 pessoas e ferindo outras 150.

Este regime terrível terminou inesperadamente quando o ditador morreu, em Dezembro do ano passado. A junta elevou um banqueiro a seu Primeiro-Ministro. A questão agora é saber exactamente que caminho prepara a junta militar que entretanto tomou o poder. Será este golpe de Estado um passo na via da democracia e da igualdade de todos os residentes, ou irá abrir caminho a um novo ditador que, uma vez mais, estará principalmente interessado nos recursos naturais do país e na perspectiva de encher os próprios bolsos?

A reacção do mundo exterior é de confusão. O bloco da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental, CEDEAO, condenou o recente golpe de Estado. O Presidente nigeriano elogia o falecido ditador mas, felizmente, exige uma rápida transferência de poder para um governo democraticamente eleito. A França e o Senegal estão também a exercer pressão para que se realizem eleições no prazo de um ano.

Ao longo dos anos, o meu grupo sempre apoiou as exigências da oposição democrática da Guiné, que parece continuar excluída do jogo. Não condenamos a mudança de poder, mas condenamos a possível continuação de uma falta de democracia no futuro próximo. Não há, por enquanto, razão para penalizar ou isolar a Guiné, mas importa recordar aos novos dirigentes que o seu tempo na ribalta será necessariamente muito curto. O país não precisa de um novo ditador, mas sim da restauração da democracia.

 
  
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  Filip Kaczmarek, em nome do Grupo PPE-DE.(PL) Senhor Presidente, Senhor Comissário, acabou felizmente o tempo, na África Ocidental, em que os golpes militares eram o único meio conhecido de derrubar um governo. Mas apesar da evolução política registada em países que fazem fronteira com a Guiné, nomeadamente a Serra Leoa, a Costa do Marfim, o Senegal e a Libéria, onde regimes militares foram substituídos pela emergência de jovens democracias, a Guiné continua presa no passado. O próprio Presidente que acaba de desaparecer, Lansana Conté, havia tomado o poder num golpe militar, e assiste-se neste momento a um episódio semelhante. Vinte e quatro horas após o anúncio da morte do Presidente, os militares tomaram o poder na Guiné e suspenderam a constituição.

A única boa notícia é a da condenação do golpe por parte de outros Estados africanos e da União Africana. A futura ajuda da União Europeia à Guiné deverá ser condicionada ao restabelecimento da ordem constitucional e à realização de eleições o mais rapidamente possível, as quais deverão ser monitorizadas por organizações internacionais independentes. Se o capitão Camara sonha ser um Obama guineense, terá de reduzir drasticamente a corrupção e a pobreza no país.

 
  
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  Ewa Tomaszewska, em nome do Grupo UEN.(PL) Senhor Presidente, no dia seguinte à morte do Presidente Lansana Conté, a 23 de Dezembro de 2008, uma junta militar, chefiada pelo capitão Camara, tomou o poder na República da Guiné, suspendeu a constituição e o direito de actividade política e dissolveu o governo. A junta declarou guerra à corrupção e anunciou a intenção de realizar eleições presidenciais até Dezembro de 2010, embora a legislação anterior estipulasse, até esse momento, a realização de eleições 60 dias após o termo do mandato.

Não é possível, no entanto, ignorar que a população da Guiné apoia o novo governo. No dia 29 de Dezembro, a União Africana suspendeu das suas actividades a Guiné e impôs ao país um prazo de seis meses para restabelecer a ordem constitucional. O Parlamento Europeu deve exortar o Governo guineense a restabelecer os direitos civis e a realizar eleições presidenciais democráticas no mais breve prazo possível. Espero que a Comissão Europeia forneça ajuda humanitária à população civil e abra um diálogo com o Governo da Guiné.

 
  
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  Charles Tannock (PPE-DE). (EN) Senhor Presidente, o Presidente Lansana Conté foi o arquétipo do homem forte africano, um ditador corrupto que governou o povo da Guiné com mão de ferro. Com efeito, este país nunca desfrutou de uma verdadeira democracia em meio século de independência.

A morte do Presidente Conté proporcionou uma oportunidade para a Guiné virar a página. Mas quaisquer esperanças de transição para uma verdadeira democracia foram eliminadas pelo golpe militar. Como era de esperar, a reacção da União Africana ao golpe foi lamentavelmente frouxa. A UA não pode esperar ser levada a sério pela comunidade internacional enquanto continuar a tergiversar e a adiar. Por que razão o Ocidente se há-de dar a tanto trabalho para resolver este assunto se os governos africanos parecem tão indiferentes?

A UE deve considerar a invocação das disposições do Acordo de Cotonu relativas às sanções. O capitão Camara e os líderes do golpe têm de compreender que a UE espera certos padrões básicos de governação em troca de uma relação de comércio e ajuda. A única via da Guiné para a prosperidade passa por um governo civil democrático.

 
  
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  Zdzisław Zbigniew Podkański (UEN). (PL) Senhor Presidente, Senhor Comissário, assistimos a mais um caso de tomada do poder por um grupo de oficiais. Todas as juntas militares actuam da mesma forma: primeiro efectuam prisões, em seguida a Constituição é suspensa e depois é feito o anúncio de que serão convocadas eleições democráticas. Neste caso, as eleições estão previstas para daqui a dois anos. Na prática, porém, os oficiais começam a mandar no país e cedo descobrem que gostam do exercício do poder, o que inexoravelmente conduz à opressão social e a revoltas, assim como a violações dos direitos humanos e dos princípios democráticos. Temos razões para recear que o mesmo venha a suceder na Guiné, embora todos esperemos que tudo seja diferente desta vez, ou seja, que os acontecimentos evoluam no bom sentido e que o desfecho seja mais positivo.

Espero que o anúncio das decisões tomadas pela Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental e a União Africana, de suspenderem a Guiné das suas actividades, exerça uma determinada pressão e funcione como um apelo ao bom senso. Considerando a situação social, ou seja, o decréscimo constante do rendimento per capita da Guiné, julgo que a União Europeia, através da Comissão Europeia, designadamente, também adoptará medidas adequadas e sensatas, mas igualmente firmes, no sentido de garantir o rápido regresso à normalidade neste país, a bem do povo guineense e a fim de evitar a violação dos direitos humanos e maior violência.

 
  
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  Laima Liucija Andrikienė (PPE-DE). (LT) Hoje estamos a debater o golpe de Estado que ocorreu na Guiné, um dos países mais corruptos de África. Além do mais, a situação económica e social na Guiné não é de modo algum invejável, as condições de vida da população são extremamente duras, faltam alimentos básicos, os direitos humanos são violados de forma notória e tudo isto contribui para a criação de um ambiente favorável à tomada do poder pela via ilegal.

Por outro lado, sabemos muito bem que a tomada do poder através de um golpe militar tornou-se uma tradição na Guiné. Não foram convocadas eleições parlamentares no final da legislatura da Assembleia Nacional há dois anos atrás. Tudo isto constitui, naturalmente, uma preocupação para a comunidade internacional. Em qualquer país, uma situação como esta conduziria, mais cedo ou mais tarde, a motins, a instabilidade e, frequentemente, também a derramamento de sangue.

Concordo, por isso, totalmente com a resolução que estamos aqui a debater e que apela à organização de eleições parlamentares e presidenciais, à observação de normas internacionais e à ajuda da União Africana e da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental. É necessário que sejam garantidas as liberdades de imprensa, de expressão e de reunião antes das eleições, caso contrário estas tornar-se-ão uma farsa eleitoral.

 
  
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  Leopold Józef Rutowicz (UEN). (PL) Senhor Presidente, o golpe de Estado na Guiné obedece ao modelo da maioria dos golpes do mesmo género em África e noutros continentes. Ocorreu imediatamente a seguir à morte do Presidente Conté, que havia tomado o poder 24 anos antes, também na sequência de um golpe. Com efeito, a situação económica e política neste país extremamente pobre é geradora de protestos por parte da população, os quais são depois esmagados pelas forças armadas, que procedem à consolidação de um governo corrupto e à divisão do país entre aqueles que procuram enriquecer e os que continuam a morrer à fome.

Neste contexto, representa um sinal positivo o facto de a União Africana e a Comunidade Económica Africana terem suspendido as relações com a junta. A pressão externa poderá forçar a junta a convocar eleições democráticas. A lição a retirar desta situação é que, para apoiar a democracia em África, a União Africana precisa de um plano de acção, destinado a prevenir golpes que resultam em enormes perdas para os cidadãos desta região extremamente carenciada. Esta resolução merece o meu apoio.

 
  
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  Vladimír Špidla, Membro da Comissão.(CS) Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, à notícia da morte do Presidente da Guiné, Lansana Conté, chegada na manhã do dia 23 de Novembro de 2008, seguiu-se, algumas horas mais tarde, um golpe militar, liderado por uma junta que criou um Conselho Nacional para a Democracia e o Desenvolvimento e declarou a suspensão da Constituição e a dissolução das instituições governamentais.

A Comissão Europeia apoia plenamente a declaração da Presidência da UE que condena esta tomada violenta do poder e exorta as autoridades da Guiné a regressar o mais rapidamente possível a um governo civil, constitucional e democrático. A recepção positiva do regime militar por parte da população guineense, em especial pelos partidos políticos e pelos sindicatos, mostra claramente que os padrões de vida para a população guineense se deterioraram de tal forma que até um golpe militar é considerado uma mudança para melhor e um acontecimento gerador de optimismo para o futuro. Também demonstra que o regime anterior perdeu a confiança do povo guineense ao ponto de este preferir que o governo seja assumido por unidades militares, em vez de sucessores oficiais.

Nesta situação confusa, é importante felicitar as iniciativas rápidas e eficazes tomadas pela Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) e pelo seu Presidente, Mohammed Ibn Chambas, assim como a determinação e firmeza da Comunidade e da União Africana, que suspenderam a participação da Guiné nas suas organizações e condenaram a tomada violenta do poder. A Comissão está decidida a apoiar os esforços da CEDEAO e da União Africana, assim como os seus esforços para permitir o regresso mais rápido possível a um governo civil, constitucional e democrático, através de eleições livres e transparentes.

O desafio que se coloca à comunidade internacional nos próximos meses consiste em apoiar a Guiné na sua transição para a democracia e na organização de eleições livres e democráticas de uma assembleia legislativa e de um presidente.

Senhoras e Senhores Deputados, como sabem, em Março de 2004, decidimos iniciar consultas entre a Guiné e a União Europeia, nos termos do artigo 96.º do Acordo de Cotonu, depois da ocorrência de eleições que não respeitaram os princípios democráticos e violaram elementos fundamentais deste acordo. Houve progressos nos seguintes domínios: eleições gerais a realizar em 2006, liberalização dos meios de comunicação social, mudança do sistema eleitoral a levar a cabo em conjunto pelo governo e pela oposição e melhoria do quadro macroeconómico.

Não estamos a perder a esperança. Estamos firmemente convencidos de que o processo eleitoral iniciado em Outubro do ano passado pode ser retomado com sucesso. Neste momento, está preparada uma missão conjunta da Presidência e da Comissão que partirá para a Guiné esta quarta-feira. A missão inclui grupos da CEDEAO e da União Africana e o seu objectivo consistirá em avaliar a situação no país e propor medidas adequadas para apoiar a Guiné na sua transição para a democracia.

 
  
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  Presidente. - Está encerrado o debate.

A votação terá lugar no final dos debates.

 
  

(1) Ver acta.

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