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Processo : 2008/2154(INI)
Ciclo de vida em sessão
Ciclo relativo ao documento : A6-0123/2009

Textos apresentados :

A6-0123/2009

Debates :

PV 25/03/2009 - 14
CRE 25/03/2009 - 14

Votação :

PV 26/03/2009 - 4.1
Declarações de voto

Textos aprovados :

P6_TA(2009)0187

Relato integral dos debates
Quarta-feira, 25 de Março de 2009 - Estrasburgo Edição JO

14. Livro Branco sobre acções de indemnização por incumprimento das regras comunitárias no domínio antitrust (debate)
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Ata
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  Presidente. Segue-se na ordem do dia o relatório do senhor deputado Klaus-Heiner Lehne, em nome da Comissão dos Assuntos Económicos e Monetários, sobre o Livro Branco sobre as acções de indemnização por incumprimento das regras comunitárias no domínio antitrust (2008/2154(INI)) – (A6-0123/2009).

 
  
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  Klaus-Heiner Lehne, relator. − (DE) Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, gostaria primeiro de agradecer aos relatores-sombra, em particular, ao senhor deputado Sánchez Presedo, em nome dos socialistas, e à senhora deputada Bowles, em nome dos liberais, pelo trabalho de sucesso que desenvolveram comigo a nível do texto de compromisso apresentado hoje como relatório sobre o Livro Branco da Comissão. Desta vez, obtivemos uma grande maioria transversal aos vários grupos e chegámos a um compromisso verdadeiramente viável, que pode igualmente ser utilizado como orientação para o trabalho futuro da Comissão e, posteriormente, durante o processo legislativo, pelo Parlamento e pelo Conselho.

Neste relatório ficou bem claro – e ainda bem – que, em caso de infracção das regras da concorrência, de acordo com a tradição europeia, o Parlamento defende a posição de que a tomada de medidas é sobretudo da competência das autoridades – tanto das autoridades nacionais no domínio da concorrência como da Autoridade de Concorrência europeia – e que isso não equivale à criação de um segundo ramo, por assim dizer, que esteja em pé de igualdade com as medidas oficiais de combate aos cartéis. Na Europa, optámos deliberadamente por uma via diferente da adoptada pelos EUA, com os quais a situação é comparada frequentemente.

Há um consenso político, nesta Assembleia, quanto à necessidade de uma solução para as chamadas acções colectivas. No caso de conduta ilegal individual que prejudique um grande número de pessoas que sofram prejuízos comparativamente menores, é necessária uma solução separada para essas acções judiciais, relativamente às quais o direito processual simplesmente não é suficientemente eficaz. A criação de um instrumento desse tipo permite também proporcionar acesso à justiça e promover o desenvolvimento do mercado interno. Neste ponto, estamos de acordo.

Estamos também de acordo quanto a não querermos que se desenvolva uma indústria de litigância na Europa, como a que existe na América e que representa um volume de negócios de 240 mil milhões de dólares, e que, em última análise, não beneficia os consumidores e, como todos sabemos – bastando para isso ler os livros pertinentes – beneficia sobretudo as empresas de advocacia americanas. Nada disto tem muito que ver com o Estado de direito, nem queremos que venha a ter. Concordámos que os instrumentos de tortura processuais utilizados pelo sistema americano não devem ser adoptados na Europa. Isto aplica-se, em especial, à apresentação de elementos de prova e às custas judiciais. Trata-se de um ponto muito importante.

Concordámos também que, essencialmente, somos da opinião que, de uma perspectiva de princípio, a nível europeu a legislação apenas pode basear-se numa solução de adesão e que uma solução de desistência (modelo “opt-out”) apenas seria admissível nos casos em que os Estados-Membros já contam com uma solução semelhante e em que o direito constitucional nacional o permite. No âmbito do direito constitucional nacional, nem todos os países permitem a interposição de acções por adesão, além de que estas também contradizem o princípio do consumidor responsável.

Queixámo-nos insistentemente de, no seu Livro Branco, a Comissão Europeia se ter esquecido completamente de abordar a questão da resolução extrajudicial de litígios. A Direcção-Geral da Concorrência e a Comissão optaram directamente pelo recurso à via litigiosa. Contudo, como já sabemos há muito através dos debates sobre política de direito realizados nesta Assembleia, essa opção nem sempre constitui a via ideal e, regra geral, os mecanismos de resolução extrajudicial são frequentemente mais adequados para a resolução de litígios. Além disso, o trabalho paralelo levado a cabo pela Direcção-Geral da Protecção do Consumidor sobre esta mesma questão registou progressos muito superiores. No Livro Verde elaborado por esta Direcção-Geral, que se encontra na fase de consulta anterior à deste Livro Branco, foi considerada uma margem ampla para estes instrumentos de resolução alternativos. Estamos convencidos de que a Comissão Europeia deve retomar esta questão urgentemente.

Uma última questão, também fulcral: não pretendemos a fragmentação do direito. Ora, a legislação em matéria de concorrência começa agora a criar esse tipo de instrumento. E a protecção do consumidor está a seguir-lhe os passos. Sabemos que, a dada altura, serão consideradas opções semelhantes no que respeita à legislação no domínio do mercado de capitais, à legislação ambiental e à legislação social. Cremos ser absolutamente necessário considerar igualmente uma abordagem horizontal e, pelo menos em nossa opinião, utilizar um instrumento horizontal para apoiar os instrumentos processuais que são relativamente idênticos em todos os domínios. Esta questão tem igualmente uma importância decisiva.

 
  
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  Ján Figeľ, Membro da Comissão. Senhor Presidente, em nome da Comissão, saúdo o relatório do senhor deputado Lehne, adoptado pela Comissão dos Assuntos Económicos e Monetários (ECON) e cuja adopção é representativa de um grande consenso entre todos os grupos políticos. Congratulamo-nos também por este relatório apoiar firmemente o Livro Branco.

A Comissão refere que o relatório apoia as conclusões do Livro Branco quanto ao facto de as vítimas de infracções às regras da concorrência da Comunidade Europeia enfrentarem presentemente dificuldades consideráveis em obter indemnização pelos danos sofridos. Concordamos que devem ser tomadas medidas que garantam a plena indemnização dessas vítimas.

Somos igualmente de opinião que a reparação colectiva é essencial para os consumidores e para as pequenas empresas, de modo a permitir que tenham uma possibilidade realista e eficiente de obter indemnizações em caso de danos esporádicos. A Comissão concorda também plenamente com o relatório da Comissão dos Assuntos Económicos e Monetários no que respeita à necessidade de evitar o recurso excessivo ou abusivo à via litigiosa. Assim, para atingir esse objectivo é necessário que os mecanismos colectivos de reparação incluam salvaguardas adequadas.

Por último, concordamos plenamente que a abordagem da Comissão dos Assuntos Económicos e Monetários à reparação colectiva deve ser coerente, devendo igualmente ser garantida a compatibilidade entre as iniciativas visadas nos diferentes domínios do direito, como o direito no domínio da concorrência ou as normas de protecção dos consumidores. A Comissão saúda igualmente o reconhecimento do facto de uma abordagem coerente à reparação colectiva não significar, necessariamente, que todos os domínios tenham de ser sujeitos a um único instrumento horizontal. O apelo à coerência não pode atrasar indevidamente o desenvolvimento de medidas identificadas como necessárias para a plena aplicação das regras comunitárias da concorrência.

 
  
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  Gabriela Creţu, relatora de parecer da Comissão do Mercado Interno e da Protecção dos Consumidores. – (RO) A Comissão do Mercado Interno e da Protecção dos Consumidores formulou a sua posição com base numa realidade específica: muitas vezes, os efeitos negativos resultantes da legislação no domínio antitrust podem fazer-se sentir a nível económico, no extremo da cadeia comercial, afectando os consumidores finais e as pequenas empresas.

Neste caso, embora as indemnizações por prejuízos sofridos sejam importantes, são também difíceis de obter, dado que o número de pessoas afectadas é grande e as quantias envolvidas são reduzidas. Em resultado disso, solicitámos a adopção de um pacote de medidas legislativas e não legislativas que funcione como instrumento passível de ser utilizado por todos os cidadãos europeus afectados por este tipo de situações, para defenderem o seu direito a uma indemnização plena e adequada.

Apoiamos todas as medidas destinadas a eliminar as dificuldades inerentes à concretização deste objectivo: simplificação do acesso a documentação, redução das custas dos processos judiciais e inversão do ónus da prova.

Saudamos a proposta da Comissão no sentido de, nos casos em que existe um acordo explícito, combinar acções representativas intentadas por entidades qualificadas com acções colectivas. Contudo, consideramos que as acções colectivas com opção de desistência (modelo “opt-out”) devem continuar a ser debatidas, tendo em conta as vantagens que apresentam, nomeadamente, a possibilidade de uma "resolução definitiva" e a redução da incerteza jurídica.

 
  
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  Ioan Lucian Hămbăşan, em nome do Grupo PPE-DE. – (RO) Embora o Tratado da União Europeia proíba claramente a formação de cartéis e outras infracções às regras da concorrência, os consumidores da Comunidade Europeia continuam a ter dificuldade em reivindicar o seu direito a ser indemnizados pelos prejuízos sofridos.

Na Roménia, por exemplo, um cartel da indústria do cimento foi multado recentemente em vários milhões de euros. Contudo, a legislação actualmente em vigor não obriga as autoridades com competências para controlar a concorrência a participar nas acções de indemnização das vítimas.

Gostaria de salientar a necessidade de estas autoridades terem em consideração as indemnizações que são ou deviam ser pagas, aquando do cálculo das coimas impostas às empresas declaradas culpadas de infracção, para evitar discrepâncias entre os prejuízos causados e as medidas punitivas aplicadas, e, em especial, para garantir que as indemnizações são pagas às pessoas afectadas por essas práticas.

Por este motivo, saúdo a intenção da Comissão no sentido de melhorar os métodos de garantia dos direitos dos consumidores afectados pelas infracções às regras que ocorrem em toda a Europa.

O Parlamento afirmou muito claramente que, na Europa, não pode existir um sistema baseado na opção de desistência (“opt-out”). Assim, é imperativo identificar as vítimas com a máxima celeridade aquando da apresentação da denúncia.

O sistema de interposição de acções colectivas por adesão garante que as vítimas de infracções às regras da concorrência serão, efectivamente, indemnizadas. O Parlamento não pretende que qualquer outra entidade, quer se trate de advogados, de associações empresariais ou de organizações de protecção do consumidor, beneficie em resultado de acções privadas.

Acredito igualmente que o Parlamento acrescenta um novo elemento importante, que foi omitido na proposta da Comissão. No que respeita às vítimas com direito a indemnização, em muitos casos os mecanismos alternativos de resolução de litígios são muito mais eficazes que os processos judiciais. Refiro-me ao facto de a resolução das acções de indemnização dever ser iniciada, antes de mais, a nível extrajudicial. Tendo em conta que os consumidores serão muito mais rapidamente indemnizados pelas perdas sofridas, estes mecanismos são muito menos dispendiosos que as acções judiciais privadas.

 
  
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  Antolín Sánchez Presedo, em nome do Grupo PSE. – (SP) Senhor Presidente, Senhor Comissário, Senhoras e Senhores Deputados, este relatório foi aprovado por unanimidade na Comissão dos Assuntos Económicos e Monetários. Não só é um resultado excelente como, dada a natureza difícil, complexa e controversa dos assuntos em questão, é um resultado excepcional, que deve impulsionar e consolidar firmemente o novo pilar das acções judiciais privadas, essencial para tornar eficiente a política de competência comunitária. Trata-se de um novo passo na direcção de uma política de responsabilidades mais avançada e eficiente, com maior respeito pelos direitos das vítimas e mais eficaz no que respeita à responsabilização dos infractores.

Assim, primeiramente, gostaria de felicitar o relator, senhor Deputado Lehne, que assumiu a responsabilidade crucial de concluir esta tarefa com êxito. A qualidade das suas ideias, a sua abertura de espírito, a disponibilidade para dialogar e a inteligência para chegar aos compromissos mais adequados foram essenciais para a conclusão desta tarefa. Gostaria de alargar as minhas felicitações aos relatores dos pareceres, aos relatores-sombra e aos responsáveis pela apresentação de alterações, que tão positivamente contribuíram para valorizar o relatório.

O Livro Branco da Comissão sobre acções de indemnização por incumprimento das regras comunitárias no domínio antitrust é a resposta a um pedido apresentado pelo Parlamento Europeu na sua resolução sobre o Livro Verde, com cujo conteúdo concorda em grande medida. Entre outros aspectos, é esse o caso quando, nomeadamente, subscreve a natureza complementar das acções judiciais públicas e privadas, e assume uma posição favorável às acções colectivas, evitando, contudo, os excessos das acções judiciais colectivas interpostas nos Estados Unidos, e simplificando, deste modo, a obtenção de indemnizações, sendo também esse o caso quando propõe o acesso a informação relevante – sob controlo judicial – evitando investigações aleatórias (as chamadas "fishing expeditions"), e quando reconhece e apela à necessidade de interposição de acções individuais ou de seguimento e de um sistema voluntário de indemnizações.

O relatório defende os poderes de co-decisão do Parlamento Europeu no que respeita ao estabelecimento de um quadro jurídico para a interposição de acções de indemnização por incumprimento das regras comunitárias no domínio antitrust. Esta posição não deve ser entendida como uma negação da política de competência comunitária, enquanto base jurídica para legislação, mas como uma actualização dos requisitos do procedimento normal nesta esfera, de modo alcançar os mais elevados valores expressos no Tratado.

Quando um regulamento tem um efeito significativo sobre um direito fundamental, como o direito dos cidadãos a uma protecção jurídica efectiva (que integra o sistema da União Europeia e o dos Estados-Membros), o princípio democrático e o respeito pelas tradições jurídicas nacionais – que requerem que tais matérias apenas possam ser regulamentadas através de disposições jurídicas ou, por outras palavras, através de medidas tomadas pelos representantes directos dos cidadãos – implicam a participação legislativa do Parlamento Europeu.

Além disso, estabelece igualmente uma abordagem horizontal e integrada para resolver problemas comuns que podem surgir relativamente a outros domínios quando são interpostas acções judiciais privadas no âmbito da legislação em matéria de concorrência, e evita assim uma abordagem fragmentada e inconsistente.

As acções judiciais privadas podem ser interpostas quer por um organismo público quer por requerentes individuais ou colectivos. A segunda opção permite que as vítimas interponham a acção directamente, podendo também fazê-lo indirectamente através de entidades qualificadas, previamente designadas ou autorizadas ad hoc, como é o caso das associações empresariais ou de defesa do consumidor. No caso de acções interpostas por entidades qualificadas, o colectivo de vítimas tem de ser identificado na data de interposição da acção, podendo a identificação de cada requerente ser efectuada posteriormente, embora deva ser claramente estabelecida com a maior celeridade possível, evitando atrasos desnecessários e respeitando a legislação em vigor. Esta solução é muito importante no caso de acções que envolvem danos esporádicos e de baixo valor.

O relatório levanta a questão do acesso às informações necessárias para a interposição de acções de seguimento e fá-lo de forma equilibrada. É necessário salvaguardar quer a protecção de sigilos comerciais e empresariais quer a eficiência dos programas de clemência, para os quais são necessárias directrizes.

Foram fixadas condições para que as decisões tomadas por uma autoridade que seja membro da Rede Europeia da Concorrência possam tornar-se vinculativas noutro Estado-Membro e para que, respeitando plenamente o princípio da responsabilidade, o ónus da prova seja invertido e exista presunção de culpa nos casos em que o incumprimento foi provado.

Merece a pena salientar igualmente a aprovação da admissibilidade de invocar a repercussão como meio de defesa dos adquirentes indirectos e de um sistema que simplifica e reduz as custas processuais. Gostaria também de salientar a interacção positiva entre as acções judicias públicas e privadas, tanto no que respeita ao incentivo da indemnização das vítimas como à aplicação de um prazo de cinco anos para a sua interposição.

Para concluir, gostaria de expressar a minha gratidão para com a Comissão, pelo diálogo mantido ao longo de todo este processo, e de solicitar ao senhor Comissário que apresente rapidamente as iniciativas necessárias para o desenvolver.

 
  
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  Diana Wallis, em nome do Grupo ALDE. – (EN) Senhor Presidente, gostaria de começar por agradecer ao senhor deputado Lehne e confirmar que o meu grupo apoiará o relatório por ele elaborado.

Gostaria também de referir que considero algo estranho que este debate seja realizado a uma hora tão tardia, quando temos uma questão sobre o mesmo assunto agendada para amanhã de manhã. Faria muito mais sentido apresentar ambas as questões na mesma altura.

Contudo, felicito o relatório e gostaria de referir que o ponto de partida do meu grupo consistirá em “fazer justiça” – fazer justiça relativamente às PME e aos consumidores da União Europeia, nos casos em que têm de enfrentar actividades incorrectas e anticoncorrenciais. Há algumas semanas o meu grupo organizou um seminário no Parlamento, em Bruxelas e fiquei muito surpreendida com a presença de algumas pessoas, que estavam bem a par destas actividades anticoncorrenciais e que, curiosamente, fazem parte da indústria do cimento. Que disseram essas pessoas? “Por favor, por favor, avancem com esta questão: precisamos de um instrumento que nos permita processar as empresas que operam incorrectamente no mercado europeu.

Pretendemos uma solução europeia, que seja aplicada com a maior brevidade, caso contrário, acredito que aquilo que acontecerá e aquilo para que vos alerto é o seguinte: alguns Estados-Membros irão desenvolver sistemas que conduzirão a uma corrida à jurisdição mais favorável em resultado da livre circulação das decisões judiciais. Assim, por favor – crie-se urgentemente um sistema europeu.

 
  
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  Presidente. Certificar-me-ei de que a sua observação sobre a ordem do dia é comunicada à Conferência dos Presidentes, responsável pela sua elaboração – por vezes, são cometidos erros.

 
  
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  Nils Lundgren, em nome do Grupo IND/DEM. – (SV) Senhor Presidente, o mercado interno representa, incontestavelmente, o melhor contributo da União Europeia para a liberdade e a prosperidade na Europa. Entre outros aspectos, necessita de legislação eficiente no domínio antitrust. O que está agora em apreço é a questão das acções de indemnização por incumprimento das regras antitrust.

Há motivos fundamentais válidos que justificam a possibilidade de os cidadãos e as empresas poderem intentar acções de indemnização. O relatório do senhor deputado Lehne indica, embora algo involuntariamente, os problemas e os riscos existentes. Embora o Livro Branco se refira a uma cultura jurídica europeia, tal não existe. Não devemos criar regulamentos com base em ilusões. O relator pretende que evitemos o surgimento de uma cultura de indemnizações “americanizada”. Também isso é uma ilusão. Pelo contrário, os riscos de surgir uma cultura desse tipo são elevados.

Foi ignorada a partilha de responsabilidade entre as instituições da União Europeia e os Estados-Membros. Não há uma análise objectiva das exigências inerentes ao princípio de subsidiariedade. Pura e simplesmente, o princípio não é encarado com seriedade.

Há vários outros pontos pouco claros e também pontos que correm o risco de ser totalmente arbitrários. Os pontos 7 e 11 do relatório suscitam dúvidas. As acções de indemnização por incumprimento das regras antitrust devem ser o ponto de partida óbvio. É necessário que o tribunal tenha verificado o delito, aplicando-se depois, supostamente, o princípio da transição em julgado, ainda que no contexto de uma acção individual, de modo a que as sentenças relativas a um caso singular não possam ser revistas.

Os pontos 15 e 18 permitem ambos que o requerente opte pelo sistema jurídico mais favorável. Isso levanta incertezas jurídicas e resultará numa corrida à jurisdição mais favorável, facto que constituirá uma ameaça real.

Espera-se reduzir as assimetrias em matéria de informação obrigando as empresas a fornecer informações ao requerente. Isto resultará no tratamento subjectivo de informações comerciais importantes, que podem ser indevidamente utilizadas.

Nesta fase, há demasiados riscos e pontos que são pouco claros. Assim, a Assembleia deve rejeitar este relatório e solicitar uma análise mais aprofundada deste assunto, antes de tomarmos uma decisão.

 
  
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  Andreas Schwab (PPE-DE).(DE) Senhora Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, gostaria de começar por agradecer ao relator, senhor deputado Lehne, que realizou um trabalho magnífico neste relatório e encontrou soluções adequadas para uma questão que, segundo a opinião de deputados de outros grupos parlamentares, é muito difícil.

O debate permite-me perceber que todos concordamos ser necessária uma abordagem horizontal no que respeita a todas as acções judiciais colectivas, pelo que solicito à Comissão que não apresente, relativamente a cada domínio, propostas individuais de várias Direcções-Gerais, e que, na melhor das hipóteses, nos apresente um mecanismo de reparação jurídica verdadeiramente colectivo, que abranja todos os domínios referentes ao mercado interno europeu, aos cidadãos europeus e, obviamente – como a senhora deputada Wallis referiu – às PME europeias. Estamos de acordo quanto ao facto de os interesses dos que foram lesados por um cartel deverem ser defendidos eficazmente e de os cartéis deverem ser controlados no âmbito da economia europeia, de acordo com o princípio da economia social de mercado. Também não queremos que os vários regulamentos nacionais sejam objecto de quaisquer abusos, sob a forma de uma corrida à jurisdição mais favorável.

Contudo, o debate desta noite não me deu muitas informações quanto à forma mais eficaz de concretizar estes objectivos, pois creio que, muitas vezes, o potencial das acções colectivas é sobrestimado. É por isso importante voltar a estabelecer determinadas referências relativamente às quais sejam avaliadas todas as acções de indemnização colectivas. É preciso determinar se a protecção jurídica adicional para consumidores ou vítimas nos processos colectivos, as acções judiciais transfronteiras e as acções judiciais que afectam mais de um Estado-Membro são, efectivamente, necessárias. O procedimento europeu tem de incluir as limitações processuais dos Estados-Membros, nomeadamente as opções de adesão (opt-in) e de desistência (opt-out), bem como várias outras. Se isto não for possível, de todo, como a própria Comissão já admitiu, em parte, então é necessário incluir os instrumentos jurídicos dos Estados-Membros e criar um procedimento comum, com os parlamentos dos Estados-Membros, de forma a defender os interesses dos consumidores europeus.

Decididamente, queremos evitar que as acções colectivas interpostas na Europa sigam o modelo americano. Queremos garantir a atribuição das indemnizações, mas apenas àqueles que realmente sofreram prejuízos. Devemos opor-nos, tão categoricamente quanto possível, a eventuais acções judiciais injustificadas e incentivar o recurso a procedimentos de resolução alternativos.

 
  
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  Olle Schmidt (ALDE). - (SV) Senhor Presidente, também eu gostaria de agradecer ao senhor deputado Lehne pela elaboração de um relatório extremamente construtivo e exaustivo, que aborda questões importantes no domínio da legislação em matéria de concorrência e que aumenta a protecção dos consumidores.

Embora o Tribunal de Justiça Europeu defenda o direito de os particulares e as empresas receberem indemnizações por incumprimento das regras no domínio da concorrência, a verdade é que, na realidade, aqueles que sofreram prejuízos em resultado do incumprimento das regras comunitárias no domínio antitrust raramente são indemnizados. Devemos, portanto, criar mecanismos que contribuam para aumentar a confiança e para facilitar a reivindicação dos direitos dos cidadãos além fronteiras.

Sabemos que os consumidores e as pequenas empresas têm relutância em instaurar acções por temerem a morosidade dos processos e, em especial, as elevadas custas judiciais. A constatação de mudanças a este nível contribuirá para promover o comércio transfronteiriço.

Se pretendemos um mercado interno funcional em toda a União Europeia, em que as pessoas possam confiar que o seu caso será analisado de forma juridicamente correcta e que serão plenamente indemnizadas pelos danos sofridos – ou seja, pelo prejuízo – temos também de criar novos mecanismos que facilitem a interposição de acções colectivas.

Sempre que se fala de acções judiciais colectivas, refere-se a questão dos EUA e das experiências e exageros deste país. É claro que temos a aprender com esse exemplo, mas não devemos permitir que isso nos intimide. A Europa tem de ter um sistema europeu e não um sistema americano. Caso não tomemos medidas, a situação apenas irá piorar.

 
  
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  Ján Figeľ, Membro da Comissão. Senhor Presidente, agradeço a todos pelos interessantes contributos, em especial a declaração inicial do senhor deputado Klaus-Heiner Lehne. Foi extremamente interessante e percebo agora o motivo de tanto consenso e do trabalho conjunto sobre estas questões, não só em comissão mas também no plenário.

Não tenho muito a acrescentar, excepto talvez no que se refere às bases jurídicas. É claro que isso depende dos objectivos e do conteúdo das medidas propostas, e enquanto Comissário – embora de outra pasta, mas intervindo em nome da Comissão – quero garantir-lhes que, por princípio, procuramos trabalhar em estreita cooperação com o Parlamento. Fica por determinar a forma como isto deve ser instituído em relação a um ponto ou assunto prático e concreto, mas esforçar-nos-emos por manter um cooperação estreita, ou tão estreita quanto possível, com o Parlamento, no âmbito da base jurídica aplicável.

Relativamente ao que foi dito sobre a fragmentação e a abordagem horizontal, creio que a resposta da Comissão – bem patente no Livro Branco – é uma abordagem consistente e coerente, e considero que a tradição jurídica europeia e as raízes da nossa cultura jurídica são diferentes das americanas, tão frequentemente citadas. No entanto, acredito que podemos aprender com terceiros e desenvolver ainda mais o nosso sistema.

No que respeita à aplicação do direito público e ao acesso à justiça, é óbvio que considero muito importante não progredirmos rumo a uma aplicação menos sólida e que creio que os artigos 81.º e 82.º são pilares extremamente importantes do mercado único e das políticas da União Europeia. Esses artigos dizem respeito à justiça e as acções de indemnização são complementares à aplicação da lei.

Por último, embora talvez não menos importante, uma palavra sobre o que foi dito no que respeita à resolução extrajudicial de litígios. Embora a Comissão seja a favor desse ponto, a condição prévia ou a base para uma abordagem desse tipo – que seria positivamente acolhida – assenta na existência e no correcto funcionamento, a nível dos Estados-Membros, de um sistema de resolução de litígios eficiente no que respeita às acções de indemnização. Assim, considero que devemos incentivar e apoiar os Estados-Membros de modo a que essas questões e sistemas sejam aplicados na Europa dos 27. Posteriormente, creio que poderemos também abordar estes pontos.

Agradeço aquilo que foi, também para mim, um debate muito interessante e desejo-vos as maiores felicidades.

 
  
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  Klaus-Heiner Lehne, relator. − (DE) Senhor Presidente, Senhor Comissário, gostaria de começar por agradecer aos meus estimados colegas pelos contributos muito úteis. Creio que todos unimos esforços e chegámos a um resultado positivo.

Contudo, quero igualmente transmitir à Comissão, de forma muito clara e para evitar quaisquer malentendidos, o seguinte: do ponto de vista do Parlamento, não faz sentido a apresentação de uma lei que provavelmente nesta altura já não tem qualquer utilidade. Não há qualquer dúvida quanto a isso. Esperamos que a Comissão tenha em conta o que decidimos hoje e que inclua esses pontos na legislação efectivamente proposta.

A abordagem horizontal é um aspecto importante, mas não só em função dos argumentos que expus anteriormente; o próprio Comissário referiu a questão da base jurídica. Num projecto desta envergadura, é imperativo optar por uma abordagem que, em última análise, garanta a participação do Parlamento enquanto legislador e em pé de igualdade. Nos termos do Tratado de Nice, presentemente em vigor, tal não acontecerá se se optar por uma abordagem baseada exclusivamente na legislação em matéria de concorrência. Este ponto é também um argumento político muito importante, que justifica o motivo pelo qual consideramos que a abordagem horizontal é a correcta e somos a favor desta. Creio que a Comissão deve ponderar muito seriamente esta questão.

Outro factor que, em minha opinião, é decisivo é a necessidade de tomar medidas no que respeita à resolução extrajudicial de litígios. O Senhor Comissário referiu-se anteriormente à convergência do trabalho entre a Comissão e a Direcção-Geral da Concorrência. Contudo, quando se compara o Livro Verde sobre protecção dos consumidores e o Livro Branco sobre concorrência, não se fica necessariamente com a impressão de que essa convergência efectivamente exista. O exemplo mas flagrante é a diferença na abordagem aos mecanismos de resolução extrajudicial de litígios no Livro Branco – ou, mais exactamente, a inexistência de uma abordagem.

Existem ainda vários outros problemas que esperamos ver resolvidos. Gostaria apenas de referir rapidamente a questão do acesso aos processos na posse da Comissão Europeia. É permitido, em todos os procedimentos penais relativos à interposição de acções de indemnização, consultar os processos do Ministério Público. Por que motivo o mesmo não se aplica à Comissão Europeia? É uma questão que ultrapassa a minha compreensão.

O mesmo se aplica à questão da estipulação de sanções: dado que é imperativo permitir a interposição de acções de indemnização numa data futura, este ponto tem igualmente de ser tido em conta. Também neste caso é necessário que a Comissão retome urgentemente o texto e apresente textos e propostas mais específicos que os incluídos até à data no Livro Branco. Permitam-me que transmita, da perspectiva do Parlamento, de forma muito clara e para evitar quaisquer malentendidos, o seguinte: esperamos mais do que o contido no Livro Branco e esperamos igualmente que a Direcção-Geral da Concorrência, no seu todo, aceite as sugestões por nós apresentadas, caso contrário, deparar-se-á com resistência por parte desta Assembleia.

 
  
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  Presidente. Gostaria de agradecer a todos os contributos que deram sobre este tema importante, e agradecer também ao Senhor Comissário, aos funcionários e aos intérpretes.

Está encerrado o debate.

A votação terá lugar na terça-feira, 26 de Março de 2009.

Declarações escritas (artigo 142.º)

 
  
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  Katrin Saks (PSE), por escrito. – (ET) O relatório do Parlamento salienta a utilidade dos programas de clemência para a denúncia de acordos entre cartéis e apraz-me poder afirmar que o Parlamento estónio está actualmente a debater um projecto de programa de clemência. Estes programas devem tornar-se num instrumento significativo da luta contra os cartéis – importante tanto para um melhor funcionamento do mercado comum como para a protecção dos direitos dos consumidores – já que os acordos entre cartéis podem resultar num aumento dos preços de venda ao consumidor que pode atingir 25%.

Contudo, acredito que as acções judiciais representativas podem igualmente ter um papel importante a nível da aplicação eficiente da legislação em matéria de concorrência e do aumento da protecção dos consumidores, pelo que deve também ser dada atenção a este aspecto, tanto a nível da União Europeia como da Estónia. A investigação demonstrou que as acções representativas contribuiriam para aumentar significativamente a disponibilidade dos consumidores para defender os seus direitos, tendo também demonstrado a importância crucial da aplicação de medidas como as acções representativas nos países em que os consumidores são menos activos por temerem a complexidade e os custos dos processos.

 
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