Presidente. - Segue-se na ordem do dia o debate sobre a pergunta oral (O-0064/2009) apresentada por Doris Pack, em nome do Grupo do Partido Popular Europeu (Democratas-Cristãos) e dos Democratas Europeus, à Comissão, sobre o papel da cultura no desenvolvimento das regiões da Europa (B6-0226/2009).
Doris Pack, autora. – (DE) Senhora Presidente, Senhor Comissário, reunimos numa altura pouco habitual, mas, seja como for, a pergunta oral que hoje apresentámos teve a sua origem no Intergrupo “Uma Alma para a Europa”. Consideramos que encontraremos essa alma nas nossas unidades mais antigas – as regiões – onde as pessoas comunicam umas com as outras com o seu sotaque específico, num dialecto específico ou mesmo numa língua regional; onde a cozinha local possui os seus sabores característicos; onde nos mercados são vendidos frutos e legumes verdadeiramente locais; onde ainda existem canções populares locais; onde reside a origem de lendas e mitos específicos. Em suma, nos locais relativamente aos quais as pessoas nutrem sentimentos de pertença e onde se sentem em casa.
O avanço da globalização ameaça uniformizar de mais e fazer desaparecer características ímpares. Só as maravilhosas regiões europeias poderão salvaguardar aquela especificidade, e é preciso que possam contar com a protecção da União Europeia. A riqueza e a variedade das regiões da Europa – foram frequentemente inimigas, foram ocupadas, foram divididas, foram destruídas pela guerra e foram reunificadas – deverão ser preservadas. As regiões são como as nossas células estaminais. A União Europeia manteve uma certa cultura do pequeno, e está obrigada pelos direitos humanos também neste domínio.
O nosso breve debate de hoje e a resolução poderão instigar a Comissão a encontrar formas de tornar a riqueza cultural das regiões ainda mais visível e a encontrar maneiras de a UE contribuir para a sua preservação e desenvolvimento contínuo. O potencial cultural da Europa deverá ser utilizado de forma estratégica. Em 2009, o ano da criatividade e da inovação, as possibilidades de integração de ideias e iniciativas dos sectores público e privado aos níveis local e regional deverão ser exploradas de forma útil.
Gostaria de dizer aos membros da Comissão do Desenvolvimento Regional que não temos qualquer intenção de cercear a actual política regional – queremos apenas reforçar a sua dimensão cultural. Imploramos à Comissão para que faça também a sua parte.
Joe Borg, Membro da Comissão. – (EN) Senhora Presidente, permita-me que comece por lhe agradecer a oportunidade de, em nome do Comissário Figeľ, tratar da questão do lugar da cultura nas nossas políticas e da sua contribuição específica para o desenvolvimento das regiões e cidades europeias. A importância da cultura é tomada em consideração de diferentes maneiras a nível comunitário.
No contexto da política de coesão da UE, diversas estratégias regionais e locais integraram com êxito a cultura para apoiar a criatividade e promover a inovação. A política de coesão apoia, por exemplo, a protecção do nosso património cultural, o desenvolvimento das infra-estruturas e serviços culturais, o desenvolvimento da capacidade de atracção regional e as suas ligações ao turismo sustentável, mas também a regeneração das economias locais e o desenvolvimento das estratégias transfronteiras.
Em 2007, a Comissão lançou a Agenda Europeia para a Cultura num mundo globalizado, que se encontra neste momento nas fases iniciais de implementação. Esta nova abordagem estratégica da cultura estabelece objectivos comuns e visa impulsionar o valor económico, social e político da cultura reforçando o seu papel transversal. Neste enquadramento, a Comissão e os Estados-Membros colaboram no âmbito de um novo método de cooperação aberto, a fim de reforçar esforços comuns em áreas que têm um impacto directo nas estratégias de desenvolvimento local e regional. Isto vai contribuir, por exemplo, para maximizar o potencial de indústrias criativas e culturais, em especial PME, promover o acesso à cultura e incentivar a mobilidade de profissionais da cultura.
A fim de contribuir para a reflexão em curso, a Comissão vai lançar em breve um estudo independente sobre a contribuição da cultura para o desenvolvimento económico local e regional como parte da política regional europeia. Os resultados desse estudo contribuirão para sublinhar o valor do investimento nos sectores culturais e criativos e ilustrarão as ligações existentes entre esse investimento, objectivos específicos de desenvolvimento regional e a Agenda de Lisboa para o crescimento e o emprego. O estudo contribuirá também para a preparação de um Livro Verde sobre o potencial das indústrias culturais e criativas, que se encontra neste momento em fase de preparação e deverá ser adoptado pela Comissão no início de 2010.
A Comissão organiza periodicamente conferências com representantes das autoridades locais e regionais. Vou destacar simplesmente os chamados "dias abertos", que todos os anos reúnem em Bruxelas um grande número de entidades interessadas para debater um vasto leque de questões relacionadas com a política regional e de coesão. No contexto desses workshops têm sido apreciados regularmente aspectos relacionados com a cultura.
Para além disso, no contexto de outras políticas europeias, como a política marítima integrada da UE, a Comissão esforça-se igualmente por chamar actores da sociedade civil a participar no destaque a conferir à riqueza do património marítimo da Europa. Assim, no próximo mês de Maio, durante as celebrações do Dia Europeu do Mar em Roma, entidades interessadas analisarão, entre outras, as ligações existentes entre o património marítimo e o turismo regional sustentável.
Por último, desejo referir também o Fórum Cultural Europeu, que vai ser organizado pela primeira vez pela Comissão, no contexto da Agenda Europeia para a Cultura em Bruxelas, nos dias 29 e 30 de Setembro e reunirá representantes do sector cultural e autoridades nacionais, incluindo autoridades locais e regionais.
Manolis Mavrommatis, em nome do Grupo PPE-DE. – (EL) Senhora Presidente, Senhor Comissário, gostaria de começar por saudar a iniciativa sobre uma matéria tão interessante como é o papel da cultura no desenvolvimento das regiões da Europa. O património cultural é um elemento importante da identidade e da história do desenvolvimento dos povos europeus. A sua protecção e preservação revestem-se, por isso, de especial relevância para a educação da juventude e, ao mesmo tempo, para o respeito da identidade europeia. Independentemente da sua dimensão europeia, nacional ou local, o património cultural é um valor fundamental para os cidadãos europeus. Todos sabemos que todas as atenções estão centradas nas grandes cidades onde se encontram os museus e monumentos mais famosos.
Todavia, é um facto que o mundo rural europeu, que representa 90% do território europeu, está a sofrer de abandono e de estagnação económica. Por isso, os programas europeus com conteúdo cultural contribuem consideravelmente para o desenvolvimento da actividade económica das regiões. Não se trata apenas da oferta de trabalho e emprego, trata-se também da criação de pólos de atracção de turismo cultural e histórico que irão contribuir para o desenvolvimento sustentável dessas regiões.
Consideramos, portanto, que a cultura contribui directamente para o desenvolvimento da educação cultural dos europeus e indirectamente para a prosperidade económica, sobretudo nas regiões que mais carecem de projecção e de desenvolvimento.
Mary Honeyball, em nome do Grupo PSE. – (EN) Senhora Presidente, para mim é, de facto, motivo de grande satisfação ter oportunidade de participar neste debate. Só é pena que estejamos a realizá-lo numa quinta-feira à tarde, com um número de presenças não tão elevado como talvez devesse ser.
Penso, na realidade, que este é um debate importante no contexto do actual clima económico. Já ouvimos o debate sobre cultura e emprego e sobre a forma como as indústrias da cultura e as pessoas que trabalham no sector da cultura podem contribuir para a economia e dar realmente uma ajuda. Nos tempos de precariedade com que nos confrontamos – de que já ouvimos falar neste Parlamento – é importante que discutamos estes assuntos o mais completamente possível.
Também me encontro aqui porque represento efectivamente uma daquelas grandes cidades a que o orador antecedente se referiu. Londres, como todos sabem, é um dos centros culturais da UE, com uma imensa história – como todos temos – e muito para oferecer. É também o centro de indústrias da cultura, das britânicas, certamente. Portanto, penso que tenho aqui o papel de falar em nome dos cidadãos que represento e de lutar pelos postos de trabalho que, quando as coisas começam a correr mal, são muitas vezes os primeiros a desaparecer. Congratulo-me, pois, profundamente, com o que disse a Comissão acerca do papel das indústrias culturais, sobre o facto de as querermos preservar e desenvolver e sobre o facto de haver um papel para a cultura no domínio económico. A sensação que tenho é que, muito frequentemente, esse papel económico é ignorado e não falamos nele; nem sequer pensamos nele, e relegamos a cultura para um estatuto secundário. Isto não é aceitável, em particular quando a cultura pode ser tão importante no quadro do nosso desenvolvimento nacional e regional. Faço votos de que uma das coisas que sairá deste debate de hoje – que levemos de regresso aos nossos Estados-Membros e que a Comissão e o Conselho levem também – seja o facto de que estamos muito interessados na maneira como ocorre este desenvolvimento regional, na maneira como lidamos com ele e no papel que a cultura aí pode desempenhar.
Também, como a senhora deputada Pack já referiu, há toda a questão da diversidade cultural. Penso que uma das grandes forças da UE e do Parlamento Europeu é que todos nos juntamos – somos agora 27 Estados-Membros – e de facto somos todos muito diferentes, sob muitos pontos de vista: temos antecedentes e culturas diferentes e, obviamente, línguas diferentes. Isso é apenas um começo. Embora o mundo esteja a ficar mais pequeno e as pessoas se aproximem mais, continuam a existir estas diferenças significativas. Devíamos celebrá-las, porque essas diferenças estão precisamente no cerne das coisas de que falamos. Todos nós queremos preservar a nossa identidade e o que sentimos acerca de nós próprios, e precisamos de o fazer.
Neste contexto, penso que também é necessário ter em linha de conta que há pessoas que vêm para o nosso continente. Chegam-nos pessoas de outras partes do mundo – muitas das quais estão agora na segunda e na terceira geração em alguns dos nossos Estados-Membros –, pessoas que têm também antecedentes e origens diferentes. Penso que também é necessário termos em linha de conta que elas trazem consigo a sua própria cultura, a sua própria tradição e as suas próprias línguas. Embora as integremos e elas aprendam as nossas línguas, continuam a ter as suas próprias identidades, separadas das nossas. Essa foi uma questão não referida no presente debate, uma questão que considero importante e que, assim o espero, podemos integrar, em especial quando falamos de questões como o multilinguismo, assunto acerca do qual já travámos bons debates. É uma questão de extrema importância e penso que se deverá dar-lhe mais relevo do que temos dado, mas no contexto de uma Europa em mudança. Precisamos, pois, de preservar as nossas culturas actuais e a nossa diversidade actual e de absorver de facto a nova diversidade que chegou e vai continuar a chegar ao nosso continente. Por todas estas razões, congratulo-me com o apoio que estamos a dar à cultura e às indústrias da cultura, com o apoio às pequenas e médias empresas, que penso que, no actual clima económico, serão possivelmente a coluna vertebral daquilo a que iremos assistir. Se as grandes sociedades e as grandes empresas perdem trabalhadores, dispensam trabalhadores e suspendem contratos de trabalho, é bem possível que devam ser as firmas de menor dimensão – as PME – a agarrar esta fase de estagnação e a tomar a iniciativa de criar emprego para os que podem trabalhar neste sector.
Espero, pois, que todos reconheçamos quão importante é o papel da cultura no nosso continente e na nossa sociedade e que todos os que de facto comparecemos a este debate levemos a mensagem de regresso aos nossos Estados-Membros, às regiões e às pessoas que representamos. Sei que temos uma boa mensagem para transmitir, por isso tratemos de passar a palavra.
Grażyna Staniszewska, em nome do Grupo ALDE. – (PL) Senhora Presidente, as regiões são um lugar extremamente importante para o desenvolvimento da cultura. É aí que surge a maior parte dos programas de intercâmbio duradouros e dos projectos conjuntos entre regiões com diferentes tradições, costumes e realizações. As regiões estimulam o desenvolvimento da cultura, e a cultura – projectos e eventos importantes e atraentes – torna-se um íman que atrai o investimento económico. Este é o clássico efeito dominó que é melhor ilustrado pelos efeitos do excelente programa da Capital Europeia da Cultura. A seguir a um ano de eventos culturais regista-se sempre uma revitalização da economia. As numerosas cidades europeias que tentam participar no projecto sabem isso.
A cultura representa uma grande oportunidade especialmente para regiões subdesenvolvidas que são ricas em recursos naturais ou em atracções turísticas ou recreativas devido à sua localização geográfica. Por isso, é especialmente importante ter consciência do papel de relevo que as autoridades regionais podem desempenhar para estimularem a sua actividade através de programas especiais da União Europeia. Espero que a Comissão apresente brevemente um Livro Verde que proponha um vasto conjunto de medidas na área da cultura, incluindo a questão fulcral do nível regional.
Senhoras e Senhores Deputados, para concluir, permitam-me chamar a atenção para a iniciativa de proclamar o ano 2013 como o Ano Europeu das Línguas dos Países Vizinhos. Muitas das vezes, o desenvolvimento dinâmico da cooperação regional na Europa é entravado por problemas relacionados com o desconhecimento da língua e da cultura dos países e regiões vizinhos e com a incapacidade de estabelecer uma comunicação total. A aprendizagem da língua de um país vizinho pode representar um grande salto em frente para a compreensão mútua e a comunicação, e, consequentemente, para o reforço da cooperação cultural e económica e para a consolidação de toda a Comunidade Europeia.
Ryszard Czarnecki, em nome do Grupo UEN. – (PL) Senhora Presidente, penso que vale a pena lembrar neste debate as palavras características de Jacques Delors, o antigo Presidente da Comissão Europeia. Quando lhe perguntaram, depois de ter terminado o seu mandato como Presidente da Comissão, se se arrependia de alguma coisa ou se havia alguma área em que pudesse ter feito mais, ele admitiu que a União Europeia e a Comissão tinham dedicado muito pouco tempo às questões da cultura. Penso que esta sua autocrítica característica podia constituir um indicador para nós.
Concordo com o orador que falou das prioridades estranhas do nosso Parlamento. Dizemos que a cultura é importante, e que prioridades como as instituições, a administração e os regulamentos não são as únicas importantes. Depois falamos destas coisas na segunda, na terça, na quarta e na quinta-feira de manhã e só no debate de quinta-feira à tarde é que tratamos de questões que poderíamos designar como fundamentais – tratamos da cultura, porque a cultura é de facto a fundação da unidade europeia. Não apenas a cultura das regiões mas também a cultura nacional, porque na realidade a herança da Europa é a herança das nações europeias, e isto talvez seja especialmente verdade no caso da nossa herança cultural.
Estou contente por este tema ter sido abordado. Estou contente porque suponho que irá assumir cada vez mais relevância no trabalho do Parlamento e também dos órgãos executivos da UE, especialmente a Comissão e o Conselho.
Věra Flasarová, em nome do Grupo GUE/NGL. – (CS) Senhora Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, concordo com o texto das perguntas formuladas pela minha colega Doris Pack. Na minha opinião, o apoio multilateral às regiões europeias é muito importante. Havia fronteiras na Europa que separaram os Estados e as nações entre si durante séculos, criando uma espécie de “terra de ninguém psicológica”. Felizmente, agora conseguimos eliminar as fronteiras, graças ao Acordo de Schengen, mas as regiões continuam divididas, as cidades, partidas ao meio e, em particular, os problemas psicológicos persistem, como se uma parte do território pertencesse aqui ou ali e outra, a qualquer outro lugar. Numa Europa cada vez mais integrada, estas velhas cicatrizes no mapa e nas mentes das pessoas estão a sarar bem, mas devagar. O caminho mais rápido para a sua cura, muito mais eficaz e prático do que todas as medidas que vêm de cima para baixo, consiste no apoio a iniciativas cívicas e a actividades das organizações culturais e das instituições regionais. As instituições regionais e as pessoas comuns que vivem neste ou naquele território sabem melhor o que é preciso fazer para reanimar a sua região.
Existem muitos projectos cuja implementação representaria tanto um passo em frente como um impulso para outras acções. Sou da região do Norte da Morávia, da Silésia, uma zona onde se encontra o território checo, polaco e eslovaco. E é precisamente ali, na região histórica de Tešín, que abrange actualmente a cidade checa de Český Těšín e a Cieszyn polaca, que foi criado um projecto intitulado “Um jardim nas duas margens do rio”, visto que existe um rio que passa entre as duas cidades, em tempos uma única unidade urbana. O projecto está a criar ligações entre as duas margens do rio, que não são apenas de natureza urbana, mas também arquitectónica e, sobretudo, cultural. As duas partes divididas do todo antes homogéneo têm de ser ligadas através das actividades culturais dos habitantes. O rio entre as duas cidades e os seus arredores tem de se tornar um lugar de intercâmbio cultural e de cruzamento cultural. No entanto, um aspecto importante destes projectos consiste nas novas oportunidades de emprego criadas não só durante a implementação do trabalho, mas também no período posterior. O sector de serviços vai certamente expandir-se, aumentando a capacidade de atracção da zona e apoiando o potencial para o turismo e outros tipos de empreendimento relacionados com o mesmo. Os autores do projecto “Um jardim nas duas margens do rio” inspiraram-se no exemplo de Estrasburgo, em França, e Kehl, na Alemanha, que também eram vizinhos tão próximos que formaram uma estrutura urbana natural. Também aqui, o rio Reno passa entre as duas cidades. O que se consegue em França e na Alemanha também se pode fazer na República Checa e na Polónia ou em qualquer lugar na Europa. Existem muitos mais exemplos disto na Europa Central. Quando falamos do intercâmbio cultural no desenvolvimento das regiões europeias, são precisamente estes projectos que me vêm à cabeça.
A UE, a Comissão e o Parlamento Europeu deveriam apoiar ainda mais do que aconteceu até à data projectos culturais deste tipo. Os autores das iniciativas cívicas queixam-se frequentemente de que estas actividades são excessivamente dificultadas por uma burocracia complicada ou por estruturas demasiado complexas nos ministérios e departamentos da tutela.
Christopher Heaton-Harris (PPE-DE). - (EN) Senhora Presidente, tenho duas perguntas para fazer ao Senhor Comissário. Uma: o que é cultura? E duas: que diabo é que ela tem a ver com a União Europeia?
Na minha região fica situado o condado histórico de Northamptonshire. Parte da sua identidade cultural, da sua história, do seu tecido social provém dos laços históricos que o ligam à indústria do calçado. O fabrico de calçado neste condado foi originalmente reconhecido em 1202, quando Peter the Cordwainer, o Pedro Sapateiro, quase se tornou famoso na região. Em 1452 o tribunal regulamentou preços e pesos para diversos comerciantes, incluindo os sapateiros, e a própria localidade de Northampton foi o centro da indústria do calçado durante todo esse tempo.
Em 1841, segundo a lista de recenseamento, havia no condado 1 821 sapateiros. A equipa de futebol local, Northampton Football Club, continua a ser designada como "The Cobblers", os sapateiros remendões, e neste momento ainda estão em actividade em Northamptonshire 34 fábricas de calçado, todas com mais de 100 anos. Os sapatos que hoje trago são da fábrica Barker, de uma aldeia chamada Earls Barton, no maravilhoso círculo eleitoral de Daventry, Westminster. Temos um museu, temos eventos culturais relacionados com a indústria do calçado – e tudo isso chegou antes da União Europeia.
Portanto, embora compreenda perfeitamente o papel da cultura nas regiões dos países, pergunto a mim próprio se, ou como é que, a União Europeia nos pode ajudar nestas coisas. E o que é que são as regiões da Europa? Penso que devemos deixar que a cultura nas regiões da Europa se desenvolva como sempre se desenvolveu – a nível local, organicamente e não dirigida pelo Governo central.
Vittorio Prodi (ALDE). – (IT) Senhora Presidente, Senhor Comissário, Senhoras e Senhores Deputados, obrigado pela vossa disponibilidade. Gostaria de alargar um pouco a nossa perspectiva e olhar não só para o passado mas também para o futuro. Estamos numa situação em que vemos que o crescimento não pode ser sempre contínuo, sendo restringido pela natureza limitada dos recursos naturais e pela capacidade limitada da Terra de absorver e metabolizar os nossos resíduos. Não podemos continuar a basear a nossa perspectiva unicamente no crescimento material – o nosso conceito de desenvolvimento; em vez disso, devemos ver o desenvolvimento com uma referência mais forte à qualidade de vida; no fundo, devemos desmaterializar a nossa sociedade.
Nesta perspectiva, as regiões são igualmente importantes pela sua riqueza cultural - ou seja, pela riqueza da sua qualidade de vida – que é extremamente importante numa altura como esta, em que devemos mudar radicalmente o nosso estilo de vida. Neste contexto de desmaterialização, a riqueza de uma região em termos da sua qualidade de vida é, pois, extremamente importante, diria mesmo absolutamente indispensável.
Por conseguinte, gostaria de orientar tanto a Comissão como o Parlamento no sentido de se consciencializarem da mudança de estilo de vida que devemos pôr em prática, da necessidade de uma desmaterialização das nossas sociedades e, portanto, de um trabalho cultural, que se tornará insubstituível já que teremos de substituir bens materiais por riqueza imaterial. Esta experiência regional é, pois, algo que devemos tentar compreender e preservar antes que seja varrida por toda uma série de desatenções.
Por esta razão gostaria de pedir que se avance com este debate, por ser tão essencial e porque, pura e simplesmente, temos de mudar a nossa forma de vida.
Zdzisław Zbigniew Podkański (UEN). – (PL) Senhora Presidente, a beleza da cultura advém da sua diversidade regional e local, que se altera com o desenvolvimento da sociedade. As culturas regionais, que estão profundamente enraizadas na tradição, formam uma base sólida para as culturas nacionais e as suas inúmeras variantes. Com o seu colorido de forma e expressão tornam-se muito atractivas e fornecem estímulo artístico, transportam experiência e emoção, e fortalecem os vínculos da sociedade local.
As culturas regionais estão a ser postas de lado pelos artistas profissionais que nelas vão buscar inspiração. Muitas das vezes pensa-se que a cultura regional tem de ser um movimento amador e que se deve dar um forte apoio financeiro ao movimento profissional. É provavelmente aqui que reside a fonte da tendência, que também se vê na UE, para financiar projectos de grande envergadura e dispendiosos, incluindo projectos internacionais que envolvem artistas profissionais de diferentes países. As culturas regionais e locais estão a morrer gradualmente e muitas das suas formas de expressão e as suas disciplinas e capacidades criativas estão a desaparecer.
Hoje podemos falar da cultura tradicional e popular nas regiões historicamente subdesenvolvidas, mas não há muito que possamos dizer sobre a sua existência em regiões em desenvolvimento. Torna-se, portanto, urgentemente necessário desenvolver um programa de investigação para documentar a protecção e o desenvolvimento da cultura regional em todas as suas expressões espirituais e artísticas. Essas expressões são apresentadas mais circunstanciadamente na minha alteração à resolução em debate. Espero que mereça o apoio dos colegas.
Pál Schmitt (PPE-DE). - (HU) A cultura é criadora de valor, tanto no sentido intelectual como material. As indústrias culturais e criativas dão emprego a milhares de pessoas em toda a Europa, encontrando-se os filmes, a edição de livros, as composições e publicações musicais - aquilo a que tantas vezes se chama indústria musical - entre os sectores de crescimento mais dinâmico.
Não é por acaso que as iniciativas mais populares e com mais êxito da UE têm a ver com cultura. No âmbito do programa de intercâmbio de colecções de arte europeias, o público de Budapeste tem agora oportunidade de visitar uma exposição de nível excepcional de Gustave Moreau e uma exposição de Alfons Mucha num museu de primeira linha.
Outra iniciativa de sucesso é o programa das capitais europeias da cultura. Através deste programa não só cidades mas regiões inteiras são promovidas e adquirem relevo. Dentro de menos de um ano, em 2010, uma pequena cidade do sul da Hungria, Pécs, ostentará orgulhosamente esse título, e os milhares de visitantes atraídos para essa área serão um incentivo ao crescimento de toda a região.
Creio que é justamente através da cultura que a UE pode aproximar-se progressivamente dos seus cidadãos e aproximá-los entre si. Quando falamos de identidade regional na União Europeia estamos, inevitavelmente, a remeter para a cultura. Espero que no período que se seguir à Estratégia de Lisboa haja ainda mais iniciativas e recursos disponíveis para a cultura e a educação do que actualmente. O motor de uma sociedade moderna e com uma economia baseada no conhecimento reside no espírito inventivo e original, isto é, na inovação e na criatividade.
Bernd Posselt (PPE-DE). – (DE) Senhora Presidente, há trinta anos, estava aqui em Estrasburgo quando o Parlamento eleito por sufrágio universal directo se reuniu pela primeira vez. A decana era Louise Weiss, que veio a dar o nome a este fantástico edifício, ele próprio um magnífico exemplar da cultura europeia. O discurso que proferiu constituiu o documento da fundação intelectual do Parlamento Europeu. Nessa altura, referiu-se ao tipo de europeus de que precisamos, unidos com base numa cultura europeia comum.
Esta cultura europeia não é algo de novo, como muitos pensam, é sim a redescoberta de algo que é muito mais antigo do que os Estados-nação, Senhor Deputado Heaton-Harris. As fronteiras, pelo menos no continente, são na sua maioria bastante artificiais. A cultura está profundamente enraizada em regiões que estão frequentemente divididas por fronteiras artificiais, e a cultura regional é de enorme importância como um elo entre as nações. Uma das suas maiores figuras culturais foi o poeta da floresta boémia, Adalbert Stifter, que trabalhou na Baviera, Alta Áustria e Boémia e que uniu os povos checo e alemão. Esta tradição deverá ser mantida viva – a cultura que é destruída pelo nacionalismo e pela deslocação, a cultura das minorias, a cultura regional, a cultura das regiões europeias que atravessa fronteiras e, em particular, a diversidade que só conseguiremos preservar em conjunto.
Franz Josef Strauß, o grande europeu bávaro, afirmou em tempos que só conseguiremos permanecer bávaros, bascos, alemães ou bretões se entretanto nos tornarmos europeus – sendo a Europa não um factor centralizador, mas antes um tecto comum contra a chuva da globalização e da uniformização.
Iosif Matula (PPE-DE) . – (RO) O projecto da União Europeia, concebido antes de mais como um mecanismo para a integração económica, tem uma enorme dívida para com o “cimento” que representa a cultura europeia. Ao mesmo tempo, encorajar a diversidade figura entre os objectivos da agenda cultural europeia lançada nesta legislatura, a par da promoção da cultura como um meio de crescimento económico e da integração da mesma nas relações com países terceiros.
A cultura acaba por ser vista de uma perspectiva ligeiramente diferente se pensarmos que este sector gera mais riqueza do que a indústria química europeia, por exemplo, dando um modo de vida a milhões de empregados.
Este sector pode contribuir para o desenvolvimento de regiões desfavorecidas através de subvenções a projectos de cooperação cultural nos domínios da arte e cultura. Por exemplo, a Roménia deu mostras de que está em posição de executar projectos de grande escala em parceria com regiões europeias através do programa "Sibiu, a Capital Europeia da Cultura 2007", que teve um enorme impacto económico nesta zona.
Paralelamente, cumpre-nos encorajar programas que promovam a mobilidade transfronteiriça entre todos aqueles que trabalham no sector cultural e a apresentação de eventos artísticos e culturais numa base transnacional.
Menciono estes assuntos como membro da Comissão da Cultura e da Educação e da Comissão do Desenvolvimento Regional, assim como na qualidade de antigo Presidente de uma região fronteiriça europeia.
Zbigniew Zaleski (PPE-DE). – (PL) Senhora Presidente, as pessoas têm de se alimentar, têm de se movimentar e têm de se abrigar do frio ou da chuva. Estes são elementos da produção e do comércio que servem para satisfazer necessidades básicas. Porém, o tipo de garfo com que comemos, ou a aparência da nossa bicicleta ou do telhado da nossa casa não têm nada a ver com economia, mas são uma expressão de cultura. As pessoas têm uma necessidade espiritual de criar, muito simplesmente pela criação em si. Elas têm orgulho na sua obra quando aqueles que a vêem ou a tocam exprimem o seu apreço e se sentem melhor por causa dela. Um dado importante é o facto de a diversidade cultural estar frequentemente associada às regiões. Não deveríamos nunca unificar essas regiões e a sua cultura – na verdade, devíamos era apoiar essa diversidade. A cultura é a expressão da alma das regiões. A UE seria um lugar extremamente desinteressante sem as riquezas culturais que possui actualmente. Manter a cultura fica caro, e o nosso papel é apoiar a cultura. Sem ela não haverá uma economia nem gente feliz na União Europeia.
Ewa Tomaszewska (UEN). – (PL) Senhora Presidente, a riqueza cultural da Europa vem da grande diversidade das suas regiões. Essa diversidade precisa de ser protegida. A renda de Koniaków é totalmente diferente da renda de Bruges. A mistura criada por uma reprodução superficial de ideias retiradas da cultura conduz ao empobrecimento. Temos de preservar essa diversidade de todas as formas e expressões de cultura, incluindo o multilinguismo e a cultura material, porque a nossa diversidade é a nossa identidade, é uma fonte de desenvolvimento criativo e de fecundação cruzada enriquecedora. Além disso dá uma finalidade ao turismo cultural. A cultura das regiões precisa de apoio e protecção. Gostaria de solicitar à Comissão Europeia que desenvolva um programa para esse efeito.
Janusz Onyszkiewicz (ALDE). – (PL) Senhora Presidente, o lema da União Europeia é "Unidos na Diversidade". Essa diversidade torna toda a UE excepcionalmente atraente, e também significa que somos muito diferentes de países como os Estados Unidos. De facto, a diversidade cultural assenta, entre outras coisas, na enorme diversidade das nossas culturas regionais, uma diversidade que torna essas regiões e países inteiros extremamente atraentes para os turistas. Eles são atraentes para nós, Europeus, e são também extremamente atraentes para outros povos que vêm à Europa para ver, experienciar e apreciar essa diversidade incomum.
A cultura regional deveria, por conseguinte, ser apoiada nem que seja só por isso. Mas também devemos lembrar que a cultura regional é uma ponte que permite que as pessoas que vivem nas regiões participem naquilo que é conhecido como alta cultura. Sem isso é difícil falar de harmonização e popularização de certos modelos de cultura e da sua percepção.
Czesław Adam Siekierski (PPE-DE). – (PL) Senhora Presidente, é na concretização da unidade da Europa e na preservação em simultâneo da sua diversidade, identidade e herança cultural que reside o grande valor da nossa Comunidade. Nações individuais, regiões e diferentes comunidades locais cultivam e desenvolvem a sua cultura e tradição e trazem essa herança para uma Europa unida. Partilham a sua cultura com outras regiões e em troca aprendem os feitos e realizações dessas regiões, dando algo aos outros e recebendo algo dos outros.
Para manter a herança cultural nas regiões e áreas mais pequenas é também importante que sejam disponibilizados fundos do orçamento da UE. Quem receava perder a sua cultura e a sua identidade após a adesão está a aperceber-se de que acontece o contrário – a UE apoia a cultura regional, popular e local.
Christopher Beazley (PPE-DE). – (EN) Senhora Presidente, uso da palavra para apoiar o meu colega Zbigniew Zaleski.
Alguém disse um dia o seguinte: "Cada vez que oiço a palavra "cultura", levo a mão ao revólver". Penso que o Parlamento Europeu subestima hoje em dia, como aliás o fazem os nossos parlamentos nacionais e governos nacionais, a importância da educação e da cultura. Estamos sempre no fim da fila.
Diz-se que "a mão que embala o berço governa o mundo". Eu penso – e este é tão-somente o meu ponto de vista pessoal – que a Grécia foi o berço da civilização europeia. Um ou dois ingleses – Lord Byron e outros – fizeram algumas coisas. Talvez o Senhor Comissário Borg, de Malta, o país da George Cross, saiba responder a esta pergunta: porque é que não podemos gastar um pouco mais de dinheiro para apoiar o futuro da nossa cultura e da nossa civilização? Gastamos não sei quantos milhões de milhares de milhões de euros nisto, naquilo e naqueloutro; por favor – música, poesia, história, harmonia. Dêem-nos uma oportunidade.
Joe Borg, Membro da Comissão. – (EN) Senhora Presidente, gostaria de agradecer aos senhores deputados o número de aspectos que focaram. Vou certamente transmitir os aspectos e as preocupações que expressaram ao Comissário Figeľ. Gostaria, no entanto, de focar alguns aspectos e reacções gerais.
A senhora deputada Pack falou sobre a harmonização de regras a nível europeu e de como isso tem impacto na diversidade regional. Gostaria de assinalar que é necessário haver harmonização a nível europeu para assegurar igualdade de circunstâncias em toda a União Europeia, a fim de que os cidadãos possam beneficiar plenamente do mercado interno único. Isto não quer, porém, dizer que essa harmonização conduza a uma menor diversidade cultural. Na realidade, foi também essa a conclusão do Ano Europeu do Diálogo Intercultural.
Além disso, a Comissão, através da sua política regional, promove a diversidade cultural e investe na cultura, tanto directa como indirectamente, chamando, na realidade, as autoridades e as entidades interessadas a nível regional a participar. Em diversas áreas de política, a Comissão procura promover a diversidade e ter em conta as especificidades regionais no território da União Europeia.
No que respeita ao aspecto focado relativamente à questão da cultura e da crise económica e à contribuição global para o crescimento e o emprego, gostaria de recordar que a Comissão vai efectuar um estudo este ano para analisar a forma como a dimensão cultural foi integrada nas estratégias de desenvolvimento regional para 2007-2013. Os resultados do estudo porão em destaque o valor do investimento no sector cultural, incluindo as indústrias culturais e criativas, e sublinhará as ligações entre esse investimento, os objectivos específicos do desenvolvimento regional e a Agenda de Lisboa.
Relativamente ao Livro Verde, gostaria de vos informar, como disse à partida, que este documento de política deverá surgir no primeiro trimestre de 2010 e que tem por objectivo encetar um processo de consulta aberto. Tem três objectivos políticos principais. Primeiro, apresentar uma abordagem mais estratégica. Segundo, desbloquear o potencial das indústrias culturais e criativas europeias. Terceiro, contribuir para o desenvolvimento de estratégias destinadas a incentivar uma melhor articulação entre indústrias culturais e criativas e outros sectores da economia, ligando dessa forma a cultura e a criatividade à inovação e à economia em sentido mais lato. A dimensão regional será, como é óbvio, totalmente tomada em consideração neste contexto.
Gostaria de terminar com uma referência à afirmação feita pelo senhor deputado Posselt de que a cultura é frequentemente destruída pelos nacionalismos. Pela União Europeia certamente que não: a União Europeia acredita firmemente na unidade e na diversidade e defende-as.
Presidente. - Declaro que recebi três propostas de resolução, apresentadas nos termos do n.º 5 do artigo 108.º do Regimento.
Está encerrado o debate.
A votação terá lugar no próximo período de sessões.