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Relato integral dos debates
Terça-feira, 19 de Outubro de 2010 - Estrasburgo Edição JO

7. Sessão solene - Alocução de Ban Ki-Moon, Secretário-Geral das Nações Unidas
Vídeo das intervenções
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  Presidente. – Senhor Secretário-Geral, ilustres convidados, colegas, amigos, é uma grande honra para nós receber no Parlamento Europeu, na sua primeira visita oficial, Sua Excelência o Dr. Ban Ki-moon, Secretário-Geral das Nações Unidas.

Esta visita é muito oportuna. No mês passado, na cimeira das Nações Unidas sobre os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio, tivemos o ensejo de rever as nossas realizações e de ver o que ainda é preciso fazer. No domingo passado foi o Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza. Faltam dois meses para a cimeira de Cancún. Estamos a aguardar um acordo vinculativo e algumas decisões fundamentais e medidas práticas. Também estamos a assistir a acontecimentos importantes que afectam a segurança global, com desenvolvimentos no Médio Oriente, na Ásia e na África.

Contudo, uma visita do Secretário-Geral das Nações Unidas seria sempre oportuna, dado que nós, Nações Unidas e União Europeia, partilhamos uma responsabilidade por questões globais. Como V. Exa. escreveu há minutos no Livro de Ouro do Parlamento Europeu, somos aliados naturais. É verdade, sentimos o mesmo. V. Exa. vai dirigir-se ao nosso Parlamento e aos nossos cidadãos dentro de alguns minutos.

O Parlamento Europeu foi sempre a força impulsionadora de políticas europeias ambiciosas. Esta é a forma como entendemos as aspirações dos nossos cidadãos. Eles querem uma Europa de solidariedade, de solidariedade dentro da Europa, mas também de solidariedade com todas as pessoas de todo o mundo, de solidariedade com as nações que trabalham continuamente para garantir que os seus cidadãos vivam com dignidade. Mas a dignidade não significa apenas ausência de fome, de doença e de violência. Também significa liberdade para realizar as ambições da educação e da participação activa na vida social e política. Dignidade é também a liberdade de crença e respeito pelas diferenças.

Estamos convictos de que o Senhor Secretário-Geral partilha connosco essas aspirações. Consideramos muito importante o seu empenhamento incansável e apaixonado nos valores que as Nações Unidas e a União Europeia têm em comum. E é com expectativa que aguardamos o seu discurso.

(Aplausos)

 
  
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  Ban Ki-moon, Secretário-Geral das Nações Unidas. – (FR) Senhor Presidente Jerzy Buzek, Senhor Secretário-Geral Klaus Welle, Senhoras e Senhores Ministros, Senhoras e Senhores Deputados, muito boa tarde.

É para mim uma grande honra estar aqui a dirigir-me ao Parlamento Europeu.

Senhoras e Senhores Deputados, V. Exas. foram enviadas para Estrasburgo pelos cidadãos dos vossos países com o objectivo de construir uma Europa mais forte para o século XXI.

Eu próprio vim aqui porque os senhores são a voz democrática da população europeia, isto é, de quase 500 milhões de pessoas.

Aprovam orçamentos, legislam e debatem com um espírito extraordinário.

São o elo vital entre as dimensões mundial, regional e local.

São um poderoso veículo de paz, de estabilidade e de prosperidade na vossa própria região.

Desempenham também um papel crucial na formulação de políticas cujo alcance ultrapassa largamente as vossas fronteiras.

As vossas responsabilidades vão aumentar devido às possibilidades abertas pelo Tratado de Lisboa.

Congratulamo-nos por este progresso.

(EN) As Nações Unidas e a União Europeia são parceiros naturais. Fazemos realmente a diferença para as populações dos países de todo o mundo.

Milhões de crianças pobres, de ambos os sexos, frequentam a escola, milhares de milhões de crianças estão a ser vacinadas contra doenças mortais e milhares de soldados estão a manter a paz desde o Líbano até à África Central, a Chipre e mesmo mais além, tudo como resultado da nossa parceria e da extraordinária generosidade e liderança da Europa. Esse trabalho deve aprofundar-se e crescer.

Enfrentamos muitos desafios e crises múltiplas. Mas outra coisa está a acontecer – um momento de súbita inspiração em todo o mundo. País após país, líder após líder, começam a reconhecer que a melhor maneira de enfrentar os nossos desafios é procurando resolvê-los juntos – juntos com as Nações Unidas e com todos os membros da União Europeia. Nenhuma nação, nenhum grupo, nenhuma região pode fazer isso sozinho. Se partilharmos o fardo, vamos partilhar os benefícios.

Por isso, hoje, gostaria de falar de solidariedade – do modo como a União Europeia e as Nações Unidas juntas conseguem enfrentar os medos reais de pessoas reais. Por toda a parte, vemos correntes de preocupação. Os empregos são escassos, as tensões são elevadas, as pessoas sofrem, estão zangadas e desiludidas. Isso levou a uma erosão da confiança nas instituições, nos líderes, e entre vizinhos. Estamos a viver tempos conturbados, mesmo numa região próspera como a Europa.

Estou convencido de que podemos passar no teste. Juntos, definimos uma visão para o nosso trabalho − uma definição precisa dos principais desafios do nosso tempo. Mobilizámos um apoio global para uma acção comum. Permita-me que seja claro: estamos em dívida para com as pessoas, que, com toda a razão, exigem resultados. Agora não é a altura própria para nos limitarmos a fazer discursos, mas é a hora de pôr em prática esses discursos e de passar à acção.

Gostaria de me centrar em três desafios globais: em primeiro lugar, lutar contra a pobreza extrema no mundo, em segundo lugar, enfrentar as mudanças climáticas e, em terceiro lugar, construir um mundo livre de armas nucleares.

Permitam-me que seja mais específico. Primeiro, o desafio da pobreza. No mês passado, os líderes mundiais reuniram-se na cimeira das Nações Unidas para os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio, em Nova Iorque. Há uma boa notícia – um importante progresso no combate à pobreza extrema e à fome, nas matrículas na escola, na saúde infantil, na água potável, e no combate à malária, tuberculose e VIH/SIDA.

No entanto, os resultados que obtemos são irregulares e surgem obstáculos no nosso caminho. Negociações comerciais globais estagnaram, mantendo subsídios nocivos e um regime injusto que nega novas oportunidades aos países em desenvolvimento. O aumento dos preços está a deixar medicamentos essenciais fora do alcance de muitos dos mais necessitados. Quase mil milhões de pessoas vão para a cama com fome todas as noites. Só este ano, mais 64 milhões de pessoas irão cair na pobreza extrema.

Tudo isto exige um impulso renovado para alcançar as metas dentro do prazo de 2015. No encontro recente da cimeira para os ODM, foi precisamente em relação a isso que chegámos a acordo. Vamos reforçar os recursos e a prestação de contas. Desejo louvar os membros da União Europeia que assumiram compromissos fortes, apesar das pressões fiscais. Podemos apertar os cintos sem fechar os olhos aos desafios comuns.

Peço a todos os presentes que apoiem as Nações Unidas onde a acção é urgente e particularmente necessária. Temos de fixar a nossa atenção no crescimento centrado no emprego − trabalho decente. O investimento em energia limpa e renovável é fundamental para dinamizar de novo o emprego e a inovação. Onde as pessoas passam fome, temos de ajudá-las a ajudarem-se a si próprias.

Agradeço-vos por terem investido um montante de mil milhões de euros na Facilidade Alimentar da União Europeia. Temos de colocar os recursos onde eles irão ter o maior impacto − em particular, na saúde e no reforço do poder das mulheres. No mês passado, conseguimos angariar 40 mil milhões de dólares em compromissos para os próximos cinco anos para a nossa Estratégia Global para a Saúde das Mulheres e das Crianças. Este é o mais ambicioso dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio. Alguns poderiam dizer, empenhem-se nas vitórias fáceis, mas eu não acredito em declarar vitória dessa maneira. Temos de lutar pelas metas mais difíceis de alcançar e pelas pessoas mais difíceis de alcançar nos lugares mais difíceis de alcançar. Podemos salvar as vidas de mais de 16 milhões de mulheres e crianças.

O nosso segundo grande desafio são as alterações climáticas. Aqui, também, a visão e a voz da Europa foram fundamentais.

Os cientistas alertam-nos para o facto de as condições meteorológicas extremas a que assistimos em muitos países poderem ser o número de abertura do nosso futuro. Assistimos a incêndios devastadores na Rússia e a inundações épicas no Paquistão. No entanto, devemos sempre tomar cuidado ao ligar os fenómenos meteorológicos específicos com as alterações climáticas. Também não devemos desviar os olhos do que é fácil de ver. A mensagem é clara: quanto mais adiarmos, mais vamos ter de pagar − em termos de competitividade, de recursos e de vidas humanas. Devemos agir agora para reduzir riscos climáticos, reforçar a nossa resiliência e apoiar os países em desenvolvimento na aposta no crescimento energético limpo.

A Cimeira de Copenhaga não foi perfeita, mas constituiu uma base importante para avançarmos. Desde então, tem havido progressos relativamente a questões de implementação importantes, como adaptação, cooperação tecnológica e medidas no sentido de reduzir a desflorestação. O movimento tem sido mais lento no que toca a compromissos em matéria de atenuação, financiamento a longo prazo, vigilância e verificação, bem como ao futuro do Protocolo de Quioto. Na próxima Conferência das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas, em Cancún, devemos alcançar progressos nas questões em que há consenso. Sobre essas questões ainda por resolver, os governos têm de chegar a acordo sobre como irão avançar para as solucionar.

Apelo a todas as partes para que mostrem flexibilidade, solidariedade e coragem para assumirem compromissos, se necessário. Disso dependem a saúde, a segurança e a prosperidade de milhões de pessoas. Não há tempo a perder.

No imediato, o financiamento é fundamental para construir a confiança e estimular a acção. Há ainda uma grande lacuna de confiança entre o mundo em desenvolvimento e o mundo desenvolvido. A maneira mais rápida de colmatar esta lacuna é através do fornecimento de apoio financeiro àqueles que não têm quaisquer recursos.

Apelo a todos os países desenvolvidos, incluindo os que estão representados neste venerável Parlamento, para que assegurem a sua quota-parte dos 30 mil milhões de dólares em financiamento acelerado prometido em Copenhaga para 2010-2012. Muitos vêem isso como um teste decisivo do empenhamento dos países industrializados em fazer progredir negociações mais amplas. Temos também de angariar 100 mil milhões de dólares por ano até 2020. Esta foi uma promessa feita pelo mundo desenvolvido em Copenhaga. O meu Grupo Consultivo de Alto Nível sobre o financiamento das alterações climáticas tem vindo a trabalhar este ano e apresentará várias opções sobre a forma de angariar 100 mil milhões de dólares por ano para países em desenvolvimento até 2020.

A alteração climática constitui uma parte fundamental da agenda mais ampla sobre o desenvolvimento sustentável. É por isso que recentemente criei um novo Painel de Alto Nível sobre Sustentabilidade Global, co-presidido pelo Presidente Halonen da Finlândia e pelo Presidente Zuma da África do Sul. O seu trabalho será ligar os diversos pontos que estão interligados, e encontrar o caminho certo através dos desafios económicos, sociais e ambientais interligados das próximas décadas.

Em tudo isto, a liderança da Europa – a vossa liderança – será essencial. A Europa tem sido uma máquina histórica de crescimento e mudança. Agora, quando os governos não estão em movimento − quando o comboio empancou nas nossas conversações sobre as alterações climáticas ou outras questões − a Europa pode ser a locomotiva que o impulsiona para a frente. Podemos empurrar, podemos puxar e podemos voltar a pôr o comboio nos trilhos. Podemos manter-nos em movimento na direcção certa.

Estamos também a avançar juntos na construção não só de um mundo mais limpo, mas de um mundo mais seguro. Este é o terceiro desafio global que desejo apresentar-vos hoje.

O objectivo de conseguir um mundo livre de armas nucleares é um assunto de grande interesse para os membros deste Parlamento. Felicito-vos por falarem sobre as questões de desarmamento, fazendo perguntas oportunas e pedindo novos avanços. Obrigado pela vossa resolução de Abril de 2009, que apoiou o desarmamento nuclear total e citou a proposta de uma Convenção sobre Armas Nucleares.

Hoje, há uma nova dinâmica no cumprimento dos compromissos do desarmamento. Este progresso continuará se − e somente se − as vozes das populações estiverem totalmente reflectidas nas questões nacionais e regionais, e se os quinhentos milhões de vozes na União Europeia falarem em harmonia sobre esta questão, juntamente com as vozes de outras regiões.

Agradeço e congratulo-me pelo vosso apoio à minha proposta em cinco pontos sobre o desarmamento nuclear e a não proliferação de armas nucleares, bem como o de muitos líderes, incluindo a União Inter-Parlamentar. Estamos a trabalhar para eliminar as armas de destruição maciça, para restringir o comércio de armas de pequeno porte e armamento ligeiro e para conter o risco de que os materiais nucleares possam cair nas mãos de terroristas. Vamos avançar para além da nossa época sobrearmada e subdesenvolvida em direcção a um mundo mais seguro para todos.

Estes são grandes desafios e grandes objectivos – temas distintos, com um denominador comum, ou seja, a solidariedade global. Ascenderemos ou cairemos juntos, por isso devemos proteger-nos contra a divisão − divisão em todo o mundo e divisão no seio das comunidades.

Há quase sete anos, o meu antecessor Kofi Annan esteve aqui, perante vós. No seu discurso, ele fez um apelo apaixonado à Europa para que aproveitasse as oportunidades apresentadas pela imigração e resistisse àqueles que diabolizavam esses recém-chegados como "o outro". Hoje, eu gostaria de poder referir que a situação na Europa melhorou entretanto, mas enquanto amigo da Europa, partilho uma preocupação profunda.

É quase um lugar-comum dizer que o nascimento da União Europeia pôs termo a séculos de guerra e trouxe uma paz duradoura ao continente, embora isso continue a ser uma verdade profunda e um farol de esperança. A Europa tem servido como um extraordinário mecanismo de integração, entretecendo as nações e as culturas num todo que é muito, muito maior que a soma das suas partes. Mas para a Europa, "conquistar a paz" foi uma história do século passado.

O desafio europeu do século XXI é "a tolerância dentro". A inclusão e a construção de comunidades diversas é uma tarefa tão complexa como a que a Europa enfrentou após a Segunda Guerra Mundial. Nada disto é fácil. Os migrantes, seja de dentro ou de fora da Europa, sofrem desproporcionadamente com o desemprego, a discriminação e a desigualdade de oportunidades em escolas e locais de trabalho. Uma tendência perigosa está a surgir − uma nova política de polarização.

(Aplausos)

Alguns jogam com o medo das pessoas. Eles procuram invocar os valores liberais para causas não liberais. Acusam os imigrantes de violar os valores europeus.

(Aplausos)

No entanto, muitas vezes, são os acusadores que subvertem estes valores − e, por conseguinte, a própria ideia do que significa ser um cidadão da União Europeia.

Os capítulos mais negros da Europa foram escritos numa linguagem semelhante a esta. Hoje, os principais alvos são imigrantes da fé muçulmana. A Europa não pode permitir estereótipos que fecham as mentes e criam ódio. O mundo não pode permitir uma Europa que faz isso.

(FR) A Europa moderna baseia-se nos direitos humanos e nos valores fundamentais da humanidade. A nossa ambição é, portanto, a de um continente unido e não dividido por diferenças étnicas ou religiosas. Uma União onde todas a crianças, independentemente da origem étnica dos seus pais, tenham as mesmas oportunidades de sucesso.

Tenho confiança no modelo europeu, numa Europa que representa não apenas uma entidade geográfica mas também um ideal. Estamos a atravessar tempos difíceis. É justamente porque eles são difíceis que devemos continuar a dar mostras de solidariedade.

Temos de estar à altura dos desafios mundiais. Hoje mencionei três deles: a luta contra a pobreza, as alterações climáticas e a construção de um mundo sem armas nucleares.

Faço um apelo a vós, membros do Parlamento Europeu, para que mostrem liderança e solidariedade, tanto dentro como fora da Europa. Como esse ilustre alsaciano, Albert Schweitzer, disse, o primeiro passo para o desenvolvimento das regras morais é um sentimento de solidariedade para com outros seres humanos.

Não duvido de que a Europa, um símbolo de solidariedade, saberá mostrar-se à altura desse desafio.

(O Parlamento, de pé, aplaude o orador)

 
  
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  Presidente. – Senhor Secretário-Geral, agradeço-lhe as suas palavras tão encorajadoras, e designadamente ter referido a liderança da União Europeia, a nossa solidariedade, e o facto de a Europa ser também uma locomotiva do nosso comboio global. Estou bastante seguro de que iremos manter o comboio nos trilhos. Para ambas – as Nações Unidas e a União Europeia – a palavra mais importante é "unidos". Dizemos que estamos unidos na diversidade, e que por isso vamos cooperar. Vamos trabalhar juntos para um mundo melhor, para todas as nações, as Nações Unidas. Mais uma vez, muito obrigado.

(Aplausos)

 
  
  

PRESIDÊNCIA: R. ANGELILLI
Vice-presidente

 
  
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  Michał Tomasz Kamiński (ECR).(PL) Senhoras e Senhores Deputados, há várias horas, teve lugar um brutal ataque terrorista a um dos gabinetes do meu partido na Polónia. Como resultado desse ataque, duas pessoas morreram, incluindo um dos funcionários do nosso parlamento, que trabalhava para um dos nossos colegas. Espero que a reacção a este acto brutal de agressão política, sem precedentes na história do meu país e em resultado do qual duas pessoas perderam a vida, seja a condenação do Parlamento e uma condenação clara dos métodos de violência e do assassinato de opositores políticos.

(Aplausos)

 
  
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  Presidente. – Obrigada, Senhor Deputado Kamiński. Como viu, esta Assembleia manifestou a sua solidariedade para com as vítimas desse acto absolutamente inaceitável.

 
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