PROPOSTA DE RESOLUÇÃO COMUM sobre as medidas recentemente tomadas pela Federação da Rússia contra os juízes, procuradores e investigadores lituanos que participaram na investigação dos trágicos acontecimentos de 13 de janeiro de 1991 em Vílnius
26.11.2019 - (2019/2938(RSP))
em substituição das propostas de resolução seguintes:
B9‑0182/2019 (PPE)
B9‑0183/2019 (Verts/ALE)
B9‑0184/2019 (ECR)
B9‑0185/2019 (S&D)
B9‑0186/2019 (Renew)
Rasa Juknevičienė, Andrius Kubilius, Michael Gahler
em nome do Grupo PPE
Kati Piri, Birgit Sippel, Tonino Picula, Raphaël Glucksmann, Juozas Olekas, Vilija Blinkevičiūtė, Sven Mikser
em nome do Grupo S&D
Petras Auštrevičius, Abir Al‑Sahlani, Malik Azmani, Phil Bennion, Gilles Boyer, Jane Brophy, Sylvie Brunet, Jordi Cañas, Dita Charanzová, Olivier Chastel, Anna Júlia Donáth, Fredrick Federley, Barbara Ann Gibson, Klemen Grošelj, Christophe Grudler, Antony Hook, Ivars Ijabs, Moritz Körner, Ondřej Kovařík, Nathalie Loiseau, Jan‑Christoph Oetjen, Urmas Paet, Michal Šimečka, Susana Solís Pérez, Ramona Strugariu, Marie‑Pierre Vedrenne
em nome do Grupo Renew
Sergey Lagodinsky, Tineke Strik, Bronis Ropė
em nome do Grupo Verts/ALE
Anna Fotyga, Ryszard Czarnecki, Zdzisław Krasnodębski, Ruža Tomašić, Assita Kanko, Adam Bielan, Alexandr Vondra, Jan Zahradil, Evžen Tošenovský, Witold Jan Waszczykowski, Veronika Vrecionová, Jacek Saryusz‑Wolski
em nome do Grupo ECR
Resolução do Parlamento Europeu sobre as medidas recentemente tomadas pela Federação da Rússia contra os juízes, procuradores e investigadores lituanos que participaram na investigação dos trágicos acontecimentos de 13 de janeiro de 1991 em Vílnius
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta as suas anteriores resoluções sobre a Federação da Rússia,
– Tendo em conta a Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais (Convenção Europeia de Proteção dos Direitos Humanos),
– Tendo em conta a Declaração Universal dos Direitos Humanos,
– Tendo em conta o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos,
– Tendo em conta a Convenção Europeia de Auxílio Judiciário Mútuo em Matéria Penal,
– Tendo em conta a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia,
– Tendo em conta os Princípios Fundamentais da Independência do Sistema Judiciário das Nações Unidas,
– Tendo em conta a recente troca de pontos de vista na Comissão das Liberdades Cívicas, da Justiça e dos Assuntos Internos em 12 de novembro de 2019[1],
– Tendo em conta o artigo 132.º, n.ºs 2 e 4, do seu Regimento,
A. Considerando que, em consequência direta do Pacto Molotov-Ribbentrop, a URSS comunista anexou a República da Lituânia, para além de outros países;
B. Considerando que a Federação da Rússia, tendo assumido compromissos ao abrigo da Declaração Universal dos Direitos do Homem e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, assim como na qualidade de membro efetivo do Conselho da Europa e da Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa, se comprometeu a respeitar os princípios da democracia, do Estado de Direito e do respeito pelas liberdades fundamentais e pelos direitos humanos;
C. Considerando que, entre 11 e 13 de janeiro de 1991, as forças armadas da URSS cometeram um ato de agressão contra o Estado independente da Lituânia e contra os cidadãos que tentavam defender pacificamente a torre de televisão de Vilnius, de que resultaram 14 mortos e cerca de 800 feridos; considerando que as ações repressivas das forças armadas soviéticas continuaram até à tentativa de golpe de Estado que teve lugar em agosto de 1991, em Moscovo;
D. Considerando que o derramamento de sangue foi denunciado em todo o mundo, nomeadamente pelo Chefe do Conselho Supremo da República Socialista Federativa Soviética Russa, durante uma manifestação maciça organizada em Moscovo alguns dias mais tarde;
E. Considerando que a Federação da Rússia reconheceu a restauração da independência da República da Lituânia, em 11 de março de 1990, no Tratado entre a República da Lituânia e a República Socialista Federativa Soviética Russa que estabelece as bases para as relações entre Estados, de 29 de julho de 1991;
F. Considerando que a Federação da Rússia assumiu os direitos e obrigações da antiga União Soviética e é o Estado que lhe sucedeu;
G. Considerando que, em 27 de março de 2019, o Tribunal Regional de Vílnius proferiu uma sentença no denominado «processo de 13 de janeiro», em que Dmitry Yazov, antigo ministro da defesa da União Soviética, Vladimir Uskhopchik, antigo comandante do exército soviético de Vilnius, Mikhail Golovatov, antigo comandante das forças especiais do KGB, e 64 cidadãos russos, bielorrussos e ucranianos foram considerados culpados de crimes de guerra e de crimes contra a humanidade pela sua participação na agressão contra o Estado da Lituânia;
H. Considerando que todos os autores desse ataque foram julgados à revelia, com a exceção de dois, Yuri Mel e Gennady Ivanov, antigos oficiais do exército soviético, e que os arguidos foram condenados a penas de prisão até 14 anos; considerando que as sentenças proferidas na primavera de 2019 dizem respeito aos trágicos acontecimentos que se seguiram à declaração de independência da Lituânia, em 11 de março de 1990, e às tentativas soviéticas para forçar a Lituânia a revogar a sua declaração de independência, que tiveram início com um bloqueio económico no primeiro semestre de 1990 e culminaram num esforço brutal para derrubar o Governo lituano em janeiro de 1991;
I. Considerando que, ao realizar a investigação prévia ao «processo de 13 de janeiro», as autoridades da República da Lituânia solicitaram ativamente a assistência jurídica das autoridades competentes da Federação da Rússia neste processo, não tendo estas autoridades, no entanto, colaborado;
J. Considerando que a Federação da Rússia é considerada responsável por abrigar e proteger os principais responsáveis e os autores dos atos de agressão armada contra civis inocentes e não armados, como o principal oficial militar durante os acontecimentos de janeiro de 1991, Mikhail Golovatov, e que está a tomar todas as medidas possíveis para os ajudar a eximir-se da sua responsabilidade;
K. Considerando que a reação inicial da Rússia à decisão judicial foi negativa, tendo a Duma do Estado Russo alegado que o julgamento tinha «motivações políticas», constituía «uma tentativa de reescrever a História», e o Ministério dos Negócios Estrangeiros russo anunciado que «o assunto não iria ficar por ali»;
L. Considerando que, entre julho de 2018 e abril de 2019, a Comissão de Investigação da Federação da Rússia instaurou vários processos penais contra procuradores, investigadores e juízes da República da Lituânia envolvidos na investigação ou na apreciação do «processo de 13 de janeiro», com base nos artigos 299.º e 305.º do Código Penal da Federação da Rússia, que preveem responsabilidade penal para quem «atribui responsabilidade penal a uma pessoa cuja inocência é conhecida» e para o juiz ou os juízes que «proferem uma sentença, uma decisão ou outro ato jurídico reconhecidamente injusto»;
M. Considerando que esta ação penal movida pela Federação da Rússia por razões políticas pode resultar em tentativas de utilização abusiva do sistema da Interpol e de outros acordos de cooperação bilaterais e multilaterais para restringir os direitos dos procuradores juízes durante as buscas, os interrogatórios e as detenções no quadro do «processo de 13 de janeiro»; considerando que a Rússia pode tentar solicitar mandados de detenção internacionais contra os funcionários lituanos envolvidos neste processo;
N. Considerando que os meios de comunicação social controlados pela Federação da Rússia, bem como pelos seus representantes oficiais, organizam uma campanha de propaganda e desinformação com o objetivo de desenvolver teorias da conspiração sobre o «processo de 13 de janeiro», e considerando que esta campanha se integra nas ameaças híbridas contra a UE e as democracias;
O. Considerando que o Estado de Direito, incluindo a independência do poder judicial, constitui um dos valores comuns em que a União Europeia se alicerça; considerando que, nos termos dos Tratados, compete à Comissão, juntamente com o Parlamento e o Conselho, garantir o respeito pelo Estado de Direito enquanto valor fundamental da União, bem como assegurar que a legislação, os valores e os princípios da UE sejam respeitados;
P. Considerando que os juízes de um Estado-Membro são também juízes de toda a União Europeia;
Q. Considerando que a independência do poder judicial está na base do Estado de Direito e é essencial para o funcionamento da democracia e o respeito dos direitos humanos; considerando que a independência do poder judicial está consagrada no artigo 47.º da Carta dos Direitos Fundamentais e no artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos;
R. Considerando que os Princípios Básicos das Nações Unidas relativos à Independência da Magistratura estipulam que é o dever de todas as instituições governamentais ou de outros tipos respeitar e observar a independência do poder judicial; considerando que estes princípios também estipulam que não pode haver ingerências inadequadas ou injustificadas nos processos judiciais[2];
S. Considerando que a Declaração Universal dos Direitos Humanos consagra, designadamente, os princípios da igualdade perante a lei, da presunção de inocência e do direito a um julgamento equitativo e público por um tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido pela lei;
T. Considerando que o artigo 1.º da Convenção Europeia de Auxílio Judiciário Mútuo em Matéria Penal — ratificada pela Federação da Rússia — estipula que « As Partes Contratantes comprometem-se, de acordo com as disposições da presente Convenção, a conceder mutuamente o mais amplo auxílio judiciário possível, nos processos relativos a infrações cuja repressão seja da competência das autoridades judiciárias da Parte requerente no momento em que o auxílio for solicitado»;
U. Considerando que a Federação da Rússia infringe cada vez mais o direito e os compromissos internacionais e assume posições contrárias às boas relações de vizinhança, comprometendo assim qualquer perspetiva de cooperação futura;
1. Manifesta a sua solidariedade e simpatia para com os familiares das vítimas do «processo de 13 de janeiro»;
2. Observa que as ações das autoridades da Federação da Rússia no que diz respeito aos juízes e procuradores lituanos violam valores jurídicos fundamentais, em particular a independência do poder judicial, bem como o princípio segundo o qual as liberdades e os direitos humanos só podem ser legalmente limitados para os fins com que o direito internacional impõe tais restrições;
3. Recorda que a ação penal contra os procuradores e os juízes pelas suas atividades profissionais constitui uma forma inaceitável de influência externa que afeta o Estado de Direito;
4. Salienta que os processos penais contra os procuradores e os juízes não podem ser considerados legítimos;
5. Condena veementemente estas violações dos princípios fundamentais e das normas de direito internacional cometidas pelas autoridades russas e opõe-se a estes casos de ação penal por motivos políticos;
6. Manifesta a sua solidariedade para com os procuradores, investigadores e juízes lituanos acusados pela Federação da Rússia neste processo e com os esforços do Governo lituano para chamar a atenção para o caso e para limitar os danos e os riscos que enfrentam as pessoas ilegalmente acusadas pelas autoridades russas;
7. Salienta que as garantias universalmente reconhecidas para independência dos juízes e dos procuradores proíbem qualquer ingerência na administração da justiça pelo tribunal, ou mesmo a mais pequena influência sobre uma decisão judicial, bem como ações judiciais devido a um julgamento proferido ou a ingerência no trabalho do Ministério Público na investigação de casos;
8. Insta as autoridades públicas da Federação da Rússia a porem termo aos processos penais instaurados contra os procuradores, investigadores e juízes lituanos no quadro do «processo de 13 de janeiro»;
9. Insta as autoridades da Federação da Rússia, na aplicação do Tratado entre a República da Lituânia e a República Socialista Federativa Soviética Russa sobre as bases para as relações entre Estados, de 29 de julho de 1991, a avaliarem a responsabilidade das pessoas que lideraram ou participaram na agressão de 11 a 13 de janeiro de 1991 contra o Estado da Lituânia e a prestarem assistência às autoridades responsáveis pela aplicação da lei da República da Lituânia nos esforços para obter justiça no «processo de 13 de janeiro»;
10. Exorta as autoridades russas e bielorrussas a respeitarem os pedidos de auxílio judiciário mútuo da República da Lituânia no «processo de 13 de janeiro»;
11. Insta as autoridades russas a porem termo à desinformação e às declarações de propaganda irresponsáveis por parte dos funcionários da Federação da Rússia no que respeita ao «processo de 13 de janeiro»;
12. Exorta os Estados-Membros, caso recebam pedidos de auxílio judiciário mútuo da Federação da Rússia relacionados com uma ação penal no país contra procuradores e juízes lituanos envolvidos no «processo de 13 de janeiro», a considerarem este processo como politicamente motivado, cooperarem estreitamente com as autoridades lituanas e negarem assistência judiciária à Federação da Rússia neste processo;
13. Solicita à Comissão de Controlo dos Ficheiros da Interpol, à qual incumbe a missão de evitar mandados de detenção abusivos de caráter político, que se mantenha vigilante no que respeita a qualquer pedido de mandado de detenção internacional contra os funcionários lituanos acusados; insta todos os Estados-Membros e outros signatários da Constituição da Interpol a ignorarem todos os mandados de detenção internacionais contra os funcionários lituanos acusados; insta a Interpol a ignorar todos os pedidos russos de mandados relacionados com o «processo de 13 de janeiro»;
14. Exorta todos os Estados-Membros a absterem-se de transferir para a Rússia quaisquer dados pessoais que possam ser utilizados em processos penais contra juízes, procuradores e inspetores da Lituânia;
15. Insta os Estados-Membros a cooperarem plenamente a nível europeu no que se refere às suas políticas em relação à Rússia – uma vez que uma maior coerência e uma melhor coordenação são essenciais para lograr uma política da UE mais eficaz – e a envidarem mais esforços para reforçar a resiliência e trabalhar com vista a encontrar soluções práticas que proporcionem apoio e reforcem os processos democráticos e um sistema judicial independente;
16. Exorta os presidentes do Conselho e da Comissão, a VP/AR e os Estados–Membros a continuarem a acompanhar de perto estes casos e a levantarem estas questões em diferentes formatos e reuniões com a Federação da Rússia, bem como a informarem o Parlamento das trocas de pontos de vista com as autoridades russas, sem deixar de fazer com que estas últimas tomem plena consciência da unidade e solidariedade que reina na União Europeia em torno deste caso e de casos semelhantes; insta os Estados-Membros da UE a abordarem esta questão nas suas conversações com as autoridades russas;
17. Encarrega o seu presidente de transmitir a presente resolução à vice-presidente da Comissão/Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, ao Conselho, à Comissão, aos governos e parlamentos dos Estados‑Membros, ao Conselho da Europa, à Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa e aos presidentes, aos Governos e aos Parlamentos da Federação da Rússia e da Bielorrússia.