Resolução do Parlamento Europeu sobre as implicações do Livro Verde sobre a defesa do consumidor na União Europeia para o futuro da política europeia dos consumidores (COM(2001) 531 – C5&nbhy;0295/2002 – 2002/2151(COS))
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta o Livro Verde da Comissão (COM(2001) 531 – C5&nbhy;0295/2002),
– Tendo em conta a Comunicação da Comissão sobre o seguimento do Livro Verde (COM(2002) 289),
– Tendo em conta o parecer do Comité Económico e Social sobre o Livro Verde (CES 344/2002), de 20 e 21 de Março de 2002(1),
– Tendo em conta os artigos 95º e 153º do Tratado CE,
– Tendo em conta a Convenção de Roma de 1980 sobre a Lei Aplicável às Obrigações Contratuais,
– Tendo em conta o nº 1 do artigo 47º do seu Regimento,
– Tendo em conta o relatório da Comissão do Meio Ambiente, da Saúde Pública e da Política do Consumidor (A5&nbhy;0423/2002),
A. Considerando que as insufuciências de que enferma o Direito Comunitário em matéria de defesa do consumidor - que radicam, nomeadamente, na fragmentação existente entre as normas nacionais e comunitárias - obstam à realização de um verdadeiro mercado interno dos consumidores, devido à falta de confiança destes últimos na certeza jurídica das transacções comerciais transnacionais,
B. Considerando que as práticas comerciais leais contribuem para a defesa tanto dos consumidores como dos concorrentes, sendo de particular interesse para as pequenas e médias empresas,
C. Considerando que é oportuno prosseguir as actividades de inquérito e pesquisa destinadas a melhor entender o comportamento das empresas e dos consumidores face ao comércio transfronteiriço e a melhor definir os óbices ao desenvolvimento do mercado interno,
D. Considerando a necessidade de alcançar um nível elevado de protecção do consumidor, condição essencial para criar o clima de confiança necessário ao bom funcionamento do mercado interno,
E. Considerando a importância de proporcionar aos consumidores um quadro jurídico simples, homogéneo, fiável e eficiente que possa ser aplicado independentemente da natureza da prática comercial em consideração,
F. Considerando a necessidade de defender sobretudo os consumidores mais vulneráveis, nomeadamente os idosos, as crianças e as pessoas portadoras de deficiências,
G. Considerando que a capacidade que os consumidores têm de exercer os seus direitos radica, nomeadamente, na qualidade, exaustividade e fiabilidade da informação que lhes é prestada, devendo essa informação ser dispensada numa língua que o consumidor domine,
H. Considerando que os produtores, quando solicitados, devem documentar todas as afirmações sobre um produto ou serviço,
I. Considerando a utilidade de que se reveste, para a elaboração de normas equilibradas e adequadas, a concertação entre os agentes económicos e os consumidores,
J. Considerando, porém, que cabe às autoridades públicas determinar o nível adequado de defesa do consumidor e garantir a respectiva implementação,
K. Considerando que cumpre intensificar o papel que desempenham as organizações de consumidores, de molde a melhor assegurar a representação dos seus interesses colectivos, nomeadamente no domínio da regulação e no exercício das intervenções legais associadas à aplicação do direito do consumidor,
L. Considerando que há que facilitar o recurso dos consumidores a meios alternativos de resolução de litígios que sejam acessíveis a todos, equitativos, rápidos e disponíveis a baixo custo, sem esquecer o direito de acederem livremente à justiça,
M. Considerando as dificuldades inerentes à falta de coordenação entre as entidades nacionais incumbidas de aplicar o direito do consumidor,
N. Considerando que a realização de um estudo de direito comparado sobre a legislação em matéria de lealdade das práticas comerciais nos Estados-Membros é tida como necessária para determinar se já existe um acervo legal comum,
1. Crê ser prioritário adoptar normas gerais comuns que permitam obter um nível elevado de protecção do consumidor;
2. Subscreve o objectivo de harmonizar a legislação sobre práticas comerciais, o que deverá ser feito de forma coerente, estabelecendo-se primeiro o quadro geral e só depois, se necessário, a legislação vertical sobre práticas específicas, tais como a promoção das vendas;
3. Recorda que o procedimento de harmonização não deve causar uma regressão no nível de protecção dos consumidores que lograram obter certos dispositivos nacionais;
4. Sublinha que a aplicação dos princípios de reconhecimento mútuo e de controlo pelo país de origem só pode ser tomada em consideração se se lograr alcançar um âmbito de harmonização suficientemente amplo segundo um padrão elevado de protecção dos consumidores;
5. Recorda que o procedimento de harmonização não deve causar uma regressão no nível de protecção em matéria de lealdade das práticas comerciais que lograram obter certos dispositivos nacionais;
6. Pronuncia-se a favor da incorporação, na directiva-quadro, de uma cláusula geral de lealdade para com o consumidor, e apoia a perspectiva segundo a qual a directiva se deve ocupar sobretudo das práticas lesivas para os consumidores; o consumidor não deve ser confundido no que respeita ao conteúdo e funções do produto ou serviço, devendo ser atribuídos a estes unicamente as características, efeitos ou origens que possam ser comprovados;
7. Considera que a cláusula geral de lealdade deve assentar em critérios precisos e objectivos, por forma a obviar a interpretações divergentes entre as legislações e jurisprudências nacionais, e propõe que se defina uma prática comercial desleal como contrária aos requisitos de "boa fé" considerados em conformidade com o disposto na Directiva 93/13/CEE relativa às cláusulas abusivas nos contratos celebrados com os consumidores(2);
8. Frisa a necessidade de capacitar o consumidor para efectuar uma escolha esclarecida; salienta, por isso, a necessidade de que entre os critérios de lealdade figure o dever de facultar sistematicamente, numa língua que o consumidor domine e que seja acessível a todos - incluindo às pessoas com deficiências -, informações prévias sobre aspectos essenciais para a saúde e a segurança do consumidor que, no mínimo, compreendam:
–
a natureza dos bens e serviços fornecidos,
–
a presença de substâncias perigosas nos bens de consumo,
–
o teor e origem exactos, no caso dos géneros alimentícios,
–
o preço em euros, e na moeda local no exterior da zona euro, incluindo os impostos,
–
o custo de entrega do bem, se for caso disso,
–
as modalidades de fornecimento e de execução,
–
as condições de retractação, troca e reembolso,
–
a identidade, o endereço e todos os dados necessários para contactar o fornecedor,
–
dados pormenorizados sobre a garantia do produto e as condições do serviço pós-venda,
–
a eventual subscrição de um código de conduta,
–
as vias de recurso existentes;
–
a apresentação das informações de forma clara e visível;
9. Considera oportuno, no intuito de se dispor de um corpo único de normas gerais harmonizadas, incorporar na directiva-quadro certas disposições das directivas existentes, como, por exemplo, as relativas à publicidade enganosa;
10. Considera fundamental definir como desleais todos os comportamentos comerciais que visem tirar partido da vulnerabilidade física ou mental, temporária ou permanente, devida, nomeadamente, à idade, à doença, ao estado mental ou ao baixo nível educacional de um consumidor ou de um grupo de consumidores;
11. Entende igualmente, sem prejuízo das disposições específicas aplicáveis aos consumidores vulneráveis, que deverão ser considerados desleais todos os comportamentos comerciais equiparáveis a coacção física ou moral e, nomeadamente, o assédio ou a intimidação, a ameaça ou o recurso à força, e os comportamentos obstrutivos (como a prática de dificultar aos consumidores a mudança de fornecedor);
12. Sugere que seja aditada à directiva-quadro uma "lista negra", não exaustiva, de práticas consideradas lesivas dos interesses dos consumidores, a qual deverá ser actualizada periodicamente com a ajuda das associações de consumidores, ao nível apropriado, nos Estados-Membros;
13. Sugere que a directiva-quadro enuncie os princípios aplicáveis em caso de procedimento judicial, nomeadamente quanto à competência territorial e à lei aplicável quando a empresa posta em causa por prática desleal tenha a sua sede social num Estado&nbhy;Membro que não o de residência do consumidor supostamente lesado;
14. Recomenda que, além de uma cláusula de ordem geral, sejam incluídos na directiva-quadro tipos concretos de práticas comerciais desleais;
15. Considera que cumpre prosseguir a reflexão com os Estados-Membros e as partes interessadas em torno das novas formas de regulação e, em particular, da co-regulação e da auto-regulação; quando se optar por estas novas formas, manifesta a sua preferência pela co-regulação, já que esta permitiria o envolvimento do Parlamento Europeu e do Conselho na adopção dos objectivos, além de assegurar processos abertos e transparentes com a consulta do sector empresarial e dos consumidores;
16. Insiste na necessidade de garantir a representatividade das partes interessadas no procedimento de regulação;
17. Considera que a co-regulação e a auto-regulação devem continuar a ser subsidiárias face às normas comunitárias e que o seu objectivo se deve cingir à elaboração de disposições complementares mais ajustadas aos interesses dos consumidores nos sectores em consideração;
18. Preconiza o estabelecimento de códigos de conduta à escala comunitária;
19. Considera que as propostas para regulamentar os códigos de conduta ao nível da UE são insuficientes;
20. Afirma, no intuito de garantir a certeza jurídica das relações comerciais entre as empresas e os consumidores, que o incumprimento de um compromisso voluntariamente assumido por via do acatamento facultativo de um código de conduta devidamente validado pelas autoridades comunitárias deve ser considerado uma prática desleal, na acepção da directiva-quadro;
21. Considera, tendo em conta as mesmas necessidades de certeza jurídica, não ser oportuno favorecer a aplicação de meras recomendações destituídas de valor vinculativo;
22. Pede à Comissão que avalie as experiências levadas a cabo através da cooperação voluntária, entre outros, pelos países nórdicos ou no âmbito da OCDE, e que institua um quadro jurídico e controlos eficazes para a cooperação entre as entidades incumbidas de aplicar a regulamentação em matéria de práticas comerciais; convida a Comissão a estudar os elementos que uma directiva-quadro deve incluir e a discutir o seu teor com os Estados&nbhy;Membros e com as associações de consumidores e as organizações empresariais interessadas;
23. Requer à Comissão que prossiga a consulta que iniciou sobre este aspecto com os Estados-Membros, à qual deverão ser associadas as partes interessadas;
24. Convida a Comissão a elaborar, até meados de 2004, uma proposta que estabeleça enquadramentos para a colaboração com vista à aplicação da regulamentação;
25. Sugere a criação de bases de dados destinadas a facilitar o intercâmbio de informações entre os Estados-Membros;
26. Sugere a criação de uma rede de alerta harmonizada que permita aos Estados-Membros levarem a efeito acções coordenadas, a fim de fazer respeitar as normas comunitárias vigentes;
27. Propõe que a Comissão prossiga a prática vigente de convocar reuniões periódicas com as autoridades dos Estados-Membros para examinar o modo como funcionam na prática as directivas gerais e específicas;
28. Solicita à Comissão que apresente rapidamente um projecto de directiva-quadro, tendo em conta os pareceres dos peritos nacionais e das partes interessadas;
29. Recomenda à Comissão que organize reuniões periódicas que permitam o intercâmbio das melhores práticas entre os Estados-Membros, garantindo uma transposição eficaz e coerente da legislação da UE relativa à defesa do consumidor;
30. Convida a Comissão a publicar e a divulgar um guia do consumidor de fácil leitura, destinado a informar os consumidores dos seus direitos;
31. Convida a Comissão a assegurar que as iniciativas destinadas a dar seguimento ao Livro Verde sejam, na medida do possível, discutidas paralelamente com a proposta de regulamento relativo às promoções de vendas;
32. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão e aos parlamentos dos Estados-Membros.