Resolução do Parlamento Europeu sobre os efeitos da globalização no mercado interno (2004/2225(INI))
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta o artigo 45º do seu Regimento,
– Tendo em conta o relatório da Comissão do Mercado Interno e da Protecção dos Consumidores e o parecer da Comissão do Comércio Internacional (A6-0021/2006),
A. Considerando que a globalização, definida como "a generalização dos fluxos de bens, serviços, trabalho e capital a nível global, reforçada pela revolução da informação", tem sido vista como um factor que coloca desafios fundamentais aos modelos social, cultural, decisório e económico da tradição europeia, assim como ao seu sistema económico e, em especial, ao mercado interno da UE,
B. Considerando a estreita interligação existente entre o desenvolvimento do mercado interno da UE e da economia mundial e o facto de a globalização, juntamente com o progresso tecnológico e a redução das barreiras políticas ao acesso aos mercados de determinados países, facilitar o comércio internacional, no que respeita aos bens e serviços,
C. Considerando que os dados estatísticos indiciam que, nos últimos anos, a UE no seu conjunto tem enfrentado desafios que põem em causa a sua liderança em domínios fundamentais como o crescimento económico, o desempenho do mercado de trabalho, a investigação e a inovação, como se constata na revisão intercalar do processo de Lisboa (Comunicação ao Conselho Europeu da Primavera - Trabalhando juntos para o crescimento e o emprego - Um novo começo para a Estratégia de Lisboa (COM(2005)0024) e Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu - Acções Comuns para o Crescimento e o Emprego: o Programa Comunitário de Lisboa (COM(2005)0330)),
D. Considerando que o objectivo da Estratégia de Lisboa, confirmado na revisão intercalar, é construir uma Europa competitiva num ambiente global, e que a Estratégia de Lisboa estabelece como seu objectivo central a construção, até 2010, da economia baseada no conhecimento mais dinâmica e competitiva do mundo, com mais e melhores empregos, requisitos ambientais mais exigentes e maior coesão social,
E. Considerando que a concorrência mundial tem vindo a ser afectada pela emergência de grandes economias em crescimento rápido, especialmente na Ásia, que concorrem na produção e comércio de bens e, de forma crescente, nos serviços, o que pode ter consequências inesperadas para a UE, pondo em risco, especificamente, os direitos consagrados no acervo comunitário,
F. Considerando que a globalização não deve ser considerada unicamente como um factor negativo conducente à fragmentação social, mas, de preferência, como um quadro que proporciona por um lado, novas oportunidades, mediante o acesso ao mercado mundial, mas que também coloca, por outro lado o risco de uma dependência da UE em relação ao desenvolvimento do comércio mundial, sendo necessário, por isso, que a gestão política apoie as influências positivas e elimine as influências negativas no mercado interno,
G. Considerando que a rápida liberalização multilateral do comércio com os países terceiros, caracterizada por normas pouco exigentes em matéria de trabalho e ambiente, representa um desafio considerável para a competitividade da economia europeia e requer ajustes significativos aos modelos económicos e sociais europeus; apoia os esforços da Comissão no sentido de prosseguir a Estratégia de Lisboa, que prevê ajustes apropriados,
H. Considerando que, a fim de obter potenciais dividendos da globalização, a UE deve adaptar-se às mutações económicas globais, progredir nos domínios mais fortes do ponto de vista económico, como o sector de tecnologias médias-altas, fazer face às suas debilidades, nomeadamente no sector de tecnologias altas, incluindo as tecnologias da informação e da comunicação e a biotecnologia, e desenvolver novos sectores que ofereçam uma vantagem comparativa,
I. Considerando que a realização da economia baseada no conhecimento não é possível sem uma estratégia adequada e um financiamento correcto,
J. Considerando que a UE, alargando-se de 15 para, possivelmente em breve, 27 ou mais Estados-Membros, precisa de definir uma estratégia para enfrentar estes desafios, tornando o mercado interno mais flexível e orientado para o mundo, mas encontrando formas de assegurar o crescimento, o emprego, a justiça social e o respeito pelo equilíbrio ecológico, e a manutenção dos nossos valores e do nosso modelo social, de modo a responder aos desafios da globalização com base na nossa experiência de construção do mercado único,
K. Considerando que esta estratégia tem de incluir a exigência de um empenhamento político claro na realização integral do mercado interno, que constitui o mais valioso activo da UE para maximizar as vantagens da globalização; considerando que os esforços de reforma com vista a reduzir o excesso de regulamentação têm de ter em conta as indicações da revisão intercalar da Estratégia de Lisboa, enunciadas nas supracitadas comunicações da Comissão e na Comunicação "Legislar melhor" (COM(2005)0097),
L. Considerando que a UE pretende atingir os seus objectivos e enfrentar os seus desafios específicos sem renunciar aos seus valores históricos e sociais nem prescindir dos elevados níveis de qualidade que caracterizam o modo de vida europeu (aspectos como a segurança social, a solidariedade e a qualidade ambiental), e que está disposta a lutar para que esses valores sejam reconhecidos como referência à escala mundial,
M. Considerando que aumentaram as possibilidades e as obrigações da UE na relação com os países do terceiro mundo,
N. Considerando que a solidariedade, o respeito dos direitos humanos, das normas ambientais e sociais, do desenvolvimento sustentável e da responsabilidade partilhada para a resolução do problema da pobreza nos países em desenvolvimento constituem valores essenciais da União Europeia;
1. Congratula-se com o recente debate europeu sobre os desafios colocados pela globalização ao mercado interno, uma questão cuja importância foi acentuada pelos chefes de Estado e de governo da União Europeia na reunião informal de Hampton Court, em 27 de Outubro de 2005;
2. Salienta a importância da realização do mercado interno (na área das finanças e de outros serviços e da liberdade de movimentos dos trabalhadores), em conformidade com os princípios e liberdades fundamentais consagrados nos Tratados;
3. Salienta as preocupações expressas pela Comissão, na sua Comunicação intitulada "Os valores europeus no contexto da globalização" (COM(2005)0525), sobre o impacto da globalização nos trabalhadores europeus;
4. Convida a Comissão a supervisionar a competitividade da indústria da UE no seu conjunto, a desenvolver uma genuína política industrial da UE e a iniciar um processo de rastreio dos sectores especialmente afectados pela globalização;
5. Convida a Comissão a monitorizar sinais de proteccionismo nos Estados-Membros e a informar regularmente o Parlamento sobre esses eventuais sinais;
6. Reconhece a necessidade de criar um ambiente saudável, de apoio às pequenas e médias empresas, e de reforçar a sua posição e acesso à inovação e aos instrumentos financeiros;
7. Salienta a importância de assegurar que os grandes operadores do mercado europeu encontrem apoio e oportunidades suficientes no mercado interno para se converterem em operadores do mercado mundial;
8. Acrescenta que o mercado interno tem de ser suficientemente atractivo para constituir a melhor opção disponível para as empresas e os investidores globais;
9. Está convicto de que a aplicação da Estratégia de Lisboa requer a sua atenção interessada e permanente, nomeadamente através de relatórios anuais de avaliação dos progressos realizados desde a revisão intercalar;
10. Considera que a Estratégia de Lisboa, sendo um plano económico geral, pode não ser suficiente para enfrentar os desafios da globalização e apela a outras linhas de acção que possam ser desenvolvidas especificamente para minimizar os impactos negativos da globalização e para ajudar a tirar proveito dos seus impactos positivos (como o Fundo de Adaptação à Globalização);
11. Convida a Comissão e os Estados-Membros a desenvolverem estratégias de sucesso para salvaguardar os valores europeus num ambiente global competitivo e a incorporar estes valores na definição de políticas globais;
12. Exorta o Conselho e os Estados-Membros a manterem e desenvolveram a tradição europeia de excelência e a assegurarem como prioridade o estabelecimento de um sistema educativo de alto nível, acompanhado de uma base financeira respectivamente apropriada para a investigação e desenvolvimento e a inovação;
13. Reconhece a necessidade de um sistema comum de gestão do conhecimento, com instrumentos de protecção do conhecimento eficazes, assim como a necessidade de um programa eficiente para converter a inovação em investimento e valor económico;
14. Salienta que, neste contexto, têm de ser protegidos os direitos de propriedade intelectual e industrial, nomeadamente por meio de sistemas de patentes integrados e eficientes, juntamente com uma regulamentação eficaz e o controlo da contrafacção, de forma a proteger os interesses económicos europeus;
15. Insta a Comissão e os Estados-Membros a darem continuidade ao programa "Legislar melhor", a nível comunitário e nacional, e a informarem o Parlamento dos progressos realizados;
16. Sublinha a importância de uma resolução mais rápida e eficiente dos litígios no interior do mercado interno;
17. Exorta os Estados-Membros a apressarem o processo de transposição das regras do mercado interno;
18. Convida a Comissão a desenvolver um processo de avaliação ex-post eficiente e regular dos efeitos e da aplicação da regulamentação económica e do mercado interno, e compromete-se com esse processo;
19. Convida a Comissão a dar continuidade aos diálogos a nível mundial em matéria de regulamentação e a manter informado o Parlamento;
20. Solicita uma análise dos factores da economia da UE exteriores ao mercado relacionados com os desafios da globalização ao nível da Comunidade (como o desafio demográfico) e à escala mundial (como a responsabilidade em relação a países terceiros);
21. Para este efeito, exorta todos os actores políticos a nível comunitário e nacional a cooperarem de forma responsável para a realização das ambições europeias de excelência;
22. Considera a aplicação de regras mais claras em matéria de rotulagem e observância das denominações de origem um meio de garantir a protecção das mercadorias e valores europeus;
23. Exorta a Comissão a aumentar o acesso preferencial ao mercado comunitário apenas no caso dos países terceiros que ratificaram e aplicaram adequadamente convenções básicas internacionais em matéria de trabalho e ambiente, bem como a conceder acesso preferencial adicional ao mercado aos países que aprovaram legislação sobre a protecção social e ambiental e o respeito pela diversidade cultural;
24. Salienta que a criação de um mercado interno no sector dos serviços é fundamental para cumprir os objectivos da Estratégia de Lisboa e, portanto, para aumentar a competitividade da União Europeia no mercado global;
25. Aplaude os Estados-Membros que abriram os seus mercados de trabalho aos cidadãos dos novos Estados-Membros e, desse modo, contribuíram significativamente para um mercado interno de trabalho mais flexível e competitivo; insta os Estados-Membros que ainda mantêm restrições sobre esta matéria a eliminar os actuais obstáculos à livre circulação dos trabalhadores;
26. Insta a Comissão a levar a cabo uma avaliação do impacto no mercado interno de uma nova abertura multilateral do mercado nos domínios da agricultura, indústria e serviços, bem como a partilhar tal avaliação com um vasto leque de interessados, antes de formular a sua estratégia de negociação comercial no âmbito das negociações comerciais internacionais;
27. Convida a Comissão e o Conselho a prepararem uma política externa equilibrada que permita à UE aumentar a sua influência a nível internacional;
28. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão e aos governos dos Estados-Membros.