Resolução do Parlamento Europeu, de 15 de Março de 2007, sobre a acção comunitária relativa à prestação de cuidados de saúde transfronteiriços
O Parlamento Europeu,
‐ Tendo em conta a Comunicação da Comissão intitulada "Consulta sobre a acção comunitária relativa aos serviços de saúde" (SEC(2006)1195/4),
‐ Tendo em conta o artigo 152º do Tratado CE,
‐ Tendo em conta os acórdãos do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias ("TJE") proferidos nos processos Decker (C-120/95, de 28 de Abril de 1998), Kohll (C-158/96, de 28 de Abril de 1998), Geraets-Smits & Peerbooms (C-157/99, de 12 de Julho de 2001), Vanbraekel (C-368/98, de 12 de Julho de 2001), IKA (C-326/00, de 25 de Fevereiro de 2003), Müller-Fauré & van Riet (C-385/99, de 13 de Maio de 2003), Inizan (C-56/01, de 23 de Outubro de 2003), Leichtle (C-8/02, de 18 de Março de 2004) e Watts (C-327/04, de 16 Maio de 2005),
‐ Tendo em conta a sua Resolução de 9 de Junho de 2005 sobre a mobilidade dos doentes e a evolução dos cuidados de saúde na União Europeia(1),
‐ Tendo em conta a Pergunta Oral B6-0013/2007 da Comissão do Ambiente, da Saúde Pública e da Segurança Alimentar, nos termos do artigo 108º do seu Regimento,
‐ Tendo em conta o nº 5 do artigo 108º do seu Regimento,
A. Considerando que os serviços de saúde foram excluídos da Directiva 2006/123/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro de 2006, relativa aos serviços no mercado interno(2),
B. Considerando que no Parlamento Europeu se encontra actualmente em discussão um projecto de relatório sobre o impacto e as consequências da exclusão dos serviços de saúde do âmbito de aplicação da Directiva 2006/123/CE,
C. Considerando que o TJE proferiu, desde 1998, vários acórdãos que permitem a livre circulação dos doentes que necessitam de tratamento e de cuidados médicos, aplicando deste modo o princípio da livre circulação ao reembolso dos cuidados de saúde prestados no estrangeiro,
D. Considerando que o TJE começou por determinar que condicionar o reembolso das despesas incorridas noutro Estado-Membro a autorização prévia deveria ser considerado como um obstáculo à prestação de serviços, mas que, posteriormente, desenvolveu os princípios aplicáveis ao reembolso e à necessidade de autorização prévia,
E. Considerando que os sistemas de saúde da União Europeia se baseiam nos princípios da solidariedade, equidade e universalidade, a fim de garantir que todas as pessoas, independentemente dos seus rendimentos, condição social ou idade, recebam cuidados adequados e de alta qualidade,
F. Considerando que as disposições relativas à prestação de cuidados de saúde variam de um país para outro,
1. Saúda a iniciativa da Comissão de lançar um procedimento de consulta sobre a melhor forma de acção comunitária destinada a criar um quadro para os aspectos transfronteiriços da prestação de cuidados de saúde;
2. Recorda a obrigação, consagrada no Tratado, de garantir um nível de protecção elevado da saúde humana em todas as políticas comunitárias; recorda, além disso, o nº 3 do artigo 95º do Tratado, que constitui a base legal das medidas do mercado interno relativas à saúde; considera, por isso, necessário criar para as disposições relativas aos cuidados de saúde transfronteiriços o enquadramento legal que melhor garanta o oportuno acesso dos doentes a cuidados de saúde adequados e de alta qualidade, o desenvolvimento da prestação de cuidados de saúde transfronteiriços e a sustentabilidade do financiamento dos cuidados de saúde;
3. Refere que os aspectos transfronteiriços dos cuidados de saúde incluem a mobilidade dos doentes e dos profissionais da saúde e a prestação de cuidados de saúde a partir de outro país; refere, além disso, que a jurisprudência do TJE trata especificamente do problema dos direitos dos doentes a submeterem-se a tratamento no estrangeiro e da ulterior obtenção de reembolso pelos respectivos regimes nacionais de seguro de saúde;
4. Considera, por isso, que garantir segurança jurídica no que diz respeito ao reembolso dos custos dos cuidados de saúde transfronteiriços é uma questão prioritária, não o para os doentes mas também para os sistemas nacionais de seguro de saúde e para os prestadores de cuidados de saúde; sublinha a necessidade de clarificar os procedimentos e as condições de reembolso nos vários casos;
5. Insta a Comissão a desenvolver princípios comuns e orientações de base para os cuidados de saúde, a fim de garantir a segurança dos doentes; entende, também, que o desenvolvimento de indicadores de saúde harmonizados (como normas para testes sanguíneos) a nível comunitário se reveste de grande importância para melhorar o intercâmbio de melhores práticas, em particular entre profissionais de saúde;
6. Entende que a UE deve desempenhar um papel importante na melhoria da disponibilidade de informações aos doentes sobre mobilidade transfronteiriça, através da coordenação da cooperação entre os EstadosMembros neste domínio;
7. Entende que a mobilidade dos doentes deve permanecer sempre uma questão da livre escolha do doente e que nenhuma pressão deve ser exercida sobre essa liberdade;
8. Sublinha a necessidade de garantir a segurança dos doentes em todas as circunstâncias, independentemente do lugar e do modo de prestação dos cuidados de saúde; solicita a clarificação das responsabilidades entre as autoridades competentes para a supervisão dos prestadores de cuidados de saúde e um eficaz intercâmbio de informações entre as autoridades nacionais quanto à inscrição e ao estatuto disciplinar dos profissionais de saúde; considera necessário criar um mecanismo de recurso para os casos de erro médico na prestação de cuidados de saúde transfronteiriços;
9. Refere que, praticamente em todos os casos, os cuidados de saúde e o tratamento médico requerem acompanhamento ulterior, o que pode demorar muito tempo; reconhece a necessidade de regras claras sobre a divisão de tarefas e de responsabilidades entre os prestadores de cuidados de saúde durante as diferentes etapas de tratamento e de prestação de cuidados;
10. Considera que a criação de um enquadramento legal comunitário constitui a melhor forma de garantir segurança jurídica aos doentes, aos sistemas nacionais de saúde e aos prestadores privados de cuidados de saúde; considera que esta é também a melhor forma de optimizar a utilização dos recursos de cuidados de saúde e acelerar o acesso ao tratamento;
11. Entende que é necessário incorporar uma carta comum dos direitos dos doentes no referido futuro enquadramento comunitário, a fim de garantir, na prática, o exercício destes direitos a nível transfronteiriço e no país de origem;
12. Considera necessário inserir, também, no referido enquadramento legal um mecanismo de recolha de dados e de intercâmbio de informações entre as autoridades nacionais sobre os prestadores de cuidados de saúde, a sua inscrição e o seu estatuto disciplinar, e as competências disponíveis; considera, além disso, que a criação de uma rede de Centros Europeus de Referência poderia trazer vantagens consideráveis ao tratamento de doenças;
13. Exorta os Estados-Membros a instituírem um procedimento de balcão único para as reclamações dos doentes;
14. Considera necessário, por imperativos de segurança do doente, incluir no referido enquadramento legal uma disposição que obrigue as autoridades nacionais a proceder ao intercâmbio das suas informações sobre a inscrição e o estatuto disciplinar dos profissionais de saúde que prestem cuidados de saúde transfronteiriços;
15. Solicita à Comissão que dispense uma atenção especial à informação dos doentes sobre os seus direitos e obrigações e que inclua disposições sobre esta matéria na sua proposta legislativa;
16. Está convicto de que o proposto quadro comunitário pode proporcionar uma oportunidade para conferir aos cidadãos europeus os necessários direitos enquanto doentes e para encorajar os Estados-Membros a desenvolverem os seus sistemas de cuidados de saúde;
17. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão e aos governos e parlamentos dos Estados-Membros.