Resolução do Parlamento Europeu, de 27 de Setembro de 2007, sobre "i2010: Bibliotecas digitais" (2006/2040(INI))
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta a Comunicação da Comissão intitulada "i2010: Bibliotecas digitais" (COM(2005)0465),
– Tendo em conta Recomendação 2006/585/CE da Comissão, de 24 de Agosto de 2006, sobre a digitalização e a acessibilidade em linha de material cultural e a preservação digital(1),
– Tendo em conta as conclusões do Conselho sobre a digitalização e a acessibilidade em linha de material cultural e a preservação digital(2),
– Tendo em conta a Directiva 2001/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de Maio de 2001, relativa à harmonização de certos aspectos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação(3),
– Tendo em conta o relatório do grupo de peritos de alto nível sobre os direitos de autor, a preservação digital, obras órfãs e obras esgotadas, de 18 de Abril de 2007,
– Tendo em conta a Comunicação da Comissão intitulada "Acesso, difusão e preservação da informação científica na era digital" (COM(2007)0056),
– Tendo em conta o artigo 45º do seu Regimento,
– Tendo em conta o relatório da Comissão da Cultura e da Educação (A6-0296/2007),
A. Considerando que a cultura é um factor de união, de intercâmbio e de partilha que contribui para aproximar a União Europeia dos seus cidadãos e para favorecer o aprofundamento e a expressão de uma verdadeira identidade europeia,
B. Considerando que é necessário garantir a promoção, a salvaguarda e uma difusão tão ampla quanto possível da riqueza e da diversidade do património cultural europeu,
C. Considerando que os Estados-Membros e as instituições culturais, em especial as bibliotecas, têm um papel decisivo a desempenhar neste domínio tanto a nível nacional, como a nível regional e local,
D. Considerando a necessidade de ter em conta o desenvolvimento rápido das novas tecnologias e a evolução das práticas culturais daí resultante,
E. Considerando, com efeito, que a Internet se tornou para um grande número de cidadãos, em particular para os jovens, um dos principais meios de acesso ao conhecimento e ao saber,
F. Considerando que é primordial garantir neste ambiente digital um acesso generalizado ao património cultural europeu e assegurar a sua preservação para as gerações futuras, e constituir, assim, a nossa memória colectiva,
G. Considerando que a digitalização em grande escala e a acessibilidade em linha do património cultural europeu constituem os principais meios para atingir esse objectivo,
H. Considerando que o património cultural europeu reflecte a diversidade da Europa e que, por conseguinte, o acesso a este património deve ser multilingue,
I. Considerando que é necessário implementar políticas coerentes em matéria de digitalização e conservação das obras digitais, a fim de evitar a perda definitiva de conteúdos culturais, no estrito respeito dos direitos de autor e direitos conexos,
J. Considerando que, para além das suas qualidades culturais intrínsecas, a digitalização do património cultural europeu beneficiará também outros sectores de actividade, em especial a educação, a ciência, a investigação, o turismo e os meios de comunicação,
K. Considerando que a digitalização maciça dos conteúdos culturais não tem por objectivo substituir ou fazer concorrência aos conteúdos culturais tradicionais, mas sim produzir, paralelamente a estes últimos, conteúdos digitais fiáveis e de qualidade,
L. Considerando que a tecnologia digital constitui, além disso, um notável instrumento ao serviço das pessoas deficientes e que permite adaptar os conteúdos às suas necessidades,
M. Considerando, no entanto, que apenas uma ínfima parte do património cultural europeu foi até agora digitalizada e que os Estados-Membros avançam a ritmos muito diferentes,
N. Considerando que os financiamentos públicos atribuídos à digitalização em massa são insuficientes para responder a um projecto desta envergadura,
O. Considerando que as iniciativas de digitalização continuam a ser muito fragmentadas e que a maioria das experiências já feitas a nível comunitário são ainda ignoradas e não fornecem um acesso simples, directo e multilingue ao conjunto das obras que compõem o património cultural europeu,
P. Considerando que é necessário criar uma ferramenta "grande público" que garanta o acesso universal e imediato ao património cultural europeu, sem o mínimo constrangimento de deslocação, e promova a aceleração da digitalização,
Q. Considerando, neste contexto, que é conveniente tirar partido das iniciativas europeias já lançadas que possam contribuir para o desenvolvimento inicial da Biblioteca Digital Europeia, como, por exemplo, a Biblioteca Europeia (TEL), que permite já o acesso aos documentos das colecções de bibliotecas nacionais europeias e, nomeadamente, a busca através dos recursos, digitais ou bibliográficos, de 23 das 47 bibliotecas nacionais, o projecto TEL-ME-MOR, que tem por objectivo promover a integração das 10 bibliotecas nacionais dos novos Estados Membros, o projecto EDL, que visa acrescentar mais nove bibliotecas nacionais no âmbito EU/EFTA, bem como o projecto Europeana, que reúne as bibliotecas nacionais de França, da Hungria e de Portugal,
A biblioteca digital europeia, rosto da Europa unida na sua diversidade
1. Recomenda a criação, por fases, de uma biblioteca digital europeia, que sirva de ponto de acesso único, directo e multilingue ao património cultural europeu;
2. Sublinha que, se o objectivo pretendido é a criação de uma ferramenta para cobrir todas as categorias de material cultural, como os conteúdos audiovisuais, a biblioteca digital europeia deve concentrar-se, inicialmente, no potencial oferecido pelo material escrito e livre de direitos;
3. Convida, para o efeito, o conjunto das bibliotecas europeias a pôr à disposição da biblioteca digital europeia as obras isentas de direitos já disponíveis em formato digital,
4. Convida as universidades europeias e as demais instituições de ensino superior a tornarem possível o acesso a teses de doutoramento e outros trabalhos científicos relacionados com temas e matérias respeitantes ao património cultural europeu, em condições a estabelecer e no respeito integral dos direitos de autor;
5. Convida as outras instituições culturais europeias, incluindo as regionais e locais, a participarem neste projecto para que este seja representativo da riqueza e da diversidade da cultura europeia; encoraja, por outro lado, os museus a digitalizarem os seus arquivos, visando a sua inclusão neste projecto;
6. Sublinha ainda que a biblioteca digital europeia não tem por objectivo a difusão exclusiva dos conteúdos, mas sim a coordenação do acesso às obras digitalizadas;
7. Incentiva a escolha e a utilização de normas comuns, com base em formatos existentes e adaptados, a fim de assegurar a interoperabilidade dos conteúdos, necessária para o bom funcionamento da biblioteca digital europeia, adoptando progressivamente linguagens de metadados estabilizadas (Dublin Core, etc.);
8. Exorta os Estados-Membros a prosseguirem os seus esforços e a acelerarem o ritmo de digitalização dos conteúdos culturais para se obter uma massa suficiente de conteúdos;
9. Exorta, para o efeito, os Estados-Membros a elaborarem, em concertação com as instituições culturais, planos de digitalização a nível nacional ou regional, a fim de estabelecer uma cartografia europeia de todas as actividades de digitalização e permitir as sinergias, sempre de modo a evitar duplicações de esforços e de custos suportados por muitas instituições públicas e privadas para a digitalização dos seus fundos, e devendo considerar-se indispensável um levantamento por tipos de instituições do trabalho já efectuado;
10. Exorta a uma cooperação estreita entre os Estados-Membros e as instituições culturais, bem como a um intercâmbio de boas práticas para a digitalização e a acessibilidade das obras, bem como para a sua preservação digital;
11. Sublinha, além disso, que a biblioteca digital europeia favorecerá a investigação nos domínios da digitalização, da interoperabilidade e da preservação digital, nomeadamente por via de centros de competência criados pela Comissão, uma vez que a Biblioteca Digital Europeia não pode tornar-se realidade sem uma forte componente de investigação e desenvolvimento;
12. Salienta que é necessário apoiar a inovação e a investigação no domínio do multilinguismo;
13. Recorda que, caso os programas comunitários não permitam financiar a digitalização enquanto tal, é necessário desenvolver novos modos de financiamento, incluindo em parceria com o sector privado, mas de modo a evitar, tanto quanto possível, as digitalizações a diferentes velocidades em cada um dos Estados Membros;
Estrutura e conteúdo da biblioteca digital europeia - Um ponto de acesso multilingue comum ao património cultural europeu
14. Incentiva a instauração de uma interface comum que dê acesso a conteúdos cuja qualidade e fiabilidade estejam garantidas, através de um motor de busca integrado entendido como ferramenta de pesquisa sobre a meta-informação e de pesquisa directa sobre texto para o caso de documentos digitalizados em modo de texto;
15. Salienta a importância de uma interface multilingue que permita aceder directamente aos conteúdos pesquisados em todas as línguas da União Europeia, a fim de assegurar, para além da pesquisa corrente por autores ou títulos, a pesquisa por assuntos ou palavras-chave, caso em que em os resultados deverão vir a integrar os dados referentes a todas as bibliotecas envolvidas e em qualquer língua constitutiva do catálogo;
16. Exorta à instauração de funcionalidades inovadoras, modernas e adaptadas a todos os visitantes;
17. Salienta ser importante que a biblioteca digital europeia seja concebida e organizada a partir de um conjunto de recursos e de capacidades técnicas que facilitem a criação, a investigação e a utilização da informação e que não se circunscreva a um catálogo digitalizado das obras europeias;
18. Precisa, por outro lado, que seria desejável não limitar o património cultural europeu ao conjunto das obras da União Europeia, mas ter em conta igualmente o contributo cultural de outros países europeus;
19. Precisa, além disso, que, embora o património cultural europeu seja maioritariamente composto por obras que são do domínio público, tal património não se limita a esta única categoria;
20. Recorda, por conseguinte, a conveniência de distinguir as obras que são do domínio público das obras sujeitas a direitos, incluindo as obras órfãs e as obras esgotadas, bem como a necessidade de prever modelos diferentes para cada uma delas que estejam adaptados a cada sector de actividade;
21. Aprova a instituição do citado grupo de peritos de alto nível e apoia nomeadamente as suas propostas no sentido de registar as obras órfãs e esgotadas e elaborar mecanismos que facilitem a procura dos titulares dos direitos;
22. Assinala que as propostas formuladas pelo grupo de peritos de alto nível no seu primeiro relatório respeitam principalmente ao sector da edição de livros e que a respectiva extensão a outros sectores deverá ser decidida em concertação com os respectivos representantes;
23. Observa que seria desejável, numa segunda fase, que a biblioteca digital europeia pudesse propor, se possível, a par dos documentos livres de direitos, documentos sujeitos a direitos de autor, no estrito respeito das legislações nacionais, comunitária e internacional em matéria de propriedade intelectual;
24. Sublinha que qualquer decisão nesse sentido deverá ser tomada em colaboração com todos os agentes implicados, em especial os autores, os editores e os livreiros;
25. Propõe que, a partir da biblioteca digital europeia, o utilizador possa localizar os documentos digitalizados, em modo imagem e modo texto, independentemente da sua natureza, e consultá-los livremente, quer integralmente para as obras livres de direitos, quer sob a forma de curtos extractos para as obras protegidas, com o acordo do titular dos direitos;
26. Propõe que seja prevista a possibilidade de folhear virtualmente a obra protegida por direitos através de sítios especializados que forneçam as garantias de segurança requeridas pelos titulares dos direitos;
27. Propõe, neste último caso, que a biblioteca digital europeia funcione como um mero vector da informação;
28. Assinala que o acesso à integralidade de todos os documentos protegidos poderia ser feito a partir de sítios especializados com o acordo dos titulares dos direitos e mediante, por outro lado, uma justa remuneração;
Gestão e acompanhamento
29. Apela à constituição de um comité director, no seio do qual as instituições culturais desempenhem um importante papel, que delimite as prioridades e orientações a dar à biblioteca digital europeia, assegurando a coordenação, a gestão e o acompanhamento dessas actividades;
30. Incita à coordenação dos grupos instituídos pela Comissão, nomeadamente o grupo de peritos dos Estados-Membros sobre a digitalização e a conservação digital e o citado grupo de peritos de alto nível, a fim de lograr uma verdadeira sinergia a nível europeu;
31. Sugere a criação de uma instância coordenadora a nível europeu, equivalente à TEL, para os acervos dos museus e dos arquivos nacionais que venham a gerar toda a espécie de elementos digitalizados em relação com o património cultural europeu com fins de integração no sistema de pesquisa da Biblioteca Digital Europeia;
32. Sublinha ainda que, quando coerentemente integrada a nível dos sistemas de educação, a biblioteca digital europeia permitirá uma mais fácil aproximação aos jovens europeus, familiarizando-os com o seu património cultural e literário, contribuindo, além disso, para a sua formação no domínio das novas tecnologias e para combater a fractura digital;
33. Considera imprescindível seja potenciada a troca de experiências e boas práticas com outras instituições europeias, como a European Commission on Preservation and Access (ECPA), instituições de países terceiros, como a Library of Congress dos Estados Unidos, associações internacionais como a International Federation of Library Associations (IFLA), e organizações públicas ou privadas, como a Online Computer Library Center (OCLC) e outras, tentando, sempre que possível, utilizar software e soluções já testadas e em funcionamento;
34. Incentiva a promoção, a visibilidade e a disponibilização da biblioteca digital europeia, através de uma comunicação alargada a todos os níveis e da criação de um logótipo que permita identificá-la;
35. Recomenda, a este propósito, que uma parte dos recursos destinados à biblioteca digital europeia seja consagrada à sua promoção junto de um público tão vasto quanto possível;
36. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho e à Comissão, bem como aos governos e parlamentos dos Estados-Membros.