Resolução do Parlamento Europeu, de 11 de Novembro de 2010, sobre a crise no sector da pecuária na União Europeia
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta a sua resolução de 8 de Julho de 2010 sobre o futuro da Política Agrícola Comum após 2013(1),
– Tendo em conta a sua Resolução, de 7 de Setembro de 2010, sobre rendimentos justos para os agricultores: melhor funcionamento da cadeia de abastecimento alimentar na Europa(2),
– Tendo em conta a sua Resolução, de 5 de Maio de 2010, sobre a análise e avaliação do Plano de Acção Comunitário relativo ao Bem-Estar dos Animais 2006-2010(3),
– Tendo em conta n.º 5 do artigo 115.º do seu Regimento,
A. Considerando a possibilidade de um grande número de explorações pecuárias da UE se encontrar de momento seriamente ameaçado por uma combinação de factores, entre os quais se inclui:
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os custos crescentes dos meios de produção, como combustíveis e fertilizantes,
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os custos elevados inerentes ao cumprimento da regulamentação da UE,
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uma maior concorrência das importações de países terceiros,
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a dependência de países terceiros para a produção de alimentos para animais,
–
o recente aumento dos preços dos cereais, em particular devido a condições climáticas imprevistas e ao impacto negativo da especulação e da instabilidade dos preços,
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os baixos preços obtidos pelos agricultores para os produtos à base de carne,
B. Considerando que os produtores europeus estão vinculados ao cumprimento das normas mais rigorosas em vigor à escala mundial em matéria de segurança e qualidade alimentar, ambiente, saúde e bem-estar dos animais e condições de trabalho; considerando que o cumprimento destas normas extremamente rigorosas aumenta significativamente os custos de produção dos produtores europeus, deixando-os numa situação de desvantagem competitiva face aos produtores de países terceiros,
C. Considerando que a actual crise no sector da pecuária pode originar uma redução significativa na produção de carne em toda a União Europeia, a qual poderá ter graves consequências, não só a nível dos preços, mas também a nível da segurança alimentar na UE, e implicará uma maior dependência das importações,
D. Considerando que a União Europeia é altamente dependente das sementes de soja e do milho importados de países terceiros e que qualquer interrupção no fornecimento destes produtos devido a uma presença diminuta de OGM não autorizados tem consequências bastantes dispendiosas para a indústria da alimentação animal e para os criadores de animais (por exemplo, 1 000 milhões de euros, se a interrupção demorar seis meses),
E. Considerando que as importações provenientes de países terceiros têm vindo a conquistar quotas de mercado na União Europeia e a agravar ainda mais a pressão sobre os preços de mercado dos produtos de origem animal,
F. Considerando que a procura mundial de carne e de outros produtos de origem animal aumentará nas próximas décadas, devido ao crescimento da população mundial combinado com o aumento do poder de compra nos países em desenvolvimento, o que levará à adopção de uma dieta de tipo ocidental,
G. Considerando que os avultados investimentos necessários no sector da pecuária o tornam particularmente vulnerável a crises de mercado,
H. Considerando que, em alguns dos novos Estados-Membros, são muito poucos os criadores de gado que têm beneficiado de pagamentos directos e que, por isso, têm tido maiores dificuldades em cumprir as rigorosas normas europeias, que implicam avultados investimentos,
I. Considerando que os sectores porcino e avícola não recebem qualquer apoio directo da PAC, não dispõem de qualquer rede de segurança para mitigar os efeitos da volatilidade do mercado e têm de cumprir as normas mais rigorosas da UE em matéria de ambiente e bem-estar dos animais,
J. Considerando que a discrepância entre os preços pagos pelos consumidores e os preços obtidos pelos produtores aumentou consideravelmente,
K. Considerando que os produtores primários estão a ser «entalados» entre as grandes empresas multinacionais de transformação e de venda a retalho, que adquirem os seus produtos, e as grandes empresas multinacionais de distribuição, que os fornecem,
L. Considerando que as pequenas explorações pecuárias da UE estão indissociavelmente vinculadas às economias das zonas rurais da Europa e apresentam vantagens ambientais importantes, e que muitas dessas explorações se situam em regiões desfavorecidas onde não existem alternativas de produção viáveis,
M. Considerando que a situação no mercado da carne de bovino está estreitamente ligada à evolução do sector leiteiro, já que 60% da produção de carne vermelha da UE provém de vacas leiteiras,
N. Considerando que o sector leiteiro da UE enfrenta uma extrema volatilidade do mercado desde 2007, o que tem tido efeitos perniciosos para o rendimento dos produtores de leite e para a sua capacidade de produzir de forma sustentável alimentos de qualidade para os consumidores europeus,
O. Considerando que os dados da Comissão sobre o funcionamento da cadeia alimentar mostram que é necessária mais transparência e informação quanto à evolução da produção e do mercado,
1. Solicita à Comissão e ao Conselho que garantam que a PAC pós-2013 disponha de um financiamento adequado, a fim de assegurar a viabilidade de todos os produtores agrícolas da UE, incluindo os criadores de gado; realça, neste contexto, que é necessário garantir uma concorrência leal entre os produtores agrícolas dos diferentes Estados-Membros;
2. Solicita à Comissão que introduza urgentemente mecanismos de mercado eficazes e flexíveis no sector da pecuária e que tome as medidas necessárias para limitar os impactos da volatilidade dos preços e da especulação em todo o sector agrícola;
3. Exorta a Comissão a fazer uso dos mecanismos de mercado disponíveis para mitigar a actual crise no sector da carne de suíno e noutros sectores da pecuária;
4. Toma nota da intenção da Comissão de, até ao fim de Novembro, fazer escoar, por meio de adjudicação, 2,8 milhões de toneladas de cereais actualmente armazenados em regime de intervenção;
5. Exorta a Comissão a propor instrumentos de mercado que garantam um fornecimento adequado de cereais para a alimentação dos animais; entende que se deveria aplicar um mecanismo de segurança a todo o sector cerealífero com um preço de intervenção mínimo para o sistema de concurso;
6. Insta a Comissão a tomar as medidas necessárias para lutar contra a especulação excessiva nos mercados da União, bem como no mercado mundial, em particular no âmbito da nova Directiva relativa aos instrumentos financeiros;
7. Solicita à Comissão que proponha novos mecanismos flexíveis de gestão dos mercados, que permitam à União responder de forma mais rápida a situações críticas no âmbito da OCM única (artigo 186.º);
8. Apoia a introdução, com carácter de urgência, de um plano em matéria de proteínas na União Europeia, capaz de fomentar o cultivo de proteaginosas e leguminosas e de desempenhar igualmente um papel de relevo na redução das emissões de gases com efeito estufa;
9. Manifesta a sua profunda preocupação pela recente consolidação no mercado dos fertilizantes, originando em muitos mercados nacionais uma situação em que, na prática, existe um único fornecedor, sem concorrência; insta, por conseguinte, a Comissão a solicitar às autoridades da concorrência que investiguem e tomem as medidas necessárias para evitar a fixação de preços e o abuso de posições dominantes;
10. Solicita à Comissão que garanta, no contexto de uma maior consolidação, o funcionamento de um mercado livre no sector dos factores de produção, incluindo o dos fertilizantes, uma vez que a energia e os fertilizantes constituem elementos essenciais para a produção agrícola e a segurança alimentar;
11. Solicita à Comissão que, no âmbito da próxima reforma da PAC, tenha em conta a especial vulnerabilidade de determinados sectores da pecuária – como, por exemplo, a produção pastoril de carne bovina – e as condições de menor equidade em que estes concorrem com os seus congéneres de países terceiros;
12. Insta a Comissão a ponderar, no âmbito da próxima reforma da PAC, medidas específicas tendentes a evitar graves perdas no apoio da UE aos criadores de gado do sector da pecuária intensiva que recorram a métodos de produção sustentáveis;
13. Solicita à Comissão que reforce as medidas de apoio à pecuária das zonas mais desfavorecidas;
14. Insta a Comissão a procurar activamente simplificar e reduzir o peso burocrático imposto aos agricultores do sector da pecuária;
15. Considera que é necessário dotar a União Europeia de um instrumento que permita prever a tendência dos mercados mundiais;
16. Solicita à Comissão e aos Estados-Membros que tenham em conta os elevados custos da observância da legislação relativa ao bem-estar dos animais, em especial porque esses custos não se reflectem nos preços de venda; insta, por isso, a Comissão a certificar-se de que as importações de países terceiros cumpram as normas comunitárias em matéria de bem-estar dos animais, a fim de evitar fenómenos de concorrência desleal; salienta que, nos próximos anos, os sectores porcino e avícola terão de respeitar exigências ainda mais rigorosas, sem qualquer apoio financeiro da União Europeia;
17. Apela à Comissão para que avalie o impacto económico resultante da introdução de novas normas em matéria de bem-estar dos animais, e sublinha que, antes da elaboração de qualquer nova legislação, se deve proceder à correcta aplicação das normas existentes, quer estas sejam gerais quer sejam específicas;
18. Considera que os produtores primários estão a ser «entalados» entre os preços elevados dos factores de produção e os baixos preços ao consumidor, devido às fortes posições dos transformadores, retalhistas e dos sectores dos factores de produção na cadeia alimentar, não podendo, por conseguinte, beneficiar inteiramente de preços mais elevados na produção;
19. Apela à Comissão para que proponha um reforço das organizações de produtores em todos os sectores da pecuária, a fim de lhes permitir negociar melhores preços para os seus produtos e, ao mesmo tempo, ter em conta os custos de produção;
20. Solicita à Comissão que garanta que as acções que empreende no âmbito do comércio e da agricultura não entrem em conflito entre si, e que reconheça a necessidade de um conjunto equilibrado de objectivos que garanta progressos no comércio, proporcionando, ao mesmo tempo, um futuro sustentável ao sector europeu da pecuária;
21. Exorta a Comissão a salvaguardar cabalmente os interesses dos produtores europeus nas negociações comerciais bilaterais com o Mercosul e com outros países terceiros, evitando concessões que possam pôr a produção pecuária da UE em risco;
22. Solicita à Comissão que garanta a segurança jurídica nas importações de soja e de milho provenientes de países terceiros, através da introdução de um limiar pragmático para a presença acidental de OGM ainda não autorizados na União Europeia, mas em fase de estudo científico;
23. Solicita à Comissão Europeia que reveja a proibição que actualmente impende sobre a carne e a farinha de ossos para não ruminantes e avalie a possibilidade de levantar as restrições em circunstâncias que garantam um elevado nível de segurança alimentar;
24. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho e à Comissão.