Resolução do Parlamento Europeu, de 14 de março de 2012, sobre formação judiciária (2012/2575(RSP))
O Parlamento Europeu,
– Considerando os artigos 81.º e 82.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, que preveem a adoção, pelo processo legislativo ordinário, de medidas destinadas a assegurar «o apoio à formação dos magistrados e dos funcionários e agentes de justiça»,
– Tendo em conta a sua resolução de 10 de setembro de 1991 sobre a criação de uma Academia Europeia de Direito(1), a sua posição de 24 de setembro de 2002 sobre a adoção de uma decisão do Conselho que cria uma Rede Europeia de Formação Judiciária(2), a sua resolução de 9 de julho de 2008 sobre o papel do juiz nacional no sistema jurisdicional europeu(3), e a sua recomendação de 7 de maio de 2009 ao Conselho referente ao desenvolvimento de um espaço de justiça penal na UE(4),
– Tendo em conta a Comunicação da Comissão sobre um Plano de Ação de Aplicação do Programa de Estocolmo (COM(2010)0171),
– Tendo em conta a sua resolução de 25 de novembro de 2009, sobre o Programa de Estocolmo(5),
– Tendo em conta a sua resolução de 17 de junho de 2010 sobre a formação judiciária(6),
– Tendo em conta a Comunicação da Comissão de 13 de setembro de 2011 intitulada «Gerar confiança numa justiça à escala da UE – uma nova dimensão para a formação judiciária europeia» (COM(2011)0551),
– Tendo em conta o projeto-piloto sobre formação judiciária proposto pelo Parlamento em 2011,
– Tendo em conta o estudo comparativo sobre formação judiciária nos Estados-Membros encomendado pelo Parlamento à EDA em colaboração com a REFJ(7),
– Tendo em conta o n.º 5 do artigo 115.º e o n.º 2 do artigo 110.º do seu Regimento,
A. Considerando que o supracitado estudo procedeu à análise das atividades efetuadas neste domínio pelas escolas nacionais de magistrados, incluindo o tipo de formação proporcionada, as condições relevantes e os recursos orçamentais, tendo também em vista identificar necessidades e sugestões de melhoria e melhores práticas, e contém os resultados de um inquérito aprofundado a mais de 6.000 juízes e magistrados do Ministério Público nos Estados-Membros, centrando-se na sua experiência de formação em direito da UE e nas suas sugestões para melhoramentos;
B. Considerando que a formação judiciária deveria corretamente ser chamada «estudos judiciários» a fim de refletir a natureza especial do desenvolvimento intelectual contínuo que os membros da magistratura têm que fazer e o facto de as melhores pessoas para proporcionar estudos judiciários serem os próprios juízes;
C. Considerando que a oferta de formação está atualmente longe de corresponder ao objetivo da Comissão, nomeadamente o de ser disponibilizada a metade dos profissionais do direito da UE;
D. Considerando que, de acordo com o estudo, os obstáculos linguísticos, uma falta de informações (atempadas) sobre os programas existentes, o facto de os programas nem sempre serem adaptados às necessidades do juízes, bem como a elevada carga de trabalho dos juízes e a falta de financiamento relevante, se encontram entre as razões para o nível relativamente baixo de inquiridos que receberam formação em direito da UE (53% e apenas um terço deles durante os últimos 3 anos);
E. Considerando que será avisado, inclusive do ponto de vista orçamental, na atual situação de contingência financeira, tirar proveito das instituições existentes, em especial as escolas nacionais de formação de magistrados, mas também universidades e organismos profissionais, naquilo que diz respeito aos aspetos «de direito nacional» da construção de uma cultura judiciária europeia; considerando que tal significa que as melhores práticas possam ser identificadas nos Estados-Membros e promovidas e divulgadas em toda a UE; considerando que no que no que respeita à formação em direito da UE, a Academia de Direito Europeu (EDA) deve continuar a desempenhas o seu papel;
F. Considerando que, como o Parlamento já assinalara, o espaço judiciário europeu se deve basear numa cultura judiciária partilhada entre os profissionais do direito, os magistrados incluindo os magistrados do Ministério Público, que não se baseie apenas no direito da UE, mas seja desenvolvida através do reconhecimento e da compreensão mútuos dos sistemas judiciários nacionais, de uma revisão profunda dos currículos universitários, de intercâmbios, visitas de estudo e formação conjunta com o apoio ativo da Academia de Direito Europeu, da Rede Europeia de Formação Judiciária e do Instituto de Direito Europeu;
G. Considerando que a formação judiciária deve estar ligada a um debate sobre o papel tradicional do poder judicial e a sua modernização, sobre como abrir e alargar os seus horizontes; considerando que tal implica também formação linguística e a promoção do estudo do direito comparativo e do direito internacional;
H. Considerando que há também que criar uma cultura judiciária comum entre os membros da magistratura, utilizando a Carta dos Direitos Fundamentais, os trabalhos da Comissão de Veneza do Conselho da Europa e outros meios, para promover os valores fundamentais das profissões judiciais discutindo e promulgando uma ética profissional comum, o princípio da legalidade e os princípios de designação e seleção de juízes, e evitar a politização do poder judicial, promovendo assim a confiança mútua necessária para tornar realidade o espaço judiciário comum;
I. Considerando que é necessário criar redes entre juízes de diferentes culturas e melhorar a coordenação das redes existentes a fim de criar «círculos de coerência»; considerando que, para tal, não basta a comunicação eletrónica, devem existir fora em que juízes possam contactar, sendo essencial que participem juízes dos tribunais do Luxemburgo e de Estrasburgo;
J. Considerando que os estudos judiciários não se podem limitar ao direito substantivo e processual, e considerando que os juízes necessitam de formação relacionada com a sua atividade judiciária e com a «arte de julgar»;
1. Está convicto, reconhecendo que os contactos diretos são a melhor opção, que tendo em vista os constrangimentos orçamentais, bem como as respostas dadas pelos juízes no estudo, essa formação e conselhos poderão também ser fornecidos via internet (vídeo-conferência, cursos em linha, webstreaming) bem como através de intercâmbios; nota que os juízes reclamam uma maior avaliação e adaptação dos problemas de formação às suas necessidades, ao passo que parecem preferir formação interativa em que possam intercambiar experiências e debater casos para estudo em vez de fórmulas «clássicas» (de cima para baixo) de formação;
2. Considera que um outro objetivo será coordenar a formação fornecida pelas escolas de formação judiciária existentes, e facilitar e promover o diálogo e os contactos profissionais;
3. Nota que a formação multilinguística é importante uma vez que o estudo demonstra que apenas um número relativamente reduzido de juízes falam uma língua estrangeira suficientemente bem para poderem participar ativamente na formação judiciária noutros Estados-Membros;
4. É de opinião que uma forma de resolver os problemas (custos, formação linguística, eficácia em termos de custo) é utilizar tecnologia moderna e financiar a criação de aplicações («apps») na linha dos ITunes U da Apple; essas «apps», preparadas pelas escolas nacionais, a ADE, as universidades e outros formadores, consistiriam em cursos de formação, com material vídeo, incluindo formação linguística (com especial ênfase na terminologia jurídica) e instrução acerca dos sistemas jurídicos nacionais, processos específicos, etc., e seriam gratuitas para os membros da magistratura;
5. Considera que a participação com êxito nesses cursos deveria constituir a porta para o Erasmus para juízes e para a participação em cursos de formação no estrangeiro;
6. Sugere que essas «apps» poderiam também ser disponibilizadas aos profissionais do direito, a organismos profissionais, a professores e estudantes de direito por um preço módico, e que o seu desenvolvimento e produção forneceriam um impulso modesto à economia e ao emprego com um investimento relativamente reduzido;
7. Considera que o projeto-piloto apresentado por Luigi Berlinguer e Erminia Mazzoni e com execução prevista para 2012 deve em primeiro lugar ter por objetivo identificar e alargar as melhores práticas na organização do acesso ao direito da UE e formação relevante no âmbito dos sistemas judiciários e escolas de formação nacionais; considera por exemplo que a UE deve encorajar os Estados-Membros a emularem instituições de sucesso, como os coordenadores de direito da UE, do tipo que existe na Itália e nos Países Baixos, no interior da estrutura dos tribunais nacionais, e promover a formação desses coordenadores facilitando além disso o seu trabalho a nível da UE;
8. Considera que o projeto-piloto deverá incluir a criação de um grupo de trabalho que compreenda prestadores de formação judiciária nacionais e europeus, bem como agentes extra-judiciais, cujo objetivo consistiria em identificar uma série de «agrupamentos» temáticos de questões de direito da UE, que pareçam ser os mais relevantes para a prática judiciária quotidiana, tanto sobre questões «práticas» (como apresentar um pedido de decisão prejudicial, como aceder às bases de direito da UE, etc.) quanto sobre questões substanciais:
9. Sugere que o projeto-piloto poderia coordenar (a) o intercâmbio de conselhos e conhecimentos acerca de sistemas jurídicos particulares entre as escolas específicas de formação judiciária, baseando-se nas redes e recursos existentes e (b) em formação de tipo formal e familiarização com sistemas jurídicos estrangeiros;
10. Propõe, por último, que a Comissão realize um fórum anual em que juízes de todos os níveis de experiência, sobre domínios do direito em que surjam frequentemente questões nacionais e transfronteiriças, onde se possam realizar debates sobre uma ou mais áreas recentes de controvérsia jurídica ou de dificuldades, a fim de encorajar o debate, estabelecer contactos, criar canais de comunicação e construir confiança e compreensão mútuas; considera que esse fórum poderia também proporcionar uma oportunidade para que as autoridades competentes, os prestadores de formação e os peritos, incluindo as universidades e os organismos profissionais, debatam a política de formação judiciária e o futuro da educação jurídica na Europa;
11. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução à Comissão.