Resolução do Parlamento Europeu, de 10 de maio de 2012, sobre a concessão de patentes relativas a processos biológicos essenciais (2012/2623(RSP))
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta a Diretiva 98/44/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de julho de 1998, relativa à proteção jurídica das invenções biotecnológicas(1) (a seguir denominada «Diretiva 98/44/CE»), e, em particular, o seu artigo 4.º, nos termos do qual não são patenteáveis as variedades vegetais e as raças animais, nem os processos essencialmente biológicos de obtenção de vegetais ou de animais,
– Tendo em conta o artigo 2.º, n.º 2, e o considerando 33 da Diretiva 98/44/CE, nos termos dos quais os processos de obtenção de vegetais ou de animais serão considerados essencialmente biológicos se consistirem, na sua totalidade, em fenómenos naturais como o cruzamento ou a seleção,
– Tendo em conta a importância de uma cabal aplicação do artigo 11.º da Diretiva 98/44/CE, que garante o privilégio do agricultor,
– Tendo em conta a Convenção de 5 de outubro de 1973 sobre a concessão de patentes europeias (a seguir denominada «Convenção sobre a Patente Europeia») e o seu artigo 53.º, alínea b),
– Tendo em conta a decisão do Conselho de Administração do Instituto Europeu de Patentes, de 16 de junho de 1999, relativa à incorporação da Diretiva 98/44/CE no regulamento de execução da Convenção sobre a Patente Europeia(2),
– Tendo em conta a Decisão G 2/06 do Instituto Europeu de Patentes (IEP) e o Acórdão C-34/10 do Tribunal de Justiça Europeu, que estabelece que, aquando da interpretação das proibições previstas no direito das patentes, há que ter em conta a informação técnica do pedido no seu todo e não só a respetiva redação,
– Tendo em conta as Decisões G 2/07 (sobre o brócolo) e G1/08 (sobre o tomate) da Grande Secção de Recurso do IEP, que, em princípio, excluem da patenteabilidade os processos de reprodução,
– Tendo em conta as patentes concedidas pelo IEP para a produção de plantas por métodos de obtenção convencionais, como o brócolo (EP 1069819), o tomate (EP 1211926) e o melão (EP 1962578),
– Tendo em conta as patentes concedidas pelo IEP para a produção de animais por métodos de reprodução convencionais, como a seleção sexual e o material de reprodução utilizado nos processos de reprodução convencionais (EP 1263521, EP 1257168), a seleção de vacas leiteiras (EP 1330552) e a produção pecuária (EP 1506316),
– Tendo em conta o Tratado Internacional sobre os Recursos Fitogenéticos para a Alimentação e a Agricultura, ao qual a União Europeia aderiu por força da Decisão n.º 2004/869/CE do Conselho(3),
– Tendo em conta a Convenção Internacional, de 2 de dezembro de 1961, para a Proteção das Variedades Vegetais, revista em Genebra, em 10 de novembro de 1972, 23 de outubro de 1978 e 19 de março de 1991 (a seguir designada «Convenção UPOV»),
– Tendo em conta o Regulamento (CE) n.º 2100/94 do Conselho, de 27 de julho de 1994, relativo ao regime comunitário de proteção das variedades vegetais(4) (a seguir denominado «Regulamento (CE) n.º 2100/94»),
– Tendo em conta o artigo 110.º, n.º 2, do seu Regimento,
A. Considerando que os direitos de propriedade intelectual são essenciais para estimular o desenvolvimento de novas variedades vegetais e as inovações associadas aos vegetais e que constituem uma condição prévia necessária para impulsionar o crescimento e a inovação, bem como para ajudar as empresas europeias, em particular, as pequenas e médias empresas (PME) a enfrentarem a crise económica e a concorrência a nível mundial;
B. Considerando que, nomeadamente no setor da criação, uma proteção concedida por patentes que seja demasiado ampla é suscetível de constituir um obstáculo à inovação e ao progresso e de prejudicar os pequenos e médios criadores pecuários, bloqueando o acesso aos recursos genéticos animais e vegetais;
C. Considerando que a obtenção de vegetais é essencial à segurança do aprovisionamento alimentar e, em certa medida, do aprovisionamento energético;
D. Considerando que os métodos convencionais de criação se revestem de uma importância crucial para a produção vegetal e animal moderna;
E. Considerando que o regime internacional de proteção das variedades vegetais assente na Convenção UPOV e o regime da UE baseado no Regulamento (CE) n.º 2100/94 estipulam como princípio fundamental que o titular de uma variedade vegetal não pode impedir terceiros de utilizar a variedade protegida para promover a utilização de variedades protegidas no quadro de outras atividades de produção;
F. Considerando que é importante a existência de privilégios similares na legislação em matéria de patentes em toda a União Europeia;
G. Considerando que, de acordo com o artigo 4.º da Diretiva 98/44/CE e o artigo 53.º, alínea b), da Convenção sobre a Patente Europeia, as variedades vegetais e as raças animais, bem como os processos essencialmente biológicos de obtenção de vegetais ou de animais não são patenteáveis;
H. Considerando que as patentes relativas a produtos derivados dos métodos convencionais de reprodução ou ao material genético necessário à reprodução convencional são suscetíveis de comprometer a exceção prevista no artigo 4.º da Diretiva 98/44/CE e no artigo 53.º, alínea b), da Convenção sobre a Patente Europeia;
I. Considerando que podem ser concedidas patentes no setor da engenharia genética, mas que se impõe salvaguardar a proibição de patentes relativas a variedades vegetais e a raças animais;
J. Considerando que, no domínio da biotecnologia, importa ter em conta, não só o texto explícito dos pedidos, mas também a informação técnica da invenção, no seu todo, quando se trate de tomar uma decisão sobre a patenteabilidade, e que este princípio da abordagem «informação técnica no seu todo» foi aplicado pelo Instituto Europeu de Patentes e pelo Tribunal de Justiça Europeu em algumas das suas recentes decisões(5);
K. Considerando que, em conformidade com o artigo 16.º, alínea c), da Diretiva 98/44/CE, a Comissão apresentará anualmente «um relatório sobre a evolução e as implicações do direito de patentes no domínio da biotecnologia e da engenharia genética»;
L. Considerando que a Comissão não publicou relatórios dessa natureza desde 2005;
M. Considerando que, na sua Resolução, de 26 de outubro de 2005, sobre as patentes das invenções biotecnológicas(6) o Parlamento convidou a Comissão a abordar cuidadosamente, no seu próximo relatório, a questão da boa aplicação do artigo 4.º, n.º 1, alínea a), da Diretiva 98/44/CE;
N. Considerando que esses relatórios da Comissão teriam por finalidade informar cabalmente o público e que a União deve desempenhar um papel de primeiro plano na promoção do debate;
1. Reconhece o importante papel desempenhado pelo IEP no apoio à inovação, à competitividade e ao crescimento económico na Europa;
2. Reconhece que as patentes favorecem a difusão de informações técnicas preciosas e constituem um importante instrumento para a transferência de tecnologias;
3. Congratula-se com as Decisões das Grande Secção de Recurso do IEP nos processos denominados «brócolo» (G 2/07) e «tomate» (G 1/08), que têm por objeto a interpretação correta da expressão «processos essencialmente biológicos de obtenção de vegetais (ou de animais)» utilizada na Diretiva 98/44/CE e na Convenção sobre a Patente Europeia, no intuito de excluir da patenteabilidade tais processos;
4. Convida igualmente o IEP a excluir da patenteabilidade os produtos derivados da reprodução convencional e todos os métodos convencionais de reprodução, incluindo a reprodução que utiliza marcadores e tecnologias reprodutivas avançadas (reprodução SMART ou de precisão), bem como o material genético utilizado para a reprodução convencional;
5. Insta a Comissão a examinar, no âmbito do seu próximo relatório, as «decisões sobre o brócolo e o tomate», adotadas pela Grande Secção de Recurso do IEP;
6. Acolhe favoravelmente a recente decisão do Instituto Europeu de Patentes no processo WARF e do Tribunal de Justiça Europeu no Processo Brüstle, porquanto interpretam adequadamente a Diretiva 98/44/CE e dão importantes indicações sobre a designada estratégia «informação técnica no seu todo»; exorta a Comissão Europeia a extrair destas decisões as conclusões que se impõem também noutras áreas de intervenção relevantes, a fim de ajustar a política da UE a essas decisões;
7. Exorta a Comissão a tratar, no seu próximo relatório, a questão das repercussões potenciais da concessão de patentes a métodos de obtenção de vegetais e do respetivo impacto no setor da obtenção de vegetais, na agricultura, na indústria alimentar e na segurança alimentar;
8. Convida a Comissão e os EstadosMembros a velarem por que a União continue a aplicar, na sua legislação em matéria de patentes relativas à obtenção de variedades vegetais e de raças animais, uma ampla exceção a favor dos obtentores;
9. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão, aos governos dos EstadosMembros e ao IEP.
Grande Câmara de Recurso do Instituto Europeu de Patentes, Decisão de 25 de novembro de 2008, G 2/06 («WARF»), e Decisão do TJE no Processo C-34/10 (Greenpeace contra Brüstle)