Resolução do Parlamento Europeu, de 13 de setembro de 2012, sobre a África do Sul: massacre de mineiros grevistas (2012/2783 (RSP)).
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta o plano de ação conjunta da Parceria Estratégica África do Sul-UE, que constitui a única parceria do género celebrada até à data entre a UE e um país africano,
– Tendo em conta o Acordo de Parceria ACP-CE (’Acordo de Cotonu’),
– Tendo em conta a Declaração da OIT relativa aos princípios e direitos fundamentais no trabalho e o seu seguimento,
– Tendo em conta o Pacto Global da ONU e as orientações para as empresas multinacionais da OCDE,
– Tendo em conta o Quadro do Conselho Internacional para o Desenvolvimento Sustentável da Exploração Mineira e de Metais,
– Tendo em conta o Acordo de Comércio, Desenvolvimento e Cooperação (ACDC) assinado entre a União Europeia e a África do Sul em 1999, concluído em 2009, e que inclui disposições sobre cooperação política e económica,
– Tendo em conta o comunicado de imprensa do Presidente Jacob Zuma de 17 de agosto de 2012,
– Tendo em contas as observações da Alta Representante Catherine Ashton, de 23 e 24 de agosto de 2012, na sequência do 11.º Diálogo político interministerial UE-África do Sul com o Ministro dos Negócios Estrangeiros Nkoana-Mashabane,
– Tendo em conta a resolução da APP ACP-UE, de 30 de maio de 2012, sobre o impacto social e ambiental da atividade mineira nos países ACP,
– Tendo em conta o artigo 122.º, n.º 5, e o artigo 110.º, n.º 4, do seu Regimento,
A. Considerando que 34 pessoas foram assassinadas e pelo menos 78 ficaram feridas em 16 de agosto de 2012, em confrontos entre a polícia e trabalhadores grevistas na mina de platina da Lonmin, em Marikana, na província Noroeste da África do Sul; considerando que isto foi antecedido de vários dias de uma ação de greve violenta em que morreram 10 pessoas, incluindo dois agentes de segurança e dois agentes da polícia;
B. Considerando que 270 trabalhadores mineiros foram presos durante as greves e condenados pela morte dos seus próprios companheiros ao abrigo da lei do ’propósito comum’, da era do apartheid;
C. Considerando que, na sequência de protestos da população, os procuradores deixaram cair as acusações de assassínio contra os mineiros detidos em 16 de agosto de 2012, ao mesmo tempo que a acusação de violência pública de que foram alvo foi adiada até à conclusão das investigações;
D. Considerando que o tiroteio constitui o incidente mais sangrento entre a polícia e manifestantes desde o final do apartheid em 1994;
E. Considerando que este incidente deve ser visto na perspetiva mais vasta dos enormes desequilíbrios socioeconómicos que o país tem vindo a enfrentar; que, embora a África do Sul tenha logrado construir um Estado democrático desde a queda do regime do apartheid, o país enfrenta ainda desafios económicos e sociais muito relevantes, com a persistência de grandes desigualdades, bem como de uma elevada taxa de desemprego e de pobreza;
F. Considerando que, após esses acontecimentos sangrentos, o Presidente Zuma lamentou publicamente a dimensão trágica da situação;
G. Considerando que a Comissão de Inquérito Judicial foi criada pelo Presidente Zuma para investigar os homicídios, e que o Departamento Independente de Investigação Policial da África do Sul (IPID) iniciou também uma investigação sobre esses homicídios; que foi criado um Comité Interministerial responsável por encontrar uma solução sustentável para os problemas que causaram estas mortes;
H. Considerando que a falta de uma reforma dos mecanismos de litígio laboral tem originado custos económicos consideráveis à África do Sul e tem sido um entrave ao investimento estrangeiro;
I. Considerando que os mineiros grevistas estavam envolvidos numa disputa salarial com a proprietária da mina, Lonmin, uma empresa de exploração mineira com sede em Londres - a terceira maior do mundo;
J. Considerando que a intensa rivalidade política e sindical tem contribuído para este litígio, em particular para as tensões entre a União Nacional dos Trabalhadores Mineiros (NUM) e a Associação Sindical dos Trabalhadores das Minas e Construção (AMCU);
K. Considerando que o ex-Presidente expulso da Liga da Juventude do Congresso Nacional Africano (ANCYL), Julius Malema, tem sido visto a apoiar os mineiros grevistas e a AMCU;
L. Considerando que os minerais e produtos mineiros da África do Sul são exportados, inclusive para os países da União Europeia; que o setor das minas é afetado por uma procura em baixa e pelo aumento dos custos operacionais;
M. Considerando que alguns trabalhadores da mina de platina da Lonmin, em Marikana, continuam ainda em greve por melhores salários;
N. Considerando que um forte contingente policial se encontrava presente em 5 de setembro de 2012 quando mais de 3000 mineiros em greve marcharam pelas ruas perto da mina de Marikana, naquele que foi o maior protesto não violento desde o tiroteio de 16 de agosto de 2012;
O. Considerando que a ação alastrou a outras minas e que quatro pessoas ficaram feridas em 5 de setembro de 2012 num confronto ocorrido na mina Gold One Modder East, quando agentes de segurança dispararam balas de borracha contra mineiros grevistas;
1. Condena de forma veemente o assassínio brutal de mineiros grevistas em 16 de agosto de 2012, bem como a anterior violência que custou a vida a 10 pessoas, incluindo dois agentes de segurança e dois agentes da polícia;
2. Manifesta a sua sentida solidariedade com as famílias de todos aqueles que perderam a vida desde o início da crise na mina em Marikana;
3. Saúda a decisão do Presidente Zuma de criar uma Comissão de Inquérito assim como a iniciativa do Departamento Independente de Investigação Policial (IPID) de investigar os homicídios;
4. Solicita à Comissão de Inquérito que defenda a transparência, atue de forma absolutamente independente e imparcial, e garanta que as suas investigações complementem as do Departamento Independente de Investigação Policial (IPID);
5. Insta todas as partes afetadas a trabalharem com a Comissão de Inquérito no apuramento dos factos sobre o que aconteceu em Marikana;
6. Exorta a Comissão de Inquérito a que investigue a principal causa da utilização excessiva de violência pelas forças policiais e expressa a sua profunda preocupação face ao recurso pelas autoridades à lei do ’propósito comum’ da era do apartheid;
7. Mostra-se apreensivo pelo facto de que os parceiros sociais estabelecidos na África do Sul estão a perder legitimidade aos olhos dos cidadãos, devido à persistência dos sinais de corrupção a todos os níveis;
8. Exorta as autoridades da África do Sul e a Lonmin a que garantam que as vítimas, incluindo as famílias dos assassinados, tenham acesso à justiça, sejam indemnizadas e tomadas a cargo;
9. Requer o tratamento equitativo de todos os presos e conforme com os procedimentos judiciais, incluindo uma investigação policial imparcial e transparente;
10. Lamenta o facto de a Lonmin não ter logrado tratar o litígio laboral com a merecida sensibilidade necessária e não ter assumido qualquer responsabilidade, mas congratula-se com o anúncio feito por esta empresa de que não iria despedir grevistas que não retomassem o trabalho, ao contrário da anterior posição da empresa;
11. Está profundamente preocupado com a ameaça de violência expressa pelos mineiros grevistas, em especial face às alegações de intimidação contra os trabalhadores mineiros que têm sido ameaçados de morte se continuarem a trabalhar; exorta todas as partes envolvidas a que garantam que os protestos permaneçam pacíficos;
12. Está preocupado com o facto de que o confronto na mina Gold One Modder East é um sinal de que a agitação laboral se pode alastrar ao setor do ouro, originando uma possível propagação da violência;
13. Lembra a todas as partes a sua obrigação de respeitar o direito internacional, incluindo os princípios e as prioridades da OIT, e a Constituição da África do Sul, que garante os direitos de associação, de reunião e de liberdade de expressão;
14. Exorta as autoridades e os sindicatos da África do Sul e a Lonmin a que prossigam todos os esforços para chegarem a uma solução rápida, global e justa para o conflito e a disputa salarial, com o objetivo de trazer paz e estabilidade àquela zona;
15. Solicita a resolução urgente dos litígios e conflitos em curso entre a União Nacional dos Trabalhadores Mineiros (NUM) e a Associação Sindical dos Trabalhadores das Minas e Construção (AMCU);
16. Insiste em que seja examinada a questão dos salários adequados para os trabalhadores das minas da África do Sul bem como a das desigualdades da grelha remuneratória;
17. Reconhece que o Governo da África do Sul tem levado a cabo uma série de ações para melhorar as condições de trabalho na indústria mineira e exorta as autoridades a prosseguirem os seus esforços;
18. Exorta o Governo da África do Sul a atender à necessidade do desenvolvimento de competências por parte do serviço de polícia da África do Sul, em particular, para conter manifestações violentas e a utilização de munições verdadeiras; apela à intensificação da cooperação, para efeitos do treino das forças policiais, entre a UE e a África do Sul;
19. Apela à Comissão Europeia para que crie um mecanismo de controlo tendente a impedir a importação na UE de produtos mineiros extraídos sem garantias sociais, laborais, de segurança e ambientais; encoraja a Comissão Europeia a estabelecer um selo de qualidade para os produtos mineiros extraídos de acordo com as normas mínimas sociais, laborais, de segurança e ambientais;
20. Exorta o Governo da África do Sul a fazer face às principais causas da violência registada, incluindo o fosso preocupante entre ricos e pobres, o aumento do desemprego entre os jovens, as condições de trabalho e de vida dos trabalhadores e, assim, a pôr termo às extremas desigualdades económicas;
21. Está disposto a prosseguir o seu apoio à África do Sul e salienta a necessidade de uma parceria sustentada e mais focalizada para ajudar o país a dar resposta aos desafios socioeconómicos que enfrenta;
22. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão, à Vice-Presidente da Comissão/Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, ao Governo e ao Parlamento da África do Sul, aos Copresidentes da Assembleia Parlamentar Paritária ACP-UE, ao Parlamento Pan-Africano e à União Africana.