Resolução do Parlamento Europeu, de 16 de fevereiro de 2017, sobre a Guatemala, nomeadamente a situação dos defensores dos direitos humanos (2017/2565(RSP))
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta a Declaração Universal dos Direitos do Homem, as convenções das Nações Unidas em matéria de direitos humanos e os respetivos protocolos facultativos,
– Tendo em conta a Convenção Europeia dos Direitos do Homem, a Carta Social Europeia e a Carta dos Direitos Fundamentais da UE,
– Tendo em conta o Consenso Europeu sobre o Desenvolvimento, de dezembro de 2005,
– Tendo em conta as suas anteriores resoluções sobre a violação dos direitos humanos, nomeadamente as resoluções sobre os debates relativos a casos de violação dos direitos humanos, da democracia e do Estado de direito,
– Tendo em conta as suas resoluções de 15 de março de 2007, sobre a Guatemala(1), e de 11 de dezembro de 2012(2), sobre o Acordo de Associação UE-América Central,
– Tendo em conta a visita da Subcomissão dos Direitos do Homem ao México e à Guatemala, em fevereiro de 2016, e o seu relatório final,
– Tendo em conta o relatório da Delegação para as relações com os países da América Central sobre a visita à Guatemala e às Honduras, de 16 a 20 de fevereiro de 2015,
– Tendo em conta a sua resolução, de 21 de janeiro de 2016, sobre as prioridades da UE para as sessões do CDHNU em 2016(3),
– Tendo em conta o relatório sobre as ameaças globais com que se deparam os defensores dos direitos humanos e sobre a situação das mulheres defensoras dos direitos humanos, elaborado pelo Relator Especial das Nações Unidas,
– Tendo em conta o relatório anual de 2016 do Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos sobre as atividades do seu gabinete na Guatemala,
– Tendo em conta a recente visita do Representante Especial da UE para os Direitos Humanos à Guatemala,
– Tendo em conta o Pacto da ONU sobre os Direitos Civis e Políticos, de 1966,
– Tendo em conta o Plano de Ação da UE para os Direitos Humanos e a Democracia (2015‑2019),
– Tendo em conta o roteiro da UE 2014-2017 para a colaboração com a sociedade civil em países parceiros,
– Tendo em conta as orientações da UE para a proteção dos defensores dos direitos humanos e o quadro estratégico da UE para os direitos humanos, que se compromete a colaborar com os defensores dos direitos humanos,
– Tendo em conta a resolução do Conselho dos Direitos do Homem das Nações Unidas (CDHNU), de 26 de junho de 2014, segundo a qual o CDHNU decidiu criar um grupo de trabalho intergovernamental aberto e cujo mandato será elaborar um instrumento internacional, juridicamente vinculativo, para regulamentar, no âmbito dos direitos humanos, as atividades de empresas transnacionais e de outros tipos de empresas,
– Tendo em conta a Convenção da Organização Internacional do Trabalho relativa às Populações Indígenas e Tribais nos Países Independentes (Convenção n.º 169 da OIT), de 1989,
– Tendo em conta as cláusulas relativas aos direitos humanos do Acordo de Associação UE‑América Central e do Acordo de Parceria e Cooperação (APC) entre a UE e a América Central, em vigor desde 2013,
– Tendo em conta o programa indicativo plurianual para a Guatemala 2014-2020 e o seu empenho em contribuir para a resolução de conflitos, a paz e a segurança,
– Tendo em conta os programas de apoio da União Europeia para o setor da justiça da Guatemala, nomeadamente o programa SEJUST,
– Tendo em conta a decisão do Tribunal Interamericano de Direitos Humanos no caso Defensores dos direitos humanos et al. vs. Guatemala, e o relatório da Comissão Interamericana de Direitos Humanos sobre a situação dos direitos humanos na Guatemala (OEA/Ser.L/V/II. Doc. 43/15), de 31 de dezembro de 2015,
– Tendo em conta o artigo 25.º do Regulamento Interno da Comissão Interamericana dos Direitos Humanos, relativo ao mecanismo de medidas de precaução,
– Tendo em conta as conclusões do Conselho, de 2009, sobre o apoio à democracia no âmbito das relações externas da UE,
– Tendo em conta as orientações do Conselho, de 2009, sobre os direitos humanos e o direito humanitário internacional,
– Tendo em conta a declaração, de 9 de dezembro de 2016, da Alta Representante Federica Mogherini, em nome da União Europeia, por ocasião do Dia dos Direitos Humanos, 10 de dezembro de 2016,
– Tendo em conta a declaração, de 17 de agosto de 2016, do porta-voz do SEAE sobre os defensores dos direitos humanos na Guatemala,
– Tendo em conta a declaração de Santo Domingo da reunião ministerial UE-CELAC, de 25 e 26 de outubro de 2016,
– Tendo em conta a declaração, de 1 de fevereiro de 2017, do Grupo dos Treze sobre o reforço do Estado de direito e a luta contra a corrupção e a impunidade,
– Tendo em conta o artigo 2.º, o artigo 3.º, n.º 5, e os artigos 18.º, 21.º, 27.º e 47.º do Tratado da União Europeia, e o artigo 208.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia,
– Tendo em conta o artigo 135.º do seu Regimento,
A. Considerando que a Guatemala é o terceiro maior beneficiário de ajuda bilateral ao desenvolvimento na América Central, num montante de 187 milhões de euros para o período 2014-2020, centrada na segurança alimentar, na resolução de conflitos, na paz, na segurança e na competitividade;
B. Considerando que a Guatemala se encontra estrategicamente localizada na rota de fornecimento de droga e de migração ilegal entre a América Central e os Estados Unidos; que os guatemaltecos continuam a ser o segundo maior grupo de deportados dos EUA; que décadas de conflito interno, taxas elevadas de pobreza e uma cultura profundamente enraizada de impunidade resultaram em níveis constantes de violência e ameaças à segurança na Guatemala; que toda a sociedade é afetada por taxas elevadas de criminalidade, mas, mais especificamente, os defensores dos direitos humanos, as ONG e as autoridades locais;
C. Considerando que 2017 marca o 20.º aniversário dos acordos de paz da Guatemala; que a luta contra a impunidade, incluindo os crimes graves cometidos durante os anteriores regimes não democráticos, é essencial; que as autoridades da Guatemala devem enviar uma mensagem clara aos autores físicos e intelectuais de atos de violência contra defensores dos direitos humanos de que esse tipo de ações não irão ficar impunes;
D. Considerando que, entre janeiro e novembro de 2016, foram registados catorze homicídios e sete tentativas de assassinato de defensores dos direitos humanos na Guatemala pela unidade de proteção dos defensores dos direitos humanos da Guatemala (UDEFEGUA); que, de acordo com as mesmas fontes, em 2016, ocorreram 223 agressões contra defensores dos direitos humanos, incluindo 68 novos processos instaurados contra defensores dos direitos humanos; que os defensores ambientais e fundiários e os que trabalham no setor da justiça e da luta contra a impunidade fazem parte dos grupos mais frequentemente visados de defensores dos direitos humanos;
E. Considerando que 2017 já ficou marcado pelo assassinato dos defensores dos direitos humanos Laura Leonor Vásquez Pineda e Sebastián Alonzo Juan, além dos jornalistas alegadamente mortos em 2016: Victor Valdés Cardona, Diego Esteban Gaspar, Roberto Salazar Barahona e Winston Leonardo Túnchez Cano;
F. Considerando que a situação em matéria de direitos humanos continua a ser muito grave; que a situação das mulheres e das populações indígenas, em especial dos que defendem os direitos humanos e os direitos dos migrantes, é motivo de grande preocupação, bem como é o caso de outras questões como o acesso à justiça, as condições prisionais, a conduta policial e as alegações de tortura, agravadas pela corrupção, conluio e impunidade generalizada;
G. Considerando que a Guatemala ratificou a Convenção n.º 169 da OIT sobre os Povos Indígenas e Tribais e a Convenção n.º 87 da OIT sobre a Liberdade Sindical e a Proteção do Direito Sindical; que existem alguns sinais positivos, tais como a criação da Mesa Sindical del Ministerio Público; que a legislação guatemalteca não inclui qualquer obrigação de consulta prévia, livre e informada das comunidades indígenas, tal como referido na Convenção n.º 169 da OIT;
H. Considerando que o Tribunal Interamericano dos Direitos Humanos proferiu uma sentença vinculativa em 2014, que apelava à adoção de uma política pública destinada à proteção dos defensores dos direitos humanos; que está em curso um processo de consulta financiado pela UE para a criação da referida política;
I. Considerando que os Princípios Orientadores das Nações Unidas sobre Empresas e Direitos Humanos se aplicam a todos os Estados e a todas as empresas, sejam de caráter transnacional ou outro, independentemente da sua dimensão, setor, localização, propriedade e estrutura, embora o controlo eficaz e os mecanismos de sanção continuem a ser um desafio em termos da aplicação a nível mundial dos Princípios Orientadores das Nações Unidas; que a situação em matéria de direitos humanos na Guatemala será revista em novembro de 2017, no âmbito do mecanismo de Revisão Periódica Universal do Conselho dos Direitos Humanos (CDH);
J. Considerando que o Provedor de Justiça para os direitos humanos da Guatemala, o Ministério Público e o sistema judicial têm dado passos importantes na luta contra a impunidade e em prol do reconhecimento dos direitos humanos;
K. Considerando que a Guatemala tomou algumas medidas positivas, como o alargamento do mandato da CICIG (Comissão Internacional contra a Impunidade na Guatemala) para 2019; que, em outubro de 2016, foi apresentada ao Congresso uma proposta de reforma constitucional do setor da justiça baseada, nomeadamente, nas mesas redondas com a sociedade civil, pelos Presidentes do Executivo, do Congresso e do sistema de justiça da Guatemala, proposta essa que procura reforçar o sistema de justiça com base em princípios como a carreira judicial, o pluralismo jurídico e a independência do poder judicial;
L. Considerando que uma campanha específica de assédio impediu uma série de casos emblemáticos relativos a corrupção e a justiça transicional, com os defensores dos direitos humanos que trabalhavam nesse contexto, incluindo juízes e advogados, foram alvo de intimidação e de denúncias falsas; que Iván Velasquez, diretor da internacionalmente reconhecida Comissão Internacional contra a Impunidade na Guatemala (CICIG), também está a enfrentar acusações e a ser objeto de uma campanha de difamação; que casos emblemáticos no domínio da justiça transicional estão a avançar, como os que envolvem Molina Theissen e CREOMPAZ ou os referentes à corrupção nos casos La Linea y Coparacha, entre outros;
M. Considerando que alguns Estados-Membros da UE ainda não ratificaram o Acordo de Associação UE-América Central e que o pilar «Diálogo Político», por conseguinte, ainda não entrou em vigor; que os direitos humanos e o Estado de direito estão no cerne da ação externa da UE, para além do desenvolvimento económico e social sustentável;
1. Condena veementemente os recentes assassinatos de Laura Leonor Vásquez Pineda, Sebastian Alonzo Juan e dos jornalistas Victor Valdés Cardona, Diego Esteban Gaspar, Roberto Salazar Barahona e Winston Leonardo Túnchez Cano, bem como cada um dos outros 14 assassinatos de defensores dos direitos humanos na Guatemala, perpetrados em 2016; apresenta as suas sinceras condolências às famílias e aos amigos de todos os referidos defensores dos direitos humanos;
2. Realça a sua preocupação pelo facto de os atos contínuos de violência e a falta de segurança terem um impacto negativo na capacidade de os defensores dos direitos humanos exercerem de forma plena e livre as suas atividades; presta homenagem a todos os defensores dos direitos humanos na Guatemala e solicita uma investigação imediata, independente, objetiva e exaustiva dos assassinatos supracitados; salienta que uma sociedade civil dinâmica é essencial para que o Estado seja, a todos os níveis, mais responsável, reativo, inclusivo, eficaz e, por conseguinte, mais legítimo;
3. Saúda os esforços da Guatemala de luta contra a criminalidade organizada, solicita que esses esforços sejam intensificados e reconhece a enorme dificuldade com que o país se depara na garantia da segurança e da liberdade de todos os cidadãos numa situação de violência estrutural, como a criada pelo tráfico de estupefacientes; insta as instituições da UE e os Estados-Membros a proporcionarem meios técnicos e orçamentais à Guatemala a fim de apoiar a luta contra a corrupção e a criminalidade organizada e darem prioridade a esses esforços nos programas bilaterais de cooperação;
4. Recorda a necessidade de desenvolver uma política pública de proteção dos defensores dos direitos humanos, tal como indicado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) em 2014; toma nota do diálogo nacional recentemente encetado, exorta as autoridades da Guatemala a garantirem que a política pública é desenvolvida através de um processo participativo abrangente e aborda as causas estruturais que aumentam a vulnerabilidade dos defensores dos direitos humanos e solicita à comunidade empresarial que apoie estes esforços;
5. Congratula-se com a decisão da Delegação da UE na Guatemala de contribuir financeiramente para o debate e o processo de consulta desse programa e insta a Delegação da UE a continuar a dar o seu apoio aos defensores dos direitos humanos; insta as autoridades competentes a elaborarem e a aplicarem uma política pública destinada a proteger os defensores dos direitos humanos, em estreita cooperação com um vasto leque de partes interessadas, e a prosseguir na via das reformas que contribuam para um poder judicial independente, a luta contra a impunidade e a consolidação do Estado de direito;
6. Solicita a adoção urgente e obrigatória das medidas preventivas recomendadas pela CIDH e insta as autoridades a anularem a decisão que suprime unilateralmente as medidas cautelares nacionais que beneficiam os defensores dos direitos humanos;
7. Recorda os resultados das 93 consultas comunitárias efetuadas em boa-fé, em 2014 e 2015; recorda que está atualmente em curso um processo participativo e exorta as autoridades da Guatemala a acelerarem os procedimentos destinados a assegurar a criação de um mecanismo nacional de consulta prévia, livre e informada, conforme previsto pela Convenção n.º 169 da OIT; solicita ao Governo da Guatemala que lance consultas sociais mais abrangentes sobre as centrais hidroelétricas, os projetos de extração mineira e as empresas petrolíferas e exorta as instituições da UE a garantirem que nenhuma assistência ou apoio europeu promove ou permite projetos de desenvolvimento sem satisfazerem a obrigação de consulta prévia, livre e informada das comunidades indígenas;
8. Congratula-se com a iniciativa de reforma do sistema judicial apresentada ao Congresso pelos poderes executivo, judicial e legislativo, a fim de continuar a desenvolver um sistema judicial profissional e democrático com base numa verdadeira independência do poder judicial; insta a realização de esforços conjuntos no Congresso da Guatemala a fim de concluir a reforma do sistema judicial na sua totalidade em 2017; insta, para o efeito, as autoridades guatemaltecas a atribuírem financiamento e recursos humanos suficientes ao sistema judicial e, em especial, ao Gabinete do Procurador-Geral; apoia o trabalho importante da Comissão Internacional contra a Impunidade na Guatemala (CICIG);
9. Congratula-se com a decisão da Primeira Secção do Tribunal de Recurso, que reiterou a imprescritibilidade dos crimes de genocídio e dos crimes contra a humanidade no julgamento do antigo ditador Rios Montt, como marco importante da luta contra a impunidade;
10. Solicita ao Estado guatemalteco que coopere com o mecanismo de Revisão Periódica Universal e tome todas as medidas adequadas para aplicar as suas recomendações;
11. Solicita à União Europeia que apoie o Gabinete do Procurador-Geral; rejeita firmemente qualquer tipo de pressão, intimidação ou influência que ponha em causa a independência, o pluralismo jurídico e a objetividade; insta as autoridades da Guatemala a continuarem a promover a cooperação entre a unidade do Ministério do Interior responsável pela análise dos ataques contra os defensores dos direitos humanos e a secção dos direitos humanos do Gabinete do Procurador-Geral;
12. Insta as instituições da UE a trabalharem em prol da celebração de acordos vinculativos a nível internacional que reforcem o respeito dos direitos humanos, especificamente no caso de empresas sediadas na UE que operam em países terceiros;
13. Exorta os Estados-Membros da UE que ainda não o fizeram a ratificarem rapidamente o Acordo de Associação UE-América Central; solicita à União Europeia e aos Estados-Membros que utilizem os mecanismos previstos no Acordo de Associação e de Diálogo Político, com vista a incentivar vivamente a Guatemala a seguir uma agenda ambiciosa em matéria de direitos humanos e de luta contra a impunidade; exorta as instituições da UE e os Estados-Membros a reservarem fundos e assistência técnica suficientes para esta tarefa;
14. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão, ao Serviço Europeu para a Ação Externa, ao Representante Especial da UE para os Direitos Humanos, à Organização dos Estados Americanos, à Assembleia Parlamentar Euro‑Latino-Americana, aos governos e parlamentos dos Estados -Membros, ao Presidente, ao Governo e ao Parlamento da República da Guatemala, ao SIECA e ao Parlacen.