Aplicação das diretrizes do Conselho sobre as pessoas LGBTI, nomeadamente no que diz respeito à perseguição de homens (considerados) homossexuais na Chechénia, Rússia
Resolução do Parlamento Europeu, de 18 de maio de 2017, sobre a aplicação das diretrizes do Conselho sobre as pessoas LGBTI, nomeadamente no que diz respeito à perseguição de homens (considerados) homossexuais na Chechénia, Rússia (2017/2688(RSP))
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta as suas anteriores resoluções sobre a Rússia,
– Tendo em conta a Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais,
– Tendo em conta o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos,
– Tendo em conta a Convenção Europeia dos Direitos do Homem e os respetivos protocolos,
– Tendo em conta a Constituição da Federação da Rússia, em particular o capítulo 2 sobre os Direitos e as Liberdades do Homem e do Cidadão,
– Tendo em conta as diretrizes do Conselho Europeu, de 24 de junho de 2013, para a promoção e a proteção do exercício de todos os direitos humanos por parte de lésbicas, gays, bissexuais, transgéneros e intersexuais (LGBTI),
– Tendo em conta as conclusões do Conselho, de 16 de junho de 2016, sobre a igualdade das pessoas LGBTI,
– Tendo em conta as Orientações da União Europeia relativas aos Defensores dos Direitos Humanos, à Tortura e aos Maus-tratos,
– Tendo em conta a sua resolução, de 4 de fevereiro de 2014, sobre o Roteiro da UE contra a homofobia e a discriminação com base na orientação sexual e na identidade de género(1),
– Tendo em conta a declaração, de 13 de abril de 2017, dos especialistas em direitos humanos da ONU sobre o abuso e a detenção de homossexuais na Chechénia,
– Tendo em conta o Plano de Ação da UE para os Direitos Humanos e a Democracia 2015-2019,
– Tendo em conta a sua resolução, de 14 de dezembro de 2016, sobre o Relatório Anual sobre os direitos humanos e a democracia no mundo e a política da União Europeia nesta matéria (2015)(2),
– Tendo em conta a declaração, de 6 de abril de 2017, do porta-voz da Vice-Presidente da Comissão/Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, Federica Mogherini, sobre as violações dos direitos humanos de homossexuais na Chechénia,
– Tendo em conta a declaração da UE a nível local relativa às violações dos direitos humanos dos homossexuais na Chechénia, de 19 de abril de 2017,
– Tendo em conta a declaração da UE sobre a persistência de relatos de detenções e assassínios de homossexuais por parte do Governo da Chechénia, proferida no Conselho Permanente da OSCE em 27 de abril de 2017,
– Tendo em conta a declaração do porta-voz do Departamento de Estado dos EUA em 7 de abril de 2017,
– Tendo em conta a declaração emitida pelo Diretor do Gabinete da OSCE para as Instituições Democráticas e os Direitos Humanos (ODIHR) em 13 de abril de 2017,
– Tendo em conta a conferência de imprensa conjunta da Vice-Presidente da Comissão/Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, Federica Mogherini, e do Ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Sergey Lavrov, em Moscovo, em 24 de abril de 2017,
– Tendo em conta o artigo 128.º, n.º 5, e o artigo 123.º, n.º 4, do seu Regimento,
A. Considerando que, em 1 de abril de 2017, foi publicado no jornal independente russo Novaya Gazeta um artigo que indicava que mais de uma centena de homens, homossexuais ou considerados como tal, tinham sido raptados e detidos na República Autónoma Chechena da Federação da Rússia, no âmbito de uma campanha coordenada, alegadamente organizada pelas autoridades e forças de segurança da República sob ordem direta de Ramzan Kadyrov, Presidente da Chechénia;
B. Considerando que, segundo o Novaya Gazeta, as vítimas tinham sido maltratadas, torturadas e forçadas a divulgar a identidade de outras pessoas LGBTI; que, pelo menos, três homens tinham sido assassinados, dois na sequência do tratamento infligido durante a detenção e um por familiares no contexto dos denominados «crimes de honra»;
C. Considerando que a Human Rights Watch e o Grupo de Crise Internacional confirmaram, separadamente, os relatórios iniciais, citando fontes no terreno que confirmam que os homens considerados homossexuais têm sido alvo de detenção por parte da polícia e das forças de segurança;
D. Considerando que, alegadamente, as autoridades na Chechénia repudiaram estas acusações e demonstraram relutância em investigar e intentar ações penais;
E. Considerando que as vítimas se abstêm, em larga medida, de procurar obter justiça, uma vez que temem retaliações por parte das autoridades locais; que os homossexuais e as lésbicas e as pessoas consideradas como tal são particularmente vulneráveis devido à forte homofobia societal e correm o risco de se tornarem vítimas de crimes de honra perpetrados pelos seus familiares;
F. Considerando que, após anos de ameaças e repressão e de uma deterioração grave da situação dos direitos humanos no Norte do Cáucaso, praticamente nenhum jornalista independente ou ativista dos direitos humanos consegue trabalhar na região; que os jornalistas que trabalham para o jornal Novaya Gazeta, que revelou a repressão, terão recebido ameaças de morte durante o seu trabalho; que as autoridades chechenas negaram todas as acusações e exigiram que os jornalistas identificassem as vítimas entrevistadas;
G. Considerando que a polícia em São Petersburgo e Moscovo deteve ativistas LGBTI, que tentavam sensibilizar e exigir uma investigação sobre a perseguição de homossexuais na Chechénia;
H. Considerando que a Federação da Rússia é signatária de vários tratados internacionais em matéria de direitos humanos e, na qualidade de membro do Conselho da Europa, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, tem o dever de garantir a segurança de todas as pessoas que possam estar em risco, incluindo devido à sua orientação sexual; que a Rússia tem a obrigação e os meios para investigar os crimes cometidos pelas autoridades chechenas; que a homossexualidade foi despenalizada na Federação da Rússia em 1993;
I. Considerando que o Presidente Putin encarregou a Provedora dos Direitos Humanos russa, Tatyana Moskalkova, de formar um grupo de trabalho para investigar as acusações;
J. Considerando que as pessoas LGBTI estão protegidas ao abrigo da legislação internacional existente em matéria de direitos humanos e ao abrigo da legislação interna da Rússia; que, no entanto, são muitas vezes necessárias medidas específicas a fim de assegurar o pleno exercício dos direitos humanos por parte das pessoas LGBTI, uma vez que a orientação sexual e a identidade de género podem acarretar riscos suplementares de discriminação, intimidação e perseguição, em escolas, no local de trabalho e na sociedade em geral, mas também no seio familiar; que é tarefa e responsabilidade da polícia, do poder judicial e das autoridades lutar contra estas formas de discriminação e combater as atitudes sociais negativas;
K. Considerando que as diretrizes do Conselho sobre as pessoas LGBTI preconizam uma atitude proativa por parte das delegações da UE e das embaixadas dos Estados-Membros no que diz respeito à promoção dos direitos das pessoas LGBTI; que estas diretrizes estipulam que o combate à violência fóbica contra as pessoas LGBTI e o apoio aos defensores dos direitos humanos das pessoas LGBTI constituem áreas prioritárias;
L. Considerando que, em 7 de março de 2017, a Duma russa aprovou legislação que descriminaliza a violência doméstica, tornando a «agressão física dentro da família», previamente considerada uma infração penal, numa infração administrativa com sanções mais leves para os infratores; que o Parlamento Europeu debateu esta questão no seu período de sessões em Estrasburgo, de 13 a 16 de março de 2017;
1. Manifesta profunda preocupação perante os relatos de detenção arbitrária e tortura de homens considerados homossexuais na República Chechena da Federação da Rússia; insta as autoridades a pôr termo a esta campanha de perseguição, a libertar imediatamente os que ainda se encontram detidos ilegalmente, a garantir a proteção jurídica e física das vítimas, dos defensores dos direitos humanos e dos jornalistas que têm acompanhado este caso e a permitir que as organizações internacionais de defesa dos direitos humanos conduzam uma investigação credível dos alegados crimes;
2. Condena todas as declarações das autoridades chechenas que toleram e incitam à violência contra as pessoas LGBTI, incluindo a declaração do porta-voz do Governo checheno que nega a existência de homossexuais na Chechénia e desacredita o relatório, considerando-o apenas «mentiras e absoluta desinformação»; lamenta a relutância das autoridades locais em investigar e intentar ações penais contra as violações graves dirigidas especificamente a pessoas devido à sua orientação sexual e relembra às autoridades que os direitos à liberdade de reunião, de associação e de expressão são direitos universais e se aplicam a todas as pessoas; apela à libertação imediata de todos os que ainda se encontram detidos ilegalmente; insta as autoridades russas a garantirem a proteção jurídica e física das vítimas, bem como dos defensores dos direitos humanos e dos jornalistas que têm acompanhado este caso;
3. Observa que o Presidente Putin deu instruções ao Ministério do Interior russo e ao Ministério Público Federal no sentido de que investigassem os acontecimentos na Chechénia e insta a Comissão, os Estados-Membros e o Conselho da Europa a prestarem aconselhamento e apoio material às autoridades russas nesta investigação;
4. Insta as autoridades chechenas e as autoridades da Federação da Rússia a respeitarem a legislação nacional e os compromissos internacionais, a defenderem o primado do Direito e as normas universais em matéria de direitos humanos e a promoverem a igualdade e a não discriminação, inclusivamente no que respeita às pessoas LGBTI, apoiadas por medidas como campanhas de sensibilização destinadas a promover uma cultura de tolerância, respeito e inclusão, com base na igualdade e na não discriminação; apela à adoção imediata de medidas de proteção das pessoas vulneráveis que correm o risco de se tornar vítimas e à plena reabilitação de todas as vítimas de tortura;
5. Lamenta as violações generalizadas dos direitos humanos na região e o clima de impunidade que possibilita a ocorrência destes atos, e apela à elaboração de medidas jurídicas e outras destinadas a prevenir essa violência e a controlar e intentar ações penais, de modo eficaz, contra os seus autores, em cooperação com a sociedade civil; salienta que a Rússia e o seu Governo são, em última instância, responsáveis pela investigação destes atos, pela entrega à justiça dos seus autores e pela proteção de todos os cidadãos russos contra abusos ilegais;
6. Exorta, com caráter de urgência, à realização de investigações imediatas, independentes, objetivas e exaustivas dos atos de detenção, tortura e assassínio, a fim de levar a tribunal os seus mandantes e autores materiais, e pôr termo à impunidade; congratula-se, a este respeito, com a criação de um grupo de trabalho sob a liderança da Provedora dos Direitos Humanos russa, que está a investigar a questão; insta as autoridades russas a encarregarem o Gabinete do Procurador-Geral de proporcionar um verdadeiro anonimato e outras medidas de proteção às vítimas e testemunhas da purga homofóbica chechena, bem como às respetivas famílias, de modo a que possam participar na investigação; insta a Delegação da UE, bem como as embaixadas e os consulados dos Estados-Membros da UE na Rússia, a acompanharem ativamente as investigações e a intensificarem os esforços para colaborar com as vítimas, as pessoas LGBTI, os jornalistas e os defensores dos direitos humanos atualmente sob ameaça;
7. Insta a Comissão a cooperar com organizações internacionais de defesa dos direitos humanos e com a sociedade civil russa, a fim de ajudar as pessoas que fugiram da Chechénia e a trazer à luz esta campanha de abuso; insta, além disso, os Estados-Membros a facilitarem os processos de pedido de asilo para essas vítimas e para os jornalistas e os defensores dos direitos humanos, em conformidade com o Direito europeu e nacional;
8. Saúda e reconhece os esforços envidados por muitos chefes de delegações da UE e respetivos funcionários, bem como pelos embaixadores dos Estados-Membros e respetivo pessoal, no sentido de apoiar os defensores dos direitos humanos das pessoas LGBTI e defender a não discriminação e a igualdade de direitos; convida os chefes das delegações da UE e outros membros do pessoal do Serviço Europeu para a Ação Externa (SEAE) a consultar o Parlamento Europeu e os seus deputados relevantes sempre que tenham dúvidas ou pretendam fornecer ao Parlamento informações, inclusivamente durante a conferência anual dos embaixadores, em setembro; salienta a importância de as delegações da UE e as representações dos Estados-Membros conhecerem e aplicarem as diretrizes sobre as pessoas LGBTI; solicita, a este respeito, ao SEAE e à Comissão que promovam uma aplicação mais estratégica e sistemática das diretrizes, nomeadamente através da sensibilização e da formação adequada dos funcionários da UE em países terceiros, para que o tema dos direitos das pessoas LGBTI seja abordado, de forma eficaz, nos diálogos sobre política e direitos humanos com países terceiros e em fóruns multilaterais, bem como para apoiar os esforços envidados pela sociedade civil;
9. Realça veementemente a importância de uma avaliação contínua da aplicação das diretrizes, com base em critérios claros; insta a Comissão a realizar e a publicar uma avaliação aprofundada da aplicação das diretrizes pelas delegações da UE e pelas representações diplomáticas dos Estados-Membros em todos os países terceiros, a fim de detetar e colmatar eventuais diferenças e lacunas na sua aplicação;
10. Lamenta profundamente que a Federação da Rússia tenha votado contra a resolução, de junho de 2016, do Conselho dos Direitos do Homem da ONU sobre a proteção contra a violência e a discriminação em razão da orientação sexual e da identidade de género;
11. Relembra às autoridades russas e chechenas que os sistemas de valores regionais, culturais e religiosos não devem ser utilizados como pretexto para tolerar ou exercer discriminação, violência, tortura, e/ou detenção de indivíduos ou grupos, incluindo devido à orientação sexual ou à identidade de género;
12. Assinala com preocupação, e como um retrocesso, a adoção por parte da Rússia de nova legislação em matéria de violência doméstica, incluindo contra as crianças; destaca que legislação que tolera a violência no seio familiar é suscetível de ter consequências graves, tanto para as vítimas como para a sociedade no seu conjunto; insta a Comissão e o SEAE a continuar a promover a erradicação de todas as formas de violência com base no género, nomeadamente a violência doméstica, a proteger as pessoas vulneráveis e a apoiar as vítimas, tanto dentro como fora da Europa;
13. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução à Vice-Presidente da Comissão Europeia/Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, ao Conselho e à Comissão, ao Secretário-Geral do Conselho da Europa, ao Alto-Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, ao Governo e ao Parlamento da Federação da Rússia, e às autoridades chechenas.