Resolução do Parlamento Europeu, de 14 de junho de 2017, sobre a situação na República Democrática do Congo (2017/2703(RSP))
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta as suas resoluções anteriores sobre a República Democrática do Congo (RDC), em particular as de 23 de junho de 2016(1), 1 de dezembro de 2016(2) e 2 de fevereiro de 2017(3),
– Tendo em conta as declarações da Vice-Presidente da Comissão/Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, Federica Mogherini, e do seu porta-voz sobre a situação na RDC,
– Tendo em conta as declarações da Delegação da UE à RDC sobre a situação dos direitos humanos no país,
– Tendo em conta o acordo político alcançado na RDC, em 31 de dezembro de 2016,
– Tendo em conta a Resolução da Assembleia Parlamentar Paritária ACP-UE, de 15 de junho de 2016, sobre a situação pré-eleitoral e em matéria de segurança na RDC,
– Tendo em conta as conclusões do Conselho, de 17 de outubro de 2016 e de 6 de março de 2017, sobre a RDC,
– Tendo em conta o relatório do Secretário-Geral das Nações Unidas, de 10 de março de 2017, sobre a Missão de Estabilização das Nações Unidas na RDC,
– Tendo em conta as resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre a RDC, nomeadamente a Resolução 2293 (2016), sobre a renovação do regime de sanções contra a RDC e do mandato do Grupo de Peritos, e a Resolução 2348 (2017), sobre a renovação do mandato da Missão de Estabilização das Nações Unidas na RDC (MONUSCO),
– Tendo em conta a declaração conjunta, de 16 de fevereiro de 2017, da União Africana, das Nações Unidas, da União Europeia e da Organização Internacional da Francofonia sobre a RDC,
– Tendo em conta o Acordo de Parceria de Cotonu revisto,
– Tendo em conta a Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos, de junho de 1981,
– Tendo em conta a Carta Africana sobre a Democracia, as Eleições e a Governação,
– Tendo em conta a Constituição da RDC, adotada em 18 de fevereiro de 2006,
– Tendo em conta o artigo 123.º, n.ºs 2 e 4, do seu Regimento,
A. Considerando que a RDC tem sido afetada por ciclos contínuos de conflito e brutal repressão política; que a crise humanitária e de segurança na RDC se deteriorou ainda mais em consequência da crise política causada pela não observância, pelo President Joseph Kabila, do limite de dois mandatos fixado na Constituição;
B. Considerando que o conflito ocorre no contexto da crise política na RDC; que o acordo alcançado em 31 de dezembro de 2016, sob os auspícios da Conferência dos Bispos Católicos do Congo (CENCO), visa uma transição política conducente à realização de eleições presidenciais livres e justas até finais de 2017, sem alterar a constituição; que, até à data, não se registaram quaisquer progressos na aplicação do acordo;
C. Considerando que, em agosto de 2016, eclodiram confrontos armados entre o exército congolês e as milícias locais na província do Kasai Central, confrontos esses que se propagaram às províncias limítrofes do Kasai Oriental, Lomami e Sankuru, causando uma crise humanitária e a deslocação interna de mais de um milhão de civis; que os relatórios das Nações Unidas documentaram violações em massa dos direitos humanos, nomeadamente o massacre de mais de 500 civis e a existência de 40 valas comuns; que, segundo as Nações Unidas, cerca de 400 000 crianças se encontram em risco de fome; que 165 organizações congolesas da sociedade civil e defensores dos direitos humanos apelaram à realização de uma investigação internacional independente às violações em massa dos direitos humanos nas províncias do Kasai e Lomami, realçando que tanto as forças governamentais como as milícias estão envolvidas nesses crimes;
D. Considerando que, em março de 2017, dois peritos das Nações Unidas, bem como membros do pessoal de apoio, foram raptados e assassinados na província do Kasai;
E. Considerando que o Gabinete das Nações Unidas de Coordenação dos Assuntos Humanitários (OCHA) lançou um apelo, em abril de 2017, no sentido de conseguir 64,5 milhões de dólares para ajuda humanitária de emergência na região do Kasai;
F. Considerando que as organizações de direitos humanos transmitem constantemente informações sobre a degradação da situação no país em matéria de direitos humanos e de liberdade de expressão, de reunião e de manifestação, do aumento dos julgamentos por motivos políticos e do uso excessivo da força contra manifestantes pacíficos, jornalistas e opositores políticos, perpetrados, em especial, pelo exército e pelas milícias; que as mulheres e as crianças são as primeiras vítimas do conflito e que a violência sexual e baseada no género, frequentemente utilizada como tática bélica, é generalizada;
G. Considerando que, no âmbito do seu mandato, renovado por mais um ano em abril de 2017, a MONUSCO deve contribuir para a proteção das populações civis num momento caraterizado pela escalada de violência, assim como apoiar a aplicação do acordo político de 31 de dezembro de 2016, e que a mobilização do contingente da MONUSCO deve também efetuar-se tendo em conta as novas prioridades humanitárias e em matéria de segurança;
H. Considerando que a UE adotou, em 12 de dezembro de 2016, medidas restritivas contra sete pessoas em resposta à obstrução do processo eleitoral e a violações dos direitos humanos e, em 29 de maio de 2017, contra mais nove pessoas que ocupam cargos de responsabilidade na administração pública e na cadeia de comando das forças de segurança da RDC;
1. Continua profundamente preocupado com o agravamento da situação política, humanitária e de segurança na RDC; condena veementemente todas as violações dos direitos humanos, nomeadamente os atos de violência cometidos por todos os autores, os raptos, os homicídios, a tortura, a violência sexual, bem como as prisões arbitrárias e as detenções ilegais;
2. Exorta à criação de uma comissão de inquérito independente e abrangente, incluindo peritos das Nações Unidas, para investigar a violência na região do Kasai e assegurar que os autores dos massacres sejam responsabilizados pelas suas ações; insta os Estados-Membros a prestarem apoio político e financeiro à comissão de inquérito;
3. Recorda que o Governo da RDC é o principal responsável pela proteção da população civil, quer no seu território, quer no território sob a sua jurisdição, incluindo a proteção contra crimes contra a humanidade e crimes de guerra;
4. Lamenta profundamente os atrasos verificados na organização das próximas eleições presidenciais e legislativas na RDC, circunstância esta que constitui uma grave violação da Constituição congolesa; lamenta ainda a falta de progressos na aplicação do acordo político de 31 de dezembro de 2016 sobre as disposições transitórias; recorda o compromisso assumido pelo governo da RDC relativamente à realização de eleições transparentes, livres e justas antes do final de 2017, assegurando a proteção das liberdades e dos direitos políticos e a conformidade com o acordo político, conducentes à transferência pacífica do poder; reitera a importância da publicação de um calendário eleitoral pormenorizado, congratulando-se simultaneamente com o processo de recenseamento eleitoral; apela à rápida implementação dos compromissos previstos no acordo, em especial a alteração e adoção da legislação necessária pelo Parlamento congolês antes do final da legislatura; solicita que a lei eleitoral seja alterada de forma a garantir a representação das mulheres com as medidas adequadas;
5. Realça que a Comissão Eleitoral Nacional Independente tem a responsabilidade de desempenhar o papel de instituição imparcial e inclusiva na organização de um processo eleitoral credível e democrático; solicita a criação imediata de um conselho nacional para o acompanhamento do acordo e do processo eleitoral, em consonância com o acordo político de 2016;
6. Recorda o dever que o governo tem de respeitar, proteger e promover as liberdades fundamentais enquanto base da democracia; exorta as autoridades congolesas a restabelecerem um ambiente favorável ao exercício livre e pacífico da liberdade de expressão, associação e reunião e da liberdade dos meios de comunicação social; exige a libertação imediata de todas as pessoas detidas ilegalmente, incluindo membros da oposição, jornalistas e representantes da sociedade civil; insta todos os intervenientes políticos a prosseguirem o diálogo político;
7. Condena todas as violações do direito humanitário internacional cometidas pelas autoridades e pelos serviços de segurança nacionais; manifesta-se também preocupado com os relatos de graves violações dos direitos humanos pelas milícias locais, designadamente o recrutamento e a utilização ilegal de crianças-soldados, que podem constituir crimes de guerra ao abrigo do Direito internacional; considera que a erradicação do fenómeno das crianças-soldado deve constituir uma prioridade para as autoridades e a comunidade internacional;
8. Reitera a sua profunda preocupação perante a alarmante situação humanitária na RDC, que abrange deslocações, insegurança alimentar, epidemias e catástrofes naturais; insta a UE e os seus Estados-Membros a aumentarem a ajuda financeira e humanitária através de organizações fiáveis, para responder às necessidades urgentes da população, sobretudo na província do Kasai; condena veementemente todos os atentados contra as instalações e o pessoal humanitário e insiste no facto de as autoridades congolesas deverem assegurar a entrega correta e em tempo útil das ajudas à população pelas organizações humanitárias;
9. Saúda a renovação do mandato da MONUSCO e o trabalho realizado pelo Representante Especial do Secretário-Geral das Nações Unidas para a RDC no sentido de proteger a população civil e defender os direitos humanos no contexto eleitoral; salienta que o mandato original e atual, que se aplica a todas as tropas da ONU no país, é «neutralizar os grupos armados»; insta a que a totalidade das forças da MONUSCO intervenham no sentido de proteger a população contra os grupos armados, proteger as mulheres contra as violações e outras formas de violência sexual, e não tolerar quaisquer restrições baseadas no controlo nacional;
10. Observa, com preocupação, o risco de desestabilização regional; reitera o seu apoio às Nações Unidas, à Organização Internacional da Francofonia e à União Africana no respeitante à facilitação do diálogo político; Exorta à intensificação do empenhamento na região dos Grandes Lagos, de molde a evitar uma maior desestabilização;
11. Recorda a importância de responsabilizar os autores de violações dos direitos humanos e de outras ações que comprometam uma solução pacífica e consensual na RDC; apoia o recurso a sanções específicas da UE contra os responsáveis por violações graves dos direitos humanos; solicita o aprofundamento das investigações sobre as pessoas responsáveis e o alargamento das sanções, ao mais alto nível do governo, na sequência da violência e dos crimes cometidos na RDC, bem como da pilhagem dos seus recursos naturais, em conformidade com as investigações realizadas pelo Grupo de Peritos das Nações Unidas; realça que as sanções devem abranger o congelamento de bens e a proibição de entrar na UE;
12. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão, à Vice-Presidente da Comissão/Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, à União Africana, ao Parlamento Pan-Africano, ao Conselho de Ministros e à Assembleia Parlamentar Paritária ACP-UE, ao Secretário-Geral das Nações Unidas, bem como ao Presidente, ao Primeiro-Ministro e ao Parlamento da República Democrática do Congo.