Resolução do Parlamento Europeu, de 24 de outubro de 2017, sobre o documento de reflexão sobre o futuro das finanças da UE (2017/2742(RSP))
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta os artigos 311.º, 312.º e 323.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE),
– Tendo em conta o Regulamento (UE, Euratom) n.º 1311/2013 do Conselho, de 2 de dezembro de 2013, que estabelece o quadro financeiro plurianual para o período 2014-2020(1), nomeadamente o artigo 2.º,
– Tendo em conta o Acordo Interinstitucional de 2 de dezembro de 2013 entre o Parlamento Europeu, o Conselho e a Comissão sobre a disciplina orçamental, a cooperação em matéria orçamental e a boa gestão financeira(2),
– Tendo em conta a sua resolução, de 6 de julho de 2016, sobre a preparação da revisão pós-eleitoral do QFP para 2014-2020: contributo do Parlamento anterior à proposta da Comissão(3),
– Tendo em conta o documento de reflexão da Comissão, de 28 de junho de 2017, sobre o futuro das finanças da UE,
– Tendo em conta a declaração da Comissão, de 4 de julho de 2017, sobre o documento de reflexão sobre o futuro das finanças da UE,
– Tendo em conta a sua resolução, de 16 de fevereiro de 2017, sobre a capacidade orçamental da área do euro(4),
– Tendo em conta a proposta de resolução da Comissão dos Orçamentos,
– Tendo em conta o artigo 123.º, n.º 2, do seu Regimento,
1. Está convicto de que um debate sobre o financiamento futuro da União Europeia não pode ocorrer sem ter em conta os ensinamentos extraídos dos quadros financeiros plurianuais precedentes e, em particular, do QFP 2014-2020; chama a atenção para as graves deficiências do QFP em vigor, que foi levado até ao limite para proporcionar os recursos necessários para a União enfrentar uma série de crises graves e novos desafios, e financiar as suas novas prioridades políticas; salienta a sua convicção de que o baixo nível do QFP em vigor se revelou insuficiente para responder às necessidades reais e às ambições políticas da União;
2. Congratula-se com a apresentação pela Comissão do seu documento de reflexão sobre o futuro das finanças da UE; observa que a Comissão traduz em termos orçamentais os cinco cenários para o modelo futuro da União Europeia, apresentados no seu Livro Branco, de março de 2017, sobre o futuro da Europa, examinando, simultaneamente, um certo número de características básicas e princípios do orçamento da UE; concorda com a metodologia proposta e manifesta uma posição favorável em relação à declaração da Comissão de que o futuro QFP deve assentar numa visão clara das prioridades da Europa; crê que o documento de reflexão define uma estrutura clara de discussão e abre o tão necessário debate político sobre a orientação, a finalidade e o nível do orçamento da UE, em função dos objetivos fundamentais e desafios futuros da União; exorta os Estados-Membros a consultarem os cidadãos e a terem um papel ativo e construtivo, ao definirem a sua visão para o futuro do orçamento da UE;
3. Lamenta, no entanto, que quatro dos cinco cenários apresentados («Manter o rumo», «Fazer menos em conjunto», «Quem quiser faz mais» e «Reconfiguração radical») signifiquem um recuo efetivo das ambições da União e prevejam uma redução de duas políticas de longa data da UE e que são pedras angulares do projeto europeu, consagradas nos Tratados, a política agrícola comum e a política de coesão; salienta a sua posição de longa data segundo a qual as prioridades políticas adicionais deverão ser conjugadas com meios financeiros adicionais e não financiadas em detrimento das políticas existentes da UE; considera que o quinto cenário («Fazer muito mais em conjunto») é um ponto de partida positivo e construtivo para o debate em curso sobre o futuro das finanças da UE e, consequentemente, o modelo futuro da União Europeia; encoraja a Comissão a desenvolver um cenário que tenha em conta as recomendações do Parlamento, a fim de responder aos desafios atuais e futuros e definir um novo conjunto de prioridades;
4. Recorda que, nos termos do artigo 311.º TFUE, a União deve dotar-se dos meios necessários para atingir os seus objetivos; considera que as insuficiências do atual QFP e a escala das novas prioridades, assim como o impacto da retirada do Reino Unido apontam para a mesma conclusão: a necessidade de romper o teto das despesas de 1 % do Rendimento Nacional Bruto da UE (RNB) e, por conseguinte, aumentar significativamente o orçamento da União, a fim de responder aos desafios que se apresentam; opõe-se, neste contexto, a qualquer diminuição nominal do volume do orçamento da UE no próximo QFP, e considera, por conseguinte, que o próximo QFP deve ser fixado ao nível de, pelo menos, 1,23 % do RNB da UE; preconiza um debate entre os Estados-Membros sobre esta questão;
5. Lamenta que o orçamento da UE seja predominantemente financiado a partir de contribuições nacionais baseadas no RNB em vez de verdadeiros recursos próprios, como previsto nos Tratados da UE; reitera o seu empenhamento numa verdadeira reforma do sistema de recursos próprios da UE, com a simplicidade, equidade e transparência como princípios orientadores, e de acordo com as recomendações do Grupo de Alto Nível sobre os Recursos Próprios; salienta que um tal sistema deverá incluir um cabaz equilibrado de novos recursos próprios da UE concebidos para apoiar os objetivos políticos da UE, que deverão ser introduzidos progressivamente, para que as finanças da UE sejam mais justas e mais estáveis; salienta, além disso, que a retirada do Reino Unido da União constitui uma oportunidade para pôr termo a todas as correções; espera que a Comissão apresente propostas legislativas ambiciosas neste sentido e salienta que tanto o lado da despesa como o lado da receita do próximo QFP serão tratados como um pacote único nas futuras negociações;
6. Está convicto de que, a menos que o Conselho aceite um aumento significativo do nível das suas contribuições nacionais para o orçamento da UE, a introdução de novos recursos próprios da UE é a única opção para financiar adequadamente o próximo QFP a um nível correspondente às necessidades reais e às ambições políticas da União; espera, por conseguinte, que o Conselho tome uma posição política sobre esta matéria, considerando que um bloqueio de facto de qualquer reforma do sistema de recursos próprios da UE já não é concebível; recorda, a este respeito, que o relatório do Grupo de Alto Nível sobre os Recursos Próprios foi adotado unanimemente por todos os seus membros, incluindo os membros nomeados pelo Conselho;
7. Congratula-se com a intenção da Comissão de conceber o futuro orçamento da UE com base nos princípios de valor acrescentado da UE, ênfase no desempenho, obrigação de prestar contas, maior flexibilidade dentro de um quadro estável e regras simplificadas, como indicado no documento de reflexão;
8. Salienta, neste contexto, a importância de uma avaliação aprofundada da eficiência e eficácia das atuais políticas, programas e instrumentos da UE; aguarda com expectativa, a este respeito, os resultados do processo em curso de reapreciação da despesa e espera que estes sejam tidos em conta na elaboração do QFP pós-2020; sublinha, em particular, a necessidade de garantir a taxa de êxito de programas da UE cuja procura excede largamente a oferta, por um lado, e determinar os motivos de subexecução, por outro; considera que é importante obter sinergias entre o orçamento da UE e os orçamentos nacionais, e prever os meios para assegurar o acompanhamento do nível e do desempenho da despesa a nível nacional e da UE;
9. Reconhece que a procura de valor acrescentado europeu é uma questão fundamental a abordar e concorda que o orçamento da União deverá ser, nomeadamente, um instrumento para a consecução dos objetivos do Tratado e a provisão de bens públicos europeus; salienta, porém, a natureza multifacetada do conceito de valor acrescentado europeu e as suas múltiplas interpretações e alerta contra qualquer tentativa de utilizar a sua definição para pôr em causa a pertinência de políticas e programas da UE por motivos puramente quantitativos ou económicos de curto prazo; considera que existe um claro valor acrescentado, quando uma ação a nível europeu:
–
vai além do que seria possível com uma mobilização de esforços a nível nacional, regional ou local (efeito induzido);
–
incentiva ações a nível nacional, regional e local, para o cumprimento de objetivos dos Tratados da UE, que, de outro modo, não seriam concretizadas;
–
apoia ações que só podem ser financiadas mediante a congregação de recursos a nível da UE, devido à magnitude muito elevada das suas necessidades de financiamento; ou
–
contribui para o estabelecimento e o apoio à paz e estabilidade na e para além da vizinhança da UE;
incentiva a Comissão a continuar a desenvolver o conceito de valor acrescentado europeu, tendo em conta, ao mesmo tempo, as especificidades territoriais; insta a Comissão a propor os indicadores de desempenho adequados para este efeito;
10. Considera que a estrutura do próximo QFP deve tornar o orçamento da UE mais legível e compreensível para os cidadãos da UE e permitir uma apresentação mais clara de todos os domínios de despesa da UE; recorda, simultaneamente, a necessidade de facilitar tanto a continuidade de planeamento como a flexibilidade no interior das rubricas; considera que a estrutura global do QFP deverá refletir o debate político sobre os principais pilares e a orientação da despesa da UE, incluindo o desenvolvimento, crescimento e inovação sustentáveis, as alterações climáticas, a solidariedade, a segurança e a defesa; está, por conseguinte, convencido da necessidade de um ajustamento das atuais rubricas do QFP;
11. Considera que o orçamento da UE deverá ser transparente e democrático; recorda o seu firme empenhamento no conceito de unidade do orçamento da UE e duvida da necessidade e valor acrescentado da criação de instrumentos adicionais fora do âmbito do QFP; reitera a sua posição de longa data de que o Fundo Europeu de Desenvolvimento, juntamente com outros instrumentos que estão fora do QFP, deverá ser integrado no orçamento da União; salienta que esta integração deverá implicar o acréscimo dos respetivos envelopes financeiros destes instrumentos aos atuais limites máximos do QFP, a fim de não pôr em risco o financiamento de outras políticas e programas da UE;
12. Salienta que, após esgotar todas as margens disponíveis, a autoridade orçamental aprovou a mobilização substancial das disposições em matéria de flexibilidade e dos instrumentos especiais incluídos no Regulamento QFP, a fim de garantir as dotações suplementares necessárias para responder a crises ou financiar novas prioridades políticas durante o atual QFP; sublinha que, durante a revisão intercalar do QFP, foram eliminados vários obstáculos aos mecanismos de flexibilidade do QFP, a fim de permitir uma maior flexibilidade no âmbito do quadro financeiro em vigor;
13. Sublinha, neste contexto, que o próximo QFP deverá proporcionar diretamente o nível de flexibilidade adequado que permita à União reagir a circunstâncias imprevistas e financiar a evolução das suas prioridades políticas; considera, por conseguinte, que as disposições em matéria de flexibilidade do QFP deverão permitir a transição de todas as margens não utilizadas, assim como das autorizações anuladas, sem quaisquer restrições, para exercícios futuros e a sua mobilização pela autoridade orçamental, para qualquer fim considerado necessário, no âmbito do processo orçamental anual; apela, além disso, a um reforço significativo dos instrumentos especiais do QFP, que deverão ser contabilizados para além dos limites máximos do QFP tanto em autorizações como em pagamentos, bem como à criação de uma reserva de crise separada, que permita uma mobilização imediata de recursos em caso de emergência;
14. Preconiza uma simplificação real e palpável das regras de execução para os beneficiários e uma redução da carga administrativa; incentiva, neste contexto, a Comissão a identificar e eliminar as sobreposições entre instrumentos facultados pelo orçamento da UE que visam objetivos semelhantes e apoiam tipos de ações semelhantes; é, no entanto, de opinião que esta simplificação não deverá resultar numa substituição de subvenções por instrumentos financeiros e não pode levar a uma sectorização dos programas e políticas da UE mas garantir uma abordagem transversal com a complementaridade no seu centro; exorta a uma vasta harmonização de regras, com o objetivo de criar um conjunto único de regras para todos os instrumentos da UE;
15. Reconhece o potencial dos instrumentos financeiros como modalidade de financiamento complementar aos subsídios e subvenções; sublinha, no entanto, que os instrumentos financeiros não são adequados para todos os tipos de ações e domínios de intervenção, uma vez que nem todas as políticas são inteiramente orientadas em função do mercado; insta a Comissão a simplificar as regras aplicáveis à utilização de instrumentos financeiros e incentivar a possibilidade de uma combinação de vários recursos da UE ao abrigo de regras harmonizadas, criando sinergias e evitando todo o tipo de concorrência entre as diferentes modalidades de financiamento; manifesta a sua preocupação com a opção que consiste num fundo único que integraria os instrumentos financeiros a nível da UE e facultaria empréstimos, garantias e instrumentos de partilha de riscos no âmbito de vertentes para as diversas políticas, como apresentado no documento de reflexão neste contexto, e analisará cuidadosamente esta proposta;
16. Reitera a sua posição de que a duração do QFP deverá ser alinhada pelo ciclo político do Parlamento e da Comissão e assegurar uma programação a longo prazo; salienta, neste contexto, que a duração do QFP deverá ter plenamente em conta a necessidade de uma previsibilidade a longo prazo no âmbito da execução dos programas em regime de gestão partilhada dos Fundos Europeus Estruturais e de Investimento (FEEI), que não podem funcionar sem a estabilidade de um compromisso pelo menos a sete anos; propõe, por conseguinte, que o próximo QFP seja acordado para um período de 5+5 anos, com uma revisão intercalar obrigatória;
17. Toma nota do anúncio feito pelo Presidente da Comissão, no seu discurso sobre o estado da União, de uma futura proposta relativa a uma rubrica orçamental específica da área do euro; insta a Comissão a facultar informações adicionais e mais pormenorizadas a este respeito; recorda que a resolução do Parlamento de 16 de fevereiro de 2017 preconiza uma capacidade orçamental específica para a área do euro, que deverá fazer parte do orçamento da UE, acima dos limites máximos atuais do QFP e ser financiada pela área do euro e por outros membros participantes através de uma fonte de receitas que, por seu turno, deverá ser acordada entre os Estados-Membros participantes e considerada como receita afetada e com garantias;
18. Espera que a Comissão apresente as suas propostas quer sobre o futuro QFP quer sobre os recursos próprios até maio de 2018; declara a sua intenção de apresentar oportunamente a sua posição sobre todos os aspetos conexos e espera que os pontos de vista do Parlamento sejam plenamente integrados nas futuras propostas da Comissão;
19. Manifesta a sua disponibilidade para encetar um diálogo estruturado com a Comissão e o Conselho, com vista à conclusão de um acordo final sobre o próximo QFP antes do termo da presente legislatura; está convicto de que uma rápida adoção do regulamento QFP permitirá a adoção subsequente de todos os atos legislativos setoriais em tempo útil, para que os novos programas estejam operacionais no início do próximo período; salienta os efeitos negativos do lançamento tardio dos programas no âmbito do QFP em vigor; insta o Conselho Europeu, neste contexto, a utilizar a cláusula-ponte do artigo 312.º, n.º 2, do TFUE, que permite uma votação por maioria qualificada do QFP no Conselho;
20. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão, às demais instituições e organismos interessados, e aos governos e parlamentos dos Estados-Membros.