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Processo : 2017/2936(RSP)
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Ciclo relativo ao documento : B8-0068/2018

Textos apresentados :

B8-0068/2018

Debates :

PV 06/02/2018 - 11
CRE 06/02/2018 - 11

Votação :

PV 07/02/2018 - 7.7
CRE 07/02/2018 - 7.7
Declarações de voto

Textos aprovados :

P8_TA(2018)0033

Textos aprovados
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Quarta-feira, 7 de Fevereiro de 2018 - Estrasburgo
Tolerância zero em relação à mutilação genital feminina
P8_TA(2018)0033B8-0068/2018

Resolução do Parlamento Europeu, de 7 de fevereiro de 2018, sobre a tolerância zero em relação à mutilação genital feminina (2017/2936(RSP))

O Parlamento Europeu,

–  Tendo em conta o os artigos 8.º e 9.º, da Diretiva «Direitos das Vítimas» (2012/29/UE), de 25 de outubro de 2012(1), sobre a prestação obrigatória de serviços de apoio a vítimas de violência, incluindo as vítimas de mutilação genital feminina,

–  Tendo em conta os artigos 11.º e 21.º da Diretiva «Condições de Acolhimento», (2013/33/UE), de 26 de junho de 2013(2), que inclui especificamente as vítimas da mutilação genital feminina no grupo de pessoas vulneráveis que devem receber cuidados de saúde adequados durante o processo de concessão de asilo,

–  Tendo em conta o artigo 20.º, da Diretiva «Condições de elegibilidade» (2011/95/UE), de 13 de dezembro de 2011(3), no qual a mutilação genital feminina enquanto forma grave de violência psicológica, física ou sexual é incluída como critério a ter em consideração para a concessão de proteção internacional,

–  Tendo em conta a sua resolução, de 6 de fevereiro de 2014, sobre a Comunicação da Comissão sobre a eliminação da mutilação genital feminina(4),

–  Tendo em conta a sua resolução, de 14 de junho de 2012, sobre a eliminação da mutilação genital feminina(5), na qual apelou ao fim da mutilação genital feminina em todo o mundo através de medidas de prevenção e proteção e de medidas legislativas,

–  Tendo em conta o Relatório Anual da UE sobre os Direitos Humanos e a Democracia no Mundo,

–  Tendo em conta as conclusões do Conselho, de junho de 2014, subordinadas ao tema «Prevenção e combate a todas as formas de violência contra as mulheres e as raparigas, incluindo a mutilação genital feminina»,

–  Tendo em conta as conclusões do Conselho, de março de 2010, sobre a erradicação da violência contra as mulheres na UE,

–  Tendo em conta a Comunicação da Comissão, de 25 de novembro de 2013, sobre a eliminação da mutilação genital feminina (COM(2013)0833),

–  Tendo em conta a declaração conjunta, de 6 de fevereiro de 2013, sobre o Dia Internacional da Tolerância Zero contra a Mutilação Genital Feminina, na qual a Vice-Presidente da Comissão / Alta Representante e cinco comissários confirmaram o empenho da UE em combater a mutilação genital feminina nas suas relações externas,

–  Tendo em conta o Plano de Ação da UE para os Direitos Humanos e a Democracia 2015-2019, em particular o objetivo 14, alínea b),

–  Tendo em conta a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, em particular a meta 5.3 sobre a erradicação de todas as práticas perniciosas, tais como o casamento infantil, precoce e forçado e a mutilação genital feminina,

–  Tendo em conta Plano de Ação sobre o Género para 2016-2020,

–  Tendo em conta o relatório de 2013 do Instituto Europeu para a Igualdade de Género sobre «Mutilação genital feminina na União Europeia e na Croácia»,

–  Tendo em conta a Convenção do Conselho da Europa, de 2014, para a Prevenção e o Combate à Violência Contra as Mulheres e a Violência Doméstica (Convenção de Istambul),

–  Tendo em conta a sua resolução, de 12 de setembro de 2017(6), sobre a adesão da UE à Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência Contra as Mulheres e a Violência Doméstica,

–  Tendo em conta a Declaração do Comité de Ministros do Conselho da Europa, de setembro de 2017, sobre a necessidade de intensificar os esforços no sentido de prevenir e combater a mutilação genital feminina e o casamento forçado na Europa,

–  Tendo em conta a Resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 20 de dezembro de 2012, sobre a intensificação dos esforços da comunidade mundial para eliminar as mutilações genitais femininas (A/RES/67/146),

–  Tendo em conta o Acordo de Cotonu,

–  Tendo em conta a iniciativa «Spotlight», de 2017, da União Europeia e das Nações Unidas sobre a eliminação da violência contra as mulheres e as raparigas,

–  Tendo em conta a pergunta à Comissão sobre a tolerância zero da mutilação genital feminina (O-000003/2018 – B8-0005/2018),

–  Tendo em conta a proposta de resolução da Comissão dos Direitos da Mulher e da Igualdade dos Géneros,

–  Tendo em conta o artigo 128.º, n.º 5, e o artigo 123.º, n.º 2, do seu Regimento,

A.  Considerando que na Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável se apela explicitamente à eliminação da mutilação genital feminina, juntamente com outras práticas nocivas, no quadro do Objetivo 5 «Alcançar a igualdade de género e conferir autonomia a todas as mulheres e raparigas»;

B.  Considerando que a mutilação genital feminina é uma prática objeto de atenção especial no âmbito do Objetivo 14 «Promover a igualdade de género, os direitos das mulheres, o empoderamento e a participação das mulheres e das raparigas» do Plano de Ação da UE para os Direitos Humanos e a Democracia 2015-2019;

C.  Considerando que o Plano de Ação sobre o Género para 2016-2020 ao abrigo da Prioridade Temática B: «Segurança física e psicológica» inclui como indicador a percentagem de raparigas e mulheres com idades entre 15 e 49 anos que foram submetidas a mutilação genital feminina;

D.  Considerando que, enquanto prática nociva de natureza transnacional, a mutilação genital feminina passou a ser reconhecida como um problema global que a Agenda 2030 sobre os objetivos de desenvolvimento sustentável das Nações Unidas identifica como prática nociva que deverá ser eliminada até 2030;

E.  Considerando que o relatório estatístico de 2016 da UNICEF refere que, pelo menos, 200 milhões de raparigas e mulheres foram submetidas a mutilação genital feminina a nível mundial, embora a ordem de grandeza exata seja desconhecida;

F.  Considerando que a mutilação genital feminina – ainda tradicionalmente praticada em determinadas regiões do continente africano, mas também em algumas regiões do Médio Oriente, da Ásia e da Oceânia – constitui igualmente um problema na União Europeia, com consequências graves para as mulheres e as raparigas afetadas;

G.  Considerando que se registaram progressos ao longo das últimas três décadas, embora de forma desigual, com uma diminuição das taxas de prevalência na ordem dos 30 %; que estes progressos foram, porém, ultrapassados pelo crescimento demográfico, o que significa que um maior número de raparigas e mulheres serão submetidas ao procedimento;

H.  Considerando que as comunidades locais representam frequentemente os principais e únicos elementos de condicionamento da decisão dos pais de submeterem as crianças do sexo feminino à prática de excisão ou da decisão das mulheres de se submeterem a mutilação genital feminina;

I.  Considerando que, apesar de não existir uma obrigação religiosa subjacente à mutilação genital feminina, uma forte presença da religião em muitas comunidades que a praticam torna necessário que os líderes religiosos e outros líderes se empenhem contra a mutilação genital feminina;

J.  Considerando que, a fim de gizar uma estratégia de erradicação adequada, esta prática deve ser sempre perspetivada à luz do contexto local;

K.  Considerando que a mutilação genital feminina é frequentemente indissociável de outras questões relativas à desigualdade de género e é considerada apenas como uma entre as muitas violações dos direitos das mulheres, tais como: a falta de acesso das raparigas à educação, incluindo a uma educação sexual abrangente; a falta de trabalho ou de emprego para as mulheres; a impossibilidade de possuírem ou herdarem bens; o casamento infantil precoce ou forçado; a violência física e sexual; e a falta de qualidade dos cuidados de saúde, incluindo serviços de saúde e direitos sexuais e reprodutivos;

L.  Considerando que a mutilação genital feminina, a exemplo de outras formas de violência de género, assenta na premissa do controlo sobre o corpo da mulher e viola o direito que assiste às mulheres à integridade física, segurança e saúde e, em alguns casos, o próprio direito à vida;

M.  Considerando que, embora a prevenção represente uma medida mais adequada para efeitos de eliminação da mutilação genital feminina do que a repressão penal, uma vez que os infratores, os cúmplices e os instigadores são frequentemente os pais da vítima, há uma necessidade clara de eliminar igualmente os obstáculos à repressão penal dos casos de mutilação genital feminina, tendo em conta o superior interesse da criança;

1.  Regista uma quebra nas taxas de prevalência da mutilação genital feminina em resultado de medidas e de campanhas de sensibilização decisivas, e incentiva todos os intervenientes a prosseguirem os seus esforços a fim de preservar esta dinâmica nos países em que a mutilação genital feminina é endémica;

2.  Considera que esta dinâmica constitui uma oportunidade para as organizações internacionais e os Estados redobrarem os seus esforços, nomeadamente através da criação de ligações e elos entre diferentes regiões, intervenientes e setores, a fim de trabalhar em conjunto para lograr a eliminação desta e de outras práticas prejudiciais para as raparigas, que podem continuar a sofrer as consequências físicas, psicológicas e emocionais ao longo de toda a sua vida;

3.  Reconhece a ação inestimável desenvolvida pelas organizações que trabalham com as comunidades no terreno, tanto na UE como fora dela, no domínio da prevenção, da sensibilização e do patrocínio, e entende que é necessário criar pontes entre elas, caso se queira pôr termo definitivo à mutilação genital feminina;

4.  Exorta a Comissão e os Estados-Membros a integrarem a prevenção da mutilação genital feminina em todos os setores, especialmente no domínio da saúde, incluindo a saúde sexual e reprodutiva, o trabalho social, o asilo, a educação, incluindo a educação sexual, a aplicação da lei, a justiça, a proteção das crianças e os meios de comunicação;

5.  Sublinha que, em conformidade com o artigo 38.º da Convenção de Istambul, os Estados-Membros têm a obrigação de tipificar como crime a mutilação genital feminina, bem como o ato de incitar ou forçar uma rapariga a submeter-se a esse procedimento, e que a Convenção protege não apenas as raparigas e as mulheres em risco de serem sujeitas a mutilação genital feminina, mas também as raparigas e as mulheres que arcam com as consequências desta prática ao longo da vida (em caso de reinfibulação, ou em situações relacionadas com asilo, acesso a cuidados de saúde, etc.); salienta que a Convenção de Istambul estabelece que a cultura, os costumes, a religião, a tradição ou a pretensa «honra» não podem ser considerados como justificação para quaisquer atos de violência contra as mulheres;

6.  Exorta a UE e os Estados-Membros que ainda não tenham ratificado a Convenção de Istambul do Conselho da Europa relativa à prevenção e ao combate à violência contra as mulheres a fazê-lo sem demora, para que o compromisso da UE seja conforme às normas internacionais que promovem uma abordagem holística e integrada da violência contra as mulheres e da mutilação genital feminina;

7.  Constata com agrado que o direito penal em todos os Estados-Membros protege, explícita ou implicitamente, as raparigas e as mulheres contra a mutilação genital feminina, manifestando, porém, a sua viva preocupação com a sua clara ineficácia, em função do número extremamente reduzido de processos judiciais na UE;

8.  Regista com preocupação o facto de a aplicação da legislação e, em especial, o exercício da ação penal constituírem desafios para todos os Estados-Membros e para os países de origem; convida, por conseguinte, a Comissão a promover medidas específicas de formação destinada aos intervenientes pertinentes em matéria de deteção, investigação e instauração de ações penais contra a mutilação genital feminina; insta os Estados-Membros a reforçarem a vigilância no que se refere à deteção, investigação e repressão penal de casos de mutilação genital feminina;

9.  Recorda que o direito penal e a formação específica devem ser complementados com esforços destinados a sensibilizar os profissionais da justiça, a fim de dissuadir a prossecução desta prática;

10.  Reconhece que uma diferença importante entre a mutilação genital feminina e outras formas de violência com base no género consiste na inexistência de má-fé, e salienta que, embora não possa servir, de modo algum, de justificação, este facto deve ser tido em conta nas estratégias de eliminação;

11.  Lamenta a crescente medicalização em determinados países e reafirma que se trata de uma resposta inaceitável para abordar as causas profundas, tal como já estabelecido pelas Nações Unidas e pela OMS; convida os Estados-Membros a proibirem explicitamente a medicalização da mutilação genital feminina, reforçando paralelamente a sensibilização dos profissionais de saúde para esta problemática;

12.  Sublinha que a mutilação genital feminina é uma das formas mais previsíveis de violência baseada no género e convida a Comissão e os Estados-Membros a garantirem a adoção de medidas preventivas vigorosas nos campos de refugiados; solicita à Comissão que continue a incluir a prevenção da mutilação genital feminina e de outras práticas perniciosas no âmbito de processos de integração e do Fundo para o Asilo, a Migração e a Integração (FAMI) e que transmita informações pertinentes através da Agência da União Europeia para o Asilo;

13.  Solicita que, no quadro da reforma do Sistema Europeu Comum de Asilo e da revisão das diretivas relativas ao asilo e através do papel da nova Agência da União Europeia para o Asilo, sejam concedidas as mais elevadas normas de proteção a requerentes de asilo por motivos relacionados com a mutilação genital feminina;

14.  Aguarda com expectativa a criação da rede mundial que permitirá o estabelecimento de elos entre os intervenientes de todas as regiões do mundo, a fim de reunir ideias e unir forças; convida a Comissão a prestar apoio a esta importante rede;

15.  Convida a Comissão a dar resposta aos apelos da sociedade civil no sentido de o financiamento ser suficientemente flexível para permitir que as organizações de base que desenvolvem o seu trabalho na comunidade se candidatem a esses fundos, que um amplo leque de questões relacionadas com os direitos das mulheres e das raparigas possam ser abordadas em paralelo com a mutilação genital feminina no contexto de uma abordagem holística e que possam ser estabelecidos elos entre as organizações que trabalham na UE e nos países que praticam a mutilação genital feminina; saúda, neste contexto, o trabalho desenvolvido pela rede europeia «End FGM» e pelos seus membros, nomeadamente através do projeto Change Plus, na formação dos representantes das comunidades locais tendo em vista promover não apenas alterações legislativas, mas também mudanças de comportamento nas suas comunidades;

16.  Convida a Comissão e os Estados-Membros a manterem dados sobre a prevalência da mutilação genital feminina e das suas várias formas e a envolverem o meio académico no processo de recolha de dados, de investigação e de formação de futuras gerações de profissionais no domínio da mutilação genital feminina; reconhece que a Rede Europeia das Migrações pode desempenhar um papel importante; considera que uma agenda de investigação conjunta sobre a mutilação genital feminina, permitiria que as universidades de regiões nas quais esta prática é prevalecente estabelecessem ligações com universidades da UE, a fim de organizar programas de intercâmbio, de melhorar a recolha de dados e de reforçar as capacidades dos futuros profissionais em diferentes setores;

17.  Convida a Comissão Europeia e os Estados-Membros a incluírem informações de base sobre a mutilação genital feminina e outras práticas nocivas para as raparigas nos programas das disciplinas que desempenham um papel fundamental na prevenção da mutilação genital feminina;

18.  Salienta que, não obstante o seu contexto local, a mutilação genital feminina deve ser perspetivada no contexto da violência baseada no género e enquanto questão de igualdade entre homens e mulheres e deve ser abordada através de uma abordagem abrangente, a fim de evitar a estigmatização das comunidades onde é praticada;

19.  Destaca que os primeiros passos para melhorar a posição das mulheres nas comunidades que praticam a mutilação genital feminina consistem em garantir que todas as raparigas frequentem a escola e em desenvolver os pressupostos necessários à emancipação económica das mulheres;

20.  Chama a atenção para o potencial e a capacidade de várias vias de comunicação, tais como a arte, a literatura, os novos meios de comunicação locais, para fazer passar as mensagens aos cidadãos; salienta a importância de incluir os rapazes e os homens na criação de novas narrativas sobre a igualdade entre homens e mulheres e na luta contra as estruturas de poder existentes através de redes, programas entre pares, campanhas de informação e programas de formação;

21.  Convida a Comissão a prestar assistência aos Estados-Membros e aos países que praticam a mutilação genital feminina na criação de redes e de estratégias integradas para a prevenção da mutilação genital feminina, incluindo a formação de assistentes sociais, do pessoal médico, de líderes comunitários e religiosos, dos agentes da polícia e da justiça; reconhece que nenhuma religião advoga esta prática;

22.  Solicita à Comissão que inclua a questão da mutilação genital feminina e outras práticas nocivas para as mulheres e raparigas nos seus diálogos sobre direitos humanos e ações diplomáticas de sensibilização; insta o SEAE e os Estados-Membros a intensificarem a cooperação com países terceiros para os incentivar a adotarem legislação nacional que proíba a mutilação genital feminina e a apoiarem as autoridades responsáveis pela aplicação da lei a assegurar a respetiva execução;

23.  Constata, com satisfação, que as delegações e o SEAE beneficiam anualmente de medidas de formação no domínio da mutilação genital feminina no quadro de uma formação específica sobre direitos da criança ou sobre questões de género, e convida a Comissão a dar a conhecer os seus instrumentos, nomeadamente o programa «Unidos pelo fim da mutilação genital feminina» aos profissionais do setor e a torná-los acessíveis às populações-alvo;

24.  Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução à Comissão e ao Conselho da União Europeia.

(1) JO L 315 de 14.11.2012, p. 57.
(2) JO L 180 de 29.6.2013, p. 96.
(3) JO L 337 de 20.12.2011, p. 9.
(4) JO C 93 de 24.3.2017, p. 142.
(5) JO C 332 E de 15.11.2013, p. 87.
(6) Textos Aprovados, P8_TA(2017)0329.

Última actualização: 28 de Setembro de 2018Aviso legal - Política de privacidade