Resolução do Parlamento Europeu, de 3 de outubro de 2018, sobre normas internacionais de relato financeiro: IFRS 17 – Contratos de Seguro (2018/2689(RSP))
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta o Regulamento (CE) n.º 1606/2002 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de julho de 2002, relativo à aplicação das normas internacionais de contabilidade(1),
– Tendo em conta a Diretiva 2013/34/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa às demonstrações financeiras anuais, às demonstrações financeiras consolidadas e aos relatórios conexos de certas formas de empresas, que altera a Diretiva 2006/43/CE do Parlamento Europeu e do Conselho e revoga as Diretivas 78/660/CEE e 83/349/CEE do Conselho(2),
– Tendo em conta a Diretiva 91/674/CEE do Conselho, de 19 de dezembro de 1991, relativa às contas anuais e às contas consolidadas das empresas de seguros(3),
– Tendo em conta a Diretiva 2009/138/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de novembro de 2009, relativa ao acesso à atividade de seguros e resseguros e ao seu exercício (Solvência II)(4),
– Tendo em conta o Regulamento Delegado (UE) 2015/35 da Comissão, de 10 de outubro de 2014, que completa a Diretiva 2009/138/CE do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao acesso à atividade de seguros e resseguros e ao seu exercício (Solvência II)(5),
– Tendo em conta a norma internacional de relato financeiro IFRS 17 - Contratos de seguro, emitida pelo Conselho das Normas Internacionais de Contabilidade (IASB), em 18 de maio de 2017,
– Tendo em conta o relatório elaborado por Philippe Maystadt, de outubro de 2013, intitulado «Should IFRS standards be more European?»,
– Tendo em conta a sua resolução, de 7 de junho de 2016, sobre a avaliação das normas internacionais de contabilidade (IAS) e das atividades da Fundação das Normas Internacionais de Relato Financeiro (IFRS), do Grupo Consultivo para a Informação Financeira na Europa (EFRAG) e do Conselho de Supervisão do Interesse Público (PIOB)(6),
– Tendo em conta a sua resolução, de 6 de outubro de 2016, sobre normas internacionais de relato financeiro: IFRS 9(7),
– Tendo em conta o documento de consulta da Comissão, de 21 de março de 2018, intitulado «Fitness check on the EU framework for public reporting by companies»,
– Tendo em conta o pedido de parecer de adoção da Comissão ao EFRAG, de 27 de outubro de 2017, relativo à IFRS 17,
– Tendo em conta o parecer da Autoridade Bancária Europeia e a carta de observações da Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos Mercados (ESMA) sobre o documento para debate sobre os contratos de seguro do IASB,
– Tendo em conta o relatório da Comissão, de 23 de novembro de 2017, sobre as atividades da Fundação IFRS, do EFRAG e do PIOB em 2016 (COM(2017)0684),
– Tendo em conta o relatório do Comité Europeu do Risco Sistémico (ESRB), de julho de 2017, sobre as implicações da IFRS 9 para a estabilidade financeira,
– Tendo em conta o Relatório sobre a estabilidade financeira global do Fundo Monetário Internacional (FMI), de outubro de 2017, intitulado «Is Growth at Risk?»,
– Tendo em conta o comunicado de imprensa sobre a IFRS 17, publicado pelo Conselho de Estabilidade Financeira (CEF) em 17 de julho de 2017,
– Tendo em conta o Acordo de Paris sobre as alterações climáticas, aprovado em 12 de dezembro de 2015,
– Tendo em conta o relatório do CEF, de junho de 2017, intitulado «Recomendações do Grupo de Trabalho para a Divulgação de Informações sobre a Exposição Financeira às Alterações Climáticas»,
– Tendo em conta a Comunicação da Comissão, de 8 de março de 2018, intitulada «Plano de ação: Financiar um crescimento sustentável» (COM(2018)0097),
– Tendo em conta o relatório final do Grupo de Peritos de Alto Nível sobre Finanças Sustentáveis, de 31 de janeiro de 2018, intitulado «Financing a Sustainable European Economy»,
– Tendo em conta os documentos de informação sobre a IFRS 17, do EFRAG, sobre a publicação da margem de serviço contratual, as disposições transitórias e o nível de requisitos de agregação,
– Tendo em conta a troca de pontos de vista sobre a IFRS 17 entre o presidente da IASB, Hans Hoogervorst, o presidente do conselho de administração da Fundação IFRS, Michel Prada, e o presidente do conselho de administração do EFRAG, Jean-Paul Gauzès,
– Tendo em conta o estudo, de janeiro de 2016, preparado para a Comissão dos Assuntos Económicos e Monetários, intitulado «Changes to Accounting and Solvency Rules: The (possible) Impact on Insurance and Pensions»(8),
– Tendo em conta a proposta de resolução da Comissão dos Assuntos Económicos e Monetários,
– Tendo em conta o artigo 123.º, n.º 2, do seu Regimento,
A. Considerando que, em 18 de maio de 2017, o Conselho das Normas Internacionais de Contabilidade (IASB) emitiu uma nova norma sobre os contratos de seguro, a norma internacional de relato financeiro (IFRS) 17; considerando que, se aprovada pela UE, a IFRS 17 entrará em vigor na UE em 1 de janeiro de 2021 e substituirá a norma provisória IFRS 4; considerando que a IFRS 17 é a terceira grande norma contabilística emitida pelo IASB, após a IFRS 16 – Locações e a IFRS 9 – Instrumentos financeiros; considerando que as alterações à IFRS 4 abordaram a divergência nas datas de aplicação entre a IFRS 17 e a IFRS 9;
B. Considerando que a IFRS 4 se destinava apenas a ser uma norma temporária, contudo permite a utilização duma vasta gama de normas e práticas contabilísticas nacionais; considerando que existe uma grande diversidade na atual contabilidade dos seguros, nomeadamente quanto à mensuração dos passivos e ao reconhecimento das receitas e dos lucros;
C. Considerando que a IFRS 17 harmoniza as regras de contabilização dos contratos de seguro entre diferentes circunscrições e visa proporcionar uma descrição mais realista e permitir uma melhor comparabilidade das demonstrações financeiras no setor dos seguros;
D. Considerando que, no relatório sobre a estabilidade financeira global, de outubro de 2017, o Fundo Monetário Internacional (FMI) solicitou melhorias nos quadros regulamentares em matéria de seguros de vida, a fim de aumentar a transparência na comunicação de informações e de reforçar a resiliência do setor; considerando que o CEF acolheu favoravelmente a norma IFRS 17;
E. Considerando que, ao proporcionarem uma vasta gama de produtos de seguros e resseguros, as companhias de seguros europeias diferem nos seus modelos de negócio, incluindo as suas estruturas de investimento e responsabilidade; considerando que, sendo grandes investidoras institucionais, as companhias de seguros são igualmente investidoras a longo prazo;
F. Considerando que a Comissão está a realizar um balanço de qualidade sobre o quadro da UE para a comunicação pública de informações pelas empresas e, para este fim, examinou possíveis interações entre a IFRS 17, a Diretiva relativa à contabilidade das empresas de seguros e a Diretiva Solvência II;
G. Considerando que o EFRAG está atualmente a elaborar o seu parecer de adoção relativo à IFRS 17 e a proceder a uma análise de impacto pormenorizada para esse efeito; considerando que, nos seus documentos de informação, o EFRAG identificou como domínios controversos o nível de agregação, a margem de serviço contratual, o resseguro, as disposições transitórias e o impacto operacional;
H. Considerando que a Comissão dos Assuntos Económicos e Monetários examinará cuidadosamente a IFRS 17;
1. Observa que a IFRS 17 exigirá uma mudança fundamental na contabilidade dos contratos de seguro mas proporcionará uma maior coerência e transparência e procurará aumentar a comparabilidade;
2. Observa que serão necessários esforços e custos consideráveis e significativos para aplicar a IFRS 17, nomeadamente para as PME que trabalham no setor dos seguros, o que é indicativo da complexidade da nova norma; observa que os esforços de execução já estão em curso e que o IASB está a prestar apoio à aplicação, em especial através da criação de um grupo de recursos de transição para a IFRS 17;
3. Constata as preocupações relacionadas com a apresentação de contratos de seguro gerais, incluindo o risco de redução da qualidade da divulgação, aumentos indevidos dos custos de execução esperados e aumentos significativos da complexidade operacional da comunicação de informações nos termos da IFRS 17; insta o EFRAG a ponderar os custos previstos desta medida e se ela irá dificultar a compreensão do impacto financeiro dos contratos de seguro gerais;
4. Observa que um dos objetivos da IFRS 17 é gerar informação relevante para os acionistas, avaliando as responsabilidades decorrentes dos contratos de seguro; observa que se trata de um processo fundamentalmente complexo e que pode acentuar as perturbações financeiras;
5. Observa o trabalho em curso do EFRAG com vista a elaborar o seu parecer de adoção, especialmente sobre as questões por si identificadas – nomeadamente o nível de agregação, a margem de serviço contratual, o resseguro, as disposições transitórias e o impacto operacional; observa que o parecer de adoção final está previsto para dezembro de 2018; recomenda que este prazo seja revisto quando forem compreendidas a escala completa e a complexidade das questões identificadas no processo de ensaio de campo; congratula-se com as questões abordadas pela Comissão no seu pedido de parecer ao EFRAG – em particular, a necessidade de examinar os efeitos potenciais sobre a estabilidade financeira, a competitividade e os mercados de seguros, especialmente para as PME de seguros, bem como a necessidade de uma análise custo-benefício; insta o EFRAG a verificar se todas as características essenciais das coberturas de seguros se refletem de forma a não distorcer as garantias sociais oferecidas;
6. Salienta a necessidade de compreender plenamente a interação entre a IFRS 17 – que utiliza uma abordagem baseada em princípios – e outros requisitos regulamentares para as entidades seguradoras da UE, em particular, a Diretiva Solvência II, especialmente em relação aos custos de aplicação da IFRS 17; lamenta, contudo, que ainda não tenha sido desenvolvido qualquer ensaio de campo para examinar as repercussões potenciais da IFRS 17 para a estabilidade financeira, a competitividade e os mercados financeiros; portanto, insta a Comissão e os Estados-Membros a ponderarem a realização de testes mais amplos, incluindo ensaios de campo, para avaliar esses efeitos e interações; congratula-se com o balanço de qualidade da Comissão sobre o quadro da UE para a comunicação pública de informações pelas empresas, atualmente em curso; solicita à Comissão que informe o Parlamento sobre os resultados deste controlo e que lhe dê a devida atenção no procedimento de adoção; constata as preocupações da Autoridade Bancária Europeia (EBA) de que a IFRS 17 permite um tratamento contabilístico incoerente de transações semelhantes, em função do setor dos emitentes; portanto, insta o EFRAG a estabelecer uma ligação estreita com a EBA, a fim de avaliar se estas preocupações ainda são válidas no contexto dos requisitos finais da IFRS 17 e se as transações com uma substância económica semelhante são tratadas de forma coerente nos termos da IFRS 17;
7. Constata as preocupações manifestadas pela ESMA – no quadro da sua resposta à consulta de 2013 sobre o documento para debate sobre os contratos de seguro do IASB – sobre a apresentação dos efeitos das alterações na taxa de desconto em parte em «outro rendimento integral (OCI)» e em parte nos lucros ou prejuízos, o que poderá tornar as demonstrações financeiras demasiado difíceis de compreender e, portanto, prejudicar a comparabilidade dos contratos com características semelhantes; insta, por isso, o EFRAG a estabelecer uma ligação estreita com a ESMA e a avaliar essas preocupações – se continuarem a ser relevantes – ao elaborar o seu parecer de adoção, como parte dos requisitos finais da IFRS 17, e a concluir se a IFRS 17 cumpre o critério de adoção da compreensibilidade; constata as preocupações manifestadas pela ESMA na sua carta de observações de 2013 sobre os requisitos então propostos, nomeadamente, que a IFRS 17 pode não ser suficientemente clara quanto à apresentação das receitas e que a determinação da taxa de desconto e do ajustamento do risco pode prejudicar a sua aplicação efetiva; insta, por isso, o EFRAG a estabelecer uma ligação estreita com a ESMA e a avaliar essas preocupações – se continuarem a ser relevantes – ao elaborar o seu parecer de adoção, como parte dos requisitos finais da IFRS 17; constata as preocupações manifestadas pela EBA sobre a IFRS 17, pelo facto de permitir que uma entidade seguradora determine uma taxa de desconto utilizando uma abordagem descendente ou ascendente; insta, por isso, o EFRAG a estabelecer uma ligação estreita com a ESMA e a avaliar essas preocupações – se continuarem a ser relevantes – ao elaborar o seu parecer de adoção, como parte dos requisitos finais da IFRS 17, nomeadamente se esta opção pode aumentar significativamente a margem de apreciação e incoerência na aplicação potencialmente conducente à redução da comparabilidade da informação financeira e da gestão subjetiva dos lucros; saúda o projeto de investigação do IASB sobre as taxas de desconto e incentiva o IASB a desenvolver uma abordagem coerente e holística da metodologia para estimar e aplicar taxas de desconto;
8. Insta a Comissão e o EFRAG a terem em conta as recomendações formuladas nas suas resoluções de 7 de junho de 2016, sobre a avaliação do SAI, e 6 de outubro de 2016, sobre a IFRS 9, para a adoção da IFRS 17, nomeadamente no que se refere ao impacto das novas normas na estabilidade financeira e no investimento a longo prazo na UE, mas também aos riscos inerentes à propensão das provisões contabilísticas para provocarem efeitos pró-cíclicos e/ou uma maior volatilidade, especialmente tendo em conta que a IFRS 17 irá desviar a atenção dos custos históricos para os valores correntes; neste contexto, recorda as recomendações do relatório Maystadt sobre a expansão do critério de «bem público» – nomeadamente, que as normas de contabilidade não devem nem comprometer a estabilidade financeira na União, nem entravar o seu desenvolvimento económico; insta a Comissão a examinar especificamente se a prática de alguns Estados-Membros de basear a distribuição de lucros nas contas das IFRS sem aplicar quaisquer filtros aos ganhos não realizados é conforme com a Diretiva «Conservação do Capital»;
9. Observa que, na sequência da IFRS 17 e da IFRS 9, duas importantes alterações nas normas de relato financeiro estão a afetar a contabilidade das empresas de seguros; observa, em especial, que as alterações na avaliação são agora introduzidas tanto no ativo como no passivo dos balanços das seguradoras, dado que os ativos de investimento são avaliados a preços de mercado e as avaliações dos contratos de seguros incluem estimativas prospetivas líquidas de fluxos de caixa; insta o EFRAG a avaliar a potencial interação e as eventuais incompatibilidades entre a IFRS 9 e a IFRS 17;
10. Observa que as isenções à IFRS 17 e à IFRS 9 permitem a aplicação da IFRS 15 aos contratos relevantes; insta o EFRAG a avaliar se este tratamento é adequado;
11. Insta a Comissão e o EFRAG a terem em conta as preocupações relacionadas com o nível de agregação, incluindo os requisitos relativos ao funcionamento prático da atividade e ao agrupamento dos contratos em coortes anuais, o que pode proporcionar uma imagem pouco clara da gestão das empresas;
12. Insta a Comissão e o EFRAG a terem em conta, além disso, as preocupações relacionadas com o nível de agregação, na medida em que a desagregação de uma carteira segundo critérios de rendibilidade e de coortes anuais pode não refletir o funcionamento prático da atividade e, ao mesmo tempo, aumentar os custos, a complexidade e os encargos administrativos para as empresas;
13. Insta à clarificação sobre determinadas implicações negativas potenciais das disposições transitórias, especialmente em termos da complexidade das abordagens retrospetivas e da disponibilidade limitada de dados a este respeito; insta a Comissão e o EFRAG a terem em conta as consequências potenciais para a comparabilidade e as questões de dados da necessidade de aplicar abordagens múltiplas de transição para uma carteira de contratos de seguro;
14. Insta a Comissão e o EFRAG a terem em conta os benefícios potenciais para todas as partes interessadas;
15. Constata certas preocupações relacionadas com os contratos de resseguro, que constituem uma forma específica de seguro; insta o EFRAG a considerar o impacto das disposições da IFRS 17 na contabilidade do resseguro, tendo em conta tanto os interesses dos beneficiários como os modelos de negócio dos prestadores de serviços de resseguro;
16. Insta o recém-criado Laboratório sobre a Divulgação de Informação Financeira na Europa, do EFRAG, a prestar informações sobre a conceção das melhores práticas na comunicação de informações pelas empresas, nomeadamente no que respeita à divulgação de informações sobre a exposição financeira às alterações climáticas, em conformidade com as recomendações do grupo de trabalho sobre esta questão;
17. Observa que a verdadeira escala e complexidade da IFRS 17 apenas se tornarão claras quando o EFRAG tiver concluído a sua avaliação de impacto; insta a Comissão e o EFRAG a examinarem, em função dos resultados desta avaliação, a viabilidade do atual calendário de execução da IFRS 17 e a considerarem a potencial interação com as datas de execução noutras jurisdições;
18. Convida a Comissão – em conjunto com as Autoridades Europeias de Supervisão (ESA), o BCE, o ESRB e o EFRAG – a supervisionar atentamente a aplicação da IFRS 17 na UE, caso seja adotada, a preparar uma avaliação de impacto ex post, o mais tardar, até junho de 2024, a apresentar esta avaliação ao Parlamento Europeu e a atuar de acordo com as posições deste último sobre o tema;
19. Salienta que as seguradoras são responsáveis por informar os investidores sobre os potenciais efeitos da aplicação da IFRS 17;
20. Insta o ESRB a criar um grupo de trabalho sobre a IFRS 17;
21. Insta a Comissão a assegurar que a IFRS 17, caso seja adotada, seja favorável ao bem público europeu, incluindo os seus objetivos de sustentabilidade e de investimento a longo prazo, em conformidade com o Acordo de Paris;
22. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução à Comissão.